Ecos do G7

José Horta Manzano

Artigo publicado no Correio Braziliense de 27 maio 2023


“Nós, os líderes do Grupo dos Sete (G7), […] estamos tomando medidas concretas para apoiar a Ucrânia pelo tempo que for necessário em face da guerra ilegal de agressão da Rússia.”


Essas são as primeiras palavras do comunicado final da cúpula do G7, havida recentemente em Hiroshima. O longo texto, firmado pelos dirigentes das democracias que integram o grupo, se estende por 19.000 palavras distribuídas em 66 tópicos. A abrangência do documento é vasta: valores comuns, não proliferação de armas nucleares, tensões na região indo-pacífica, economia global e dezenas de outros pontos. Assim mesmo, a menção à “guerra de agressão da Rússia” em primeiríssimo lugar mostra a importância que ela assumiu aos olhos das democracias mais maduras.

O Brasil, em nome de sabe-se lá que doutrina, está em dissonância com a unanimidade exibida pelas três dezenas de países que compõem o dito “Ocidente”. Em março passado, comentando decisões estabanadas do governo brasileiro, uma agência de notícias comentou: “Nas últimas semanas, o Brasil de Lula enviou uma delegação à Venezuela, recusou-se a assinar uma resolução da ONU condenando as violações dos direitos humanos na Nicarágua, permitiu que navios de guerra iranianos atracassem no Rio de Janeiro e recusou-se a enviar armas para a Ucrânia, em guerra com a Rússia”. Como se vê, depois do calamitoso quadriênio Bolsonaro, o Brasil é escrutado com atenção.

Quanto à guerra na Ucrânia, Lula permanece mergulhado num negativismo obstinado, incapaz de enxergar a realidade cristalina: a Ucrânia, país independente, livre e soberano, foi brutalmente invadida por tropas russas, em guerra de conquista territorial. Parece que Luiz Inácio (e assessores) são os últimos que resistem a admitir isso. Nosso presidente insiste em enroscar-se com declarações tiradas do bolso do colete. Já disse que “a decisão pelo conflito foi tomada por dois países”, um descalabro. Referindo-se à Crimeia, já declarou que “a Ucrânia, também, não pode querer tudo”, outra barbaridade. “Não cabe a mim decidir de quem é a Crimeia ou o Donbas”, declarou um Lula esquecido de que o Brasil foi um dos primeiros, trinta anos atrás, a reconhecer a Ucrânia, dentro de suas fronteiras oficiais.

Luiz Inácio persiste em apregoar sua crença num mundo multipolar, sem potência dominante. Sua guerra particular contra o dólar americano mostra isso. Quer Lula goste ou não, sua sonhada utopia está cada dia mais longe. A impressionante evolução da China, impensável vinte anos atrás, embaralhou as cartas do jogo mundial. Os EUA não estão em declínio, apesar do que Lula da Silva possa almejar. A Rússia, essa sim, tem decaído. Portanto, não é preciso consultar uma bola de cristal para saber como será o equilíbrio de forças nas próximas décadas: teremos a volta da guerra fria – que já aponta na esquina. De um lado, a China e seus aliados; de outro, os Estados Unidos e o “Ocidente”.

O país de Putin, empobrecido, desprestigiado e privado de projeção internacional, será fatalmente atraído para a órbita da China, país do qual está se tornando vassalo. Sem o amparo chinês, a Rússia teria enorme dificuldade para sobreviver. Essa nova e previsível divisão do equilíbrio mundial entre dois polos (EUA e China) está por trás da intensa movimentação da diplomacia comercial mundial destes últimos anos. Países de peso territorial, populacional e econômico estão sendo cortejados. Está aí a razão do convite de participação estendido a Brasil, Vietnã, Indonésia, União Africana, Coreia do Sul e outros.

Lula já deu um grande passo ao declarar, em discurso oficial no G7, que o Brasil condena a violação do território da Ucrânia. Por fim, um posicionamento menos inquietante. O bom senso informa que nosso país, por sua história, língua e cultura, faz parte do mundo ocidental. Por mais que respeitemos a civilização chinesa e a russa, não descendemos de lá. A árvore genealógica de nosso povo nos prende ao mundo atlântico, na encruzilhada África, Europa e América.

Lula e o Itamaraty precisam reconhecer que um país invadido por tropas estrangeiras tem o direito (e o dever) de se defender. Ajudá-lo a repelir o invasor não é “tomar um lado”; é respeito ao direito internacional.

Presidente! Deixe de lado a vaidade de ser aquele que pôs fim à guerra – quimera que não se realizará. Mostre empatia para com os infelizes ucranianos e reponha o Brasil nos trilhos da civilização! O futuro vai lhe agradecer.

Clube de amigos?

José Horta Manzano

Está difícil captar a lógica de Lula da Silva no caso da guerra que a invasão da Ucrânia por tropas russas provocou. Analistas de todos os quadrantes – inclusive este escriba – têm atribuído o bizarro comportamento de Lula a diferentes causas: antiamericanismo primário, desejo de ficar na história como aquele que parou uma guerra, necessidade de ser visto como pacificador planetário.

Talvez as palavras e os gestos de nosso presidente reflitam um pouco de cada uma dessas razões. Mas tem mais. Um curto vídeo rodado na abertura da reunião da qual participaram todos os líderes (os do G7 e os de países convidados) revela que, à entrada de Zelenski, todos se levantaram e se dirigiram para acolhê-lo. Lula, fingindo estar entretido na leitura de um documento, nem ergueu a cabeça. Ficou sentado como se tivesse entrado a moça do café.

Lula da Silva não é homem culto. Mas também bobo não é. Se ele tivesse a intenção sincera de “levar a paz” àquela região e minorar o sofrimento de seus inocentes habitantes, sua atitude certamente seria outra. Ao ver, a dois metros de distância, entrar o líder de um dos países em conflito, teria se levantado imediatamente para saudá-lo, apertar-lhe a mão e soprar-lhe no ouvido: “Logo mais, vamos conversar”.

Não foi o que ele fez. Ao se fazer de estátua enquanto o resto dos líderes recepcionava o visitante, deu um recado: “Não vou porque não quero”. Pode-se traduzir por uma frase que criança usava antigamente: “Não sei quem é esse aí, não quero saber e tenho raiva de quem sabe”.

Em suma, o desaforo que Lula fez a Zelenski não foi gratuito. Tem um motivo, mas qual?

Lula aparenta ter ficado extremamente irritado com a presença do convidado surpresa. Zelenski, popstar conhecido e famoso no mundo todo, ofuscou o papel de protagonista que Lula imaginava assumir. Roubou-lhe a cena. O mau humor de Luiz Inácio é a face visível do ciúme e da raiva que lhe roem a alma.

Dá pra imaginar que, no fundo, o “clube de amigos” que poria fim à guerra na Ucrânia não era o objetivo maior de Lula. Se fosse isso, Luiz Inácio teria agarrado a ocasião de dar um forte abraço no líder do país invadido. O grande objetivo de Lula era dominar a cena do festival, como fazia nos bons tempos em que era “o cara” de Obama. No fundo, para quem dizia querer criar um “clube de amigos”, o procedimento de Lula foi inamistoso e revelou sua falta de sinceridade.

Pois é, os tempos mudaram, mas Luiz Inácio esqueceu de evoluir. A continuar assim, periga nem ser convidado para o G7 do ano que vem.

Arruaceiros de lá e de cá

José Horta Manzano

Aconteceu em maio de 2003. A Cúpula Anual do G8 estava para realizar-se na cidade francesa de Evian, estação de águas à beira do Lago Leman, localidade bastante turística. A reunião de líderes dos países mais importantes incluía a Rússia conduzida por um Putin que ainda não tinha mostrado seu lado B. Só depois da anexação da Crimeia é que a Rússia seria expulsa e o bloco passaria a chamar-se G7.

Durante os três dias da Cúpula, a cidadezinha de Evian estaria totalmente isolada do mundo, com entradas e saídas rigorosamente controladas por militares armados vindos da França inteira. Só habitantes e visitantes credenciados teriam o direito de entrar. Helicópteros e drones sobrevoariam a localidade. Afinal, eram figurões os que se reuniriam: Jacques Chirac, Vladimir Putin, Silvio Berlusconi, George W. Bush, Tony Blair & alia.

Grupos de jovens, que se autodefiniam como “anti G8”, preparavam manifestações pacíficas. A sabedoria popular, que não costuma falhar, afirma que “é conversando que a gente se entende”. É por isso que até hoje não consegui captar o objetivo daqueles manifestantes que viam com maus olhos o diálogo entre líderes. Será que preferiam que eles se estapeassem ou botassem tanques nas ruas?

Na impossibilidade de penetrar em Evian, onde se realizava a Cúpula, os jovens idealistas escolheram manifestar-se em Genebra (Suíça), cidade bem maior, situada a uns 50 km de distância, à beira do mesmo lago. Os manifestantes marcaram passeatas para os três dias de duração da cimeira. Eram marchas simbólicas com cartazes, megafone e palavras de ordem. Acreditavam que, quando aparecessem nas manchetes e no jornal da tevê, sua visão “anti G8” tocaria corações mundo afora.

Mas nenhuma felicidade é perfeita nem eterna. Grupos de arruaceiros, ao tomar conhecimento das passeatas, sentiram que era chegado o momento de armar um bom quebra-quebra em Genebra. Desordeiros vieram até do estrangeiro – havia alemães, franceses, austríacos, italianos – todos armados de tacos de beisebol e coquetéis Molotov. Um primor.

Vários comerciantes genebrinos, sabedores de que estava para chegar uma horda de agitadores violentos, protegeram a vitrina com tapumes de madeira. Mas nem todos tomaram essa providência. Genebra é uma cidade grandinha, impossível de ser trancada. O fato é que os baderneiros se instalaram na cidade.

Já na véspera da abertura da Cúpula, os profissionais do quebra-quebra entraram em ação. Aproveitaram do escuro da noite para agir. Encapuzados e mascarados, quebraram vitrines, incendiaram lojas, destruíram mobiliário urbano. Foi uma noite de caos. A polícia não pôde fazer muito. Os arruaceiros sempre escolhem agir em campo descoberto, de onde possam escapar rapidamente; nunca se arriscam a jogar bomba em beco sem saída.

E assim continuaram pelas noites seguintes. Hotéis foram atacados e restaurantes McDonald’s, depredados. Os agressores são desocupados sem ideologia: vêm de longe e destroem pelo simples prazer de destruir. Assim que a reunião do G8 terminou, desapareceram. E nunca mais se ouviu falar deles.

Outro dia, em Brasília, quando nosso presidente eleito foi diplomado, arruaceiros tupiniquins decidiram agir. Aproveitando que um punhado de apóstolos do bolsonarismo ainda acampa nas ruas choramingando por um milagre, vestiram-se de amarelo e promoveram uma noite de horror.

Me fizeram lembrar de Genebra 2003 – com eficácia menor, porém. Agiram em campo aberto: posto de gasolina, viaduto, esplanada diante de instituições. São lugares de onde se pode escapar rápido, caso a situação aperte.

A população vê, nesses agressores, bolsonaristas enfurecidos. Já os bolsonaristas acreditam que os autores do quebra-quebra sejam petistas infiltrados.

É difícil dizer com certeza, mas não é impossível que tenham sido agitadores compulsivos, que não precisam necessariamente ser remunerados. Destroem pelo prazer de destruir – o que não os impede de ter preferências políticas. Quais são? Só Deus sabe.

Brasil à mesa dos grandes

José Horta Manzano


Este blogueiro não tem a menor simpatia pelo Lula. E jamais votou em candidato petista. Quem me lê sabe disso, mas não custa repetir.


Cúpulas do G7
As reuniões anuais de cúpula dos países mais industrializados começaram em 1975 e continuaram a ser organizadas anualmente. Os que têm mais de 30 anos hão de se lembrar que o grupo dos países mais industrializados se chamava G8. Isso foi enquanto a Rússia, que era um dos participantes, foi considerada terra civilizada. Tudo mudou em 2014, quando Putin mandou a tropa invadir e tomar a região ucraniana da Crimeia. A partir de então, a Rússia foi suspensa do grupo e nunca mais conseguiu seu bilhete de entrada.

Tirando o ano de 2019, em que a covid grassava freio, houve cúpula todos os anos. Desde a virada do século, o país que hospeda a reunião ganhou o direito de propor a líderes de países não-membros que participem como convidados de honra. Lula da Silva, então presidente do Brasil, foi convidado nas seguintes cimeiras:

2003, realizada na França
2005, realizada no Reino Unido
2006, realizada na Rússia
2007, realizada na Alemanha
2008, realizada no Japão
2009, realizada na Itália

Nosso Guia, como se sabe, deixou a Presidência em 2010. Coincidência ou não, depois disso, o Brasil nunca mais recebeu convite para participar. Nem Dilma, nem Temer, nem muito menos Bolsonaro tiveram a honra. A bem da verdade, diga-se que o capitão estava na lista de convidados para a cúpula de 2019, a ter lugar nos EUA durante o governo de Trump. A pandemia acabou com a festa e obrigou ao cancelamento.

Aqui vai uma curiosidade pra deixar o atual presidente verde de inveja. Sabe quem esteve entre os convidados de honra este ano, na cúpula que acaba de terminar na Alemanha? Pois foi Señor Alberto Fernández, representando a Argentina. Além dele, foram homenageados os líderes da Indonésia, da Índia, da África do Sul e do Senegal. O Brasil ficou na geladeira, fazendo companhia à Rússia (banida) e à China (que nunca entrou).

Sabe quando é que o Brasil de Bolsonaro vai voltar a ter alguma chance de participar? Nunca. Só depois que voltar ao normal, ou seja, após a partida de Bolsonaro. Nem que, por impiedade do destino, o homem fosse reeleito e ficasse mais quatro anos no palácio: seriam quatro anos sem Brasil entre os grandes. Agora, se Nosso Guia vestir a faixa em janeiro próximo, boas são as chances de o Brasil subir de novo ao palco.

Anote aí
As próximas reuniões de cúpula do G7 estão previstas para 2023 no Japão e 2024 na Itália.

Efeito Bolsonaro

Cúpula do G7: foto de família em modo distanciamento social

José Horta Manzano

O status de “potência emergente” que o planeta atribuía ao Brasil até pouco anos atrás murchou feito pastel de vento depois da primeira mordida. A pandemia tem parte nisso, mas não é a única responsável. A danada afetou o mundo todo, não só nosso país. Se demos um passo atrás por causa dela, todos também deram. Portanto, empatou. Essa desculpa é furada. Atualmente, a grande diferença, o principal fator que alarga a distância entre nós e o mundo mundo civilizado tem nome: é Jair Bolsonaro.

Nossas instituições – Congresso, Forças Armadas, Poder Judiciário – vêm aceitando flacidamente o extravio presidencial, cada dia mais evidente. Por seu lado, o povo continua anestesiado, a discutir o número exato de motocicletas que participaram da última motociclata patrocinada pelo capitão. Fora de nossas fronteiras, em terras em que o peso de palavras e atos segue outra escala, a história é diferente.

Pouco divulgada no Brasil, teve lugar no fim de semana passado a cúpula anual do G7. Os grandes deste mundo se reuniram – presencialmente! –  de 11 a 13 de junho numa estância balneária do sul da Inglaterra. Pra se ter uma ideia da importância do encontro, note-se que é a primeira viagem de Joe Biden ao exterior desde que assumiu a Presidência.

A última cúpula do G7 realizada em caráter presencial tinha sido a de Biarritz (França), em agosto de 2019. Na ocasião, a zombaria que Bolsonaro acabava de fazer com relação à aparência física da primeira-dama francesa tinha sido posta à mesa pelo presidente Macron e abundantemente comentada pelos participantes estupefatos.

Tradicionalmente, nas cúpulas do G7, o anfitrião tem o direito de convidar dirigentes de outros países, que vêm na qualidade de observadores. Nesta edição, Boris Johnson, o dono da casa, resolveu convidar a Índia, a África do Sul, a Coreia do Sul e a Austrália. Honrados, todos aceitaram o convite. O distinto leitor há de ter reparado que, à exceção da China e da Rússia, que não são considerados países democráticos, o Brics inteiro foi chamado pra fazer a festa. Faltou o Brasil. É que, graças ao trabalho incansável do capitão, nosso país passou a fazer parte dos empestados, aqueles que ninguém quer ver por perto.

Tem avançado a ideia de reformar o G7 e transformá-lo no D10, um clube com as dez principais democracias. Índia, Coreia do Sul e até Austrália são cotados para entrar na agremiação. Nosso país, apesar de ter peso econômico maior do que os futuros integrantes, não aparece entre eles. De fato, não passaria pela cabeça dos integrantes do G7 convidar o Brasil de Bolsonaro. Quando se sabe que um país pode causar dor de cabeça, ele é posto na geladeira. Ninguém abre a porta de casa para sujeito encrenqueiro.

Como se sabe, nosso país não é uma ilha nem está situado no planeta Marte. Estamos com os pés fincados na velha e boa Terra, e daqui não há meio de sair. Os vizinhos que temos – próximos e distantes – são o que são, não temos escolha. São eles que compram o que produzimos em excesso; é deles que compramos aquilo que não colhemos nem produzimos. Não somos autossuficientes, sequer em produção de alimentos. Portanto, não é possível dar uma banana pro mundo, como faz nosso capitão, e esperar que, em troca, nos mandem beijinhos. Amor, com amor se paga.

Reparem que, com Bolsonaro no poder, já começamos a ser discriminados. As portas fechadas do D10 são apenas um aperitivo, uma amostra das sanções que nos esperam. São só o comecinho.

P.P.P.

José Horta Manzano

Às vezes se ouvem inacreditáveis histórias de cubanos que padecem com salário mensal de 10 ou 20 dólares. São relatos que nos deixam de queixo caído e sem entender como é possível alguém viver com uma ninharia assim.

É verdade que, em qualquer lugar do mundo, ter de se virar com poucas dezenas de dólares por mês é andar na corda bamba. No entanto, há que relativizar. O dólar não é referência absoluta. Nenhuma moeda poderia servir de régua para medir realidades assimétricas.

Tradicionalmente, o PIB (produto interno bruto) tem servido de parâmetro para medir a riqueza de cada país. O cálculo é teórico, mas é o que temos. O problema é que um cubano, com o equivalente de 10 dólares, pode comprar mais mercadoria e mais serviços do que um norueguês que dispuser da mesma quantia. Portanto, simplesmente dividir o PIB pela população de um país pode levar a resultado distorcido, longe da realidade.

Para corrigir a distorção, utiliza-se a variante PPP (Purchasing Power Parity = Paridade de Poder Aquisitivo). Uma manipulação científica de indicadores permite a obtenção de resultado mais próximo da realidade. É aí que se vê que um ordenado mensal de US$ 5.000, considerado excelente no Brasil, é salário de fome na Suíça, país onde esse montante não chega para sustentar uma família de quatro pessoas.

Calculado pelo método PPP, o PIB brasileiro per capita aumenta 50%. O G7, o clube dos ricos, congrega as nações teoricamente mais ricas do planeta. Atualmente, os membros do clube são: os EUA, o Japão, a Alemanha, a França, o Reino Unido, a Itália, o Canadá – acompanhados da União Europeia. A Rússia, que fazia parte, foi excluída desde que suas tropas se apossaram da Crimeia, território antes ucraniano.

Algum tempo atrás, uma jornalista alemã esmiuçou dados do FMI e confrontou com a riqueza dos integrantes do G7. Chegou à conclusão de que, considerada a paridade de poder aquisitivo, os integrantes do G7 não seriam os mesmos. A ilustração mostra os países que, pelo método P.P.P., deveriam participar do clube, de 1980 a 2019.

Pode-se notar que, na década de 1980 (a chamada década perdida), o Brasil contava entre as sete maiores economias. Deu um escorregão no início dos 2000. Atualmente, é o oitavo da lista, ou seja, o primeiro dos que vêm depois. É interessante notar a ascensão fulgurante da China, o grande ausente. Não passava nem perto do clube em 1980 e, em 40 anos, assumiu o primeiro lugar. Mas continua de fora, que o clube não aprecia novos-ricos. Regras são regras, ora.

A floresta e os netinhos

José Horta Manzano

Artigo publicado pelo Correio Braziliense em 31 agosto 2019.

Quando o Congresso de Viena se reuniu, duzentos anos atrás, o mundo era bem diferente. No Extremo Oriente, China e Japão ainda viviam sua Idade Média. A Índia, pobre e desunida, estava prestes a sucumbir à mão de ferro do Império Britânico. Na África, fora raras exceções, os povos ainda não estavam organizados; Estados, na acepção atual, não haviam se formado. Nas Américas em pleno processo de emancipação, os países independentes eram frágeis demais para atuar na cena mundial. Restava a Europa.

Reinos e impérios europeus constituíam as potências da época. Foram eles que se reuniram em congresso para redistribuir as cartas que Napoleão havia embaralhado. Naquele tempo, um encontro desse tipo fazia sentido. As decisões tomadas no clube dos donos do mundo não eram passíveis de contestação. Entravam em vigor, ponto e basta. E olhe que não eram resoluções de pouca importância: com as fronteiras europeias sendo redesenhadas, cada pedaço de terra era cobiçado. Doze eram as potências reunidas. Tivesse ocorrido hoje, o Congresso de Viena ganharia o apelido familiar de G12.

Dois séculos – e muitas guerras – se passaram. Foi-se o tempo em que um fosso separava as regiões periféricas das potências dominantes. Acabou-se a era em que só um punhado de gigantes comandava. O mundo hoje é matizado. O dégradé começa da potência maior e vai deslizando, em declive suave e contínuo, até o mais deserdado dos países. Já não vigora a divisão rigorosa entre países ricos e países pobres. Há nações de «classe média» ascendente.

Reuniões do G7, como a organizada no passado fim de semana, têm ares anacrônicos e cheiram a naftalina. Desse tipo de encontro, raramente brotam soluções para os problemas da humanidade. Numa mostra explícita de hipocrisia, o clube exclui a China, hoje segunda potência do planeta – um disparate! A Rússia, dona de importante economia e terrível potencial bélico, tampouco faz parte do convescote. Foi posta de castigo, como se isso fosse benéfico para a convivência entre nações. Não há que se diga: essas reuniões de gente fina que arremedam o venerável Congresso de Viena já não impõem. Pálidas imitações do original, só servem para gastar dinheiro público.

Se Monsieur Macron incluiu as queimadas da Amazônia brasileira na pauta de discussões, não terá sido exatamente por ser ecologista de carteirinha. De olho em 2022, ele está mesmo é preparando a reeleição. Pra chegar lá, tem de passar aos eleitores imagem de líder forte, combativo e, acima de tudo, empenhado na defesa do planeta, como manda o figurino atual. A luta pela preservação dos recursos naturais é legítima e louvável, mas a súbita profissão de fé do líder francês cheira a oportunismo.

Semana passada, doutor Bolsonaro se encrespou com o colega francês. Foi quando Macron, ao se referir à selva equatorial sul-americana, chamou-a de «nossa Amazônia». Bolsonaro inferiu que a França está interessada «em ter um dia um espaço aqui, na região amazônica». Enfurecido e sem se aconselhar, soltou a insinuação. Quanta tolice, capitão!

A França já tem «um espaço aqui». Fosse menos precipitado, doutor Bolsonaro teria evitado essa gafe. A Guiana Francesa, nossa vizinha de parede, é território francês e tem 97% da superfície coberta pela floresta amazônica. Isso dá a Macron o direito de dizer o que disse. Um exame de conhecimentos gerais deveria ser exigido dos pré-candidatos ao Planalto. Só quem passasse poderia registrar candidatura. No dia em que um filtro desse tipo for instalado, passaremos menos vergonha. A marca deste peculiar começo de século é a subida ao trono de indivíduos de poucas luzes. Eles tocam desafinado, e quem troca os pés somos nós.

Enquanto isso, senhores, a mata está queimando. Árvores e bichos vão desaparecendo. Se alguém pode tomar atitude eficiente, não será o G7. Muito menos Monsieur Macron. A salvação da lavoura repousa nas mãos firmes de nosso presidente. Cabe a ele decidir se, um dia, diremos a nossos netos: «Sabe, Pedrinho, no meu tempo, esta floresta era bem mais extensa». Ou se seremos obrigados a confessar: «Sabe, Pedrinho, no meu tempo, aqui havia uma floresta».

Quase-verdades e traições

José Horta Manzano

Para quem achava que o máximo em matéria de personalidade desconcertante era o Lula com suas idas e vindas e suas «quase-verdades», o presidente dos EUA é muito mais perturbador e ganha disparado. Pra quem se sentiu chocado quando o Lula apertou a mão de doutor Maluf, está aí Donald Trump pra fazer mais e melhor: apertou a mão de um ditador sanguinário, inimigo declarado de seu país.

Em matéria de traição e de reviravolta, Mister Trump deixa Lula da Silva no chinelo. É imbatível. Em apenas um ano, fez o que nenhum mandatário jamais ousou fazer nem ‘nessepaiz’, muito menos ‘nesseplaneta’.

O homem renegou os Acordos de Paris sobre o clima. Renegou o Acordo Nuclear Iraniano. Traiu países aliados ao impor tributação à importação de aço e de alumínio. Faz alguns dias, quando do último encontro do G7, assinou o acordo final para, poucas horas mais tarde, renegá-lo. E fez tudo isso sem corar.

Semana passada, tratou o primeiro-ministro canadense de traidor. E pensar que o Canadá é o mais antigo e mais fiel aliado dos EUA. Acompanhou o irmão poderoso nas horas boas e nas más, na guerra como na paz. Desembarcou na França em 1944 e batalhou junto.

Poucos dias depois, Trump declarou depositar toda confiança no ditador norte-coreano. Disse acreditar que o homem cumprirá o prometido e honrará os acordos. Pergunto agora: como é possível chamar de traidor o homem que encarna a população do maior aliado e, ao mesmo tempo, acariciar um brutal ditador e declarar confiar naquele que era inimigo até a véspera?

É dose pra elefante, como diz o outro! Ninguém pode garantir que Mister Trump não vá renegar, semana que vem, o protocolo assinado hoje com Kim Jong-un. Dá pra viver numa insegurança desse calibre?

Mas a roda gira. De tanto maltratar amigos e aliados, Donald Trump vai acabar se indispondo com todos. Não é o melhor cenário para seu país.

Parlamentarismo à francesa

José Horta Manzano

Em teoria, a França vive sob regime parlamentarista. Entretanto, a Constituição em vigor, promulgada em 1958 sob medida para o general de Gaulle, dá poderes não habituais ao presidente da República. A costura acabou inventando um regime híbrido, a meio caminho entre parlamentarismo e presidencialismo. Diferentemente do que costuma ocorrer em outros países, o chefe do Estado francês (o presidente) tem projeção muito maior do que o chefe do governo (o primeiro-ministro). Quer uma prova?

Vamos ver. Quem é que conhece o nome do atual primeiro-ministro francês? Todos sabem que sua colega alemã é Frau Merkel. Quem governa o Reino Unido é Mrs. May. Señor Rajoy é quem dirige o governo espanhol. Mas… e na França, quem será? Pois o primeiro-ministro ‒ e chefe do governo ‒ é Monsieur Édouard Philippe. Isso mesmo: Philippe é o sobrenome.

Assembleia nacional francesa

A Constituição do país garante ao chefe do Estado poderes que, em outros países europeus, são atribuídos ao primeiro-ministro. É eleito pelo voto popular. Pode dissolver a Assembleia e convocar eleições. Pode propor plebiscitos, nomear e demitir ministros, assinar decretos, nomear embaixadores, conceder graça a condenados, negociar e assinar tratados. É ele quem preside a reunião governamental, realizada todas as quartas-feiras, com a presença de todos os ministros. Em cúpulas internacionais como o G7 e o G20, é o presidente quem representa o país.

A cada cinco anos, um mês depois da eleição presidencial, os franceses vão às urnas para renovar a Assembleia. O voto é distrital puro. O país é dividido em 577 distritos de população equivalente. Cada um elege um deputado que o representará na Assembleia Nacional. Em cada distrito, será eleito o candidato que tiver obtido maioria absoluta, ou seja, 50% mais um dos votos válidos. É raro que isso aconteça já no primeiro turno, daí a necessidade de um segundo. Qualificam-se para a segunda rodada os candidatos que obtiverem voto de pelo menos 12.5% do eleitorado (não somente dos que tiverem efetivamente votado).

No domingo 11 de junho, ocorreu o primeiro turno de votação. Somente quatro deputados conseguiram eleger-se diretamente, com mais de 50% dos votos do distrito. Os eleitores das demais 573 circunscrições voltarão às urnas uma semana depois, em 18 de junho, para escolher entre os dois primeiros colocados. Este ano, há um único caso dito «triangular», em que três candidatos se qualificaram para o segundo turno.

Assembleia Nacional francesa

O sistema de voto distrital puro tem vantagens e desvantagens. Do lado bom, cada cidadão sabe perfeitamente qual é o deputado que o representa em Paris. A campanha tem custo muitíssimo menor do que no Brasil, por exemplo. O candidato, que percorre um território relativamente pequeno, fica mais próximo do eleitor, distribui santinhos pessoalmente, multiplica apertos de mão, beija crianças, tira «selfies» com apoiadores, visita feiras-livres, exposições, pequenos comércios.

Além disso, os franceses residentes no exterior também são representados. O planeta foi dividido em onze distritos eleitorais, conforme a concentração de expatriados em cada um. Portanto, dos 577 deputados, 566 representam os franceses residentes no território nacional e onze trazem a voz dos que vivem fora. Os três milhões de brasileiros que moram fora do Brasil não gozam de direito equivalente.

Do lado menos positivo, a tendência ao bipartidarismo é forte. A composição da Assembleia não reflete necessariamente a proporção de votos obtidos por cada partido. Ao final das atuais eleições francesas, a Frente Nacional, partido de extrema-direita antieuropeu e anti-imigração, não conseguirá eleger mais que uma dezena de deputados. O número de eleitos não bate com o número de eleitores do partido. No caso específico de partidos extremistas (de esquerda ou de direita, pouco importa), a distorção não incomoda os cidadãos de orientação moderada, que formam, ao fim das contas, a maioria da população.

Se um dia tal sistema for instituído no Brasil, a consequência mais imediata será o desaparecimento de siglas de aluguel, chaga nacional. Ganharemos todos.

A ruivinha deles

José Horta Manzano

Anne Lauvergeon (1959-), dirigente francesa de alto nível, cursou escolas prestigiosas, passou por empresas renomadas e acabou se aproximando do mundo político. Chegou a funcionar como xerpa(*) do presidente François Mitterrand junto ao G7.

Em 1999, foi nomeada presidente da estatal Areva, que controla a indústria nuclear do país. O posto, pra lá de relevante, jamais tinha sido ocupado por mulher. Diga-se de passagem que, na França, 75% da energia elétrica é gerada por usinas nucleares. Nesse particular, o pais é, com folga, mais nuclearizado do que qualquer outro. Por aquelas bandas, a Areva é tão importante quanto é a Petrobrás para nós.

Anne Lauvergeon, a 'Anne Atomique'

Anne Lauvergeon, a ‘Anne Atomique’

Foi naquela época que ganhou o apelido de «Atomic Anne» ‒ Ana Atômica, trocadilho que conjuga o espírito empreendedor da moça com suas atividades nucleares. Boa adaptação francesa de nosso familiar termo gerentona.

Sob a presidência da gerentona, a Areva comprou em 2007, pela inacreditável quantia de 1,8 bilhões de euros (sete bilhões de reais), uma start-up canadense do ramo mineiro. Foi decisão temerária, dado que a companhia adquirida não passava de promessa: nunca havia extraído um grama sequer de minério(!).

O negócio revelou-se um fracasso. Enquanto ainda era presidente da estatal nuclear, madame Lauvergeon tratou de disfarçar o rombo. Para embelezar o balanço, promoveu «pedaladas», chamadas na França de maquiagem fiscal. Dá no mesmo. Apresentou balanço falsificado.

Localização das 58 usinas nucleares francesas

Localização das 58 usinas nucleares francesas

Seguiram-se anos de controvérsias, provas, contraprovas, testemunhos, investigações. Nada adiantou. Olhada com desconfiança pelas altas esferas, madame perdeu o cargo. A partir daí, foi levando a vida fora da esfera política, em postos menos prestigiosos. Mas suas «pedaladas» não saíram da mira das autoridades. Afinal, era muito dinheiro. Dinheiro do contribuinte, diga-se.

Finalmente, neste maio 2016, a Justiça acaba de aceitar formalmente as acusações de trambique nas contas. O futuro de madame está agora nas mãos do equivalente francês de nosso monsieur Moro. Lá como cá, a justiça pode tardar mas acaba alcançando o malfeitor.

Interligne 18h(*) Xerpa (aportuguesamento do inglês sherpa)
Os que se aventuram a escalar montanhas no Himalaia se fazem acompanhar por guias locais da etnia xerpa. Por extensão, o termo passou a designar todo guia tibetano de montanha. Anos atrás, por analogia, a revista The Economist foi a primeira a dar o nome de xerpa àquele que substitui o titular em reuniões preparatórias do G7 (que já foi G8 mas, com a exclusão da Rússia, voltou à configuração originária). Madame Lauvergeon não é especialista de escalada. Seu apelido vem do fato de ter sido chegada ao presidente da França.

Interligne 28aAdvertência
Qualquer semelhança com algum caso ocorrido no Brasil deve ser considerada involuntária e fortuita. O mesmo vale para o título deste artigo ‒ A ruivinha deles.

A intenção do autor jamais foi trazer ao distinto leitor a desagradável lembrança da compra, pela Petrobrás, da usina de Pasadena, a “ruivinha”. Faz alusão apenas à cor do cabelo de madame Lauvergeon. Que, aliás, lhe vai muito bem.

Cadeira cativa

José Horta Manzano

Artigo publicado pelo Correio Braziliense em 3 out° 2015

Onu 3Ano sim outro também, o ritual se repete: terminadas as férias de verão do Hemisfério Norte, abre-se mais um ano de trabalho na ONU. E lá vai nosso presidente, a quem cabe discursar em primeiro lugar. Segue-se uma cachoeira de alocuções em línguas sortidas. O espetáculo se desenrola sobre fundo de granito verde-imperial muito chique – pedra que, aliás, é bem capaz de ter sido extraída de nosso solo.

Este ano, à guisa de aperitivo à liturgia, fomos mimoseados com um conciliábulo apelidado G4, que reuniu quatro mandatários. Observe-se, en passant, que o costume atual de atribuir número a reunião de medalhões (G4, G7, G20) é sintomático. Realça o fato de os objetivos dos participantes não serem necessariamente concordantes. Foi-se o tempo em que alianças tinham propósito bem estruturado e compartilhado, donde a atribuição de nome próprio como Entente Cordiale ou Pacto de Varsóvia. A acertos efêmeros, números bastam.

Brasil, Alemanha, Índia e Japão irmanaram-se, por um instante, na reivindicação de uma reforma da ONU que lhes conceda assento permanente no Conselho de Segurança. Cada qual desses países é movido por um conjunto de interesses que lhe dizem respeito. O traço comum, sem hesitação, é a busca do prestígio perdido. Ou nunca havido.

Cúpula de candidatos a assento permanente no C.S.

Cúpula de candidatos a assento permanente no C.S.

Alemanha e Japão, gigantes industriais e econômicos, procuram recuperar a aura que a derrota na última guerra lhes tolheu. A Índia, país populoso, em franca ascensão e – ponto não desprezível – dotado de armamento nuclear, também aspira a sentar-se à mesa dos grandes. Quanto ao Brasil, a justificativa é menos nítida. No frigir dos ovos, o olhar que o mundo lança sobre nosso país não é muito diferente do de setenta anos atrás, quando a Organização das Nações Unidas foi fundada. Senão, vejamos.

Já naquela época, o Brasil era visto como país de futuro promissor, mas de modesta importância militar, industrial, econômica e diplomática. Se as últimas décadas renderam progresso a nosso país, não há que perder de vista que as demais nações, longe de terem parado no tempo, também se desenvolveram e avançaram. Ao fim e ao cabo, o posicionamento relativo do Brasil no conjunto dos Estados não está lá tão distante do que era em 1945.

ONU - Conselho de Segurança

ONU – Conselho de Segurança

Ilude-se, portanto, quem faz abstração das mudanças alheias e só leva em consideração as transformações pelas quais passamos nós outros. A população de alguns países cresceu mais que a nossa. Alguns deles se aplicaram e conseguiram industrializar-se mais rapidamente que nós. Um ou outro optou por dotar-se da arma nuclear. Diligências diplomáticas constantes fizeram que certos países, por se terem mostrado mais atuantes, nos superem hoje em relevância.

Cadeira permanente no Conselho de Segurança é assunto pra lá de delicado. Titular nenhum abre mão da que lhe cabe. Qualquer país que pretenda entrar para o clube pode até ser bem-visto por uns, mas desagradará a outros. Basta que uma das cinco potências com direito a veto bote empecilho, e pronto: o candidato não passa da soleira. Reforma do sistema? Nem pensar, que não serve ao interesse dos atuais membros permanentes. Por que a fariam?

Campo de refugiados sírios, Zaatari, Jordânia

Campo de refugiados sírios, Zaatari, Jordânia

Com tantos problemas por resolver, mais graves e mais urgentes, o Brasil deveria economizar energia e evitar arriscar-se num pleito cujas chances de dar certo são próximas de zero. No dia em que uma reforma for anunciada – o que está longe de acontecer – aí, sim, terá chegado o momento de reivindicar vaga. Por enquanto, é perda de tempo. Essa atitude de pedinte é humilhante e constrangedora.

Asilo 4Nossa industrialização vem encolhendo há vários anos, o que não nos torna mais poderosos no conjunto das nações. Nossa participação proporcional nas trocas comerciais globais não progride há décadas. Seria útil começar por assumir postura diplomática séria e coerente. Milhões de sírios deslocados pela guerra civil estão imersos na precariedade. O Brasil mostraria grandeza se, por exemplo, fizesse o necessário para acolher uma parcela desses infelizes. Que, pelo menos, nos apliquemos a promover uma diplomacia digna de nação adulta e consciente.

Que não nos contentemos em ser um Brasil grande, mas que nos esforcemos para nos tornar um grande Brasil. Não custa caro e está ao alcance de nossas possibilidades. A persistir em deixar como está pra ver como fica, continuaremos pagando, à prestação, nosso bilhete de volta ao Terceiro Mundo. E olhe que faltam poucas folhas para chegar ao fim do carnê.