Falam de nós – 25

0-Falam de nósJosé Horta Manzano

Como os demais veículos da mídia mundial, o quotidiano italiano Il Giornale publicou o relato da apreensão do passaporte do Lula. A notícia foi dada em termos bastantes sugestivos.

Dou aqui abaixo um trecho. Vai primeiro na língua original ‒ traduzo em seguida.

Lula era pronto a scappare in Etiopia: il giudice gli fa sequestrare il passaporto

Lo aspettava a braccia aperte il segretario generale dell’Onu, António Guterres, ad Addis Abeba, la capitale dell’Etiopia dove oggi, dalle 15 alle 18, su invito dell’Unione Africana doveva parlare su come «vincere la fame nel mondo» a un evento ‒ non ridete ‒ tutto incentrato «su come combattere la corruzione».

Invece Lula ha suo malgrado deluso le attese del vecchio amico portoghese Guterres – compagno di socialismo anche se non tanto come l’ex premier lusitano, ex carcerato ed inquisito, José Socrates. Ha dovuto farlo perché, dopo la condanna a 12 anni e un mese di martedì per riciclaggio e corruzione, l’altroieri notte il giudice Ricardo Leite, di Brasilia, ha ordinato il ritiro del passaporto all’uomo che Barack Obama aveva definito «il miglior politico del mondo»: un acume obamiano invidiabile.

Minacciare di «mettere a ferro e fuoco il Paese» con discorsi eversivi che somigliano tanto a quelli dei gruppi chavisti più violenti controllati dal dittatore venezuelano Maduro – il solo leader latinoamericano col cubano Raúl Castro ad avere attaccato frontalmente la «giustizia fascista brasiliana» di certo non aiuta a frenare l’arresto di Lula.

Lula estava pronto para fugir para a Etiópia: o juiz ordena apreensão do passaporte

Esperava-o de braços abertos o secretário-geral da ONU, António Guterres, em Adis Abeba, capital da Etiópia onde hoje, das 15h às 18h, convidado pela União Africana, devia falar sobre como «vencer a fome no mundo» num evento ‒ sem piada ‒ focado em «como combater a corrupção».

No entanto, embora a contragosto, Lula decepcionou o velho amigo português Guterres, companheiro de socialismo ‒ amigo não tão chegado como o ex-primeiro-ministro lusitano José Sócrates, ex-encarcerado e inculpado. Lula não teve outra saída porque, na esteira da condenação a 12 anos e um mês por lavagem de dinheiro e corrupção, o juiz Ricardo Leite, de Brasília, ordenou a apreensão do passaporte daquele que Barack Obama tinha qualificado como «o melhor político do mundo» ‒ numa invejável perspicácia obamiana.

Ameaçar de «incendiar o país» com pronunciamentos subversivos tão parecidos com os dos mais violentos grupos chavistas controlados pelo ditador venezuelano Maduro ‒ o único líder latino-americano, com o cubano Raúl Castro, a ter atacado frontalmente a «justiça fascista brasileira» ‒ por certo não contribui para evitar a prisão de Lula.

Que clique aqui quem tiver interesse em ler na íntegra.

Ironias do destino

José Horta Manzano

A vida nem sempre é espetáculo cor-de-rosa. Volta e meia, ela dá um boléu e a gente leva um tombo. Mas há tombo e tombo. A gente pode se levantar ileso, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Mas pode também sentir o baque e ficar estatelado no chão sem poder se reerguer.

Costuma-se dizer que o brasileiro tem a memória curta, que esquece hoje o que aconteceu ontem, que um fato novo empurra o antigo para o fundo do poço. Assim mesmo, muitos hão de recordar-se que, no apagar das luzes do mandato, a poucos dias de deixar o Planalto, Lula da Silva exigiu ‒ e obteve ‒ passaporte diplomático. Não só para si, como para mulher, filhos e agregados.

Na época, a imprensa noticiou o ocorrido e uma grita se alevantou. Mas foi erupção breve. Em pouco tempo, ninguém mais voltou ao assunto. Aliás, nem se sabe ao certo se os passaportes obtidos fraudulentamente foram devolvidos. É permitido acreditar que não.

Diferentes modelos de passaporte emitidos pelo Estado brasileiro

Alguns dias antes do julgamento do dia 24 de janeiro de 2018, o Lula mandou avisar que estava de viagem marcada pra Etiópia. Independentemente do que fosse decidido em Porto Alegre, embarcaria na madrugada do dia 26. E não se falava mais nisso.

Nocauteado pela Justiça, o ingênuo houve por bem bancar o marrudinho. Em discurso para plateia amestrada, declarou com todas as letras que não estava disposto a acatar a determinação judicial. Ah, pra quê! Sacudiu a caixa de marimbondos. Um juiz de Brasília, sob cuja responsabilidade corre outro processo contra o falastrão, alarmou-se com a valentia. Com raciocínio lógico, entendeu que o não acatamento a uma decisão judicial podia se traduzir por fuga do país. Não esqueçamos o caso Pizzolato.

Incontinente, ordenou que se confiscasse o passaporte daquele que se propunha a desacatar a Justiça. Lula da Silva, de bom ou mau grado, foi obrigado a cumprir a imposição. Não o fizesse, perigava ser preso imediatamente. Não sei se o passaporte era o diplomático ‒ aquele vermelhinho. Seja como for, o demiurgo teve de passar pela humilhação de vê-lo confiscado e retido. De pouco terá valido a (falsa) imunidade que o documento lhe parecia garantir. A impostura teve vida curta.

Nota interessante
Lula da Silva pretendia cantar de galo numa cúpula realizada em Adis Abeba pela FAO ‒ Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. Observe-se que essa instituição é dirigida por doutor José Graziano da Silva, que foi ministro do Lula. Yes, um afilhado político.

Nota picante
Até ontem, dia 25, o distinto público podia visitar o site internet da FAO e colher ali toda informação que desejasse. De lá pra cá, o Lula foi obrigado a devolver o passaporte e a cancelar a viagem. Hoje, 26, o site está fora do ar, inaccessível. Casou, mudou e não convidou. Será mera coincidência, naturalmente.

Nota latina
Nummus regnat ubique.
O dinheiro reina por toda parte.

Café do Brasil

José Horta Manzano

Em princípio, o café não tem as qualidades necessárias para se tornar popular. É ainda mais escuro que o cacau, tem um certo amargor que nem todo o mundo aprecia, só é produzido em regiões de clima quente, requer longa e laboriosa manipulação desde a plantação até a xícara. Com todos esses senões, parecia destinado ao papel de bebida exótica, daquelas que se reservam pra ocasiões especiais. No entanto, por razões difíceis de explicar, tornou-se a bebida mais consumida no planeta, exceptuada a água.

Originário da Etiópia, tem visto seu consumo crescer vertiginosamente. Duzentos anos atrás, a produção mundial girava em torno de um milhão de sacas por ano. Atualmente, colhem-se mais de cem milhões de sacas de sessenta quilos, um aumento exponencial. São seis milhões de toneladas de grãos, uma enormidade!

Com 30% do total mundial, o Brasil é, de longe, o maior produtor. Seguem-se o Vietnã, a Colômbia, a Indonésia, a Etiópia. Em nosso país, já faz tempo que o café deixou de ser o maior produto de exportação. No entanto, em pequenos países africanos como a Etiópia, Burundi ou Ruanda, a rubiácea responde pelo grosso do comércio exterior.

Uma curiosidade pouco divulgada é o fato de cinco empresas serem responsáveis pela compra de metade da produção mundial. São três multinacionais americanas, uma alemã e uma suíça (Nestlé). Essa enorme quantidade de café destina-se tanto a ser vendida em grãos quanto a ser transformada em café solúvel.

Engana-se quem imagina que os brasileiros sejam grandes bebedores de café. Considerando o consumo por habitante, os países escandinavos estão bem lá na frente, seguidos pelos europeus do norte (Holanda, Alemanha), logo acompanhados por suíços, austríacos e italianos. Americanos e canadenses também consomem quantidade considerável de café. Até o argentino toma mais café que o brasileiro.

Tradicionalmente, os produtores brasileiros privilegiaram a quantidade em detrimento da qualidade. Essa despreocupação com a excelência desembocou em situação peculiar: apesar de ser o maior produtor, o Brasil não é conhecido pela superioridade de seus grãos. Cafés de alta qualidade provenientes da Colômbia ou de pequenos países da América Central são vendidos, no mercado internacional, a preços bem superiores aos do café brasileiro.

Mas a situação está evoluindo. Fazendo eco ao anúncio de pequenos produtores mineiros e capixabas, a imprensa francesa informou estes dias que cafés especiais estão sendo colhidos nas encostas da Serra do Caparaó. São grãos de qualidade superior, plantados em altitudes superiores a mil metros ‒ a exemplo do que ocorre na Etiópia.

Dado que a produção ainda é modesta, dezenas de compradores americanos e europeus estão na fila de espera. Enquanto a demanda mundial de café comum tem aumentado 2% estes últimos anos, a procura por cafés especiais cresce num ritmo de 10% a 15% a cada ano. Tudo isso traz a prova de que vale a pena investir na melhora do produto. Quantidade é bom, mas qualidade é melhor ainda.

Falam de nós – 3

0-Falam de nósJosé Horta Manzano

A desgraça de uns…
Os danos causados pela seca que assola boa parte do território brasileiro não se resumem à falta d’água para consumo humano. A região cafeeira do Brasil, situada dentro da zona climaticamente perturbada, também se ressente do desregramento climático.

O Brasil é o maior produtor mundial de café. A safra 2014-2015 foi afetada pela ausência de chuva, fato que causou aumento de preço da rubiácea no mercado mundial. Prevê-se que a safra 2015-2016 vá pelo mesmo caminho.

Café 2Quem ganha com isso são os demais países produtores. Entre eles, a Etiópia – mencionada em reportagem do Portal RFI (Radio France Internationale). Este ano, as exportações etíopes cresceram 6% em volume e 34% em valor justamente devido à valorização advinda da raridade do produto.

A Etiópia agradece a São Pedro.

Interligne 28aPiscina com suástica
A propagação da notícia da piscina catarinense azulejada com suástica ecoou mais fortemente em dois países: Alemanha e Israel. É compreensível.

Tanto o jornal israelense Haaretz quanto o alemão Bild deram destaque à bizarra notícia. (Já comentamos o assunto no posto Símbolos horizontais.)

Interligne 28aRapina
A palavra, que significa roubo praticado com violência, é pouco utilizada no Brasil. Preferimos assalto. Tanto faz, o crime é o mesmo.

Assalto 1O Corriere Adriatico, jornal regional da Itália, traz a notícia do susto pelo qual passaram dois médicos italianos em visita ao Brasil. Tinham vindo participar do Congresso Mundial de Alergologia, no Rio de Janeiro. Um miniônibus, lotado com médicos italianos, foi assaltado, logo na chegada ao Rio, no caminho do aeroporto ao hotel. Assalto cinematográfico, com direito a arma apontada para a cabeça do motorista. O guia levou uma coronhada, e os médicos foram aliviados de seus pertences de valor – dinheiro, cartão de crédito, celular, relógio.

Benvenuti in Brasile!

Interligne 28aOlho vivo, chineses!
O Portal China Daily relata a formação que está sendo oferecida a representantes de companhias chinesas que tencionam se instalar no Brasil. Há muitas firmas na fila. Um grupo brasileiro especializado em aconselhamento de investidores estrangeiros está encarregado de informar e formar os principiantes.

Chinês 2Entre as dicas, os chineses aprendem que, no Brasil, o cipoal legal é denso. É imprescindível que todo contrato seja examinado por advogados e fiscalistas antes do jamegão.

Os potenciais investidores são também alertados para falsas promessas feitas pelos Estados. São incitados a tomar extremo cuidado com bondades do tipo terreno grátis, favores fiscais, aluguéis a preços de pai pra filho. Podem cair em cilada.

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O país dos relógios

José Horta Manzano

Parece brincadeira mas é verdade. A inacreditável notícia foi dada por vários órgãos da mídia suíça e europeia. Está tão bem contado pelo site francês MetroNews, que não me resta senão traduzir. Aqui está:

Avião sequestrado e desviado a Genebra Foto: SIPA

Avião sequestrado e desviado a Genebra
Foto: SIPA

Interligne vertical 9Um avião que cumpria o trajeto entre a Etiópia e a Itália foi sequestrado segunda-feira de manhã e desviado para Genebra. Mas a aviação (militar) suíça não se mexeu. Por quê? Simplesmente porque era cedo demais.

O aparelho foi escoltado até Genebra por aviões militares franceses e italianos. Os aviões suíços, no entanto, não alçaram voo. Em princípio, certas situações são consideradas excepcionais. Mas na Suíça, nem o sequestro de um avião tem o poder de alterar a regra: tem hora pra tudo.

Assim, quando o aparelho das Linhas Aéreas Etíopes, no trajeto entre Adis Abeba e Roma, foi sequestrado e desviado segunda feira cedo pelo próprio copiloto, a aviação suíça não se abalou. O regulamento reza que as forças aéreas somente estão disponíveis das 8h às 12h e das 13h30 às 17h. A Itália e a França se encarregaram de escoltar o aparelho até Genebra.

O diário suíço Le Matin explica essa singular peculiaridade helvética. «As autoridades suíças foram avisadas desde as 4h30 da madrugada que um avião etíope de carreira se havia desviado de sua trajetória na Itália e se dirigia a Genebra», escreve o jornal suíço. «Pela lógica, o alarme deveria ter soado em todas as bases militares do país, deixando seus F/A 18 prontos para decolar. Só que, mesmo em casos de extrema urgência ― como hoje de manhã ― a aviação militar respeita seu horário.»

Catástrofe evitada
«Não temos condições de assegurar plantão de 24 horas por dia», reconhece Laurent Savary, porta-voz das Forças Aéreas Suíças. «Tendo em vista nossas restrições de orçamento e de pessoal, a Suíça concluiu acordo com os países vizinhos para garantir o policiamento aéreo fora das horas de abertura das bases militares.»

«O problema é que, se o sequestrador tivesse perdido a cabeça e estivesse decidido a jogar o aparelho sobre a cidade de Genebra, os jatos estrangeiros não estariam autorizados a abatê-lo. Como nenhum avião militar suíço estaria disponível antes das oito da manhã, a catástrofe teria sido total.»

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Nota à atenção dos que pretenderem invadir a Suíça: tenham a fineza de fazê-lo no horário regulamentar. Antecipadamente, agradecemos.

Acabou a copinha

José Horta Manzano

Pois é, a seleção brasileira de futebol levantou a copinha! Foi um triunfo saboroso justamente porque não era esperado. Até o mês passado, nosso País estava em 22° lugar na classificação da Fifa. Até a Suíça estava (bem) à frente.

Ok, vocês me dirão que não se pode botar muita fé no que vem da Fifa. Uma instituição que lida com rios de dinheiro torna-se, paradoxalmente, vulnerável. É, por conseguinte, susceptível a sucumbir a certas distorções.

Seja como for, todos convirão que ninguém esperava que o Brasil chegasse à final. Muito menos que vencesse o jogo. Um jornalista chegou a escrever que a seleção nacional era o azarão da copinha. Daí a (grata) surpresa com o resultado final, incontestável.

Copa das Confederações

Copa das Confederações

O povo compareceu em massa, num Maracanã festivo e tingido de amarelo. Ninguém estranhou muito a ausência de dona Dilma na cerimônia de encerramento do torneio. A vaia monumental não era uma probabilidade, mas uma certeza absoluta. Acho que ela fez bem em não ir ― dos males, o menor.

Já uma coisa me intrigou: a ausência de nosso messias, homem sabidamente chegado às coisas do futebol. Logo ele, que trabalhou tanto pela conquista do direito de sediar a copinha e a copona. Logo ele, homem notoriamente venerado e aclamado pelo povo entusiasta. Logo ele, sempre preocupado em preservar a esplêndida herança que deixou ao País. Logo ele, arroz de festa de todos os momentos de glória nacional. Logo ele, que, sólido e altruísta, jamais abandonou nenhum companheiro nem pulou do barco nas horas difíceis.

Dizem que estava na África. O compromisso na Etiópia ― país que constitui, como sabemos todos, pedra angular na pauta de relações exteriores do Brasil ― era, de certeza, mais importante do que trivialidades futebolisticas.

Sejam louvados o desapego e a abnegação de nosso intrépido e visionário estadista. Muitos anos se passarão antes que apareça no Brasil um outro com as mesmas qualidades.

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Hino
Hoje é dia de ouvir o Hino Nacional. E de pé, faz favor! Se você mora no Brasil ― e é madrugador ― procure sintonizar a Rádio Cultura FM de São Paulo. Para hoje, não dá mais. Mas diariamente, pouco antes das 6h da manhã, vai ao ar uma excelente versão do hino, com banda e coro. Para quem aprecia, é um deleite.

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Desrespeito
Por imposição da Fifa ― sempre ela! ―, a execução dos hinos nacionais não pode exceder um minuto e meio. Para a maioria deles, não há problema. São curtos e cabem perfeitamente no tempo fixado. É o caso da Alemanha, dos EUA, da França, da Itália, do Reino Unido.

Nosso belo cântico oficial, saído direto de um teatro de ópera de Rossini, como já li em algum lugar, não se ajusta ao figurino estabelecido. Um pouco mais longo, vai além de dois minutos. A Fifa não hesitou: amputou-lhe um naco.

Em pelo menos duas ocasiões durante essa copinha, a multidão presente no estádio passou por cima da injunção dos cartolas. Continuou cantando o hino a cappella até o fim da primeira parte. Fato nunca visto antes, foi ressaltado até pelo comentarista da televisão suíça.

Que se aceitem certas exigências da federação internacional de futebol, é inevitável. Mas não se pode admitir que o hino ― um dos símbolos da nação, segundo nossa Constituição ― seja executado pela metade e em andamento mais rápido que a norma. E há mais: que isso ocorra em território nacional com a complacência das autoridades e na presença de pelo menos um ministro da República. Por ironia, justamente aquele que apresentou, faz anos, um projeto de lei ultranacionalista visando a blindar a língua falada no Brasil contra influências estrangeiras.

Como o mundo dá voltas!