Campeonato de baixaria

José Horta Manzano

12 agosto 2019
Antes das eleições presidenciais pra valer, o sistema eleitoral argentino prevê a realização de prévias. Com 48% dos votos, Señor Fernández (esquerda) botou pra correr Señor Macri (direita), que só obteve 32%.

Bolsonaro, que já era presidente, se encontrava no Rio Grande do Sul. Soltou uma fala raivosa em que mandava os gaúchos se prepararem para um afluxo de refugiados vindos da Argentina, caso a “esquerdalha” ganhasse a Presidência naquele país. Em referência aos refugiados venezuelanos, acrescentou que o Rio Grande ia se transformar “num novo estado de Roraima”.

13 agosto 2019
No dia seguinte, Señor Fernández, ainda candidato, declarou que, com o Brasil, teria uma relação esplêndida, e que Bolsonaro não passava de “uma conjuntura” na vida do país. Classificou o capitão como “racista, misógino e violento”.

21 agosto 2019
Bolsonaro resolveu dar mais uma martelada no prego. Tuitou: “Com o possível retorno da turma do Foro de São Paulo na Argentina, agora o povo saca, em massa, seu dinheiro dos bancos. É a Argentina, cada vez mais próxima da Venezuela”.

Nosso extravagante chanceler, aquele barbudinho bobão, seguiu o caminho do chefe e criticou, por antecipação, o futuro governo Fernández.

1° novembro 2019
Dois dias depois da vitória de Fernández, que derrotou o candidato favorito de Bolsonaro, nosso capitão deixou claro que não compareceria à tomada de posse do novo presidente do país hermano. Com sublime elegância, acrescentou que a Argentina havia “escolhido mal” e que ele não ia dar parabéns ao vencedor. Assim mesmo, num repente de condescendência, prometeu não fazer “retaliação”(?) à Argentina.

30 novembro 2020
Neste dia teve lugar a primeira Cúpula do Mercosul à qual os dois presidentes compareceram. Conciliador, Fernández pediu a Bolsonaro que deixasse de lado as rusgas entre os dois e que ajudasse a dar um impulso ao mercado comum. Não consta que o capitão tenha dito sim ou não.

10 junho 2021
Em discurso pronunciado diante de Señor Sánchez (primeiro-ministro espanhol em visita a Buenos Aires), Fernández ousou a seguinte frase: Los mexicanos salieron de los indios, los brasileños salieron de la selva, pero nosotros, los argentinos, llegamos en los barcos, de Europa” (Os mexicanos vêm dos índios, os brasileiros vêm da selva, mas nós, os argentinos, chegamos nos barcos, da Europa).

Em suma, o presunçoso mandatário nos tratou de selvagens. Pegou mal pra caramba. Não consta, até agora, nenhuma reação do capitão, que viu seu povo inteiro tratado de bugre.

Resumo
Nesse campeonato de baixaria várias perguntas flutuam no ar.

Quem é…

… o mais agressivo dos dois presidentes?

… o mais insensível?

… o mais inconsequente?

… o mais presunçoso?

… o mais antidiplomático?

… o mais despreocupado com o futuro do próprio povo?

… o mais malcriado?

… o mais elefante em loja de porcelana?

… o mais desagradável?

… o mais imbecil?

… o mais perigoso?

O páreo é duro. Cartas para a redação, por favor.

Hasta la vista, baby!

José Horta Manzano

«A verdade liberta e a mentira escraviza. Hoje, a mentira é despudoradamente utilizada para um projeto materialista que visa a escravizar o Brasil e os brasileiros, a escravizar o próprio ser humano e roubá-lo de sua dignidade material e, principalmente, espiritual.»

A frase delirante consta da carta de demissão de Ernesto Araújo. A visão estrábica do chanceler o faz enxergar ‘verdade’ nas teorias delirantes que lhe invadem a mente, e ‘mentira’ na cabeça dos que não ruminam as mesmas fantasias.

De um ministro encarregado de cuidar da relação entre o Brasil e os quase 200 países do globo, podem-se admitir alguns defeitos – afinal, trata-se de um ser humano. Aceita-se que seja dispéptico, eupéptico ou céptico. Pode ainda ter dor nas costas, falta de cabelo ou unha encravada. Se tiver medo de cachorro, de tempestade e de assombração, ninguém vai nem perceber. Tagarelice, mau gosto vestimentar e fanhosez são defeitos que não desonram ninguém.

Mas tem um defeito que nunca, jamais, em tempo algum, ministro das Relações Exteriores pode se permitir: a ingenuidade. As relações internacionais do Brasil (assim como de qualquer outro país) não podem ser entregues a um homem ingênuo. Um irresponsável Bolsonaro conseguiu cometer o sacrilégio.

O discurso de Ernesto Araújo, pronunciado no dia em que tomou posse do cargo, já anunciava as tintas do que estava por vir. Os delírios do chanceler ingênuo, com anuência do capitão ignorante, foram a receita perfeita para desmerecer o país perante o mundo civilizado.

Consertar o estrago vai dar trabalho. Com todos os problemas que já tem, o Brasil bem que dispensava mais este.

Desconvite seletivo

José Horta Manzano

Fazer política externa na base do xilique é a receita certa para o fracasso. Poucos dirigentes conseguem distinguir onde termina o governo e onde começa o Estado. E vice-versa. A maioria tende a confundir e enfiar as duas concepções no mesmo saco. Erram. Governos passam, o Estado fica.

Entre as atribuições do governo, a política externa é a que se encontra mais ligada ao Estado brasileiro. Saúde, Instrução Pública, Economia e demais funções ‒ embora devam submeter-se aos interesses maiores do Estado ‒ costumam assumir os contornos do governo de turno. A escola tornou-se mais politizada no governo do Lula. A Economia se abriu durante a gestão Collor. A Saúde teve até intervenção cubana no governo da doutora.

A política exterior e as Forças Armadas devem, mais do que as outras funções do topo da República, servir a interesses de longo prazo. Não são campo em que se deva mexer a cada instante. Estratégias diplomáticas e militares são de longo alcance.

Como ensina o manual de bons procedimentos, os dirigentes de todos os países com os quais o Brasil mantém relações diplomáticas são convidados para a tomada de posse do novo presidente. Por descuido da Constituinte de 1988, o mandato começa num 1° de janeiro, data incômoda que obriga muitos chefes de Estado ou de governo a mandar representante. Que fazer?

Rolls-Royce presidencial

Doutor Ernesto Araújo avisou que estava cancelando o convite feito aos presidentes da Venezuela e de Cuba. Estavam desconvidados. A quem se surpreendeu com a descortesia, logo explicou que a intenção do novo presidente era, logo no início do governo, romper relações diplomáticas com esses países. Está justificado.

Ontem entrou mais um país para a lista dos indesejados. Foi a Nicarágua. A alegação é de que está sob a férula de regime ditatorial. Só que não foi anunciado rompimento de relações com esse país, o que nos põe diante de uma incongruência. O Brasil convida todos os países com os quais mantém relações diplomáticas. Uma vez que se anunciou que as relações serão rompidas com Cuba e com a Venezuela, o desconvite faz sentido. Dado que não há perspectiva de rompimento com a Nicarágua, fica esquisito.

O pretexto de que se trata de ditadura não tem consistência. Na prática, a maior parte dos países africanos tem regime ditatorial. Todos os países árabes também entram nessa lista. Se o critério para desconvite for a falta de democracia, restam muitos por desconvidar.

Vê-se que os interesses do Estado brasileiro passaram ao largo nessa decisão do futuro ministro Araújo. Esses desconvites seletivos não respondem a critério consistente, mas a antipatia pessoal. Juntando essa presepada ao anúncio, feito pelo futuro presidente, de mudança de endereço de nossa embaixada em Israel, temos rematado contraexemplo de diplomacia. É exatamente o contrário do que deveria ser. Começamos mal.

Pari sono

José Horta Manzano

Li o artigo que doutor Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores designado, escreveu para o jornal curitibano Gazeta do Povo. Sabe aqueles escritos que deixam uma sensação de desconforto no final? Pois esse é um deles. Uma tijolada.

O doutor atira para todos os lados. Derruba o PT. Mostra desprezo pela ONU ‒ (ele é diplomata!). Cospe em cima dos grandes jornais do mundo. E culmina com nota trágica: desdenha do povo brasileiro ao apresentar-se como uma espécie de Grande Conselheiro, detentor privilegiado da Verdade.

De fato, doutor Araújo bate na tecla surrada que põe no PT a etiqueta de partido marxista. Tenta provar que o marxismo que faleceu um século atrás continua vivo sob forma de captor do intelecto dos viventes. Teria deixado de se interessar pelos meios de produção para apoderar-se da mente dos desavisados.

A mim, não convenceu. Continuo a enxergar no PT tendências bem mais próximas do fascismo que do marxismo. Longe de se preocupar com a confiscação do capital privado, o lulopetismo busca aliar-se aos grandes capitalistas para melhor usufruir as delícias que esse compadrio oferece. A ideologia do Partido dos Trabalhadores centraliza o poder em um só homem. Na base, ficam as corporações dependentes do Estado, do qual recebem as benesses e ao qual se dobram em reverente e incondicional obediência. Essas corporações ‒ ou sindicatos, ou comunidades de base, como queiram ‒ são a ramificação do Estado tentacular e oniatuante. O objetivo é recolher a seiva secretada pela cúpula e com ela irrigar, por capilaridade, todos os segmentos da sociedade. Com isso, garante-se o domínio das massas e impõe-se o pensamento único.

Palácio do Itamaraty, Brasília

A fixação do doutor em combater o marxismo está com prazo de validade vencido. A doutrina comunista se esboroou com a queda da União Soviética. Regimes autoritários, que ele toma equivocadamente por marxistas, pertencem a uma cepa inextinguível. Desde que o homem se organizou em sociedades, já no tempo das cavernas, sempre houve quem tentasse tomar a si o poder absoluto. Ao longo da história, muitos conseguiram.

O discurso de doutor Araújo exala, isso sim, forte arrogância. Desinibidamente, o leitor é acusado de ser ignorante por não se dar conta de que o marxismo sobrevive sob disfarce. O maltratado leitor é ainda tratado de ingênuo por acreditar nos «marxistas culturais» de hoje ‒ seja lá o que queira dizer essa expressão.

Para fechar o artigo, o doutor faz inquietante alusão ao «alarmismo climático». Promete desenvolver o pensamento em outra oportunidade, mas a simples expressão escolhida já deixa entender que vem aí discurso negacionista, de quem não vê urgência em cuidar de assuntos ligados à ecologia.

Ao fim e ao cabo, o artigo de doutor Araújo prenuncia que nossa diplomacia será tocada ao ritmo de rolo compressor. Embora os objetivos sejam diferentes, o método é igual ao seguido pelos petistas. Pari sono ‒ são iguais.

Requiescat in pace

José Horta Manzano

Certos personagens não sobrevivem senão debaixo dos holofotes. É o caso de diversos figurões e homens políticos deste país. O exemplo maior é o Lula. «Falem bem, falem mal, mas falem de mim» parece ser o mote dessa gente. Caso se apagassem as luzes, desvaneceriam qual mariposas. Para não cair no ostracismo, têm necessidade permanente da ribalta, do incenso e dos aplausos. Em casos desesperados, até apupos servem para mantê-los em vida. Mais vale ser vaiado que esquecido.

Já alguns poucos atores do mundo político são personagens das sombras. Deles, embora pouco se fale e pouco se ouça, vêm diretivas que norteiam quadrantes inteiros da política nacional. Um deles fechou os olhos para sempre ontem. Foi Marco Aurélio Garcia, aquele que teve de carregar, ao longo dos dez últimos anos de vida, o incômodo apodo de «top-top», que lhe foi atribuído desde que o flagraram em gesto obsceno, na esteira de um acidente de avião que matou duzentas pessoas.

A decência recomenda não chutar cachorro morto, coisa mais feia. A honestidade, no entanto, me obriga a ressaltar que esse senhor foi ator de destaque na descida da diplomacia brasileira rumo à insignificância. Verdadeiro ministro de Relações Exteriores bis, doutor Garcia esteve entre os pouquíssimos que permaneceram no cargo do primeiro dia do governo do Lula até a derrocada da doutora Dilma. E olhe que não ocupava um desses cargos políticos que se barganham no balcão federal de negócios, como é o caso de ministros. Era dono de um posto de assessor especial ‒ que as más línguas chamam de aspone ‒, cargo de confiança que não tinha nada que ver com troca de favores.

Doutor Garcia, pouco imbuído dos sutis códigos diplomáticos, agia sem visão de mundo, movido apenas por empoeirada ideologia estacionada nos anos 60. Por razões que não cabe aqui analisar, esteve por detrás de bizarras tomadas de posição da política exterior brasileira. Ainda estão presentes na memória coletiva numerosos vexames internacionais aos quais nosso país foi submetido. Entre eles: aquele incompreensível mas explícito apoio a señor Zelaya na Nicarágua; o fiasco da pueril tentativa de intromissão brasileira no conflito entre Palestina e Israel; a benevolência para com terroristas das Farc; a aproximação tentada pelo Planalto com sanguinárias ditaduras africanas; a entrada (pela janela) da Venezuela no Mercosul.

O mundo não é bobo. Depois do momento de surpresa e simpatia que se seguiu à primeira eleição do Lula, caíram todos, pouco a pouco, na real. Deram-se conta de que, por detrás da bondosa fachada de distribuição de migalhas para combater a fome, havia o oco total. Como em cenário de cinema, as casas não tinham fundos. Atrás do frontispício, nada. Depois de repetidos desastres, o Brasil acabou descartado e regrediu décadas na visão do mundo civilizado. Em vez de destacar-se como locomotiva da América Latina, dissolveu-se no caldeirão comum e voltou a ser visto como país grande, não como grande país.

O Brasil se aferrou, durante os anos lulopetistas, a tentar dividir o planeta em blocos heteróclitos do tipo Brics. A assunção de Mr. Trump ao topo da hierarquia dos EUA mostrou que a formação de blocos político-comerciais é frágil e sujeita a chuvas e tempestades. De uma canetada, o homem retirou seu país do Tratado Transpacífico. Fez mais. Renegou o Acordo sobre o Clima assinado em Paris por quase 200 países depois de longas e ásperas negociações.

Culto, esperto, visionário ‒ e principalmente bem assessorado ‒, Monsieur Macron lançou, no começo de junho, convite a todos os cientistas americanos para que viessem trabalhar na França, onde as torneiras que Mr. Trump estava fechando seriam abertas para deixar jorrar fartos incentivos. Passou por cima de G8, G20, Otan e todas essas criações artificiais que atravancam mais do que ajudam. Em contraposição irônica ao slogan de campanha do colega americano, o presidente francês, que domina a língua inglesa, propagou «Make our planet great again» ‒ Vamos restituir a grandeza a nosso planeta.

O governo francês reservou orçamento de 60 milhões de euros à operação. E não é que está dando certo? Mês e meio depois do convite, centenas de cientistas de alto coturno já se candidataram. Vêm do mundo inteiro. Entre eles, 150 estão interessados em estabelecer-se na França por longo período. Metade desses 150 são americanos. Com uma pontinha de inveja, Frau Merkel se prepara para repetir, na Alemanha, a iniciativa de Monsieur Macron.

Está aí um pequeno exemplo de política exterior visionária, de longo prazo e voltada para o bem do povo em contraposição a política ideológica e capenga, meramente voltada para mesquinhos interesses presentes. Ao atrair cientistas, a França dá lastro ao futuro do próprio país, enquanto o nosso arrogante Planalto gastou bilhões surrupiados do sofrido povo para construir o porto de Mariel, em Cuba. Tristes trópicos.

Nota
Requiescat in pace, frequentemente abreviado em R.I.P., é fórmula latina usada em referência a pessoa falecida. Significa que repouse em paz.

País judiciarizado

José Horta Manzano

«Era abril de 1996 em Assunção. Um golpe estava em andamento contra Juan Carlos Wasmosy, presidente constitucional. Adiantando-se aos fatos, ele mandou para a reforma o general Lino Oviedo, chefe da insurreição ‒ que respondeu com a ameaça de bombardear a residência presidencial.

Ao cabo de três dias dignos de filme de suspense, Wasmosy recebeu telefonema de Fernando Henrique Cardoso, presidente do Brasil. Era para expressar seu apoio. Mas não foi mero bate-papo telefônico. A chancelaria brasileira tratou de despachar um avião para recolher os demais ministros de Relações Exteriores dos países do Mercosul para levá-los a Assunção.

O motim foi neutralizado. Alguns terão certamente etiquetado os fatos como ingerência em assuntos internos do Paraguai. Esse golpe foi exatamente o motivo pelo qual o Mercosul conta hoje com a cláusula democrática, consagrada pelo Protocolo de Ushuaia, assinado em 1998. Diante das crises, mais instituições.»

A citação acima é parte do excelente artigo ‘Indispensable Brasil’, escrito estes dias pelo cientista político argentino Héctor E. Schamis e publicado no jornal espanhol El País. Vale a leitura. Quem estiver interessado clique aqui.

«Diante das crises, mais instituições [são criadas]», a última frase da citação, merece reflexão. É fato. Quando situações de alto poder explosivo se esgotam, o risco é grande de serem substituídas por ordenamento ostensivamente oposto.

Nem precisa ir muito longe pra encontrar exemplo. Em nosso país, em meados dos anos 80, após a falência de um regime duro e repressivo que tinha durado duas décadas, a tendência era reorganizar a sociedade para mantê-la o mais longe possível de derivas autoritárias. Nova Constituição foi negociada. O temor de que o regime descambasse de novo não foi bom conselheiro. A Carta saiu exageradamente liberal, com muitos ‘podes’ e pouquíssimos ‘não-podes’, recheada de ‘direitos’ e parca de ‘deveres’.

Muitas das distorções que nos atormentam hoje vêm justamente das boas intenções dos constituintes de 1988. A liberalização exagerada acabou gerando descontrole. Mensalões e petrolões são filhotes tardios daquele estado de espírito. E olhe que tivemos sorte de não terminar como a Venezuela, sufocada por um autoritarismo desesperado. Estávamos caminhando para a mesma situação. Era um paradoxo. Estávamos resvalando pela ladeira da qual os constituintes tudo fizeram para nos resguardar.

A crise está de novo aí. Desta vez, é política, insitucional, econômica e moral. Um pacote de mazelas pra ninguém botar defeito. Como vai se resolver, ninguém sabe. É possível que, aos trancos e barrancos, cheguemos às eleições previstas para 2018. Não é impossível que uma PEC qualquer nos leve pelo caminho de eleições antecipadas. Pode ainda ser que uma emenda nos traga regime parlamentarista. Nem a restauração da monarquia está excluída da lista de possibilidades ‒ aliás, no meu entender, está entre as boas opções.

O importante é evitar todo exagero. Nossa república já se tornou por demais judiciarizada. Por um sim, por um não, contrata-se advogado, pede-se habeas corpus, apela-se para cortes superiores, chega-se até STF. Há que ter cuidado para não nos tornarmos um país onde tudo e qualquer coisa se decide dentro de um tribunal diante de um juiz. A justiça deve estar ao alcance de todo cidadão, mas abusar dela pode ser nocivo ao país. É questão de bom senso.

Engolindo sapo

José Horta Manzano

Tem horas em que a gente tem de engolir cobras, lagartos, lagartixas, sapos e o que mais houver no prato. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Tem outras horas em que dá pra escapar do vexame. Quando é assim, só engole sapo quem for bobo.

Quando a doutora foi destituída do trono presidencial e despachada de volta pra casa, houve gente ‒ pouca gente ‒ que tentou classificar o impeachment na categoria de golpe. A cômoda categorização servia de desculpa a maus perdedores. Mas deu no que deu, não veio a reviravolta, a destituição foi-se tornando definitiva, e os descontentes tiveram de engolir os sapos. Não só os sapos, como o brejo inteiro.

Sapo 2Acontece que algumas das republiquetas vizinhas, as mais pobres por sinal, compraram a tese do «golpe» e embarcaram nessa canoa furada. Quem sabe imaginavam que o «exército do Stedile» ou outra milícia qualquer fosse soltar brucutus nas estradas e conseguir reverter a decisão do Congresso.

Um dos inconformados foi señor Evo Morales, medalhão-mor do paupérrimo Estado Plurinacional de Bolivia, alinhado com os bolivarianos puro-sangue. Inconformado, atropelou sutis códigos diplomáticos e chamou para consultas seu embaixador em Brasilia. Señor Morales não há de se ter dado conta de que, no aveludado terreno das relações exteriores, a medida é pra lá de grave. Precede e anuncia iminente ruptura de relações diplomáticas. Por reciprocidade, o governo brasileiro teve de chamar de volta nosso embaixador em La Paz.

Passou-se mais de um mês e a situação política brasileira não se alterou. Nenhum exército paralelo soltou os cachorros. A doutora não voltou. O mandachuva boliviano começou a sentir que tinha entrado num poncho justo. Conferiu as estatísticas de comércio e deu-se conta de que o Brasil é, com folga, o maior cliente de seu país. Nada menos de 35% das vendas externas bolivianas são absorvidas por nós.

temer-5O figurão pode ser exótico, folclórico, autoritário, mas… louco não é. Ninguém, em consciência normal, se indispõe com seu melhor cliente ao bater pé firme num tema que, francamente, é página virada. Evo Morales fez, esta semana, um pronunciamento. Disse que estava devolvendo seu embaixador a Brasília apesar (sic) da situação política em nosso país. E não parou por aí.

Sublinhou que o Congresso brasileiro havia, sim, dado um golpe. Acrescentou que, embora legal, o golpe não tem legitimidade. Em suma: tinha dito besteira, tentou consertar, não conseguiu, piorou a situação e ainda se recusou a engolir lagartos.

E como reagiu nosso glorioso Itamaraty? Ostentou sua melhor cara de paisagem, engoliu o sapo inteirinho e fez de conta que nada tinha acontecido. Passando por cima da afronta, vai devolver o embaixador brasileiro a La Paz nesta segunda-feira. Ficou tudo por isso mesmo. O Barão do Rio Branco, onde quer que esteja, há de ter sentido engulho.

Passo maior que a perna

José Horta Manzano

De criança, a gente costumava cantar:

Passa, passa três “vez”
O último que ficar
Tem mulher e filhos
Que não pode sustentar

Ah, essa sabedoria popular é… sabida! Os antigos já entendiam que só deve formar família quem tiver condições de a sustentar. Quem não tem competência não se estabelece, como diz o outro.

A ignorância e a ingenuidade de nosso guia causaram estragos profundos. Sua megalomania, à qual vassalos submissos diziam amém, atingiu em cheio a imagem do Brasil no exterior. A olhos estrangeiros, nosso país se apequenou.

O Lula e a sucessora mandaram criar 17 (dezessete!) embaixadas. Estão todas situadas em países pequenos, com os quais temos discretas relações políticas e comerciais. Só nas Antilhas e no Caribe ‒ sem contar estados maiores, como Cuba, República Dominicana e Haiti ‒ temos dez embaixadas. Estão em países que a gente não conhece nem de nome: Nassau, Antigua & Barbuda, St-Kitts e Nevis, Santa Lucia, Barbados, Granada, Dominica e por aí vai.

Ciranda 1Até na Coreia do Norte, o Lula abriu embaixada. Na época, havia 6 brasileiros no país, 3 dos quais formavam a família do embaixador. Os outros três eram funcionários da representação. Não se tem notícia de que a “colônia” tenha aumentado.

Meus distintos leitores hão de ter ficado sabendo, estes últimos meses, de vexames dados por numerosas representações brasileiras no exterior. Algumas não tinham recursos nem para aluguel, conta de telefone, salário de funcionário, despesas do dia a dia. Uma humilhação.

A decisão de instalar uma fileira de representações prendia-se à falsa premissa de que a quantidade de bandeiras nacionais içadas no exterior dava prova cabal de que o Brasil se havia tornado país importante. Uma pirotecnia. Um rojão que deu chabu.

Embaixada do Brasil em Bridgetown, Barbados

Embaixada do Brasil em Bridgetown, Barbados

Sob nova direção, o Ministério das Relações Exteriores acaba de encomendar estudo da relação entre os custos e os benefícios dessa megalomania. É provável que embaixadas ociosas sejam extintas.

Os caminhos para demonstrar a força de um país são outros, mais árduos. Experiências calcadas no amadorismo acabam custando caro aos cofres públicos ‒ que, ao fim e ao cabo, são alimentados pelos impostos de todos nós.

Mercado persa

José Horta Manzano

Futebol 1Nos últimos anos, as relações exteriores estão longe de ser o foco das atenções do Planalto. Na era do Lula, ações desengonçadas foram tentadas. Jogo de futebol para apaziguar a guerra entre palestinos e israelenses foi o truque imaginado por nosso iluminado guia, vejam só! Depois dessa, levaram um chega pra lá e recolheram-se a seu canto.

Por natureza, diplomacia é discreta. Dispensa ações espetaculosas. Grandes acertos entre nações não se fazem diante das câmeras nem na presença de jornalistas. Quando vem o comunicado oficial, já está tudo combinado.

O Lula, crente que possuía um «toque de Midas» capaz de moldar a realidade à sua conveniência, levou oito anos tentando deixar sua marca na história da humanidade. Não é impossível que tenha, algum tempo, acalentado a ideia de receber um prêmio Nobel. Em qualquer categoria servia, nem que fosse honoris causa. Evidentemente, não recebeu nada, que nem todo o mundo é trouxa.

Recolhido nosso guia à condição de cidadão comum, sua sucessora mostrou total inapetência – pra não dizer desdém – pela política internacional. A seu favor, diga-se que a moça tem tido muito com que se preocupar dentro das fronteiras.

Itamaraty

Esse desprezo do Planalto por assuntos externos, longe de ser negativo, começa a dar frutos. Afinal, convenhamos: dona Dilma, seus áulicos e seu partido lidam com relações exteriores, aos trancos e barrancos, há apenas doze anos. Enquanto isso, o Itamaraty carrega dois séculos de experiência no ramo. O traquejo de um e do outro não é comparável.

Quase na surdina, como se deve, o ministro das Relações Exteriores do Brasil está, este fim de semana, em Teerã. Não foi propor partida de futebol nem associação ao Mercosul. A visita é mais séria. No rastro do aquecimento das relações entre os EUA e o Irã, a perspectiva alvissareira é o fim do embargo que estrangula a economia da potência médio-oriental há 35 anos.

Poucos se dão conta de que o Irã – que também pode, sem ofensa, ser chamado pelo tradicional e poético nome de Pérsia – é um grande país. Tirando fora o regime autoritário, que ressuscitou costumes que a gente imaginava banidos para sempre, é uma nação de peso. Regimes passam, nações ficam.

Iran 1São 80 milhões de habitantes (tanto quanto a Alemanha). O PIB anual, estimado em 12 mil dólares per capita, está longe de ser irrisório. Para efeito de comparação, o Brasil chega a 16 mil dólares por cabeça, pouca coisa a mais. Uma curiosidade: o nome da moeda persa é rial, palavra que tem a mesma origem que nosso real – a moeda do rei.

Na mídia brasileira, a visita do chanceler Mauro Vieira não mereceu mais que nota de pé de página. A notícia, contudo, não escapou a países que estão de olho no imenso potencial do mercado iraniano pós-embargo. Entre eles, naturalmente, a China.

Teerã

Teerã

O fato de a agência oficial chinesa ter publicado artigo sobre o assunto mostra que o governo de Pequim está atento a todos os que tiverem intenção de levar uma lasquinha do novo mercado.

Quanto à agência oficial iraniana, já pôs no youtube a coletiva de imprensa dada hoje pelo ministro brasileiro e pelo homólongo persa. Está aqui.

Diplomacia espezinhada

José Horta Manzano

Ignorantes e deslumbrados, os incapazes que assumiram o comando da nação há 12 anos precipitaram-se ao pote de mel, que era o que realmente lhes interessava. Ávidos mas ingênuos, não se deram conta de que o Brasil não é um planeta isolado. Sua visão estreita não lhes permitiu enxergar a importância da inserção de nosso País em circuitos adequados e proveitosos.

A prova desse desprezo pela diplomacia e pelas relações internacionais foi dada com a nomeação, para cargos de responsabilidade crucial, de gente que não é do ramo. No Ministério das Relações Exteriores, titulares entram e saem. Tão pouca importância é atribuída ao cargo, que pouca gente saberia dizer quem é o atual titular. Por detrás da figura do ministro oficial, porém, paira uma sombra sinistra.

Dilma e GarciaRefiro-me a um certo senhor Garcia, cujo nome ficará para sempre associado ao epíteto “top-top”, de triste memória. Sem formação diplomática, o homem é uma espécie de elétron livre no organograma do governo. Na teoria, não passa de assessor sem função definida – um «aspone», como qualificam línguas vulgares. Na prática, sua influência nefasta está entre as principais responsáveis pelo amadorismo e pela tacanhice de nossa política externa. O personagem está entre os fundadores do Foro de São Paulo – isto talvez explique aquilo.

Não bastassem os 12 anos de constrangimento que esse senhor já contribuiu para nos impingir, o vexame continua. Em entrevista concedida ao Estadão e publicada ontem, senhor Garcia se pronuncia como se ministro de Relações Exteriores fosse.

Foro Sao Paulo 1À pergunta sobre se nosso governo vai chamar o embaixador na Venezuela para consultas – código diplomático para exprimir forte desagrado –, o «assessor» é taxativo: «Isso não está em cogitação. O governo brasileiro já se manifestou contra atos extremados e não é o caso de dar mais extensão a esse episódio.»

Levando em conta que dona Dilma & companhia andam, neste momento, atazanados por problemas mais prementes, é de duvidar que se preocupem com assuntos menores, como política externa. Senhor Garcia periga continuar poluindo nossa imagem e emperrando nossas relações com o mundo civilizado.

Diplomacia do coice

José Horta Manzano

Dilma 1Como eu, meus distintos leitores certamente ficaram sabendo do coice que nossa egrégia presidente assestou gratuitamente no embaixador da Indonésia – e, por procuração, nos 250 milhões de habitantes daquele país.

Como eu, meus distintos leitores se consternaram com a baixeza com que foi tratado o embaixador que, tendo vindo a palácio a convite, viu-se humilhado e feito de bobo na frente de diplomatas e autoridades. Imagine a situação: convidado formalmente a uma festa, você vai. Na porta, sua entrada é proibida e você é chamado de penetra. Foi o que aconteceu.

Palácio do Itamaraty e seu espelho d'água

Palácio do Itamaraty e seu espelho d’água

Como eu, meus distintos leitores ficaram apreensivos com a repercussão que essa grosseria está tendo nos itamaratis do mundo. A estas alturas, todos os governos do planeta já estão a par da estupidez de tratamento à qual diplomatas forasteiros estão expostos no Brasil.

Como eu, meus distintos leitores entenderam que, se alguma chance ainda subsistia de salvar o traficante brasileiro prisioneiro na Indonésia, ela escoou pelo ralo. Aquele país não pode agora graciar o condenado nem atenuar sua pena. Se o fizer, mostrará que se dobrou à chantagem de Brasília, atitude inconcebível. O comportamento de nossa preclara presidente foi o passo definitivo para a execução do apenado.

Como eu, meus distintos leitores atribuíram o gesto arrogante à conjugação de dois fatores venenosos: o mau humor crônico da mandatária e o aconselhamento gangrenado que tem recebido de seus ‘assessores’, notadamente um certo senhor Garcia – aquele do ‘top-top’.

Dilma e Garcia 3Pois fiquem meus distintos leitores sabendo que… por baixo do angu tem carne. A informação vem do Diário do Poder, do superantenado jornalista Cláudio Humberto. A carne por debaixo do angu é mais podre do que se pode imaginar. Sabe aquele tipo de gente capaz de pisar o pescoço da mãe para alcançar seu objetivo? Pois é, nossa altas autoridades são membros desse clube.

Dilma 3

Pelo relato do jornalista, o coice aplicado no diplomata indonésio nada mais seria que uma ideia de marqueteiro destinada a levantar ‘cortina de fumaça’. A intenção era fornecer matéria para reportagens revoltadas e editoriais indignados que assim, distraídos, desviariam por um momento a atenção da incômoda operação Lava a Jato. Funcionou perfeitamente.

Não estou aqui pra substituir-me ao tribunal indonésio. Se o conterrâneo condenado na Indonésia é culpado ou não, se foi julgado com isenção ou não, se a pena de morte é adequada ou não – meu intuito não é discutir isso. O que nos fica é a certeza de que, nesse episódio, o traficante condenado fez papel de inocente útil, de boi de piranha. Foi sacrificado para aliviar a barra do Planalto.

Descansai tranquilos, brasileiros! Vosso País está em boas mãos!

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Quem perdeu algum capítulo da história e gostaria de pôr-se a par do assunto pode clicar aqui.

Frase do dia — 216

«Céus, o Amorim!»

Exclamação entreouvida num elevador. Foi emitida por alguém que tinha acabado de ler a notícia de que o senhor Amorim está em vésperas de ser nomeado ministro de Relações Exteriores pela terceira vez.

O sequestro

José Horta Manzano

Raptar uma pessoa e mantê-la em cativeiro a fim de chantagear terceiros é um dos crimes mais abjectos, mais nojentos. Se a extorsão por meio de chantagem já é ignóbil, o uso de um inocente como mercadoria de escambo é repulsivo e insuportável.

O rapaz raptado

O rapaz raptado

No começo de abril, bandoleiros paraguaios sequestraram um adolescente brasileiro e mandaram avisar os parentes que só o libertariam contra pagamento de resgate de meio milhão de dólares em dinheiro mais cinquenta mil dólares em víveres. A família, que tem posses, não discutiu e pagou rapidinho. Acontece que, além de criminosos, os cangaceiros eram desleais: embolsaram a fortuna, mas não soltaram o menino.

Agora, mais de seis meses depois do sequestro, o quotidiano paraguaio ABC Color informa que os delinquentes acabam de divulgar um vídeo inspirado nas asquerosas encenações de Al Qaeda e do grupúsculo Daech. No filminho, o sequestrado lê um texto escrito por outrem.

A quadrilha, que se autodenomina EPP «Ejército» del Pueblo Paraguayo, traindo a promessa feita em abril, exige a libertação de seis de seus membros, atualmente encarcerados. Sem isso, não soltará o jovem brasileiro nem um outro refém, um policial paraguaio.

Em outros tempos, esse drama, que se desenrola a poucos quilômetros da fronteira brasileira, já teria contado com reação eficaz do Planalto, do Itamaraty e até – por que não? – do exército brasileiro. Afinal, uma corriola de malfeitores está zombando de nós todos.

Em outros países mais zelosos de seus cidadãos, a opinião pública não permitiria que o caso se eternizasse, encalacrado. Afinal, o Paraguai, nosso vizinho, tem governo constituído, democrático, minimamente organizado, sobre o qual se pode fazer pressão. O brasileirinho não foi levado para as montanhas da Península Arábica nem para o dédalo de ruelas do centro antigo de Bagdá. Cáspite! Está a um tiro de estilingue da fronteira do Brasil.

Para infelicidade de todos nós, a alta cúpula que deveria estender sua mão protetora a todos os brasileiros está mais preocupada em garantir sua própria permanência no poder. Não sobra tempo nem disposição para outro assunto. Os brasileiros em apuros que se lixem. De todo modo, sequestrado não vota, não é mesmo?

Dilma e Garcia 2

Dona Dilma e o senhor Garcia

E pensar que temos, no primeiro círculo que rodeia a atual presidente, um assessor para assuntos internacionais. Seu nome é Marco Aurélio Garcia. Esse senhor, que está entre os mais influentes ideólogos do governo, tem tido, tradicionalmente, contacto com as autodenominadas Farc – Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia, narcoguerrilha que, há mais de 40 anos, atormenta a existência de nossos vizinhos do norte. O senhor Garcia tem passe livre no seio daquele, digamos assim, movimento.

Não se sabe exatamente quem escreveu o discurso pronunciado por dona Dilma na ONU, aquele em que ela preconiza o diálogo com os decapitadores do deserto sírio. Ainda que o texto tenha sido redigido por um assessor, é improvável que tenha sido liberado sem o beneplácito do senhor Garcia, nosso virtual ministro de Relações Exteriores.

Já que não fica bem despachar um comando especial para resgatar o jovem refém, que se despache o assessor especial. Tanto pode ele ir pessoalmente à selva paraguaia, como pode também convidar o chefe do bando para uma conversa particular no Planalto. Pode até receber o conviva com honras de chefe de Estado, com passagem e hospedagem pagas pelo contribuinte brasileiro. Um malfeito a menos, um malfeito a mais, ninguém vai se escandalizar.

Afinal, quem tem Garcia dispensa acrobacia.

Estreito, atrasado, trapalhão

O governo «plantou» nos jornais de ontem correção importante no seu discurso sobre o Oriente Médio: destacou que a presidenta Dilma qualifica de «massacre» e não «genocídio» o que ocorre em Gaza, em razão da ofensiva israelense.

Dilma isola e se descola do aspone lulista Marco Aurélio «Top-Top» Garcia – que usou a expressão «genocídio», provocando reação de Israel e fazendo do Brasil motivo de chacota.

O governo de Israel chutou o pau da barraca e chamou de «anã» a diplomacia brasileira por saber que «Top-Top» Garcia a lidera de fato.

Dilma e GarciaEstreito, atrasado, trapalhão, Marco Aurélio Garcia jamais foi diplomata, mas define a política externa desde o governo do Lula.

Subservientes, os diplomatas assistem Marco Aurélio Garcia esfacelar o prestígio construído pelo Itamaraty ao longo de mais de cem anos.

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Reprodução de artigo publicado pelo jornalista Cláudio Humberto in Diário do Poder, 30 jul° 2014.

Cotas raciais no comércio exterior

Percival Puggina (*)

Se existe uma parte do planeta onde bate com mais vigor o generoso coração de Lula e Dilma, esse lugar é a África Negra. Imagino ser por isso que existam cotas raciais para o comércio exterior brasileiro. Volta e meia – às vezes nem meia volta se completa – e lá estão nossos presidentes petistas na África Subsaariana, cada um a seu turno, perdoando dívidas milionárias que aqueles países têm para com o Brasil. A conta já passa de US$ 2 bilhões. Não por acaso são, em parte, débitos de governos ditatoriais, sanguinários, genocidas, que lidam com as finanças locais em regime de partilha. Vai um pouco para o interesse público e o restante para contas familiares em bancos estrangeiros.

Um deles, o senhor Omar al-Bashir, já leva 24 anos no cargo de presidente do Sudão. Tem dois mandados internacionais de prisão e, segundo um promotor do Tribunal Penal Internacional, acumula US$ 9 bilhões de recursos próprios em paraísos fiscais. Outro, o senhor Teodoro Obiang, que comanda a Guiné-Equatorial, adquiriu em 2010 um apartamento na Av. Vieira Souto, no Rio de Janeiro, naquela que foi até então a maior transação da história da cidade envolvendo um imóvel residencial. O pequeno refúgio carioca do ditador é um tríplex com 2 mil metros quadrados. O patrimônio pessoal do bilionário ditador do Congo-Brazaville, Denis Sassou Nguesco, proprietário de algumas dezenas de imóveis na França é superior à dívida do país perdoada pelo Brasil (US$ 352 milhões). E por aí vai. Em maio deste ano, numa única tacada, a presidente Dilma anunciou perdões, abatimentos e novos parcelamentos para dívidas de uma dúzia redonda de nações africanas.

Brasil e África Crédito: Cebráfrica, UFRGS

Brasil e África
Crédito: Cebráfrica, UFRGS

Alega o governo que esse procedimento está alinhado com as orientações do Clube de Paris, que o recomendam como forma de estimular a contratação de novos financiamentos e promover o desenvolvimento daqueles povos. Faria sentido se não estivéssemos tratando, em alguns casos, de povos cuja miséria aumenta na proporção direta em que a elite governante amplia sua riqueza pessoal. Faria sentido se não houvesse, na lista de beneficiados, governos ditatoriais que só perdem em longevidade e truculência para a dinastia cubana dos Castro Ruz.

É uma pena que a benevolência dos governos petistas em relação aos seus cotistas raciais no comércio exterior não encontre simetria de tratamento com as dívidas dos produtores rurais brasileiros quando suas lavouras são assoladas por estiagens e secas.

É uma pena que essa mesma prontidão não apareça na hora de atender os brasileiros vítimas de cheias, cujos bens são arrastados pelas águas.

É uma pena, também, que não se respeite o preceito bíblico de que a mão esquerda não saiba o que a esquerda faz em favor do próximo. De fato, enquanto a generosidade nacional é proporcionada pela dadivosa mão direita, a esquerda encaminha novos recursos para obras de empreiteiras brasileiras nesses países. Quem garante que a virtude da probidade e a adimplência tenham desabrochado em meio aos maus pagadores e prevaricadores de ontem? Continuaremos financiando empreiteiras e cancelando os débitos?

E é uma pena, por fim, que, junto com a bonomia das cotas raciais de nosso comércio exterior, não venha junto uma transparência maior sobre as comissões pagas pelos novos negócios que estão sendo contratados lá com as empreiteiras daqui. Tenho um palpite, mero palpite, de que iríamos encontrar, beneficiado por tais valores, um conhecido lobista que mantém relação de intimidade paternal com as decisões de governo.

(*) Arquiteto, empresário e escritor. Edita o site puggina.org

Se segura, Rogério!

José Horta Manzano

Das duas uma: ou nossa presidente é uma excelente atriz ou de fato está furibunda. Ela terá suas qualidades ― todos temos alguma ―, mas a sutileza não faz parte de seu arsenal. Portanto, o ritmo frenético com que anda disparando sua metralhadora giratória no caso do senador boliviano tende a indicar que dona Dilma esteja realmente encolerizada.

Tivesse agido com tanta firmeza desde o começo, todos esses aborrecimentos teriam sido evitados. Ela tinha a faca e o queijo na mão. Um bom acordo de bastidores é sempre preferível a essa exibição de trapos coloridos. Roupa suja, já diziam os antigos, convém lavar em casa. E de portas e janelas fechadas, de preferência.

Tentação Crédito: Carol Parrish

Tentação
Crédito: Carol Parrish

Vamos supor que a fúria de nossa mandachuva seja verdadeira, que não se trate de encenação para a galeria. Se assim for, o que salta à vista é a incompetência da própria presidente. Em vez de atacar o problema de frente, deixou que o galo fosse cozinhado em água fria durante mais de um ano. Ela hesitou, hesitou, e não foi capaz de desatar o nó. Há de ter balançado entre o apreço pelo companheiro bolivariano Evo e uma vaga e incômoda obrigação de respeito aos princípios universais do asilo.

Terá sido necessário que terceiros tomem a decisão em seu lugar. Caiu muito, muito mal. E a emenda está saindo pior que o soneto. A presidente demitiu sumariamente o ministro das Relações Exteriores. Ressalte-se que o homem tinha sido nomeado por ela mesma. Portanto, a presidente se desautoriza a si mesma. Ou não?

A presidente barrou a remoção ― que soava mais como promoção ― do embaixador do Brasil em La Paz. O homem estava de malas prontas para Estocolmo. Ressalte-se que dona Dilma já havia aprovado a troca de cadeiras. Preferiu melar a transferência. De novo, deu provas de ser criatura hesitante ou, pior, vingativa.

Senador Roger Pinto

Senador Roger Pinto

Em resumo, se entendi bem, todos os auxiliares diretos da presidente, justamente aqueles que tinham sido escolhidos pessoalmente por ela, estão errados nesta história. Quando todos a seu redor estiverem errados e só você estiver certo, é bem mais provável que errado esteja você.

Não se nomeia um ministro nem se designa um embaixador sem o beneplácito do presidente da República. Se esses funcionários executarem mal seu trabalho, não é possível escapar de uma conclusão lógica: a responsabilidade recai sobre quem os nomeou, ou seja, o próprio presidente. Nossa Constituição (ainda) não contempla a figura do autoimpeachment. Que não seja por isso. A renúncia ao mandato é direito inalienável de todo presidente ― aliás, há um precedente. No presente caso, renunciar teria sido mais digno que cortar cabeças alheias.

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Mas a novela não acabou, ainda faltam alguns capítulos. O chefe da Advocacia-geral da União (AGU) informou que o senador boliviano Roger Pinto ainda não passou pelo exame de admissão do asilado modelo. Diferentemente dos médicos cubanos, que furaram a fila e já desceram do avião vestindo jaleco, o senador ainda tem atribulações pela frente. Quem mandou fazer oposição ao companheiro bolivariano?

O chefe da AGU declarou que a decisão final sobre a concessão de asilo político depende do… Ministério da Justiça. Ai, ai, ai. Ainda está fresca, na memória coletiva dos brasileiros, o desastrado vaivém que envolveu o caso Battisti.

O senador boliviano não tem sangue nas mãos nem foi condenado pela Justiça de seu país. A priori, portanto, não preenche as condições básicas para obtenção do estatuto de asilado, segundo a lógica vigente atualmente no Planalto. Suas chances são, portanto, estreitas.

Esta novela ainda vai dar pano pra mangas. Se segura, Rogério!

Passa passa três vezes

José Horta Manzano

Na quinta-feira 25 de março de 1999, Jiang Zemin, presidente da China, estava na Suíça em visita oficial. A recepção havia sido preparada em detalhe e tudo corria bem. Cordões de isolamento, crianças agitando bandeirinhas, percurso em limusine dessas que começam aqui e terminam na esquina, autoridades sorridentes, flores por toda parte.

Assim que a comitiva parou na praça do Palácio Federal, em Berna, bem em frente ao edifício que abriga o governo e o parlamento suíço ― o equivalente da brasiliense Praça dos Três Poderes ― a coisa subitamente desandou.

Vaias, gritos, apitos se fizeram ouvir. Do alto dos prédios desenrolaram-se bandeiras do Tibete. Cartazes com os dizeres «Free Tibet» apareceram por todo lado. As autoridades suiças, que não esperavam por essa, não sabiam se riam ou choravam.

O presidente da China teve um ataque de fúria. Rispidamente, perguntou à presidente da Confederação Suíça se ela não tinha capacidade de controlar seu próprio país. E acrescentou: «Vocês acabam de perder um bom amigo».

Assim mesmo, o resto do programa foi cumprido. Mas o mandachuva chinês continuava muito chateado. Como é costume, veio a troca de presentes. O governo suíço ofereceu ao chinês uma caixinha de música de grande valor, toda esculpida e pintada à mão, uma maravilha mecânica. E o visitante, depois de examinar o presente, ousou: «Ela parece funcionar melhor que a segurança do país».

A visita continuou num clima azedo. Desde então, nunca mais nenhum dirigente máximo chinês visitou a Suíça em caráter oficial.

O estrangeiro, pouco afeito à liberdade de opinião de que gozam os cidadãos europeus, não conseguia entender que perigosos manifestantes pudessem ter sido deixados à vontade. Em seu país, esse tipo de acontecimento é inimaginável. Antes de eventos importantes, tomam-se as devidas providências para esconder a miséria e neutralizar eventuais manifestantes.

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Mata atlânticaNa terça-feira 17 de outubro de 2006, Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores do Brasil, assinou um manifesto no caderno opinião da Folha de São Paulo. O texto, tecido em tom épico e voluntarioso, rechaçava toda e qualquer intervenção estrangeira em assuntos referentes à floresta amazônica. Assegurava que o Brasil era suficientemente grandinho para cuidar sozinho de seu território. E terminava com uma afirmação pra lá de ufanista: «A Amazônia é um patrimônio do povo brasileiro, e não está à venda».

Em 1° de agosto de 2008, menos de 2 anos após o inflamado libelo de nosso inefável chanceler, foi criado, por decreto, o Fundo Amazônia. Como qualquer um pode conferir no próprio site do Fundo, ele se propõe a apoiar projetos que visem a gerir, controlar, monitorar, fiscalizar, manejar, desenvolver, zonear, ordenar, conservar, recuperar o território amazônico. Os verbos utilizados são exatamente esses.

Ao contrário do que a fala do chanceler dava a entender, o Fundo aceitou doações de governos estrangeiros. Compreende-se que, embora a Amazônia não esteja propriamente «à venda», aparecendo alguém com dinheiro na mão, dá-se sempre um jeitinho e aceita-se de bom grado. O Estadão de 6 de maio último nos dá conta do que chama “vexame amazônico”.

Ora, basta de brincadeira. Se o chanceler brasileiro, o inenarrável Amorim, declarou que o Brasil podia cuidar sozinho de seu patrimônio, é incongruente ter aceitado doações de governos estrangeiros para esse fim. Quem aceita ajuda financeira torna-se, até certo ponto, devedor. O provedor tem direito a explicações sobre o uso do dinheiro.

Mas o pior não é ter cantado de galo para, em seguida, render-se ao maná financeiro aportado por alemães e por noruegueses ― como diria Padim Ciço, todos louros de olhos azuis. O pior mesmo é que, nos últimos cinco anos, a destruição da floresta amazônica continuou impávida, a zombar dos milhões angariados pelo Fundo.Desmatamento

Está feita a prova de que, com ou sem Fundo Amazônia, com ou sem aporte de dinheiro de governos estrangeiros, o governo brasileiro continua mostrando absoluta incapacidade de controlar seu próprio território. «Tem mulher e filhos que não pode sustentar», como costumávamos cantar.

Daqui a um século, quando nada mais sobrar da antiga floresta, restarão a nossos trinetos os olhos para chorar. A arrogante frase do insigne ministro será então citada como exemplo de nacionalismo tosco, míope, vazio e daninho que terá contribuído para uma catástrofe de proporções planetárias.