Dois pra lá, dois pra cá – 2

Chamada – Folha de São Paulo

José Horta Manzano

Nem toda notícia sai nos jornais. A não ser que haja vazamento, comunicações “top secret” entre personagens dos altos círculos do poder (nacional ou internacional) passam longe das manchetes.

O caso dos falsos atestados de vacinação está aí para provar. A grande dúvida sempre foi se Bolsonaro tinha ou não tinha tomado vacina. Foi preciso a Polícia Federal quebrar certos segredos para descobrir o que ninguém jamais havia imaginado: no andar de cima, as autoridades que deviam cuidar do país estavam forjando atestados falsos de vacinação, como num filme noir francês em que falsários trabalham num subsolo, à meia-luz, fabricando dinheiro ilegal.

As inacreditáveis declarações de Lula sobre a guerra na Ucrânia horrorizaram os países democráticos. Em seguida, elas sumiram das manchetes. Mas não se engane! Nossos parceiros norte-americanos e europeus não se esqueceram nem pretendem deixar barato. Pressões irresistíveis devem estar atazanando Luiz Inácio, exortando-o a reconsiderar sua posição.

E é o que ele está tentando fazer. A contragosto, diga-se. Anda de banda feito caranguejo. Nessa matéria, age como quem fala mais por obrigação que por convicção. Percebe-se que está acuado, encostado à parede. Suas bravatas de moleque estão lhe custando caro.

Com meia dúzia de frases de botequim, Lula conseguiu destruir a imagem simpática e amena que o planeta havia guardado dele após dois mandatos e uma passagem pela casa prisão. Foi uma pena. Aquelas frases desgraçadas ecoaram forte e fizeram soar o alerta vermelho na chancelaria de todos os países democráticos.

Como é que é? Lula, o simpático pai dos pobres, que se posiciona do lado da Rússia de Putin e da China de Xi Jinping? Lula, o humanista, que desdenha a gravidade da invasão da Ucrânia e o sofrimento da população bombardeada? De repente, o posicionamento esdrúxulo de Luiz Inácio virou pesadelo para muitos dirigentes estrangeiros. E agora? Como encarar um Brasil que desliza para o lado obscuro da História?

Num primeiro momento, imaginei que, ao pronunciar as frases desconcertantes, nosso presidente estivesse num momento de mau humor ou talvez inebriado por estar de novo viajando de aerolula em terras estrangeiras. É incrível como dirigentes, quando estão longe de casa, se sentem à vontade para dizer besteira, na crença de que não haverá consequências.

Estes dias, dei de cara com o recorte que reproduzi acima, na entrada deste artigo. O jornal cita uma fala de Celso Amorim, nosso inoxidável “assessor especial de política externa”. Com a arrogante superioridade de quem está pra perder a paciência, o assessor informa que o Brasil pode até se dignar de socorrer os beligerantes, mas só o fará quando ambos “se cansarem da guerra”.

Além de exalar soberba, a frase é de uma maldade inominável. Amorim renega seu passado de diplomata de alto nível e desce ao nível do chefe. Luiz Inácio disse que “quando um não quer, dois não brigam”. Agora vem seu “assessor especial” prometer ajuda quando país agressor e país agredido “se cansarem de guerra” – frase terrível de desdém pela infelicidade de um povo agredido. Uma falta de empatia tão grande choca.

Meditei. O que estará ocorrendo? Será que as tristes falas de Lula já refletiam, desde o começo, o ponto de vista do “assessor especial”? Se assim for, Lula agiu como papagaio de Amorim. Ou será que, para agradar ao chefe, o “assessor especial” é que teria jogado ao lixo os ensinamentos angariados nos tempos em que era diplomata, para adotar o antiamericanismo primitivo de Luiz Inácio?

Seja como for, o retrato é dramático. Um presidente escorrega feio, leva um pito internacional e tenta recuar andando de costas com visível desconforto. Na contramão, um “assessor especial” volta de uma visita a Kiev requentando as besteiras do chefe e colocando-as de volta no balcão das “commodities” brasileiras. Para que todos vejam.

São dois pra lá, dois pra cá. Até que não seria dramático se o papel de nosso país na cena internacional fosse dançar bolero. Mas, na medida que o Brasil abandona aliados e se aproxima de Estados criminosos, nosso desempenho está mais pra valsa do adeus.

This guy, I love him

Vera Magalhães (*)

Não que Trump esteja ligando para o Brasil ou para a família Bolsonaro. Nunca o fez a sério.

Mas o contrário não é verdade: toda a estrutura da política externa brasileira foi erigida em razão dos interesses norte-americanos, que ditaram nossa escolha para a tecnologia 5G, o destino da base de Alcântara, a política de preços de etanol, alumínio e aço, a estratégia de ingresso em organismos multilaterais, nossa política no continente (tendo a Venezuela como ponto central), e até a relação com Israel e Palestina.

by Cristina Sampaio (1960-), desenhista portuguesa

Sem Trump, ficamos a ver navios e ainda mais expostos na questão ambiental, pois Biden certamente se unirá à Europa nas cobranças veementes e na ameaça de retaliação comercial caso continuemos queimando biomas como se não houvesse amanhã.

(*) É jornalista com atuação em numerosos veículos.

Política externa

José Horta Manzano

A prova de fogo que doutor Bolsonaro está sendo obrigado a encarar está entre as mais delicadas, especialmente para um governo inexperiente: a política externa. Nos tempos do petismo, não tivemos problemas com vizinhos. O Lula é que foi ao Oriente Médio buscar sarna pra se coçar. Foi porque quis, que seu ego imenso lhe fazia crer que estava destinado a liderar o planeta. Foi buscar sarna, encontrou, e saiu se coçando. E está se dedetizando até hoje pra se livrar da praga que rogou pra si próprio.

A encrenca que temos hoje na frente externa não é resultado de políticas nossas do passado. A ditadura venezuelana nasceu e se desenvolveu por si, ainda que o petismo lhe tenha dado uma força. A mão forte de Lula & cia., no entanto, não foi fator determinante pra garantir longevidade.

O problema que se nos apresenta é daqueles que nenhum dirigente deseja enfrentar, muito menos em começo de mandato. E até que não estamos nos saindo tão mal. Inteirados da rusticidade e do maniqueísmo primário de nosso ministro de Relações Exteriores, os integrantes da ala militar do governo não têm permitido que ele assuma protagonismo. Nem esse ministro, nem os bolsonarinhos ‒ que, por sinal, andam apagados. Minha avó dizia que criança, quando está quietinha sem dar um pio, é que está fazendo arte. Espero que os juniores não estejam tramando novo golpe.

Estivessem as decisões nas mãos do mandachuva do Itamaraty ou dos belicosos primeiros-filhos, o Brasil já teria declarado guerra ao vizinho, com bombardeio aéreo e envio de tropas de infantaria. Imaginem o desastre! Ainda bem que eles estão eclipsados. O exército bolivariano anda meio mambembe, é verdade. Assim mesmo, não convém provocar.

Señor Maduro, embora não tenha sido militar mas motorista de ônibus, entendeu que sua base de sustentação não está no parlamento, nem nas urnas, nem nas ruas. Sabe que está nas forças armadas. Ao longo dos anos, continuando o trabalho de seu antecessor, distribuiu benesses aos fardados. Os de mais alta patente não vivem num país flagelado pela fome e pela falta de medicamentos. Vivem numa outra Venezuela, um país de fartura onde tudo é possível.

Os agrados garantidos aos militares incluem promoções políticas, que nada têm a ver com ascensão por mérito. De tanto forçar a barra, as forças armadas têm hoje muito cacique pra pouco índio. Há mais de 2000(!) generais para um contingente de 123 mil homens. Isso dá um general pra cada 57 soldados ‒ um despropósito.

Só que essa abundância de graduados transmite falsa sensação de segurança. Na hora do vamos ver, quem combate não são os generais mimados e bem pagos ‒ são os soldados. Oficiais de alta patente, corrompidos e enricados, têm o rabo preso. Soldados rasos, não. E o que é que se viu diante das trapalhadas que tiveram lugar nas fronteiras este fim de semana? Pois vimos soldados desertando, entregando armas e declarando fidelidade ao presidente interino. Foram algumas dezenas. O número só não foi maior porque muitos deles têm família e temem represálias.

O desmoronamento final do regime pode demorar, mas é inevitável. No dia em que todos os soldados tiverem desertado, que vão fazer os dois mil generais? Bailar un merengue?

Requiescat in pace

José Horta Manzano

Certos personagens não sobrevivem senão debaixo dos holofotes. É o caso de diversos figurões e homens políticos deste país. O exemplo maior é o Lula. «Falem bem, falem mal, mas falem de mim» parece ser o mote dessa gente. Caso se apagassem as luzes, desvaneceriam qual mariposas. Para não cair no ostracismo, têm necessidade permanente da ribalta, do incenso e dos aplausos. Em casos desesperados, até apupos servem para mantê-los em vida. Mais vale ser vaiado que esquecido.

Já alguns poucos atores do mundo político são personagens das sombras. Deles, embora pouco se fale e pouco se ouça, vêm diretivas que norteiam quadrantes inteiros da política nacional. Um deles fechou os olhos para sempre ontem. Foi Marco Aurélio Garcia, aquele que teve de carregar, ao longo dos dez últimos anos de vida, o incômodo apodo de «top-top», que lhe foi atribuído desde que o flagraram em gesto obsceno, na esteira de um acidente de avião que matou duzentas pessoas.

A decência recomenda não chutar cachorro morto, coisa mais feia. A honestidade, no entanto, me obriga a ressaltar que esse senhor foi ator de destaque na descida da diplomacia brasileira rumo à insignificância. Verdadeiro ministro de Relações Exteriores bis, doutor Garcia esteve entre os pouquíssimos que permaneceram no cargo do primeiro dia do governo do Lula até a derrocada da doutora Dilma. E olhe que não ocupava um desses cargos políticos que se barganham no balcão federal de negócios, como é o caso de ministros. Era dono de um posto de assessor especial ‒ que as más línguas chamam de aspone ‒, cargo de confiança que não tinha nada que ver com troca de favores.

Doutor Garcia, pouco imbuído dos sutis códigos diplomáticos, agia sem visão de mundo, movido apenas por empoeirada ideologia estacionada nos anos 60. Por razões que não cabe aqui analisar, esteve por detrás de bizarras tomadas de posição da política exterior brasileira. Ainda estão presentes na memória coletiva numerosos vexames internacionais aos quais nosso país foi submetido. Entre eles: aquele incompreensível mas explícito apoio a señor Zelaya na Nicarágua; o fiasco da pueril tentativa de intromissão brasileira no conflito entre Palestina e Israel; a benevolência para com terroristas das Farc; a aproximação tentada pelo Planalto com sanguinárias ditaduras africanas; a entrada (pela janela) da Venezuela no Mercosul.

O mundo não é bobo. Depois do momento de surpresa e simpatia que se seguiu à primeira eleição do Lula, caíram todos, pouco a pouco, na real. Deram-se conta de que, por detrás da bondosa fachada de distribuição de migalhas para combater a fome, havia o oco total. Como em cenário de cinema, as casas não tinham fundos. Atrás do frontispício, nada. Depois de repetidos desastres, o Brasil acabou descartado e regrediu décadas na visão do mundo civilizado. Em vez de destacar-se como locomotiva da América Latina, dissolveu-se no caldeirão comum e voltou a ser visto como país grande, não como grande país.

O Brasil se aferrou, durante os anos lulopetistas, a tentar dividir o planeta em blocos heteróclitos do tipo Brics. A assunção de Mr. Trump ao topo da hierarquia dos EUA mostrou que a formação de blocos político-comerciais é frágil e sujeita a chuvas e tempestades. De uma canetada, o homem retirou seu país do Tratado Transpacífico. Fez mais. Renegou o Acordo sobre o Clima assinado em Paris por quase 200 países depois de longas e ásperas negociações.

Culto, esperto, visionário ‒ e principalmente bem assessorado ‒, Monsieur Macron lançou, no começo de junho, convite a todos os cientistas americanos para que viessem trabalhar na França, onde as torneiras que Mr. Trump estava fechando seriam abertas para deixar jorrar fartos incentivos. Passou por cima de G8, G20, Otan e todas essas criações artificiais que atravancam mais do que ajudam. Em contraposição irônica ao slogan de campanha do colega americano, o presidente francês, que domina a língua inglesa, propagou «Make our planet great again» ‒ Vamos restituir a grandeza a nosso planeta.

O governo francês reservou orçamento de 60 milhões de euros à operação. E não é que está dando certo? Mês e meio depois do convite, centenas de cientistas de alto coturno já se candidataram. Vêm do mundo inteiro. Entre eles, 150 estão interessados em estabelecer-se na França por longo período. Metade desses 150 são americanos. Com uma pontinha de inveja, Frau Merkel se prepara para repetir, na Alemanha, a iniciativa de Monsieur Macron.

Está aí um pequeno exemplo de política exterior visionária, de longo prazo e voltada para o bem do povo em contraposição a política ideológica e capenga, meramente voltada para mesquinhos interesses presentes. Ao atrair cientistas, a França dá lastro ao futuro do próprio país, enquanto o nosso arrogante Planalto gastou bilhões surrupiados do sofrido povo para construir o porto de Mariel, em Cuba. Tristes trópicos.

Nota
Requiescat in pace, frequentemente abreviado em R.I.P., é fórmula latina usada em referência a pessoa falecida. Significa que repouse em paz.

Obama e os nós

José Horta Manzano

Obama 2Em 2009, quando o Prêmio Nobel da Paz lhe foi atribuído, Barack Obama há de ter-se sentido meio sem graça. Até aquele momento, o gesto mais vistoso do recém-eleito presidente tinha sido o Discurso de Cairo, interpretado como guinada na política externa americana.

Foi pronunciamento importante, sem dúvida, mas daí a valer Nobel da Paz… vai um longo caminho. A opinião pública mundial ficou cismada. Por que teriam agraciado o presidente por antecipação? Que esperavam dele?

Passados quase oito anos, com o fim do mandato chegando, Obama não conta com a simpatia unânime de seu povo. Se lhe fosse permitido candidatar-se a um terceiro mandato, não é certo que viessem a reelegê-lo. E o prêmio que lhe deram adiantado como é que fica? Foi justificado ou não?

O julgamento pleno somente será dado pela História daqui a algumas dezenas de anos. No entanto, há que reconhecer que o governo de Obama desatou três grandes nós da política externa de seu país.

Nó 1Primeiro foi o Irã. Fazia mais de 35 anos que os EUA e a antiga Pérsia estavam de relações cortadas. Se nada fosse feito, a situação podia se eternizar. Prudente mas pragmático, Obama deu os passos necessários para sustar o embargo comercial e normalizar as relações. Com a bênção americana, o Irã voltou ao convívio do mundo civilizado.

Em seguida, veio Cuba, outro nó amarrado fazia já meio século. No fundo, nada tinha mudado na ilha caribenha que justificasse melhora nas relações com o “império”. A decisão unilateral da presidência americana ‒ para desespero de bolivarianos & aprendizes ‒ balançou o coreto. Por inspiração de Obama, a situação entre os dois países deu grandes passos para o descongelamento.

Obama 1O terceiro nó está sendo desfeito estes dias. A ida de Obama a Hiroshima ‒ primeira visita de presidente americano em exercício à cidade martirizada por fogo atômico ‒ é forte em simbolismo. Obama já deixou claro que não haverá pedido de desculpas, dado que considera não fazer sentido excusar-se por atos que já fazem parte da História. Seja como for, faz 70 anos que o povo japonês esperava por essa visita oficial. O primeiro-ministro nipônico já está até pensando em retribuir com uma visita a Pearl Harbor.

Diferentemente do predecessor, o famigerado Bush Júnior, Barack Obama deixará atrás de si um balanço positivo. O mundo continua cheio de problemas, como a questão israelo-palestina e o contencioso russo-ucraniano. Mas alguns nós terão sido desfeitos. Obama se esforçou pra fazer jus ao prêmio antecipado que lhe tinham atribuído.

O maior erro

Cláudio Humberto (*)

Trombar com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha foi, para Lula, o maior erro político de Dilma, cometido por influência de Aloizio Mercadante, chefe da Casa Civil.

by Amarildo Lima, desenhista capixaba

by Amarildo Lima, desenhista capixaba

Lula acha que Dilma errou ao hostilizar Barack Obama, no caso da espionagem, e a Indonésia, pela execução do traficante Marco Archer. Segundo Lula, Dilma deveria ter feito a visita de Estado a Washington, que ela cancelou, e respeitado as leis internas da Indonésia.

Ao criticar Dilma, Lula esquece um detalhe: a culpa é dele, por dar cartaz ao aspone Marco Aurélio Top-Top, que define a política externa.

(*) Cláudio Humberto, jornalista, publica coluna diária no Diário do Poder.

Basta de criminosos!

José Horta Manzano

Já temos bandidos suficientes. Não precisamos de criminosos estrangeiros.

Battisti, o fugitivo mais procurado da Itália

Battisti, o fugitivo mais procurado da Itália

Todos os jornais italianos – todos eles – aplaudiram de pé a surpreendente reviravolta do caso Battisti. Foi neste 3 de março que o Estadão deu a notícia: uma juíza federal determinou que o referido senhor seja expulso do território nacional.

A sentença leva a data de 26 fev°. É intrigante que tenha passado despercebida por quase uma semana. A gente imagina que a mídia esteja atenta a tudo o que de importante acontece mas, na hora do vamos ver, fica claro que observadores andam meio sonolentos. Jornais do mundo inteiro repercutiram a novidade. Até o New Zealand Herald, do outro lado do globo, postou um artigo.

O simbolismo por detrás da boa-nova é alvissareiro. Os longos anos em que o Lula presidiu a República caracterizaram-se por uma política externa particularmente danosa. No Planalto, a ignorância de uns combinada à ingenuidade de outros resultou em mistura explosiva.

Durante aqueles anos de tresvario, assistimos impotentes a:

Interligne vertical 16 3Kbafagos a ditadores sanguinários,

trôpega tentativa de aproximação com o Irã,

juras de amor eterno a Chávez e aos Castros,

desmantelamento da Alca,

consolidação de aliança «estratégica» com a China – o maior destruidor de nossa indústria e de nossos empregos,

intervenção marota, amadora e infrutífera na Honduras de Zelaya,

implantação de dezenas de custosas embaixadas em ilhotas que literalmente não estão no mapa,

ridícula tentativa de desenredar a questão palestina,

abertura de embaixada na Coreia do Norte, país que abriga 6 (seis) brasileiros, incluindo o embaixador, mulher e filha.

Foi um desastre que deixará marcas.

Lula e ChavezEntre as safadezas, sobressaiu a concessão de asilo político a um fugitivo chamado Cesare Battisti, condenado em seu país por participação em assassinatos.

O Lula esperou o último dia de seu mandato para, contrariando determinação do STF, assinar o ato de acolhida do criminoso. Por acaso, foi no mesmo dia em que concedeu passaporte diplomático a toda a «primeira família», crianças incluídas. Quanta arrogância!

Quanto a dona Dilma, tirando dois beijinhos nos Castros e alguma declaração retórica de apoio a este ou àquele hermano, não fez nem desfez. Menos efusiva que seu predecessor, não nos cobriu de ridículo. O fato de nossas representações diplomáticas estarem em atraso no pagamento de contas de água e luz é menos vexatório do que ver o Lula em manchete global levantando o braço de Ahmadinejad. Francamente.

Bigode 1A decisão tomada agora pela corajosa e lúcida juíza federal representa o início do desmonte do desvario inaugurado doze anos atrás. Se tudo correr como manda o figurino, signor Battisti será devolvido a seu país de origem para responder pelos crimes que tiver cometido. No momento, seu lugar é lá, não aqui.

Que volte ao Brasil mais tarde, como cidadão livre, no dia em que estiver quite com a justiça italiana. Agora, não é hora.

Para juristas
A íntegra da sentença de expulsão do estrangeiro está disponível aqui.

Frase do dia — 225

«A África era a cereja do bolo da política externa do Lula, mas sabe quantas vezes o chefe do Departamento de África do Itamaraty visitou algum dos 54 países do continente no ano passado? Nenhuma! E não foi por culpa dele.»

Eliane Cantanhêde, em sua coluna do Estadão, 20 fev° 2015.

Morreu de medo…

José Horta Manzano

Suisse 7Estes dias, realiza-se o Fórum Econômico Mundial, simpósio que, ano após ano, congrega os grandes deste mundo durante alguns dias em Davos, Suíça. Em seus tempos de esplendor, nosso guia fazia questão de comparecer e aparecer. Este ano, quarenta chefes de Estado fizeram questão de estar presentes, assim como 1500 dirigentes de multinacionais – um total de 2900 participantes.

É possível que a Mongólia não tenha enviado representante. É também provável que nenhum responsável do Haiti ou do Butão esteja presente.

Pelo ordenamento constitucional brasileiro, os cargos de chefe de Estado e de chefe do governo são exercidos pela mesma pessoa. Atualmente, dona Dilma Rousseff encarna esse superpersonagem.

Suisse 4Pois dona Dilma, mostrando que sua autoestima anda mais baixa do que se imagina, fez saber que preferia desdenhar a Suíça e prestigiar a reentronização de seu ídolo Evo Morales. A escolha há de ser fruto de um daqueles ataques de voluntarismo de que nossa presidente é vezeira. Recuso-me a acreditar que seus assessores, posto que sejam tacanhos, lhe tenham aconselhado trocar Davos por La Paz.

A ausência da figura maior da nação brasileira no fórum assinala marcha à ré na política de projeção mundial entabulada por nosso guia doze anos atrás. Põe a perder o esforço – às vezes atabalhoado, mas sincero – de alçar o nome do Brasil entre as potências planetárias.

Suisse 6Não acredito em escolhas ideológicas. Se dona Dilma faltou à reunião, foi por orgulho. Fugiu para escapar às críticas e à reprovação a seu modo de gerir a coisa pública. O mundo sabe, hoje, que a gestão de seu primeiro quadriênio foi calamitosa. Todos sabem também que nada de auspicioso se apresenta para o futuro próximo.

Resultado: como em reuniões familiares, fala-se mal dos ausentes. O economista-chefe do IHS – instituto americano de análise econômica e tecnológica – chegou a qualificar de «moribundo» o estado de saúde do Brasil. Enquanto isso, os Estados Unidos, a Índia e o México estão no foco da admiração. De fato, ninguém gosta de quem anda pra trás.

Suisse 5Dona Dilma tem perdido apoio internamente. Sua renúncia a representar o país em reuniões importantes periga ser interpretada como renúncia do Brasil a participar do clube dos grandes deste mundo. Nosso guia há de estar desgostoso.

De criança, a gente cantava um refrãozinho de deboche que assenta bem na atual chefe do Estado brasileiro. Começa com «Morreu de medo…». E termina com «… no dedo».

Falam de nós – 4

0-Falam de nósJosé Horta Manzano

Algemas 1Estelionatário
O jornal irlandês The Irish Times dá destaque ao voto do STF em favor da extradição de um certo Michael Lynn, cidadão da República da Irlanda. O homem é procurado por dezenas de crimes de estelionato. Está encarcerado em Pernambuco.

Em princípio – digo bem em princípio – a presidente deve assinar, em breve, o decreto de extradição. Com aquela gente, nunca se sabe. Está ainda na memória de todos o caso Battisti. Foi quando assistimos todos ao constrangente espetáculo de ver o italiano, acusado de numerosos crimes de sangue, ser acolhido pelo Brasil companheiro como perseguido político.

Portanto, todo cuidado é pouco. Talvez seja um pouco tarde para salvar o fugitivo irlandês. Se ele tivesse pensado em se afiliar ao partido dominante, quem sabe? Teria muita chance de ser acolhido nesta terra onde ainda sobram algumas palmeiras e poucos sabiás.

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Plataforma petróleoInvestimento
O portal financeiro alemão Finanzen informa que o governo brasileiro pretende investir estes próximos anos na construção naval e portuária. O objetivo é apoiar a exportação de petróleo, cuja produção deve dobrar daqui a seis anos.

Li e reli para ter certeza de que o que estava escrito era isso mesmo. Era. Não sou previsor financeiro nem perito em exploração de petróleo. Mas a situação atual aponta para um futuro menos risonho. O bom senso faz crer que seis anos não serão suficientes para desempacar a construção naval e a extração de petróleo. Muito menos para fazê-los subir de patamar.

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Visto americano
O Portal Univisión – braço da gigante mexicana Televisa – traz informe interessante. Transcreve estudo solicitado pelo governo dos EUA sobre as consequências de hipotética ab-rogação da obrigatoriedade de visto para brasileiros que desejem viajar àquele país.

Disneylandia 1Caso fosse concedida isenção, estima-se que turistas brasileiros deixariam nos EUA 5,5 bilhões de dólares extras nos próximos cinco anos. É mais de um bilhão por ano, quantia significativa até para político corrupto ou para assaltante da Petrobrás.

Com a abolição do visto, o período 2015-2019 deveria registrar afluxo de 14,3 milhões de brasileiros. Desse total, calcula-se que 1,2 milhões terão decidido viajar em consequência da queda do visto.

Com a exceção dos dinossauros que se deixam guiar por ideologia jurássica para orientar a política externa brasileira, autoridades não costumam desprezar entrada de divisas. Portanto, é forte a probabilidade de a exigência de visto cair.

Vamos! Enterre o boné no cocuruto e vamos andar de xícara!

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Frase do dia — 137

«O governo Lula fez uma jogada arriscada com o Irã ao tentar mediar um acordo nuclear. Imagine se a Turquia resolvesse fazer um acordo entre Argentina e Uruguai. Não tem como.»

Fernando Henrique Cardoso em entrevista concedida à Folha de São Paulo por ocasião da cerimônia em que a Universidade de Tel Aviv lhe concedeu o título de doutor honoris causa. Publicado na edição online de 19 maio 2014.

Cabo de guerra

José Horta Manzano

Michelle Bachelet presidente eleita do Chile

Michelle Bachelet
presidente eleita do Chile

Michelle Bachelet, presidente eleita do Chile, tomará posse de seu cargo na semana que entra. Aproveitando o embalo, os ministros de Relações Exteriores sul-americanos vão-se reunir para debater os atuais problemas venezuelanos.

Em passado longínquo, era imprescindível que figurões se reunissem para discutir. Na ausência de telefone e de internet, mensagens tinham de ser encaminhadas por escrito. Entre proposições e contraproposições, podiam passar-se meses, anos até.

Essas cúpulas de hoje em dia são encenadas mais pra inglês ver. Na era da videoconferência, decisões são tomadas nos bastidores e dispensam encontros físicos. O resultado mais notável dessas reuniões de medalhões são fotos de grupo que farão as manchetes de todos os jornais.

Grosso modo, o Brasil ocupa metade do território do subcontinente, reúne metade de sua população e responde por metade de seu PIB. Assim como a posição da Alemanha é predominante nas cúpulas europeias, é natural que o peso do Brasil oriente os debates e a conclusão final de todo concertamento regional.

Nada indica, infelizmente, que desse encontro chileno alguma novidade boa possa sair. Por quê? Simplesmente porque nossa alta cúpula se debate em lutas intestinas que a paralisam.

A máquina governamental brasileira aloja ideólogos que, por afinidade, preconizam o alinhamento automático com governos autoritários. Sejam eles de direita, de esquerda, de cima, de baixo, pouco importa. O atual regime venezuelano, autoritário e semidemocrático, encaixa-se perfeitamente no molde.

Por outro lado, nossa abundante equipe de governo abriga também gente menos ingênua, menos cabeça-dura, menos ressentida, mais realista. Há, certo, medalhões que já entenderam que a exacerbação do populismo e do autoritarismo, à moda bolivariana, é caminho certo para o desastre.

Na ausência de um presidente respeitado, daqueles cuja palavra não se discute, os habitués do Planalto travam uma interminável partida de cabo de guerra. Falo daquela brincadeira em que uma corda grossa é puxada por duas equipes, uma de cada lado. O mais das vezes, a corda fica imobilizada, sem se mover para lado nenhum.

Palácio do Itamaraty e seu espelho d'água

Palácio do Itamaraty e seu espelho d’água

A prova maior foi dada dias atrás por nosso chanceler, Luiz Alberto Figueiredo, em entrevista concedida a Eliane Cantanhêde, da Folha de São Paulo. A jornalista, íntima da política brasileira, foi direto ao que interessava e pisou onde doía.

O resultado foi constrangedor. Descobrimos um ministro de Relações Exteriores ― diplomata de carreira! ― acabrunhado, envergonhado. Tentou escapulir aos questionamentos, fugir à realidade. Dourou pílulas, divagou, esquivou-se, esgueirou-se, resvalou. O homem é mais «escorregoso» que sabão de lavadeira. É daqueles que falam e falam para, no final, não dizer nada. Um horror.

Tudo isso faz sentido. O desmonte da imagem externa do Brasil caminha pari passu com o desmantelamento das instituições. Essa hesitação entre servir a Deus ou a Mamon deixa a impressão de um país em estado de liquefação.

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A quem não leu, recomendo uma vista d’olhos à entrevista do chanceler. É edificante. Clique aqui.

Frase do dia — 112

«Na política externa, mesmo que a reforma do Conselho de Segurança da ONU andasse, qual a contribuição efetiva do Brasil à segurança internacional se, no próprio território, 50 mil homicídios/ano superam a destruição de vida nos conflitos do Afeganistão, do Iraque e do Sudão?»

Marcos Troyjo, economista e cientista social, em sua coluna in Folha de São Paulo, 28 fev° 2014.