Atrasado porque jovem

José Horta Manzano

Desde criancinha (olhe que já faz tempo!), ouço dizer que o Brasil é atrasado porque é país jovem. Outros países – na Europa, por exemplo – seriam mais adiantados porque já tinham milênios de história quando as primeiras caravelas aportaram na Bahia. Em resumo, os europeus já tinham tido tempo de civilizar-se.

Acredito que os que pensam assim aceitam a teoria de um Brasil construído sobre tábula rasa, tudo começando do zero, como se nada existisse antes. Para muitos, essa explicação deve parecer razoável, razão pela qual saem repetindo por aí. Quanto a mim, acho que é pura balela. Conversa mole pra boi dormir (ou colóquio flácido para acalentar bovinos, como dizíamos).

Há que ter em mente como era a Europa na época da instalação das primeiras colônias europeias no Brasil. No século 16, Espanha e Portugal eram potências planetárias. Eram tão importantes que conseguiram do papa – a maior autoridade da época – a bênção para dividirem o globo entre eles dois, sem dar fatia a mais ninguém.

Atualmente, só nações que estão na ponta do progresso tecnológico conseguem enviar um foguete à Lua, pois não? Pois naquela época, só os países ibéricos dispunham do saber necessário para dedicar-se à navegação de longo curso. Só os dois, nenhuma outra nação. Não era pra qualquer um.

Manobrando caravelas que hoje nos parecem ultrafrágeis, portugueses contornaram a África e chegaram ao Extremo Oriente, uma façanha. Castelhanos atravessaram o Atlântico e aportaram na América. Ambos mostraram agilidade no manejo da tecnologia mais avançada. Os estabelecimentos coloniais mais numerosos na América, aliás, foram justamente fundados por ibéricos.

Vista de Mauritsstad, capital do Brasil Holandês
by Frans Post (1612-1680)

Espanhóis e portugueses não foram os únicos a povoar o território onde está o Brasil atual. Holandeses, entre outros, também por aqui estiveram, na Bahia e, sobretudo, em Pernambuco. Na época em que eles se estabeleceram em Olinda, os Países Baixos enriqueciam com o comércio. Por lá, floresciam as artes do mais elevado nível – Rubens e Rembrandt, note-se, foram contemporâneos de Maurício de Nassau, o governador-geral das colônias holandesas do Brasil.

O povoamento de nosso território não foi obra de extraterrestres. Os que para cá vieram não tinham brotado do nada. Eram europeus e traziam na bagagem, prontas para o plantio, as sementes daquele avanço tecnológico e daquela cultura milenar. Quanto a nós, somos herdeiros diretos desses milênios de civilização. Se a coisa encruou, não foi por pecado de origem, mas por erro de manipulação.

Se tivesse conseguido aliar o melhor da experiência europeia à vastidão e às promessas da nova terra, o Brasil seria um país fantástico. Não deu certo. Em algum ponto, desandou. Excetuando bolsões de excelência aqui e ali, estamos mergulhados num oceano de atraso. A causa certamente não é a juventude do país.

Bolsonaro carnavalizado

Álvaro Costa e Silva (*)

O presidente teria feito melhor se, como no samba clássico “Camisa Amarela”, de Ary Barroso, tivesse bebido um copo d’água com bicarbonato. Ou mesmo desaparecido no turbilhão da galeria.

Carnaval e poder não dão rima. Meu amigo Luiz Antonio Simas, o historiador das “coisas miudinhas”, costuma lembrar dois episódios. Em 1892 o marechal Floriano decretou a transferência da folia para junho, argumentando que o verão era propício a epidemias; naquele ano, brincou-se duas vezes. Em 1912 o marechal Hermes da Fonseca mandou adiar a festa para que não coincidisse com o luto pela morte do barão do Rio Branco; foi pomposamente ignorado.

Bolsonaro levou uma lavada nas ruas. O bonecão com suas feições, mil vezes alvejado por latas de cerveja e pedras de gelo, teve de contratar segurança para descer as ladeiras de Olinda. Nos blocos, nunca antes na história deste país se viu tanta gente fantasiada de laranja. Ou bebendo água em mamadeiras com formato de pênis (fiquei sabendo que um acadêmico já está preparando a tese “A Carnavalização das Fake News”). Registre-se ainda o coro “Ei, Bolsonaro, VTNC”, cantado de norte a sul.

Com enredo de crítica social e em homenagem à vereadora Marielle Franco, a Mangueira mostrou que o samba não se rebaixa. Uma alegoria, em especial, desagradou o presidente: o livro aberto com a frase “Ditadura assassina” escrita em caixa alta.

Bastou para que a Terça Gorda, para Bolsonaro, se transformasse num dia de fúria. Esqueceu que agora é o presidente, voltou aos tempos em que se contentava em atuar como deputado do baixo clero e correu destrambelhado para as redes sociais. Para atacar o Carnaval, cometeu o tuíte pornô, desviando de novo a discussão para a pauta de costumes. Milhões de brasileiros ainda caem nessa. Resta saber até quando.

Uma tuitada pode derrubar um governo? Aguarde as próximas lambanças.

(*) Álvaro Costa e Silva (1962-) é jornalista e escritor.

Se l’Italia fosse il Brasile

José Horta Manzano

Tenho um amigo italiano enamorado pelo Brasil. Originário da região de Veneza, Massimo Pietrobon é blogueiro e poliglota. Vive a maior parte do ano em Barcelona (Espanha), mas sempre que pode dá uma escapada pra rever a Terra de Santa Cruz.

Apaixonado por Geografia em geral ‒ e por mapas em particular ‒, Massimo teve uma ideia outro dia. Tomou um mapa da Itália e deu a cidades italianas importantes o nome de localidades brasileiras. Para cada caso, acrescentou uma justificativa, algum aspecto que sirva de elo entre ambas. Ficou interessante e curioso. Dou aqui abaixo um apanhado das muitas correspondências entre os dois países encontradas pelo Massimo.

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Para começar, São Paulo, cinzento e chuvoso mas principal centro econômico, só pode corresponder a Milão. Por seu lado, o Rio de Janeiro, caótico mas denso de beleza e de turismo, se encaixa bem com Roma, a outra metrópole italiana.

I love ITFlorianópolis, bela, turística e ilhoa, compara-se com Veneza, que tem as mesmas características. Recife, centro-mor do Nordeste, se conjuga maravilhosamente com Nápoles, centro-mor do Sul da Itália. Perto de Nápoles, está Amalfi, preciosidade histórica. E ao lado do Recife, o que é que está? Olinda, naturalmente, nossa joia antiga e carregada de história.

Outro ponto focal do Sul italiano é a ilha da Sicília, a confrontar com o outro representante do Nordeste brasileiro: a Bahia. Portanto, Salvador é Palermo.

A longínqua Amazônia, com Manaus, isolada capital, só pode ser a Sardenha e sua capital Cagliari. Ambas as regiões são selvagens e souberam conservar a cultura dos primitivos habitantes.

E Bolzano, a capital do Tirol do Sul, onde predomina a língua alemã? Corresponde a Blumenau, centro maior da imigração germânica no Brasil. Já as belezas históricas e naturais da Toscana se adaptam bem às preciosidades e às paisagens das Minas Gerais.

Turim, cidade organizada e funcional, combina com Curitiba, ao passo que o grande porto industrial de Gênova tem tudo a ver com o de Santos. Falando de cursos d’água, o mais importante da Itália é o Rio Pò, que se lança ao mar num delta cuja capital é Ferrara. Não é absurdo compará-la a Belém, situada exatamente onde o Amazonas desemboca no Atlântico. Outro ponto comum é que as duas cidades estão encharcadas de História.

I love BRPorto Alegre, cidade portuária que já se aproxima dos confins culturais do Brasil, é Trieste, onde já é perceptível a mestiçagem entre italianos, eslavos do sul e remanescentes do antigo Império Austro-Húngaro.

Na hora de comparar cidades saídas de uma prancheta de urbanista, não há que hesitar: a italiana Latina e nossa Brasília têm esse ponto em comum.

A grande cidade brasileira situada próxima de um dos pontos cardeais da rosa dos ventos é João Pessoa, que marca o extremo leste das Américas continentais. Na Itália, corresponde a Reggio Calabria, que assinala a ponta sul da bota.

Bandeira brasileira com as cores italianas

Bandeira brasileira com as cores italianas

Não há como não mencionar a região de Parma, de onde é exportado para todo o mundo o delicioso queijo parmesão, aquele sem o qual o macarrão perderia a graça. (Dizem que macarrão sem queijo é como amor sem beijo…) Que se compare Parma com nosso Estado de Minas que, no Brasil, é referência em matéria de queijo.

Há certamente outras semelhanças. Que o leitor curioso ponha o bestunto a funcionar. Buona fortuna a tutti!

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