José Horta Manzano
Os que me acompanham sabem que sou radicalmente contrário a todo sistema de quotas. Embora entenda as boas intenções dos que são favoráveis a esse método, acredito que ele é contraproducente. Em vez de oferecer oportunidades iguais, a implantação de quotas acaba por sacramentar desigualdade.
As «reservas de mercado» garantidas a membros deste ou daquele grupo social instituem privilégios que são, no fundo, a exata negação do objetivo perseguido. Decretar que uma porcentagem de determinado grupo social, étnico, racial ou religioso passe à frente dos demais é uma aberração, um contrassenso. Não é possível impulsionar ascensão social por intermédio de um atalho. Cotas são solução simplista para um problema bem mais profundo. É como se o médico administrasse analgésico sem se preocupar com a origem da dor. A foto sai bonita mas dissimula a origem do mal.
Contra certas fatalidades não se pode lutar. Quando a velhice, a doença ou desastres atingem o cidadão e lhe diminuem a capacidade de acertar o passo com os demais, é natural que se lhe facilite a existência. Ceder assento no ônibus a anciãos ou a gestantes, permitir que indivíduos fisicamente diminuídos sejam atendidos com prioridade, proporcionar escolaridade especial a incapacitados físicos ou mentais são práticas meritórias, que devem ser incentivadas.
Reservar quotas em virtude de raça (se é que «raça» tenha algum significado num país colorido como o nosso), de sexo ou de origem pode parecer demonstração de bondade. O quadro é enganoso. A meu ver, agir assim é tapar o sol com peneira. A origem do mal é bem anterior e é lá que deve ser atacada.
Se jovens negros, pardos, vermelhos ou azuis precisam de um jeitinho especial para ter acesso a estudo superior, por exemplo, garantir-lhes um lugar por decreto deixa a amarga impressão de serem menos inteligentes que os demais, o que é insultante e está longe de ser verdadeiro. Como fazer então? O caminho é um só: tratar o mal pela raiz. Investimento pesado em Instrução Pública é o nome do jogo.
Em países adiantados da Europa, não viria à cabeça de ninguém escolarizar os filhos fora da escola pública. Todos recebem a mesma formação. Com o passar dos anos, a seleção se faz naturalmente. Uma pequena parte se encaminhará a estudos superiores, enquanto a maioria se dispersará numa miríade de profissões, conforme o gosto de cada um.
Quando um jovem se interessa em prosseguir estudos aprofundados mas provém de família modesta e sem condições de lhe garantir o sustento, candidata-se a uma bolsa. Se for considerado capaz, o Estado investirá em sua formação.
Faz três meses, no Dia da Mulher, vereadores paulistanos se comprometeram a equilibrar, entre os dois sexos, a quantidade de homenagens da Câmara a pessoas de destaque na história do município. Uma pesquisa indica que 84% dos logradouros levam nome de homens.
E daí? ‒ pergunto eu. «Equilibrar», nesse caso, não faz o menor sentido. Dos 37 presidentes que o Brasil já teve, 36 foram homens. Como fazer pra «equilibrar»? Contando os efetivos, os temporários, os interventores e os suplentes, o município de São Paulo já teve mais de 50 prefeitos, entre os quais apenas duas mulheres. Como fazer pra «equilibrar»?
O pronunciamento dos vereadores é um disparate feito para impressionar a galeria. Melhor mesmo seria evitar dar nome de gente a logradouros, uma impressionante falta de imaginação. Que se dê nome de planta, de árvore, de bicho, de país, de poesia, de episódio histórico, de rio, de estrela, de livro, de objeto. Há um mundo a explorar.