Mês: janeiro 2014
A bicicleta do senhor padre
Todos os domingos, num lugarejo do interior, dois padres costumavam cruzar, de bicicleta, cada um a caminho de sua paróquia para rezar a missa. Certo dia, um deles vinha a pé. Surpreso, o outro padre parou, cumprimentou e perguntou:
«Onde está sua bicicleta, Padre João?» «Sumiu! Acho que foi furtada do pátio da igreja.»
«Que absurdo!» ― exclamou o ciclista. «Eu tenho uma ideia para saber quem é o culpado: na hora do sermão, cite os 10 mandamentos. Quando chegar ao “Não roubarás”, faça uma pausa e percorra os fiéis com o olhar. O culpado com certeza vai-se denunciar!»
No domingo seguinte, os dois cruzam de novo na estrada. Ambos de bicicleta. O que tinha dado a ideia diz:
«Parece que o sermão deu certo, não é, Padre João?»
«Mais ou menos», ― responde ele ― «na verdade, quando cheguei ao “Não cobiçarás a mulher do próximo”, acabei por me lembrar onde é que tinha deixado a bicicleta.»
Inexperiência hibernal
José Horta Manzano
Você sabia?
A Folha de São Paulo deste 30 de janeiro traz uma foto surpreendente. Trata-se de um automobilista que, ao sair de casa de manhã, elimina de seu para-brisa a fina camada de geada que se formou com o frio da noite.
Até aí, nada demais. É a chatice quotidiana de quem mora em lugar frio e tem de deixar o carro na rua. O que surpreende é a maneira pra lá de original que o cidadão encontrou para se livrar do gelo.
Entornar água quente num para-brisa gelado? É um contrassenso por duas razões. A primeira é que o choque térmico pode até causar dano ao vidro. A segunda, certeira, é que a água quente formará uma poça no chão bem no lugar onde estava o carro. Com o frio, vai-se criar uma placa de gelo mais escorregadia que casca de banana.
Se alguém tiver a má sorte de pisar ali mais tarde, periga levar um tombo daqueles de quebrar o colo do fêmur. Sem contar que o próprio automóvel, quando retornar à noite, pode patinar e ficar incontrolável.
Nunca vi ninguém jogar água quente em para-brisa gelado. Para remover a placa de gelo, tem de raspar. Há no comércio diversos aparelhinhos, do mais simples ao mais sofisticado, funcionando todos a partir do mesmo princípio. Cada motorista escolherá o que melhor lhe convier.
Caso você se encontre um dia nessa situação, a última coisa a fazer é jogar água quente. Raspe. Demora um pouco, mas é mais seguro.
Castelos de cartas
Percival Puggina (*)
«Qualquer idiota com mãos firmes e um par de pulmões funcionando pode construir um castelo de cartas e depois soprar para derrubá-lo.»
O que aconteceu na Boate Kiss teve muito a ver com as afirmações dessa frase de Stephen King. Aquele local de lazer era um castelo de cartas à espera do sopro fatal.
Muitos brasileiros que emigram para o assim dito Primeiro Mundo passam por um período de adaptação. Para uns, é rápido. Para outros, porém, é um tempo de frustração que se encerra com a decisão de retornar às origens.
Na essência da adaptação ao cotidiano dos países mais bem organizados, marcando-a de modo decisivo, está a absorção da seguinte regra geral de convivência: as leis valem para todos e não são inconsequentemente desrespeitadas. Isso costuma ser um choque. A ordem que produz costuma ser vista como enfadonha. Para muitos de nós, o respeito às leis, às regras de condomínio, aos preceitos de um contrato, aos costumes locais, cria uma atmosfera irrespirável.
No entanto, o Primeiro Mundo é o que é, em grande parte, por causa disso. Em virtude de tão fundamental norma alguns países europeus estão fechando presídios. Há cada vez menos pessoas dispostas a aceitar os riscos inerentes à tentativa de prosperar no mundo agindo no submundo.
Em virtude dessa regra certos imigrantes preferem retornar à zorra nacional, aqui onde as leis são feitas para luzirem no papel e não para, de fato, sinalizarem as condutas.
No Brasil, o costumeiro desrespeito às leis, regras e costumes vai construindo castelos de carta em toda parte.
Há castelos institucionais que vemos ser soprados pela falta de racionalidade, desde dentro e desde fora, comprometendo o funcionamento da República. Há castelos de carta estatísticos e contábeis, feitos para iludir, construídos por governos prestidigitadores.
Há castelos de carta empresariais, concebidos para encher o peito de vaidades, de dinheiro os bolsos de alguns, e de problemas a vida de muitos.
Há castelos de carta em políticas públicas, ineficientes ante a realidade para a qual foram concebidas.
E há castelos de carta como a Boate Kiss, à espera do sopro quente da morte, à espera da ignição lançada ao ar na madrugada de 27 de janeiro de 2013.
Irving D. Yalom, no livro “O dia em que Nietzsche chorou”, afirma que, se subirmos suficientemente alto, chegaremos a um nível a partir do qual as tragédias deixam de parecer trágicas. Ele estava errado.
Não há nível a partir do qual deixe de ser pungente o diuturno sacrifício humano nas estradas e ruas do país, nos becos das drogas, nos presídios que o Estado já delegou ao comando dos próprios reclusos, nas filas de espera do SUS, na indigente atenção à saúde pública, no mau agouro enfermiço da falta de saneamento básico. Não há altura nem distância a partir das quais o incêndio da Boate Kiss deixe de nos queimar a todos.
Ele é uma consequência doída, ardida na alma, de uma outra tragédia, que quase não vemos: nosso hábito de dar um jeitinho e driblar a lei. Até que o país nos caia na cabeça.
(*) Arquiteto, empresário e escritor. Edita o site puggina.org
Frase do dia — 97
«Comerciantes deram um passa-fora em políticos que votaram a favor da im(p)unidade de um senador corrupto: afixaram cartazes avisando que eles não seriam bem-vindos e cumpriram a ameaça. Uma embaixatriz europeia viu quando sua cabeleireira botou uma parlamentar para correr.
Foi no Paraguai, mas vai que a moda pega por aqui?! Muita gente não poderia mais ir a bar, restaurante, posto de gasolina, shopping — nem cortar os novos cabelos implantados.»
Eliane Cantanhêde, em sua coluna na Folha de São Paulo, 28 jan° 2014.
Frase do dia — 96
«Suzane von Richthofen tenta obter na Justiça uma pensão de dois salários mínimos do espólio dos pais, que ela ajudou a assassinar em 2002. O pedido será analisado na próxima semana pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).»
Mônica Bergamo em sua coluna na Folha de São Paulo, 30 jan° 2014.
Frase do dia — 95
«Trata-se de uma inversão na prática da mendicância: é a primeira vez na História que quem dá a esmola agradece ao mendigo. Ao anunciar mais 2 mil [médicos] contratados em tais condições, a vendedora de peixe na Suíça comporta-se como receptadora de escravos no Caribe 125 anos após a Abolição.»
José Nêumanne Pinto, jornalista e escritor, referindo-se à visita que nossa presidente fez a Cuba para agradecer aos ditadores o envio de médicos. In Estadão, 29 jan° 2014. O texto integral está aqui: Da banca de peixes ao mercado de escravos.
Estrepolias: de lá e de cá
José Horta Manzano
Todos ficaram sabendo que François Hollande pagou suas estrepolias extraconjugais com moeda forte: sua companheira deixou-o falando sozinho.
Depois que todos se inteiraram de que o presidente costumava abandonar o Palácio do Eliseu numa garupa de moto para encontrar-se com uma jovem atriz 15 anos mais nova que ele, a companheira fixa foi-se embora. A França perdeu sua primeira-dama e ficou órfã de mãe.
Florent Pagny, cantor e figurinha carimbada da cena artística do país, é conhecido por não ter papas na língua. Provocado, botou fora, em linguagem chã, o que achava do acontecido.
«Para quem está num nível de responsabilidade tão elevado, das duas uma: ou tem a capacidade de se organizar para que ninguém fique sabendo ou tem de ter o poder de bloquear toda informação, como Mitterrand.»(*)
E disse mais: «Peraí, meu caro, presidente é presidente 24 horas por dia durante cinco anos. A vida privada, pode esquecer!»
Estive pensando que, guardadas as devidas proporções, as mesmas reflexões se aplicam a nossa presidente. Haja vista a excursão gastronômica dela e de sua corte por terras lusitanas.
Quem não tem o poder de bloquear a informação tem de andar na linha ou se aplicar para que ninguém fique sabendo.
Quem é presidente tem de deixar de molho sua vida privada. Pelo menos, durante o mandato.
Taí um consolo para dona Dilma: ela não é a única a ter tido de aprender a lição na base da bordoada. Esperemos que tenham aprendido, tanto ela quanto ele.
(*) Durante os 14 anos em que exerceu a função de presidente da França, François Mitterrand manteve duas famílias. A oficial (e conhecida por todos os cidadãos) residia no palácio presidencial. A oficiosa (conhecida pelos medalhões do regime e por praticamente todos os jornalistas) residia num apartamento parisiense. O presidente tinha dois filhos com a matriz e uma filha com a filial.
A verdade só veio à tona depois do falecimento do líder. Enquanto ele viveu, nenhum jornalista jamais ousou revelar a realidade, tamanho era o temor que o personagem infundia a todos.
Frase do dia — 94
«Brasil é o 8º país com mais adultos analfabetos, aponta Unesco»
Título de artigo de Flávia Foreque publicado na Folha de São Paulo, 29 jan° 2014.
«O número de analfabetos funcionais é muito maior do que a taxa oficial de analfabetismo do IBGE usada nesse estudo da Unesco.»
Comentário de leitor publicado ao pé do artigo.
Gente fina é outra coisa ― 3
José Horta Manzano
O Brasil inteiro viu a foto que ilustra este artigo. Ela mostra o instante em que nossa simpática presidente deixava, pela porta da frente, o Restaurante Eleven, que está entre os três de Portugal a merecer uma estrela no Michelin, guia gastronômico mais respeitado do mundo. Só para lhes dar uma ideia, entre todos os restaurantes do país, só 3 merecem a cobiçada estrela.
Dona Dilma, que acredita estar cercada por uma equipe de assessores competentes, imaginou que passeava incógnita. Nunca supôs que pudesse vir a ser fotografada. O espocar do flash há de ter causado pânico em toda a equipe de festivos cortesãos.
Há coisas que se fazem, há coisas que não se devem fazer. No Brasil, ao deixar um restaurante, é comum pedir que embalem pra viagem o que sobrou de comida. Faz parte dos costumes nacionais, por isso não espanta ninguém. Na China acontece o mesmo —chamam lá doggy bag, pacote pro cachorrinho.
Já na Europa, essa prática não é comum. Digo que não é comum para ser delicado — na verdade, é impensável. Não passa pela cabeça de ninguém levar restos para casa. Seria ressentido como uma confissão de penúria.
Em restaurantes, tampouco se usa comprar bebida pra viagem. Lojas especializadas estão aí para essa função. É compreensível que essas sutilezas escapem à percepção de pessoas menos traquejadas.
Reparem bem na foto. Integrantes do primeiro círculo de acompanhantes da presidente de nossa República carregam sacolas com garrafas de vinho. Tivessem comprado essas garrafas em loja apropriada, elas teriam sido envoltas em sacolas opacas. E repousariam no automóvel.
Portanto, a dedução se impõe: foram compradas no restaurante estrelado. A preço estrelado. Restaurante não é loja de bebidas. O preço de venda é, naturalmente, o mesmo que está no cardápio: de 3 a 8 vezes mais elevado que o valor que um comércio especializado cobraria.
Mas que importa? Quando se paga com dinheiro dos outros, todas as extravagâncias são permitidas, não é mesmo?
Gente fina é outra coisa: pode até tentar se esconder, mas sempre esquece o rabo de fora.
Não sabem nem mentir
José Horta Manzano
Um bando de trapalhões, é isso aí. O Brasil-potência está nas mãos de uma malta de trapalhões ignorantes e desonestos. Mas deixe estar — não passam de aprendizes.
Ainda não se deram conta de que o mundo mudou. Vivem ancorados nos anos 70, vociferam contra ditadores que já estão a sete palmos sob terra, desenterram esqueleto de presidente destituído, instauram comissões para investigar o lado da verdade que lhes interessa. Para essa gente cheia de mágoa e rancor, o passado parece mais importante que o futuro.
Insistem em seguir adiante de olhos vendados. Fazem como se o Brasil fosse povoado por jecas-tatus broncos, toscos, desdentados e ignorantes. Pois ignorantes são eles. Podem encher-se de botox, implantar fios de cabelo, tingir as melenas, mas não passam de gente tosca e primitiva. Civilização é artigo que não se vende em supermercado.
Com o advento — e o contínuo aperfeiçoamento — dos modernos meios de comunicação, o sigilo tem encolhido. Fica cada dia mais difícil manter segredo sobre atos e fatos. Todos carregam no bolso máquina fotográfica, gravador, telefone, agenda e computador. Equipamento com que James Bond nem ousava sonhar cabe hoje num bloquinho de plástico de cento e poucos gramas, accessível a todos.
A última tentativa de trapaça de nossos medalhões foi desvendada no mesmo dia em que aconteceu. A presidente e sua alentada equipe de assessores e apaniguados planejavam, já há de fazer um bom tempo, desaparecer dos radares no fim de semana para gozar as delícias de uma gastronômica etapa lisboeta. Durante dois dias, atravessariam uma espécie de zona de sombra entre as neves suíças e o mormaço cubano.
Plano havia. Tanto é verdade que, já na quinta-feira, as reservas de hotel e alojamento já estavam feitas. A prova da exatidão dessa tese está na reportagem do brasileiro Estadão e na do lusitano Expresso. Nossos ingênuos dirigentes não imaginavam que alguém os pudesse surpreender durante a excursão clandestina. Realmente, é coisa de gente incompetente.
Dizem que dona Dilma, apanhada de calça curta, ficou furibunda. Note-se que, vindo dela, não é surpreendente. Para esquivar-se de interpelação embaraçosa, escapuliu do hotel pela porta de serviço e ordenou que seus cortesãos arrumassem uma explicação que satisfizesse a plebe.
Trocando os pés pelas mãos, os áulicos tentaram serzir, mas o buraco era grande demais. Não deu. Ficou pior a emenda que o soneto. Dá vergonha e nojo da mesquinhez dessa gente. Pior ainda é o medo que dá saber que nosso país está nas mãos de ineptos.
Se, até hoje, ainda não afundamos de todo é de crer que Deus é mesmo brasileiro.
Qualquer semelhança…
«When you see that in order to produce, you need to obtain permission from men who produce nothing
— when you see that money is flowing to those who deal, not in goods, but in favors
— when you see that men get richer by graft and by pull than by work, and your laws don’t protect you against them, but protect them against you
— when you see corruption being rewarded and honesty becoming a self-sacrifice
— you may know that your society is doomed.»
«Quando você vir que, para produzir, precisa obter autorização de quem nada produz
— que o dinheiro não beneficia aqueles que comerciam produtos, mas os que negociam favores
— que tem gente enriquecendo mais fácil por suborno e por influência do que por trabalho, e que as leis não estão aí para resguardar você mas, ao contrário, para protegê-los contra você
— que a corrupção está sendo valorizada ao passo que a honestidade virou sacrifício,
— tenha certeza de que sua sociedade está condenada à ruína.»
Ayn Rand, nascida Alissa Zinovievna Rosenbaum (em cirílico: Алиса Зиновьевна Розенбаум) — (1905-1982), foi filósofa e escritora americana de origem judia russa. O trecho acima foi extraído do artigo The Meaning of Money, publicado em 1° jan° 1957. Para ler o texto integral (em inglês), clique aqui.
Frase do dia — 93
«No Brasil, estamos assistindo à glorificação de pessoas condenadas por corrupção na medida que os jornais abrem suas páginas a essas pessoas como se fossem verdadeiros heróis»
Joaquim Barbosa, presidente do STF, em entrevista a Leandro Colon, da Folha de São Paulo.
Frase do dia — 92
«O Brasil já é o segundo maior exportador para Cuba, excluindo-se o petróleo venezuelano: China (42%), Brasil (16%) e Canadá (15%). Os principais produtos vendidos ao país são óleo de soja, milho, frango, arroz, carne e café.»
Patricia Campos Mello, enviada especial a Havana pela Folha de São Paulo.
Está aí a confirmação de que o Brasil voltou a ser exclusivamente exportador de matéria-prima. Nem a pobre e desindustrializada Cuba se interessa por nossos produtos industriais. A China — nosso “parceiro estratégico”(!) — nos deu um chega pra lá e tomou nosso lugar.
Dona Dilma foi a Cuba
José Horta Manzano
Depois de visitar a rica Suíça, dona Dilma dá mais uma prova de sua largueza de espírito. Antes de regressar ao Brasil remediado, passeia sua simpatia pela miserável ilha dos Castros. Vai inaugurar um porto marítimo.
A modernização do Puerto de Mariel, principal porta de escoamento da produção de Cuba, está sendo levada a cabo por uma grande empresa brasileira de construção pesada.
Do custo total de um bilhão de dólares(!), mais de 70% estão sendo financiados pelo BNDES, o brasileiro Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
Ao bancar essa obra de infraestrutura, a estratégia confessada do governo brasileiro é dotar Cuba de uma moderna porta de saída marítima de maneira a permitir que indústrias brasileiras se instalem na ilha e explorem o baixo custo da mão de obra local.
Enxergo, nesse empreendimento, três contradições e uma ilusão. Vamos por partes.
Primeira contradição
O banco de fomento criado pelo governo brasileiro em 1952 nasceu como BNDE. Nos anos 70, suas atividades passaram a se preocupar com o social. E o S foi acrescentado.
Para um banco cujo objetivo declarado é promover o desenvolvimento econômico e social, financiar o «aproveitamento» de mão de obra semiescrava de infelizes cubanos é, no mínimo, vergonhoso. E contraditório.
Segunda contradição
O BNDES é sustentado com nossos impostos. Espera-se que essa sacola comum reverta em benefício de nosso povo. Financiamento de projetos em solo estrangeiro são admissíveis desde que provoquem exportação de produtos brasileiros. Não é o caso do custeio do porto cubano. Não há, em princípio, exportação de produtos nossos. A mão de obra é local. O principal beneficiário — se não o único — é o empresário financiado com nosso pecúlio. É contraditório.
Terceira contradição
É curioso financiar a contratação de mão de obra estrangeira para trabalhar fora do território nacional. E o trabalhador brasileiro como é que fica? Sem trabalho? Pendurado numa bolsa qualquer? Melhor seria utilizar esse bilhão de dólares para financiar nossa própria infraestrutura, que anda bem necessitada. Consertar o dos outros e deixar o nosso ao deus-dará é contraditório.
A ilusão
Enganam-se aqueles que imaginam que o regime ditatorial cubano vai durar pela eternidade. Mais dia, menos dia, cai. Se a União Soviética desapareceu um dia, não é a ilha dos Castros que vai permanecer para mostrar ao mundo o caminho de um futuro radioso. Aí vai chegar a hora do vamos ver.
O povo cubano não há de guardar gratidão eterna àqueles que tiverem sustentado sua interminável ditadura. É mais que provável que Venezuela e Brasil não sejam idolatrados por aquelas bandas. Por outro lado, Cuba tem ligação visceral com seu vizinho de parede, os EUA. No dia em que a ditadura se for, vão-se jogar nos braços do grande irmão do Norte. Pode apostar.
Imaginar que o Brasil venha a ser benquisto por ter contribuído a manter em vida a dinastia dos revolucionários é tolice. Uma doce ilusão.
E pensar que tudo isso está sendo feito com nosso dinheiro. Que desperdício!
Com olhos estrangeiros
José Horta Manzano
A cidade de São Paulo, um dos primeiros núcleos de povoamento estabelecidos pelos portugueses no Brasil, completou 460 anos este 25 de janeiro.
A Folha de São Paulo teve a boa ideia de entrevistar nove estrangeiros que lá vivem e de pedir-lhes suas impressões sobre a cidade. É interessante notar que olhos forasteiros enxergam o que autóctones já não notam mais.
Aqui vai um florilégio de fragmentos das entrevistas. Vale para todo o Brasil.
Do lado negativo:
1) As pessoas falam muito alto, ouvem música alta e buzinam em túneis.
2) As crianças fazem o que querem aqui. Parece que os pais brasileiros têm problema em dizer não a seus filhos.
3) Quando recebo tailandeses, aviso que eles têm de tirar suas joias. Eles não entendem como é realmente perigoso.
4) A burocracia do meu país é bem louca, mas o Brasil fica em primeiro lugar. Tenho a impressão de ser o Asterix realizando um dos seus 12 trabalhos quando preciso de qualquer serviço administrativo.
5) Comer de maneira saudável é coisa de rico aqui.
6) O fato de as crianças fazerem bagunça me choca. Nos ônibus, é comum ver as mães em pé e as crianças sentadas nos lugares preferenciais.
7) Não é possível sobreviver no Brasil sem um CPF. Não dá para ter nem um número de celular sem isso.
8) Em São Paulo existem muitas invasões de prédios. Nunca tinha visto isso.
9) A educação nas escolas é ruim e os brasileiros não sabem dos direitos que têm.
10) No meu país, há uma guerra declarada. Aqui ela parece que acontece escondida.
11) Aqui as pessoas não respeitam fila. É normal ver alguém passando à frente e ninguém falar nada.
Como toda moeda tem dois lados, aqui vai o positivo:
1) Aqui as pessoas se ajudam. Dão informações na rua ou no metrô, seguram sua bolsa no vagão e ajudam a carregar a mala.
2) O serviço nos restaurantes de São Paulo é excelente. Nunca vi tantos garçons gentis e sorridentes.
3) Os brasileiros adoram tomar banho.
4) Qualquer lugar no Brasil tem uma fila preferencial. As pessoas são muito atentas e educadas, sempre deixando passar à frente ou oferecendo um assento no metrô para quem está com um bebê no colo.
5) Aqui há muitas oportunidades de trabalho e de crescer na vida.
6) No futebol, as pessoas não se importam só com o seu time. Se há um jogo, elas sentam e assistem à partida inteira.
7) Dá para pagar com cartão de crédito ou de débito até em uma ilha.
8) Aqui existem sobremesas. Na África, comemos frutas.
9) O Brasil é mais bonito do que nos documentários, que só mostram a parte ruim do país.
10) No Brasil, a mulher participa das decisões da família. Na África, ela tem de ser só bonita e calada.
11) Aqui você aprende a respeitar as diferenças.
Frase do dia — 91
«En el último año un promedio de tres mil cubanos, en su mayoría médicos, llegaron a Estados Unidos desertando de los distintos programas sociales que ejecutan en Venezuela, lo que representa un incremento de 60% con respecto a 2012.»
Frank López Ballesteros in El Universal, jornal diário de Caracas, Venezuela.
Frase do dia — 90
«Assistimos ontem, em Davos, a Dilma falando de um País que infelizmente não é o nosso. As palavras não têm o dom mágico de mudar a realidade.»
Aécio Neves, senador de nossa República, ao comentar a fala da presidente de nossa República. In Estadão, 25 jan° 2014.
Frase do dia — 89
«A desconfiança em relação ao Brasil é excessiva. Os críticos estão exagerando.
(…)
Mas hoje (…) estamos fazendo road-shows.»
Guido Mantega, ministro da Fazenda de nossa República, em entrevista concedida dia 25 jan° 2014 aos enviados do Estadão a Davos.
Frase do dia — 88
«O mau humor com Dilma hoje é tamanho que, durante sua fala, o dólar chegou a bater nos R$ 2,42. Logo depois, quando começaram em Davos os boatos de que Guido Mantega não mais ficaria no cargo, o real voltou a se valorizar.»
Sonia Racy comentando o discurso pronunciado por dona Dilma em Davos. In Estadão, 25 jan° 2014.