Chirac – o funeral

José Horta Manzano

Quinta-feira passada morreu Jacques Chirac, que foi presidente da França por doze anos, na virada do século (1995 – 2007). Como todo político, teve um lado bom e outro mais escuro. Foi sem dúvida o presidente mais popular destes últimos 50 anos, desde que De Gaulle deixou o poder.

Assim que a notícia chegou, chefes de Estado do mundo todo emitiram nota expessando pesar e deixando algumas palavras de elogio. Quando alguém acaba de falecer, convém lembrar do lado bom. Só se pode começar a falar dos podres depois de alguns dias.

Nesta segunda-feira, teve lugar o funeral, com as honras devidas a todo ex-chefe de Estado. Os franceses são bons nisso. São capazes de organizar cerimônias que, de tão solenes, dão arrepio. Tambores rufando, militares em uniforme de gala, sino de Notre Dame badalando, o Requiem de Gabriel Fauré como fundo musical, a Marselhesa na hora certa – tudo milimetricamente organizado.

Dirigentes de praticamente todos os países se manifestaram. Ou mandaram mensagem, ou compareceram. Na cerimônia, estavam todos os ex-presidentes da França, além de Vladimir Putin, Bill Clinton, o presidente da Itália, o príncipe de Mônaco, chefes de Estado europeus e mais uma centena de personalidades estangeiras. O Lula, sentadinho na palha úmida da masmorra onde vive, não pôde estar presente em Paris; mas reagiu com um tuíte simpático.

Só faltou… quem poderia ser? Faltou Donald Trump! Malcriado e mal-assessorado, o tuiteiro-mor não se dignou de soltar duas linhas em homenagem a um francês que, por sinal, era muito próximo dos EUA, país onde chegou morar durante um ano, na juventude.

E quem é que acompanhou o presidente americano no desdém? Qual é o importante personagem nacional que passa o tempo tuitando e não julgou importante escrever três palavras em nome do Brasil? Quem adivinhar ganha uma passagem de ida simples pra Caracas – de ônibus. Resposta no próximo parágrafo.

Claro! Foi doutor Bolsonaro. Como dizia o Barão de Itararé, «de onde menos se espera, daí é que não sai nada».

Urna eletrônica na França

José Horta Manzano

Faz anos que dois grandes partidos condividem a cena política francesa: UMP (direita) e PS (esquerda). É verdade que o atual marasmo econômico alavancou um terceiro ator, a Frente Nacional, partido de extrema-direita, que se vale de métodos populistas. Sua ascensão vem assustando muita gente.

Daqui a oito dias, os afiliados à UMP (União por um Movimento Popular) votarão para eleger o presidente do partido. O voto será eletrônico, método praticamente desconhecido na França.

Vozes já se alevantam dentro da agremiação para denunciar a alta periculosidade do sistema. Muitos veem, no voto eletrônico, risco grande de fraude, de pirataria cibernética, de sobrecarga e falha na consolidação de dados.

UMPNo entourage de Nicolas Sarkozy – antigo presidente da República e atual candidato a dirigir o partido – estão os que mais desconfiam do sistema. Na França, cargo de presidente de partido político é trampolim excepcional para projetar-se e atingir esferas mais altas.

François Mitterrand, antes de ser eleito ao posto máximo da República, tinha sido presidente de partido. O mesmo aconteceu com Jacques Chirac e com François Hollande. Daí a preocupação de Nicolas Sarkozy. Conquistar o cargo de presidente da UMP é, para ele, de capital importância.

François Hollande, que preside o país atualmente, anda amargando índice de popularidade próximo de zero. Assim como no Brasil já se ensaiou um tímido «Volta, Lula!», na França também começa a se elevar um «Retourne, Sarkô!».

Pode até ser que dê certo. Com duas condições: se o voto eletrônico da semana que vem não atrapalhar; e se, mais adiante, a Frente Nacional não melar o jogo. De todo modo, ainda faltam dois anos e meio para a eleição presidencial.

Como se vê, desconfiança com voto eletrônico não é exclusividade nossa.

Recordar é viver ― 5

Lingua 1O ex-presidente Lula fala apenas a própria língua, e mal. Mas também não finge “arranhar” outros idiomas.

Em 2005, por ocasião da cerimônia de sepultamento do Papa João Paulo II, ele se viu em meio a personalidades políticas mundiais, incluindo o então presidente da França, Jacques Chirac, que lhe dirigiu algumas palavras.

Sem qualquer diplomata brasileiro nas proximidades para socorrê-lo, o Lula não hesitou. Cutucou o antecessor Fernando Henrique Cardoso, que estava ao lado, e pediu com toda a humildade:

― Traduz aí, Fernando!

Pescado no site do Cláudio Humberto, Diário do Poder.

Rapidinha 18

José Horta Manzano

Quem tem pressa come cru

Madame Bernadette Chirac, mulher de Jacques Chirac, foi esposa do prefeito de Paris durante 18 anos, esposa do Primeiro-Ministro por 4 anos, esposa de um ministro da República por 10 anos e mulher do presidente da República durante dois mandatos.

Hoje, com 80 anos mas ainda muito ativa, é a antiga primeira-dama mais apreciada pelos franceses. Presidente da Fundação dos Hospitais da França, encabeça, todo mês de janeiro, uma campanha nacional de arrecadação de fundos para hospitais infantis.

Bernadette Chirac

Bernadette Chirac

A «Opération Pièces Jaunes» ― Campanha das Moedinhas Amarelas ― conclama a população a doar as moedinhas de pouco valor (geralmente de cor amarela ou avermelhada). Um punhadinho não faz muita falta no bolso de ninguém, mas, juntas, podem formar um patrimônio que será utilizado para minorar o sofrimento de quem precisa.

No Brasil, é verdade, os tempos estranhos que vivemos nos desacostumaram a esse tipo de empenho pessoal em troca de nada. Há quem faça, desde que seja na base do toma lá dá cá. Mas essa é uma outra história.

Quinta-feira passada, um automóvel, possivelmente para cortar caminho, pegou uma ruazinha parisiense na contramão. Deu zebra. Estava ali justamente um policial, que ordenou ao carro que parasse. Baixado o vidro, o guarda descobre que, além do motorista, o veículo transporta, no banco de trás, uma passageira famosa: Madame Chirac.

Exasperada pela parada, que atrasava ainda mais o compromisso ao qual se dirigia, a velha senhora ameaçou continuar seu caminho a pé, largando guarda, motorista e veículo. A estratégia não deu certo. Mesmo sendo uma das personagens mais admiradas pelos franceses, teve de seguir a lei igualzinho aos demais. O coração do guarda não amoleceu. Bernadette Chirac continuou acomodada no banco e o carro foi obrigado a dar meia-volta.

Perigo à vista

José Horta Manzano

As coisas vão mal em Brasília. Deputados se escondem atrás do anonimato do voto secreto para dar apoio a colegas criminosos. Enquanto isso, a presidente e seus áulicos, acuados por suas repetidas trapalhadas, se escondem do povo, com medo de apupos.

Artigo do Correio Braziliense de 29 de agosto nos dá conta de que as manifestações de junho abalaram mais do que se imagina. A maioria que nos governa há mais de dez anos, acostumada a arrancar aplausos e a colher vivas por toda parte, está sendo obrigada a rever sua estratégia. Os tempos estão mudando rapidamente.

As festividades de 7 de setembro, a data maior, estão aí na esquina. Por um lado, lembrarão aos distraídos que nosso País se emancipou de Portugal em 1822 e tornou-se soberano. Oficialmente, pelo menos.

Por outro lado, os festejos deixarão patente a fragilidade dos que achavam que tudo estava dominado, que estavam por cima da carne seca.

7 de setembro ― preparação Crédito: Correio Braziliense

7 de setembro em Brasília ― preparação
Crédito: Correio Braziliense

Em outras plagas, aparição pública de figurões causa suor frio nos encarregados da segurança. O pavor maior é o de um atentado, de uma bomba, de uma bala disparada por um franco-atirador. É compreensível.

Assim como Júlio César, Dom Carlos de Portugal, John Kennedy e Anuar El-Sadat, muitos mandatários já perderam a vida quando de uma aparição em público. Sem contar os que passaram rente à catástrofe e sobreviveram, como De Gaulle, o papa João Paulo II, Jacques Chirac e outros.

Mas… em nossas terras tropicais, tem disso não! O medo aqui é outro, minha gente. Nossos mandachuvas têm medo mesmo é de povo. Tantas aprontam, que começam a suar frio só de pensar em encarar uma multidão.

Nos bastidores ou diante de uma seleta assembleia de correligionários, político brasileiro se solta, conta bravatas, esbraveja, acusa, se autoexalta, faz o diabo. Já quando tem de enfrentar povo de verdade, só falta fazer cocô nas calças. Uma sonora vaia machuca o ego. Quanto mais alto é o coqueiro, mais forte é o tombo. Quanto mais inflado é o ego, maior pungente é a dor.

Quem tem padrinho

José Horta Manzano

Jacques Chirac, que foi presidente da República Francesa por 12 anos seguidos, é grande admirador do Japão e de sua cultura. Dizem que o respeito que ele nutre por aquele país é sincero.

Segundo diversas fontes, o antigo presidente fez mais de 50 viagens ao País do Sol Levante. Era apaixonado pelos combates de sumô. O objetivo de algumas de suas visitas teria sido exatamente o de assistir a torneios desse esporte.

François Hollande, presidente atual, está estes dias em visita oficial ao Japão. Fazia 17 anos que um evento dessa importância não ocorria. A última visita de um chefe de estado francês àquele país havia sido em 1996.

Que se saiba, Hollande não nutre nenhuma paixão especial pelo arquipélago nipônico. No entanto, em discurso pronunciado no parlamento de Tóquio nesta sexta-feira, não foi por caminhos tortuosos: declarou, explicitamente, que o Japão deve tornar-se membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. É impossível ser mais claro.

Se a paixão que Chirac nutria pelo país oriental era pessoal e sincera, não se pode afirmar que a declaração de Hollande venha do fundo do coração. Em política, principalmente em relações internacionais, as atitudes obedecem a um emaranhado de interesses. O que parece nem sempre é.Interligne 10

Quando dona Dilma anunciou, semana passada, que o dinheiro emprestado aos governos corruptos da África será dado por perdido, não o fez porque tem bom coração. Há outras intenções por detrás dessa atitude estranha, intempestiva, inesperada. Alguns, como Elio Gaspari, veem lá interesses econômicos. Pode ser. Eu percebo, mais que isso, uma manobra malandra e sorrateira, que nenhum benefício trará ao povo brasileiro.

ONU ― Conselho de Segurança

ONU ― Conselho de Segurança

Já faz bem uns 10 anos que o alto escalão de nossa República elegeu como objetivo internacional principal a obtenção de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Com o tempo, foi-se tornando fixação obsessiva. Dado que velhos rancores impedem a muitos mandachuvas brasileiros de se aproximar daqueles que realmente decidem, nossa diplomacia tem-se dedicado a fazer lobby junto a governos inexpressivos.

A África, com seus 54 países em maioria pobres, representa ― na visão da diplomacia brasileira ― um cabo eleitoral de peso na batalha que o governo decidiu travar para obter o ansiado assento. Daí o esforço para parecer simpático a tiranos e cleptocratas africanos, segundo a pluma irreverente de Gaspari. É o programa bolsa-família expandido em escala planetária. Cooptam-se dirigentes estrangeiros corruptos a fim de conseguir apoio à cruzada brasileira rumo ao CS.Interligne 10

Tampouco a declaração de Hollande corresponde a um sentimento de especial amor pelo Japão. É nada mais que um puxão de orelhas aplicado ao governo chinês. Eis o que aconteceu.

Alguns dias atrás, ao se dar conta de que a China estava praticando dumping para acaparar o mercado europeu de painéis de energia solar, o governo francês ameaçou penalizar a importação desses artefatos produzidos na China. Em represália imediata, o governo chinês garantiu que estava estudando aumentar drasticamente as tarifas de importação de vinhos franceses.

Pronto, está aí a continuação da novela. A declaração de Hollande não passa de retórica. Está mais para jogo de cena. São palavras vazias que, no entanto, podem trazer bom retorno. Por um lado, alfinetam a China ― grande adversária da entrada do Japão no CS; por outro, afagam o orgulho nipônico. Quem é que não gosta que se lhe alise o ego?

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Resumo da ópera
Cinco dos membros permanentes do CS da ONU têm poder de veto. Basta que um só deles ― EUA, Rússia, China, Reino Unido ou França ― oponha seu veto a uma resolução, e ela será rechaçada e despachada para o arquivo morto.

Portanto, claro está que não adianta Monsieur Hollande jogar flores ao hóspede. Enquanto a China se opuser, o Japão não entrará no CS.

Tampouco adianta dona Dilma esbanjar na África perto de um bilhão do dinheiro suado dos brasileiros. Melhor faria se gastasse seu tempo e seu esforço fazendo o necessário para cativar os grandes, os que decidem. Quem tem padrinho não morre pagão.

É melhor entrar pela porta da frente. Dá mais certo do que forçar a janela.