Um susto italiano

José Horta Manzano

Susto não foi, porque já fazia semanas que as pesquisas estavam mostrando a tendência. Assim mesmo, quando a boca de urna confirmou a vitória da extrema-direita nas eleições italianas, um calafrio percorreu Oropa, França e Bahia. A primeira página de jornais mundo afora reflete o choque.

Afinal a Itália, além de ser membro fundador da União Europeia, é sua terceira economia. Uma Itália que hesitasse a seguir caminho com os demais parceiros seria um golpe extremamente pesado, do qual a UE teria dificuldade em levantar-se. Num momento em que há uma guerra trovejando no continente, é pra lá de importante que todos se mantenham unidos.

Li e ouvi numerosas análises, cada uma com sua explicação do resultado das urnas. “Como é possível que os italianos estejam se mostrando saudosos de um passado fascista?” “Onde foi parar a esquerda, relegada ao papel de simples figurante no próximo parlamento?” “Como explicar essa deriva ‘trumpista’ que tomou conta da península?”

Acredito que, para abraçar o problema e encontrar a resposta, não precisa muita filosofia – uma análise terra a terra do ânimo dos eleitores é suficiente. Muitos povos, se não for a humanidade inteira, vivem à espera do homem providencial, aquele que virá salvar a lavoura e a pátria inteira. É um estado de espírito problemático, pois a entrega do destino de um país nas mãos de um único indivíduo costuma terminar em desastre.

A Alemanha de Hitler conheceu esse destino; os EUA de Trump também; a Rússia de Stalin, a Líbia de Kadafi, a Nicarágua de Ortega idem. E decerto a própria Itália de Mussolini. Mas não vamos exagerar. A república italiana, tal como está estruturada pela Constituição de 1946, conta com pêndulos e contrapoderes que tendem a equilibrar a governança.

A razão pela qual os italianos votaram no partido da Signora Meloni (Fratelli d’Italia) não tem tanto a ver com ideologia, mas com as dificuldades do dia a dia. Carestia, desemprego, inflação, juros altos, queda do poder aquisitivo – essas são as engrenagens que levaram ao voto de extrema-direita. O pequeno comerciante obrigado a trabalhar 14 horas por dia pra tirar um salário magrinho no fim do mês é tipicamente um eleitor insatisfeito com o sistema.

Nos últimos anos, a Itália conheceu governos de esquerda moderada, de direita moderada, de centro-esquerda, de centro-direita. Aos olhos de muitos, o país continua empacado. Por isso, decidiram votar num partido que, apesar de trazer vapores tóxicos de um fascismo idealizado, lhes pareceu capaz de levantar o país. Foi assim que investiram Signora Meloni no papel de salvadora da pátria.

A meu ver, a situação guarda certa semelhança com o Brasil de 2018. Quase ninguém estava querendo implantar a extrema-direita no país. O grande motor do voto foi a ojeriza ao lulopetismo. Bolsonaro foi o candidato que pareceu encarnar mais virulentamente o antipetismo. Por isso e para isso foi eleito.

Não se pode – nem se deve – acreditar que a Itália está à beira de um novo período de obscurantismo medieval, de leis raciais e de perseguição de oponentes e de homossexuais. Se os contrapoderes internos não forem suficientes, a União Europeia tem argumentos muito poderosos, como por exemplo o repasse periódico de dezenas de bilhões de euros a que Roma tem direito.

Pra finalizar, convém relativizar. Somente 64% dos eleitores votaram, o que significa que 1 em cada 3 italianos ficou em casa num domingo de chuva. O partido vencedor ficou com apenas 26% do total. Se calcularmos 26% de 64%, veremos que menos de 17% dos eleitores votaram para Fratelli d’Italia. Não é o caso de puxar os cabelos e começar a gritar.

Abaixo, a primeira página da edição impressa de uma seleção de jornais no dia seguinte ao do voto.

 

Il Giornale, Itália
A manchete faz trocadilho com a letra do hino nacional

 

 

The Times, Londres (Reino Unido)

 

 

Corriere della Sera, Itália

 

 

O Estado de São Paulo, Brasil

 

 

El País, Madrid (Espanha)

 

 

“I”, Portugal

 

 

La Vanguardia, Barcelona (Espanha)

 

 

Ara, Catalunha (Espanha)

 

 

De Morgen, Antuérpia (Bélgica)

Bolsonaro cabulou

G20 em Roma
O isolamento do negacionista Bolsonaro: os outros líderes o evitam e o brasileiro se comporta como turista.
Il Messaggero, Roma

José Horta Manzano

Na escola, quando alguém fugia pra não assistir a alguma aula, a gente dizia que “fulano cabulou a aula”. Muito tempo depois, quando a escola tinha ficado no passado, aprendi que cabular é verbo intransitivo. Segundo o dicionário, não se deve dizer que “fulano cabulou a aula”, mas simplesmente que “fulano cabulou”.

Soa esquisito, concordo com o distinto leitor. Mas dado que são os falantes que fazem a língua, acho que já passou da hora de o dicionário registrar essa maneira nossa de falar.

Dito isso, chegamos aonde eu queria: Bolsonaro cabulou. Cabulou o quê, minha gente? Cabulou o miolo do G20, a cúpula que reúne os dirigentes dos países que respondem por 80% do PIB mundial. Não é coisa pouca.

Mas ele foi a Roma!, dirão vocês. É verdade, foi, mas não participou de todas as palestras. Tirando o encontro com o presidente da Itália – que, por ser o anfitrião, recebeu protocolarmente todos os dirigentes estrangeiros –, não aproveitou a proximidade física dos grandes do planeta para nenhum colóquio bilateral. Nenhum. Cabulou boa parte do encontro.

E o que é que o capitão foi fazer em Roma? Turismo. Aproveitando o bom tempo e o clima ameno destes dias de outono, visitou a Fontana di Trevi – aquela onde se joga uma moedinha. Mas evitou ir lá com os demais dirigentes, que foram todos juntos. Foi numa “excursão privada”, cercado por seus 20 ou 30 cães de guarda. Sentindo-se protegido, passeou por ruas e ruelas, comeu de balcão, fez o que todo turista faz. Vê-se que o G20 não passou de pretexto para a vilegiatura.

Il Messaggero, tradicional jornal romano com história de quase século e meio, reparou na solidão do negacionista Bolsonaro: “os outros líderes do G20 o evitam, e o brasileiro vai de turista”. Sublinha a “boa ação” da alemã Merkel que, condoída do isolamento a que o capitão estava sendo submetido, deu com ele algumas palavrinhas de cortesia. Me pergunto em que língua ele terá respondido à boa ação. Se é que respondeu.

O jornal lembra a seus leitores o pesadíssimo relatório da comissão do Senado brasileiro (CPI), um ato de acusação de mais de 1.200 páginas no qual 9 crimes e delitos lhe são atribuídos, entre os quais, crime contra a humanidade. Menciona ainda os mais de 600 mil mortos de covid no Brasil.

Il Messaggero ressalta ainda que, se Bolsonaro se mostrou inerte nos trabalhos do G20, esteve ativíssimo nos giros turísticos pela capital. É verdade que ninguém imaginava que, da noite para o dia, ele se transformasse em soldado engajado na luta contra o aquecimento global, mas é incompreensível que, ao não organizar nenhum encontro bilateral, tenha deixado escapar todas as ocasiões de se entreter com os colegas.

Mas Bolsonaro está em boa companhia. Dois grandes poluidores globais também esnobaram o G20: o chinês Xi Jinping e o russo Vladimir Putin. Só que os dois tiveram a decência de manter-se à distância de Roma, enquanto nosso capitão não resistiu a levar sua avantajada comitiva de dezenas de participantes para um alegre passeio turístico pela capital italiana, enquanto líderes mais civilizados discutiam o futuro da humanidade. Ir a Roma e não ver o papa, pode?

Diferentemente dos demais dirigentes, Bolsonaro negou-se a conceder entrevista coletiva à imprensa. Mas deixe estar, já está previsto um encontro dele com Matteo Salvini, o líder da extrema-direita italiana. Será esta terça-feira em Pistoia, cidade toscana que abriga o cemitério militar brasileiro. O capitão participará de cerimônia em memória dos quase 500 pracinhas da Força Expedicionária Brasileira caídos na Segunda Guerra.

O trágico da história é que os soldados brasileiros foram enviados à Itália em 1944 justamente para combater o nazi-fascismo, doutrina admirada por Bolsonaro, Salvini e respectivos devotos. Os gestos, os atos e as falas dos dois tendem a confirmar que teriam preferido que nazistas e fascistas tivessem vencido a guerra.

Como se vê, cá como lá, a hipocrisia não tem limites.

Pra que serviu a CPI?

Excursão à Europa
Depois de deixar a embaixada pela porta dos fundos, Bolsonaro dá seu passeio turístico pelas ruas de Roma, sempre rodeado por pequena multidão de apoiadores descontraídos e sorridentes.
30 out° 2021

José Horta Manzano

Faz quase 3 anos que nos acostumamos a ter na Presidência um sujeito de poucas qualidades e muitos defeitos. Fanfarrão, boca-suja, despreparado, desfocado, misantropo, debochado, ignorante, covarde, egoísta, mentiroso – são seus desarranjos mais amenos. Os mais pesados teriam de ser descritos com palavrões impublicáveis.

É impressionante como a gente acaba se habituando a uma realidade trágica. E isso tinha de acontecer logo no Brasil, país tão carente de um personagem esclarecido, bem-intencionado e de mão firme para dirigir a República. E tinha de acontecer justo durante o maior desastre sanitário desde a Gripe Espanhola, de 1918.

Que remédio? É nossa sina. Desde que o velho FHC desceu a rampa, já lá se vão 20 anos, nossos presidentes têm sido assim: uns mais empacados, outros menos, mas todos desligados do Brasil real, distantes das necessidades verdadeiras da população. Tem sido um desfile de indivíduos indignos de ocupar a Presidência de um país cuja Constituição concentra tamanho poder nas mãos de um indivíduo só.

A gente sempre espera que o próximo será melhor. “Desta vez, vai!” – é a torcida de todos. No entanto, ai de nós todos, tirando a devoção cega que uma minoria de eleitores possa ter por este ou aquele, há que constatar: é um pior que o outro.

Só que, desta vez, com Bolsonaro, atingimos o ápice, o cúmulo, o topo, o nec plus ultra – impossível ir mais longe. (Pelo menos, é o que se espera; há gente pior, mas vamos torcer para que nunca sejam eleitos para a Presidência.)

Há quem acredite que a CPI da Covid não serviu pra nada. Não é minha opinião. Ela serviu para reafirmar – de papel passado e com firma reconhecida –, o que todo o mundo já sabia sobre o governo do capitão. Pra reforçar, ainda apareceram mais podres, como o Ministério da Saúde envolvido em negociata com vacinas, um episódio de corrupção explícita do governo Bolsonaro. A corrupção à la Bolsonaro, que antes era apenas suposição, tornou-se realidade fáctica.

A notícia atravessou as fronteiras. O mundo inteiro agora conhece a verdadeira face da sinistra farsa que se desenrola nos palácios de Brasília. De passeio em Roma para ouvir o discurso dos grandes dirigentes mundiais na reunião do G20, o popular capitão teve de deixar a embaixada do Brasil pela porta dos fundos. Na entrada principal, estavam jornalistas e manifestantes contrários à sua presença. Nem Dilma, nos piores momentos de seu desastrado governo, teve de passar por esse tipo de vexame. O homem só sai à rua cercado por uma vintena de seguranças tipo dois por dois.

Aos olhos do mundo, o Brasil, como nação, continua firme e forte. O mundo compreende que, ao eleger Bolsonaro, os brasileiros deram um pulo no escuro. Se o eleitorado soubesse, na época, o que se sabe hoje, o capitão jamais teria sido eleito. Este blogueiro, que acompanha diariamente o que se diz no exterior sobre o Brasil, tem se dado conta de que a imagem do presidente se descola cada dia mais do povo brasileiro. A opinião pública mundial aprendeu a fazer a diferença entre o desvairado dirigente e o povo, que é obrigado a suportá-lo. Guardando as devidas proporções, a situação é comparável ao que ocorre atualmente no Afeganistão: o povo é visto como vítima dos talibãs, não como cúmplice.

Há potentados pouco recomendáveis no mundo. Eu não poria a mão no fogo por gente como Putin (Rússia), Lukachenko (Bielo-Rússia), Kim Jung-il (Coreia do Norte), os bondosos irmãos Castro (Cuba), Maduro (Venezuela), Erdoğan (Turquia) & outros. Mas, no fundo, o que é que o mundo sabe deles? Pouco, muito pouco. Quase nada.

No caso de Bolsonaro, depois do relatório final da CPI, é diferente. Afinal, o inquérito não foi instruído por revolucionários juvenis, mas por senadores da República, eleitos pelo povo. Durante meses, as manchetes da imprensa mundial fizeram eco aos depoimentos e às acusações da CPI. Ninguém mais pode dizer que não sabia. Agora, terminados os trabalhos, o Brasil não será mais o mesmo. Todos nós sabemos. E o mundo também.

Trilha com sabor de chocolate

José Horta Manzano

Você sabia?

Os suíços sentem muito orgulho por seu país não ter sido invadido por tropas alemãs nem italianas na Segunda Guerra Mundial. É realmente surpreendente que a pequena Suíça não tenha sido engolida, com casca e tudo, pelos exércitos do Eixo. Afinal, excluindo um minúsculo trecho que a separa do Principado do Liechtenstein, a Suíça estava completamente cercada por nações em guerra. Tinha (ainda tem) fronteira com a Alemanha, a Itália, a França (ocupada pela Alemanha) e a Áustria (anexada à Alemanha). No país helvético, muita gente atribui essa não intervenção à força de dissuasão representada pelo poderio militar suíço.

Bunker disfarçado de chalé de madeira

Há quem sorria ao ouvir essa explicação. Seja como for, tanto Berlim quanto Roma sabiam que seria bastante complicado dominar e ocupar um território montanhoso como este. Sabiam também que os suíços estavam muito bem armados e equipados, além de serem conhecidos como combatentes aguerridos.

Toblerone de verdade

Hitler e Mussolini devem ter feito a conta duas vezes. Chegaram à conclusão de que não valia a pena perder tempo, dinheiro, esforço e vidas humanas para conquistar um território pouco industrializado e totalmente desprovido de riqueza mineral. De qualquer maneira, não saberemos nunca o que realmente passou pela cabeça dos dois ditadores.

Linha dos toblerones

Linha dos toblerones

Eu acrescentaria mais uma razão. Numa Europa conflagrada, interessava a todos respeitar a neutralidade de um pequeno território, situado bem no centro geográfico do conflito. Era um lugar seguro, de onde não se receava que viesse nenhuma ameaça. Mais que isso, era um lugar onde todos podiam guardar, na confiança, seus dinheiros, seus ouros, suas obras de arte e suas joias. Mais ainda: um lugar superconveniente para eventuais encontros secretos e confabulações discretas e confidenciais. Todas essas razões hão de ter contribuído para que o país fosse poupado.

Isso hoje faz parte da História. Como diz o outro, «Depois que aconteceu, qualquer um é profeta; difícil mesmo é adivinhar o futuro». Naqueles anos 1930, um bafo de guerra soprava no continente, embora ninguém soubesse de que lado nem com que força viria a tempestade. As autoridades suíças não podiam cruzar os braços e apenas torcer para que o país não fosse invadido. Todos tinham de estar prontos para repelir tropas inimigas.

Linha dos toblerones, hoje utilizada para caminhadas a pé

A inteligência militar planejou um complexo sistema de defesa. Naqueles tempos, a referência mais próxima era a Primeira Guerra (1914-1918), durante a qual os ataques se faziam por via terrestre, com tanques e blindados. Foi pensando nisso que bolaram o sistema defensivo suíço, basicamente terrestre àquela época. Incluía numerosos pontos, alguns dos quais são hoje conhecidos do grande público, enquanto outros ficarão secretos para sempre. Talvez seja melhor assim.

Todas as pontes do país estavam minadas. Ao menor sinal, as vias de comunicação seriam interrompidas, o que dificultaria tremendamente o avanço de tropas inimigas. A região de Genebra, fronteiriça com a França, trazia um problema espinhoso para os militares. Por ser constituída de terrenos planos e pela ausência de rios, foi considerada indefensável. Tomou-se a decisão tática de dar a cidade como perdida e implantar o sistema de defesa uns 30km mais para o interior do país.

Villa Rose Fortaleza disfarçada de casa de campo

Villa Rose
Fortaleza disfarçada de casa de campo

Construíram-se fortalezas com aparência de pacíficas casas de campo. Foram levantados bunkers com aspecto externo de inofensivos chalés de madeira. Instalaram-se discretos postos de observação em pontos mais elevados ― naqueles tempos não havia street view nem espionagem por satélite. Para completar, uma verdadeira obra de arte defensiva foi construída, uma versão helvética da muralha da China. Ficou conhecida popularmente como Ligne des toblerones, a linha dos toblerones.

O que era e por que lhe deram esse nome?
Era – e ainda é – uma linha de 10km de blocos de concreto que impossibilitam a passagem de tanques de guerra. São quase 3000 blocos monstruosos de 9 toneladas cada um. Têm forma peculiar de tetraedro que lembra um pedaço de chocolate Toblerone, daí o apelido.

Villa Rose Janela com cortina falsa

Detalhe da Villa Rose: janela com cortina falsa

Não se tem notícia de que nenhum tanque tenha jamais tentado superar o obstáculo. A guerra acabou faz muito tempo. A Suíça não foi invadida. Mas os toblerones continuam lá até hoje. Quem é que vai arrastar aqueles imensos blocos? E o que fazer com eles depois? Assim, foram deixados onde estavam e, aos poucos, acabaram se tornando atração turística. Uma trilha própria para caminhadas a pé serpenteia por quilômetros, dentro da floresta, ao longo da barreira de concreto. É conhecida hoje como o Sentier des Toblerones, a Trilha dos Toblerones.

Taí uma obra militar que soube envelhecer. Em escrupuloso respeito ao espírito atual, não foi atirada a um lixão mas acabou reciclada.

Publicado originalmente em 28 nov° 2013.

Trilha dos toblerones

José Horta Manzano

Você sabia?

Os suíços sentem muito orgulho por seu país não ter sido invadido por tropas alemãs nem italianas na Segunda Guerra Mundial. É realmente surpreendente que a pequena Suíça ― cercada por Alemanha, Itália, Áustria (anexada pela Alemanha) e França (ocupada por tropas de Berlim) ― não tenha sido engolida, com casca e tudo, pelos exércitos do Eixo. A maioria do povo atribui essa não intervenção à força de dissuasão representada pelo poderio militar suíço.

Bunker disfarçado de chalé de madeira

Há quem sorria ao ouvir essa explicação. Seja como for, tanto Berlim quanto Roma sabiam que seria bastante complicado dominar e ocupar um território montanhoso como este. Sabiam também que os suíços estavam muito bem armados e equipados, além de serem conhecidos como combatentes aguerridos.

Toblerone de verdade

Hitler e Mussolini devem ter feito a conta duas vezes. Chegaram à conclusão de que não valia a pena perder tempo, dinheiro, esforço e vidas humanas para conquistar um território pouco industrializado e totalmente desprovido de riqueza mineral. De qualquer maneira, não saberemos nunca o que realmente passou pela cabeça dos dois ditadores.

Linha dos toblerones

Linha dos toblerones

Eu acrescentaria mais uma razão. Numa Europa conflagrada, interessava a todos respeitar a neutralidade de um pequeno território, situado bem no centro geográfico do conflito. Era um lugar seguro, de onde não se imaginava poder vir nenhuma ameaça. Mais que isso, era um lugar onde todos podiam guardar, na confiança, seus dinheiros, suas obras de arte, seus objetos de valor. Mais ainda: um lugar onde se podiam organizar eventuais encontros secretos e manter conversações discretas e confidenciais. Todas essas razões hão de ter contribuído para que o país fosse poupado.

Isso hoje faz parte da História. Como diz o outro, «depois do fato consumado, é fácil ser profeta». Difícil mesmo é adivinhar o que está por ocorrer. No final dos anos 30, um bafo de guerra soprava no continente, mas ninguém sabia de que lado nem com que força chegaria a tempestade. As autoridades suíças não podiam cruzar os braços e apenas torcer para que o país não fosse invadido. Todos tinham de estar prontos para repelir tropas inimigas.

Linha dos toblerones

Linha dos toblerones – hoje utilizada como trilha para caminhada a pé

A inteligência militar planejou um sistema de defesa. A referência mais próxima era a Primeira Guerra, durante a qual os ataques se faziam por via terrestre, com tanques e blindados. Foi pensando nisso que bolaram o sistema defensivo suíço, basicamente terrestre àquela época. Incluía numerosos pontos, alguns dos quais são hoje conhecidos do grande público, enquanto outros ficarão secretos para sempre. Talvez seja melhor assim.

Todas as pontes do país estavam minadas. Ao menor sinal, as vias de comunicação seriam interrompidas, o que dificultaria tremendamente o avanço de tropas inimigas. A região de Genebra, fronteiriça com a França, trazia um problema espinhoso para os militares. Por ser constituída de terrenos planos e pela ausência de rios, foi considerada indefensável. Tomou-se a decisão tática de dar a cidade como perdida e implantar o sistema de defesa uns 30km mais para o interior do país.

Villa Rose Fortaleza disfarçada de casa de campo

Villa Rose
Fortaleza disfarçada de casa de campo

Construíram-se fortalezas com aparência de casas de campo. Foram levantados bunkers com aspecto externo de inofensivos chalés de madeira. Instalaram-se discretos postos de observação em pontos mais elevados ― naqueles tempos não havia street view nem espionagem por satélite. Para completar, uma verdadeira obra de arte defensiva foi construída, uma versão helvética da muralha da China. Ficou conhecida popularmente como Ligne des toblerones, a linha dos toblerones.

O que era e por que lhe deram esse nome?
Era ― e ainda é ― uma linha de 10km de blocos de concreto para barrar a passagem de tanques de guerra. São quase 3000 monstros de 9 toneladas cada um. Têm forma peculiar de tetraedro que lembra um pedaço de chocolate Toblerone, daí o apelido.

Não se tem notícia de que nenhum tanque tenha jamais tentado superar o obstáculo. Mas os toblerones continuam lá até hoje. Viraram atração turística. Trilhas próprias para caminhadas a pé serpenteiam por quilômetros, dentro da floresta, ao longo da barreira de concreto. É hoje o Sentier des Toblerones, a Trilha dos Toblerones.

Villa Rose Janela com cortina falsa

Detalhe da Villa Rose
Janela com cortina falsa

Taí uma obra militar que soube envelhecer. Em escrupuloso respeito ao espírito atual, não foi atirada a um lixão mas acabou reciclada. Incluí algumas imagens dos bunkers disfarçados de chalé e dos toblerones.

Publicado originalmente em 28 nov° 2013.

 

De ventos e de auroras

José Horta Manzano

Antes de se interessar pelos pontos cardeais, os antigos se preocuparam com os ventos, as chuvas, o ritmo das estações. Dá pra entender. A vida era dura e não dava espaço pra divagações filosófico-astronômicas. Do tempo atmosférico dependiam os cuidados a dedicar à agricultura. Mais importante que saber onde estavam o norte ou o sul era conhecer os ventos que sopravam de um quadrante ou de outro.

vento-5Tanto na Grécia antiga quanto na Roma dos Césares, os ventos ganharam nome antes dos pontos cardeais. Por consequência, os adjetivos usados para indicar o que vem do norte (ou o que lá está) derivam dos ventos que sopram daquele quadrante. O mesmo vale para o lado oposto, o sul.

O termo latino «bórea», que corresponde ao grego «boréas», designa o vento frio que sopra do norte. Na outra ponta, o latino «áuster», relacionado com o grego «áuso», é o nome dado ao vento sul, um sopro quente e árido.

Em nossa língua, no dia a dia, dizemos “nortista”, “sulista”, “sulino” ‒ são vocábulos mais fáceis de reter e de entender. Em linguagem mais tensa, esses termos são substituídos por “boreal” e “austral”, o primeiro se referindo ao norte e o segundo, ao sul.

Nas regiões situadas em altas latitudes ‒ cerca dos polos ‒, ocorrem fenômenos elétricos episódicos na alta atmosfera, que se traduzem por clarões impressionantes, de cor variando entre verde intenso e solferino. O espetáculo leva o nome de aurora polar. Em três cliques, o distinto leitor encontrará na internet descrição detalhada dos comos e dos porquês desse fenômeno.

Folha de São Paulo, 3 março 2017 Clique para ampliar

Folha de São Paulo, 3 março 2017
Clique para ampliar

O Hemisfério Norte de nosso planeta é habitado, enquanto o Hemisfério Sul tem pouca terra e pouca gente. Logicamente, auroras polares são observadas com maior frequência nas regiões próximas do Polo Norte ‒ Rússia, Canadá, Groenlândia, Escandinávia, Islândia. Por ocorrer no Hemisfério Norte, esse fenômeno costuma ser chamado aurora boreal. No Hemisfério Sul, o mesmo acontecimento só pode ser observado a partir da Antártida, lugar pouco hospitaleiro.

Aurora polar observada nas cercanias do Polo Sul não será ‘boreal’, mas austral. O autor da legenda da belíssima foto publicada pela Folha de São Paulo trocou os pés pelas mãos. Desconhecendo o significado do termo «boreal», há de ter imaginado que se referia ao fenômeno. Errou. A palavra tem a ver com o norte.

Tivesse escrito «aurora austral», o autor da legenda teria merecido aplausos.

O legado dos Jogos Olímpicos

José Horta Manzano

De praxe, a cidade organizadora dos Jogos Olímpicos é designada com antecedência de sete anos. Como todos sabem, a próxima edição já está marcada: terá lugar em Tóquio em 2020. Para o futuro, muitas cidades adorariam abrigar os JOs.

Para a edição seguinte, a de 2024, seis cidades se candidataram. Eram todas pesos-pesados: Toronto, Hamburgo, Roma, Budapeste, Paris e Los Angeles. Três delas, por sinal, já sediaram os Jogos no passado. O Comitê Internacional Olímpico esfregou as mãos ‒ todas as postulantes apresentavam boas garantias de organização impecável. Desta vez, os suores frios causados pelos JOs Rio 2016 não deveriam se repetir.

jo-2024-1Acontece que, por mais que sejam ricas, as candidatas não são bobas. Os problemas de organização e, principalmente, o legado envenenado deixado pelas Olimpíadas no Rio de Janeiro despejaram um balde de água fria e fizeram murchar o entusiasmo de futuros postulantes.

Pouco a pouco, população e autoridades foram se dando conta de que a herança deixada pela organização dos JOs são ruinosas e perigam representar um rastro de dívidas que levarão anos para ser reembolsadas. Uma a uma, começaram a chegar as desistências.

Toronto, a metrópole canadense e Hamburgo, cidade alemã de primeira importância, foram as primeiras a jogar a toalha, já em 2015. O povo da primeira disse «no» e o da segunda ecoou «nein». Veio, em seguida, a vez de Roma. Já sufocantemente endividada, a capital italiana considerou irresponsável destinar bilhões aos «Jogos do cimento armado» e às «catedrais do deserto».

jo-2024-2A quarta desistência já chegou. Trata-se de Budapeste. Uma petição lançada por habitantes da cidade forçou as autoridades a renunciar à gastança. Saiu hoje a notícia oficial: a bela capital húngara não quer mais saber de sediar os Jogos. No páreo, sobraram Paris e Los Angeles. Ambas garantem já dispor das instalações que o evento demanda.

A decisão do Comitê Internacional será anunciada em setembro próximo. Sei não, mas algo me diz que, se Donald Trump continuar presidindo os EUA até lá e, principalmente, se persistir na insuportável política populista de vetar a entrada de visitantes oriundos de determinados países, Los Angeles dificilmente será designada como sede em 2024. Delegações inteiras correriam o risco de não serem autorizadas a pôr os pés no país, um despropósito.

Quanto a nós, estamos amargando o ônus da herança maldita deixada pela Copa e pelas Olimpíadas. O lado bom desse «legado» é a garantia de que estamos livres de acolhê-los pelo próximo século. É um alívio.

Se l’Italia fosse il Brasile

José Horta Manzano

Tenho um amigo italiano enamorado pelo Brasil. Originário da região de Veneza, Massimo Pietrobon é blogueiro e poliglota. Vive a maior parte do ano em Barcelona (Espanha), mas sempre que pode dá uma escapada pra rever a Terra de Santa Cruz.

Apaixonado por Geografia em geral ‒ e por mapas em particular ‒, Massimo teve uma ideia outro dia. Tomou um mapa da Itália e deu a cidades italianas importantes o nome de localidades brasileiras. Para cada caso, acrescentou uma justificativa, algum aspecto que sirva de elo entre ambas. Ficou interessante e curioso. Dou aqui abaixo um apanhado das muitas correspondências entre os dois países encontradas pelo Massimo.

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Para começar, São Paulo, cinzento e chuvoso mas principal centro econômico, só pode corresponder a Milão. Por seu lado, o Rio de Janeiro, caótico mas denso de beleza e de turismo, se encaixa bem com Roma, a outra metrópole italiana.

I love ITFlorianópolis, bela, turística e ilhoa, compara-se com Veneza, que tem as mesmas características. Recife, centro-mor do Nordeste, se conjuga maravilhosamente com Nápoles, centro-mor do Sul da Itália. Perto de Nápoles, está Amalfi, preciosidade histórica. E ao lado do Recife, o que é que está? Olinda, naturalmente, nossa joia antiga e carregada de história.

Outro ponto focal do Sul italiano é a ilha da Sicília, a confrontar com o outro representante do Nordeste brasileiro: a Bahia. Portanto, Salvador é Palermo.

A longínqua Amazônia, com Manaus, isolada capital, só pode ser a Sardenha e sua capital Cagliari. Ambas as regiões são selvagens e souberam conservar a cultura dos primitivos habitantes.

E Bolzano, a capital do Tirol do Sul, onde predomina a língua alemã? Corresponde a Blumenau, centro maior da imigração germânica no Brasil. Já as belezas históricas e naturais da Toscana se adaptam bem às preciosidades e às paisagens das Minas Gerais.

Turim, cidade organizada e funcional, combina com Curitiba, ao passo que o grande porto industrial de Gênova tem tudo a ver com o de Santos. Falando de cursos d’água, o mais importante da Itália é o Rio Pò, que se lança ao mar num delta cuja capital é Ferrara. Não é absurdo compará-la a Belém, situada exatamente onde o Amazonas desemboca no Atlântico. Outro ponto comum é que as duas cidades estão encharcadas de História.

I love BRPorto Alegre, cidade portuária que já se aproxima dos confins culturais do Brasil, é Trieste, onde já é perceptível a mestiçagem entre italianos, eslavos do sul e remanescentes do antigo Império Austro-Húngaro.

Na hora de comparar cidades saídas de uma prancheta de urbanista, não há que hesitar: a italiana Latina e nossa Brasília têm esse ponto em comum.

A grande cidade brasileira situada próxima de um dos pontos cardeais da rosa dos ventos é João Pessoa, que marca o extremo leste das Américas continentais. Na Itália, corresponde a Reggio Calabria, que assinala a ponta sul da bota.

Bandeira brasileira com as cores italianas

Bandeira brasileira com as cores italianas

Não há como não mencionar a região de Parma, de onde é exportado para todo o mundo o delicioso queijo parmesão, aquele sem o qual o macarrão perderia a graça. (Dizem que macarrão sem queijo é como amor sem beijo…) Que se compare Parma com nosso Estado de Minas que, no Brasil, é referência em matéria de queijo.

Há certamente outras semelhanças. Que o leitor curioso ponha o bestunto a funcionar. Buona fortuna a tutti!

PS: Para visitar o site original, clique aqui.

Vitória de Pirro

José Horta Manzano

Você sabia?

Continuo aplaudindo de pé a equipe responsável pela atribuição de nome às diferentes fases da Operação Lava a Jato. Vitória de Pirro… esta de hoje é mesmo de pasmar.

A expressão já era usada pelos romanos há dois milênios. Faz referência a Pirro I (318-272 a.C.), que reinava sobre a região de Épiro, na Grécia antiga. Era época de expansão. A Grécia havia fundado colônias na orla do Mediterrâneo ‒ Itália, França, Norte da África.

O crescente poderio do Império Romano, no entanto, começava a ameaçar a expansão grega. Enfrentamentos militares foram-se tornando inevitáveis.

Rei Pirro I

Rei Pirro I

Rei Pirro I havia estabelecido uma colônia no sul da Itália, chamada Heracleia. A “invasão” irritou os romanos, que decidiram expulsar os forasteiros. Uma batalha foi travada entre os autóctones e as tropas do rei Pirro. O exército grego venceu a batalha, mas suas tropas sofreram danos irreparáveis. A aparente vitória militar acabou revelando-se contraproducente por ter resultado em derrota a longo prazo.

Desde então, toda vitória que se transforma em fracasso costuma ser chamada de «Vitória de Pirro». A história guarda uma alentada lista de batalhas que entram nessa categoria. Feitos não militares às vezes costumam ser batizados com o mesmo epíteto. É justamente o caso da mais recente fase da Lava a Jato.

Cleptoestilo

Cláudio Humberto (*)

Tratando mal quem a cerca, Dilma firmou má reputação por casos como o da ajudante de ordens que abandonou o serviço no meio do dia, cansada de grosserias. E o do médico da Presidência, que virou paciente por estresse. Ou também daquele dia em que, brandindo um cabide, investiu contra uma pobre camareira, que deve estar correndo até hoje.

Fazem também a delícia do serpentário do Itamaraty histórias de sua curiosa mania de considerar que objetos de hotéis de luxo são seus.

by Miguel Abreu Falcão (1963-), desenhista pernambucano

by Miguel Abreu Falcão (1963-),
desenhista pernambucano

Diplomatas passaram vergonha, certa vez, em Buenos Aires, ao serem cobrados por algo que faltava após Dilma deixar o hotel Four Seasons. A mesa de jantar da suíte de Dilma tinha sido enfeitada com uma belíssima (e cara) toalha. Madame gostou tanto que a levou para casa.

Outro dia, ao deixar o hotel romano Westin Excelsior (diária de R$8 mil), Dilma não se fez de rogada: levou dois travesseiros que tinha adorado.

O apego de Dilma por pertences de hotéis só se compara à atração que Lula nutre por vinhos caros, com os quais ele se fazia presentear por embaixadores.

(*) Cláudio Humberto, bem informado jornalista, publica coluna diária no Diário do Poder.

De plebiscitos e referendos

José Horta Manzano

Mais de uma vez já abordei, neste espaço, o tema plebiscito x referendo. Como voltou às manchetes, volto eu ao assunto. Nossa presidente, talvez aconselhada por algum assessor de ideia fixa, bate com frequência nessa tecla. Nos momentos de grande tensão, costuma subir ao palanque e bradar por um plebiscito.

Aconteceu na sequência das manifestações de junho 2013 e voltou a ocorrer agora, na emoção de sua surpreendente reeleição. Ainda não captei qual será a real intenção por detrás da palavra mágica.

Plebiscito… O termo deve tocar alguma corda sensível no fundo da alma da presidente – ou do assessor que lhe sopra nos ouvidos. Parece ser a panaceia, aquele remédio universal recomendado para todos os males. Um problema? Organiza-se um plebiscito e pronto! A felicidade geral se instala e os problemas desaparecem. Antes fosse.

Ao ter notícia da vontade presidencial, o presidente do Senado logo retrucou que um referendo seria mais adequado. Plebiscito ou referendo? Enquanto não captamos o intuito dos caciques, vamos dar uma espiada no significado das duas palavras. Ambas nos vêm direto do latim por via erudita. São conceitos que a Idade Média anestesiou e que só voltaram à luz no século XVII.

Roma – senado

Roma – senado

Plebiscito é consulta direta ao povo. A palavra é composta de plebis (a plebe, o povo) + scitum (de sciscere = decretar, aprovar). Para os romanos, uma lei era dita plebiscitária quando tivesse sido feita por todos os cidadãos, incluindo aqueles que, em princípio, não estavam qualificados para participar do processo legislativo. Em resumo, era consulta ao povão, coisa rara naqueles tempos.

Referendo é conceito mais recente. Em algumas democracias – na Suíça, por exemplo – aceita-se que uma lei votada pelo parlamento seja contestada pelos cidadãos. Em casos assim, organiza-se um referendo, para que o povo aprove ou repudie a lei já votada. No fundo, um referendo é sempre um plebiscito. Mas um plebiscito nem sempre é referendário.

Senador romano

Senador romano

A meu ver, no caso de uma ampla reforma política como a que o Brasil está a exigir, não cabem nem plebiscito nem referendo. Reforma política é assunto árduo, técnico, composto de várias facetas. Tem de ser estudada por especialistas, pesada, analisada, emendada. Não faz sentido pedir ao povo que dê opinião sobre cada artigo, cada parágrafo, cada alínea. É um despropósito.

Consulta direta ao povo tem de ser simples. Os cidadãos devem responder por um sim ou por um não. Como proceder no caso de uma reforma política?

O Congresso existe exatamente para representar a população. Câmara Federal e Senado acabam de ser renovados. Que se aproveite essa nova leva de parlamentares e que se lhes dê o encargo de elaborar a reforma.

Não há necessidade de plebiscito nem de referendo. Ao eleger o novo Congresso, os eleitores já deram carta branca a seus representantes. Aquela gente é paga exatamente para isso.

Recordar é viver ― 5

Lingua 1O ex-presidente Lula fala apenas a própria língua, e mal. Mas também não finge “arranhar” outros idiomas.

Em 2005, por ocasião da cerimônia de sepultamento do Papa João Paulo II, ele se viu em meio a personalidades políticas mundiais, incluindo o então presidente da França, Jacques Chirac, que lhe dirigiu algumas palavras.

Sem qualquer diplomata brasileiro nas proximidades para socorrê-lo, o Lula não hesitou. Cutucou o antecessor Fernando Henrique Cardoso, que estava ao lado, e pediu com toda a humildade:

― Traduz aí, Fernando!

Pescado no site do Cláudio Humberto, Diário do Poder.

Frase do dia — 110

«Eleito papa, Francisco pediu aos argentinos que dessem dinheiro aos pobres em vez de ir a Roma saudá-lo. Há pouco, decidiu tirar um passaporte comum argentino. Doutora Dilma foi a Roma festejar o barrete de Dom Orani Tempesta. Na comitiva, um lote de passaportes especiais.»

Elio Gaspari, em sua coluna da Folha de São Paulo, 23 fev° 2014.

O país dos relógios

José Horta Manzano

Parece brincadeira mas é verdade. A inacreditável notícia foi dada por vários órgãos da mídia suíça e europeia. Está tão bem contado pelo site francês MetroNews, que não me resta senão traduzir. Aqui está:

Avião sequestrado e desviado a Genebra Foto: SIPA

Avião sequestrado e desviado a Genebra
Foto: SIPA

Interligne vertical 9Um avião que cumpria o trajeto entre a Etiópia e a Itália foi sequestrado segunda-feira de manhã e desviado para Genebra. Mas a aviação (militar) suíça não se mexeu. Por quê? Simplesmente porque era cedo demais.

O aparelho foi escoltado até Genebra por aviões militares franceses e italianos. Os aviões suíços, no entanto, não alçaram voo. Em princípio, certas situações são consideradas excepcionais. Mas na Suíça, nem o sequestro de um avião tem o poder de alterar a regra: tem hora pra tudo.

Assim, quando o aparelho das Linhas Aéreas Etíopes, no trajeto entre Adis Abeba e Roma, foi sequestrado e desviado segunda feira cedo pelo próprio copiloto, a aviação suíça não se abalou. O regulamento reza que as forças aéreas somente estão disponíveis das 8h às 12h e das 13h30 às 17h. A Itália e a França se encarregaram de escoltar o aparelho até Genebra.

O diário suíço Le Matin explica essa singular peculiaridade helvética. «As autoridades suíças foram avisadas desde as 4h30 da madrugada que um avião etíope de carreira se havia desviado de sua trajetória na Itália e se dirigia a Genebra», escreve o jornal suíço. «Pela lógica, o alarme deveria ter soado em todas as bases militares do país, deixando seus F/A 18 prontos para decolar. Só que, mesmo em casos de extrema urgência ― como hoje de manhã ― a aviação militar respeita seu horário.»

Catástrofe evitada
«Não temos condições de assegurar plantão de 24 horas por dia», reconhece Laurent Savary, porta-voz das Forças Aéreas Suíças. «Tendo em vista nossas restrições de orçamento e de pessoal, a Suíça concluiu acordo com os países vizinhos para garantir o policiamento aéreo fora das horas de abertura das bases militares.»

«O problema é que, se o sequestrador tivesse perdido a cabeça e estivesse decidido a jogar o aparelho sobre a cidade de Genebra, os jatos estrangeiros não estariam autorizados a abatê-lo. Como nenhum avião militar suíço estaria disponível antes das oito da manhã, a catástrofe teria sido total.»

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Nota à atenção dos que pretenderem invadir a Suíça: tenham a fineza de fazê-lo no horário regulamentar. Antecipadamente, agradecemos.

O aprendizado 2

A plataforma esqueceu de avisar, mas eu me encarrego. Tem artigo novo. O caminho é este aqui.

O aprendizado

José Horta Manzano

Signor Pizzolato pisou… na bola. Deu a confirmação de que o uso do cachimbo faz a boca torta. Acostumado com a impunidade, descuidou-se. Além disso, imaginou que a cidadania italiana lhe fornecia uma redoma protetora.

Na quase certeza de que o imbróglio do mensalão terminaria em torno de uma pizza regada a chianti, esperou até o último momento. Cometeu erros primários e preparou mal sua rota de fuga.

Aqui vão 10 conselhos para candidatos a escapar da Justiça. Para signor Pizzolato, já é tarde. Mas, sabe-se lá, pode até servir para outros.

Interligne vertical 81) O mundo encolheu. Não há mais espaço para aventuras do tipo daquela protagonizada por Ronald Biggs ― o assaltante do trem pagador. Big Brother is watching you everywhere, o Grande Irmão está de olho em você por toda parte.

2) Um passaporte estrangeiro não é garantia automática de proteção. Especialmente quando emitido por país civilizado.

3) Se a Justiça está aí para julgar, a polícia está aí para prender. É sua função. E policiais não apreciam passar por bobos. Não zombe deles, que a corda pode arrebentar do seu lado.

4) Não dê publicidade à sua fuga. Não deixe indícios, não faça nenhuma confidência, não contrate advogado, não nomeie porta-voz. Desapareça e pronto. Cabe aos outros cogitar. Quanto a você, boca calada.

5) Esqueça certas invenções da vida moderna: telefone, celular, email, facebook. Para se comunicar com aquelas duas ou três pessoas com quem mantém contacto esporádico, utilize o correio, mande recado ou escolha uma «caixa postal», quero dizer, um esconderijo discreto onde você pode deixar mensagem escrita que será recolhida mais tarde por um cúmplice.

6) Não leve sua esposa. Nem deixe que ela saiba onde você se esconde. Tenha em mente que seus familiares certamente serão vigiados e seguidos. São eles o elo fraco da corrente. Evite todo contacto com a família durante alguns anos. Deixe que a situação esfrie. É o preço a pagar, meu caro, não há outro meio. “On ne peut pas avoir le beurre et l’argent du beurre”, não se pode ter a manteiga e o dinheiro da manteiga.

7) Nem por sonho abra conta em banco. Nem em pesadelo utilize cartão de crédito. Nem por delírio envie ou receba dinheiro por via bancária.

8) Não escolha como residência a casa de um parente. (Ô, signor Pizzolato, francamente!) Passe longe de todos os que conheceu antes. Se cruzar um deles na rua, finja que não viu.

9) Resida numa cidade grande. No caso do antigo diretor do BB, Milão ou Roma teriam sido mais indicadas. Fincar pé num vilarejo? Que cochilo!

10) Escolha um prédio grande para morar, com muitos andares e muitos apartamentos. No meio da multidão, você passará despercebido.

Conheço brasileiros que vivem clandestinamente na Europa há duas décadas. Seguiram os princípios básicos e nunca foram importunados pela polícia. Bem, a honestidade me obriga a dizer que nenhum deles está na lista da Interpol.

Signor Pizzolato foi confiado demais. Acreditou em promessas de solidariedade de companheiros, que lhe garantiram apoio até a última gota de sangue. Balela. Quem imaginaria que tudo houvesse de terminar num salve-se quem puder?

No Brasil, a tramitação do processo se arrastou por 7 anos, sem que fosse determinada a prisão preventiva de nenhum acusado. Na Itália, uma vez desmascarado, em meia hora signor Pizzolato foi mandado pra trás das grades da cadeia mais próxima.Interligne 18e

Mas não sejamos severos demais. É compreensível que signor Pizzolato tenha tentado escapar. O próprio Ron Biggs ― aquele do trem pagador ―, depois de passar décadas em Pindorama, pensou melhor e chegou à conclusão de que mais valia viver preso na Inglaterra do que solto no Brasil. Entregou-se.

Pra você ver.
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Abaixo estão alguns recortes da imprensa italiana. A expressão «tangentopoli» foi inventada por jornalistas para designar uma sequência de escândalos financeiros ocorridos faz alguns anos no país. É um bom equivalente italiano para nosso “mensalão”.

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Em Pozza di Maranello, veja como foi capturado o fugitivo brasileiro

Em Pozza di Maranello, veja como foi capturado o fugitivo brasileiro

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Preso banqueiro integrante do "mensalao" brasileiro

Preso banqueiro integrante do “mensalao” brasileiro

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Preso Pizzolato: o banqueiro brasileiro estava escondido em Portovenere

Preso Pizzolato: o banqueiro brasileiro estava escondido em Portovenere

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Integrante do mensalão do Brasil de Lula, Pizzolato foi preso em Maranello

Integrante do mensalão do Brasil de Lula, Pizzolato foi preso em Maranello

A trilha dos toblerones

José Horta Manzano

Você sabia?

Bunker disfarçado de chalé de madeira

Bunker disfarçado de chalé de madeira

Os suíços sentem muito orgulho por não terem tido o país invadido por tropas alemãs nem italianas na Segunda Guerra Mundial. É realmente surpreendente que a pequena Suíça ― cercada por Alemanha, Itália, Áustria (anexada pela Alemanha) e França (ocupada por tropas de Berlim) ― não tenha sido engolida, com casca e tudo, pelos exércitos do Eixo. A maioria do povo atribui essa não intervenção à força de dissuasão representada pelo poderio militar suíço.

Toblerone de verdade

Toblerone de verdade

Há quem sorria ao ouvir essa explicação. Seja como for, tanto Berlim quanto Roma sabiam que seria bastante complicado dominar e ocupar um território montanhoso como este. Sabiam também que os suíços estavam muito bem armados e equipados, além de serem conhecidos como combatentes aguerridos.

Hitler e Mussolini devem ter feito a conta duas vezes. Chegaram à conclusão de que não valia a pena perder tempo, dinheiro, esforço e vidas humanas para conquistar um território pouco industrializado e totalmente desprovido de riqueza mineral. De qualquer maneira, não saberemos nunca o que realmente passou pela cabeça dos dois ditadores.

Linha dos toblerones

Linha dos toblerones

Eu acrescentaria mais uma razão. Numa Europa conflagrada, interessava a todos respeitar a neutralidade de um pequeno território, situado bem no centro geográfico do conflito. Era um lugar seguro, de onde não se imaginava poder vir nenhuma ameaça. Mais que isso, era um lugar onde todos podiam guardar, na confiança, seus dinheiros, suas obras de arte, seus objetos de valor. Mais ainda: um lugar onde se podiam organizar eventuais encontros secretos e manter conversações discretas e confidenciais. Todas essas razões hão de ter contribuído para que o país fosse poupado.

Isso hoje é História. Como diz o outro, «depois do fato consumado, é fácil ser profeta». Difícil mesmo é adivinhar o que está por ocorrer. No final dos anos 30, um bafo de guerra soprava no continente, mas ninguém sabia de que lado nem com que força chegaria a tempestade. As autoridades suíças não podiam cruzar os braços e apenas torcer para que o país não fosse invadido. Todos tinham de estar prontos para repelir tropas inimigas.

Linha dos toblerones

Linha dos toblerones – hoje utilizada como trilha para caminhada a pé

A inteligência militar planejou um sistema de defesa. A referência mais próxima era a Primeira Guerra, durante a qual os ataques se faziam por via terrestre, com tanques e blindados. Foi pensando nisso que bolaram o sistema defensivo suíço, basicamente terrestre àquela época. Incluía numerosos pontos, alguns dos quais são hoje conhecidos do grande público, enquanto outros ficarão secretos para sempre. Talvez seja melhor assim.

Todas as pontes do país estavam minadas. Ao menor sinal, as vias de comunicação seriam interrompidas, o que dificultaria tremendamente o avanço de tropas inimigas. A região de Genebra, fronteiriça com a França, trazia um problema espinhoso para os militares. Por ser constituída de terrenos planos e pela ausência de rios, foi considerada indefensável. Tomou-se a decisão tática de dar a cidade como perdida e implantar o sistema de defesa uns 30km mais para o interior do país.

Villa Rose Fortaleza disfarçada de casa de campo

Villa Rose
Fortaleza disfarçada de casa de campo

Construíram-se fortalezas com aparência de casas de campo. Foram levantados bunkers com aspecto externo de inofensivos chalés de madeira. Instalaram-se discretos postos de observação em pontos mais elevados ― naqueles tempos não havia street view nem espionagem por satélite. Para completar, uma verdadeira obra de arte defensiva foi construída, uma versão helvética da muralha da China. Ficou conhecida popularmente como Ligne des toblerones, a linha dos toblerones.

O que era e por que lhe deram esse nome?
Era ― e ainda é ― uma linha de 10km de blocos de concreto para barrar a passagem de tanques de guerra. São quase 3000 monstros de 9 toneladas cada um. Têm forma peculiar de tetraedro que lembra um pedaço de chocolate Toblerone, daí o apelido.

Não se tem notícia de que nenhum tanque tenha jamais tentado superar o obstáculo. Mas os toblerones continuam lá até hoje. Viraram atração turística. Trilhas próprias para caminhadas a pé serpenteiam por quilômetros ao longo da barreira de concreto. É hoje o Sentier des Toblerones, a Trilha dos Toblerones.

Villa Rose Janela com cortina falsa

Detalhe da Villa Rose
Janela com cortina falsa

Taí uma obra militar que soube envelhecer. Em escrupuloso respeito ao espírito atual, não foi atirada a um lixão mas acabou reciclada.

Quem tem telhado de vidro…

José Horta Manzano

Anos atrás, quando autoridades italianas indicaram à PF que um certo Signor Battisti, foragido da Justiça daquele país, se encontrava vivendo ilegalmente no Brasil, nossa polícia não perdeu tempo: surpreendeu o indivíduo no Rio de Janeiro e o conduziu algemado a Brasília. Naquele momento, ninguém sabia, mas a ação espetaculosa não era mais que a primeira página de uma interminável novela. A lenga-lenga, recheada de altos e baixos, durou vários anos, envolveu advogados, parlamentares, a PF, o Ministério da Justiça, o STF, a presidência da República. Ninguém pode afirmar que tenhamos chegado ao ponto final. Não é impossível que o epílogo ainda esteja por escrever.

Tarso Genro, governador do RS by Marco Aurélio, desenhista gaúcho

Tarso Genro, governador do RS
by Marco Aurélio, desenhista gaúcho

Saíram todos chamuscados daquele execrável episódio. O prisioneiro, depois de viver encarcerado durante anos, em meio a incertezas, está marcado para o resto da vida ― onde quer que vá, será reconhecido e olhado com certa reserva. O ministro da Justiça da época, ao conceder asilo ao foragido, foi forçado a alegar que desconfiava da Justiça italiana, numa atitude arrogante que pegou muito mal. O STF, que empurrou a decisão final para a presidência da República, desagradou a muita gente. A decisão do presidente da República ― tornada pública no apagar das luzes do mandato ― que confirmou o asilo ao estrangeiro ornou a novela com fecho de ouro. As autoridades italianas devem ter saído enfurecidas, o que é compreensível.

Os anos passaram e o mundo girou. O processo do mensalão está chegando ao fim e cada condenado executa a pirueta que lhe parece mais conveniente. Uns dizem que não têm nada que ver com a história, que estavam de passagem. Outros alegam que foram julgados pela imprensa ― como se o julgamento não tivesse sido público e transmitido ao vivo por rádios e tevês. Há até guerrilheiros que, embora tenham empunhado armas e participado de guerrilha na selva, hoje derramam lágrimas que destoam da bravura que outrora exibiam.

by Dalcio Machado, desenhista paulista

by Dalcio Machado, desenhista paulista

Um dos condenados, talvez mais realista que os demais, não acreditou em Papai Noel. Perspicaz, deu-se conta, bem antes dos outros, de que o desfecho poderia não ocorrer em meio a gargalhadas em volta de uma pizza. Preparou minuciosamente sua fuga do País. Não está claro se Signor Pizzolato solicitou emissão de seu passaporte italiano antes do escândalo do mensalão. Pouco importa. O que importa é que, aos olhos da Itália, ele é um cidadão do país peninsular igual a todos os outros. Todo Estado civilizado costuma zelar por seus súditos.

Algum tempo atrás, as autoridades judiciais brasileiras exigiram, como medida de precaução, que todos os réus da Ação Penal 470 consignassem seu passaporte. Signor Pizzolato fez mais que os outros: entregou dois, o brasileiro e o italiano. Fechadas, como de costume, sobre si mesmas e pouco afeitas a práticas internacionais, as autoridades de Brasília foram dormir tranquilas. Um homem sem passaporte não pode viajar, devem ter pensado.

Se o olhar de nossas sumidades fosse um pouco além de seu próprio umbigo, saberiam que um cidadão estrangeiro cujo passaporte tiver sido confiscado pode solicitar um novo, desde que não esteja sendo procurado pela polícia de seu próprio país. Era exatamente o caso de Signor Pizzolato. Bastou-lhe comparecer a um consulado italiano e requerer um novo passaporte.

Alberto Alpino, desenhista capixaba

by Alberto Alpino, desenhista capixaba

Imaginam muitos que o fujão tenha passado por peripécias semelhantes às do senador boliviano que viajou clandestinamente de La Paz até o Mato Grosso. Pois eu não vejo a coisa assim. Não tenho como provar, mas tudo me diz que, ao deixar definitivamente sua cobertura em Copacabana, o réu fugido já levava no bolso o documento que lhe permitiria viajar para onde quisesse. Atravessar a fronteira entre o Brasil e qualquer um de seus vizinhos é moleza. Em numerosas cidades de fronteira, no Rio Grande por exemplo, a divisa entre dois países é representada por uma avenida. Atravessada a rua, é fácil chegar a Buenos Aires, de onde partem diariamente voos para Roma e para Milão. Elementar, meu caro Watson.

Agora é que chega a hora de a porca torcer o rabinho. A malandragem demonstrada pelo Planalto no caso Battisti ainda é muito recente. Os personagens estão vivos e na ativa, todos se lembram. Esperar grande empenho por parte de Roma é ilusão. O fato de o Brasil dar guarida a um condenado por envolvimento em quatro assassinatos pegou muito, muito mal na Itália. Será praticamente impossível reaver o cidadão italiano Pizzolato, cuja ficha, em terra itálica, está limpa.

Os italianos, que residam na Itália ou no estrangeiro, estão inscritos no registro do município onde vivem ou ao qual estão ligados. Esse banco de dados leva o nome de anágrafe. As autoridades italianas sabem perfeitamente onde vive Signor Pizzolato. Daí a transmitir a informação às autoridades de Brasília são outros quinhentos. Quem tem telhado de vidro…