José Horta Manzano
Ninguém manda centenas de policiais bem (ou mal) treinados para a frente de batalha sem razão. Se os chefes militares que organizam e coordenam as ações do BOPE (Batalhão de operações policiais especiais) conceberam uma “operação policial especial” da magnitude da que ocorreu ontem no Rio de Janeiro, é porque tinham antes pesado os prós e os contras, medido riscos, avaliado ganhos e perdas, e considerado que a ação fazia sentido e valia a pena.
O balanço oficial – notem bem: oficial, estampilhado pelo governador do Rio – era, até a manhã desta quarta-feira 29, de 64 mortos. Acontece que moradores da região da batalha campal se deram as mãos, foram à mata que faz limite com a zona, e lá recuperaram mais de 50 mortos extras. Um por um, trouxeram os cadáveres até um descampado em meio às ruas estreitas e alinharam todos ao rés do chão.
Esses populares relatam que bom número de mortos apresentavam uma única ferida: um tiro na nuca, prova de que não tinham tombado na luta, mas tinham sido vítimas de execução sumária à moda chinesa. De fato, ao observar várias fotos dos corpos alinhados de costas para o chão, não notei nenhuma marca de ferida. Ou morreram com bala pelas costas, coronhadas ou foi tiro na nuca mesmo.
Até o meio-dia de quarta-feira, apesar da descoberta dessas dezenas de cadáveres que tinham sido abandonados na mata, o balanço oficial continuava inalterado, marcando o mesmo número de vítimas da véspera. Parece que as autoridades, agora constrangidas, não tinham previsto que os corpos largados na mata seriam encontrados tão cedo.
Numa elegante declaração, o governador do Rio elogiou a ação e foi taxativo: “De vítimas lá, só tivemos os policiais”. Em poucas palavras, pôs à mesa um concentrado de seu modo de pensar, que é o mesmo de muitos brasileiros, em especial os fãs de um certo ex-presidente, agora presidiário.
A “operação especial” conseguiu quebrar um sinistro recorde que se mantinha havia 33 anos. Foi, de fato, em outubro de 1992 que uma expedição policial exterminou 111 presidiários na Penitenciária do Carandiru, São Paulo. A carnificina de ontem acaba de provocar mortandade ainda maior.
Supondo que os policiais não fizeram essa incursão à toa, vem a pergunta inevitável: qual era mesmo o objetivo da operação?
Esse objetivo seria:
- Provocar dezenas, centenas de mortos e dizer que eram todos bandidos?
- Impor-lhes uma pena capital vetada pelas leis do país?
- Diminuir o número de integrantes das facções cariocas?
- Dar um susto nessa “gente morena” e tirar-lhes a vontade de traficar?
- Mostrar à população que as autoridades estão vigilantes?
Se alguma alma bem-intencionada tiver uma ideia, mande cartinha para a Redação.
PS: Enquanto houver demanda de entorpecentes por parte da população, haverá sempre quem os forneça. Atrás dos eventuais traficantes trucidados, virão outros. E mais outros. E muitos mais.

























