Estagiário consegue efetivação

José Horta Manzano

Num curto mas bem estruturado artigo publicado hoje, a britânica The Economist insinua, em 750 palavras, que o mandato de Jair Bolsonaro pode ser curto. O escrito se atém ao essencial, podendo ser entendido até por um turista extraterrestre recém-chegado de Marte. O título é sugestivo: Jair Bolsonaro, Brazil’s apprentice president ‒ Jair Bolsonaro, o presidente aprendiz do Brasil”.

À vista do caminhão de trapalhadas que vêm sendo patrocinadas pela família Bolsonaro e por seu entourage, a profecia parece realizável. De fato, a persistirem os desencontros, as ofensas gratuitas, os escorregões na pista do bom senso e as rajadas de ‘fogo amigo’, o governo que está aí não vai longe. As portas estão abertas pra um desenlace abrupto.

No entanto, embora legalmente possível ‒ com um impeachment, por exemplo ‒ um abreviamento do mandato de doutor Bolsonaro está longe de ser provável. Se estivesse diante de um tapetão verde, eu apostaria minhas fichas na permanência do presidente. A não ser que motivos de acidente ou saúde não lhe permitam ficar, evidentemente.

Crédito: The Economist

Por um lado, acredito que, aos trancos e barrancos, doutor Bolsonaro & família vão acabar aprendendo que a sacola de votos que receberam não lhes dá carta branca pra segurar o país na rédea curta. Podem muito, mas não podem tudo. E que se cuidem, porque se um dos superministros (Guedes ou Moro) pedir as contas, o buraco será bem maior.

Por outro lado, não interessa a muita gente que o presidente seja destituído. Apesar de trapalhão, já mostrou ser inofensivo. Suas trapalhadas não atrapalham (com o perdão do eco) os interesses dos que realmente mandam no país. Que meninos se vistam de azul ou de amarelo, não tem importância. Que a embaixada do Brasil em Israel esteja em Tel-Aviv ou Jerusalém, pouca diferença faz. Que o 31 de março seja festejado nas casernas, o andamento da nação não estará perturbado.

Por pior que seja, o presidente ainda está a anos-luz de cometer as barbaridades dos antecessores. Com um país mais vigilante que nunca, hoje em dia seria difícil depenar a Petrobrás ou o erário. Grandes empresários, grandes produtores rurais e grandes banqueiros sabem disso. O mundo político e a intelligentsia também.

Tem mais. Na hipótese de o presidente ser apeado, o substituto seria doutor Mourão, homem bem mais inteligente e mais difícil de manipular. Portanto, um elemento perigoso. Ninguém sabe que caminho tomaria o país com o general na boleia. Não tanto por ser militar, mas por ter demonstrado ter ideias próprias ‒ um risco que ninguém quer correr.

Que durmam todos em paz. A menos que seja ceifado por um acontecimento fora do controle, doutor Bolsonaro chegará ao fim do mandato. E, apesar de ter declarado ser contra a reeleição, periga se desdizer, se recandidatar, e ganhar no voto mais quatro anos no Planalto. Quem é que nunca mudou de ideia? Assim é a vida.

Nossas eleições e a ingerência russa

José Horta Manzano0-Sigismeno 1

‒ Então, Sigismeno, quanto tempo sem conversar, hein!

‒ É verdade, andei meio sumido. Coisas da vida. Como é que vai você?

‒ Vai-se levando, Sigismeno. Vosmicê?

‒ Sempre indignado, caro amigo, sempre indignado. É a maneira que encontrei de me sentir jovem. Imagine que o ano de 1968, que marcou o Brasil e o mundo, completa o 50° aniversário. E poucos se lembram, pouco se fala daquele período. É uma pena. Quem esquece o passado está condenado a revivê-lo.

‒ Tem razão, é importante reter as lições do passado. É justamente isso que anda me preocupando.

‒ Em que sentido?

‒ Tem-se falado muito na ingerência russa nas mais recentes eleições americanas e no plebiscito que o Reino Unido organizou para decidir se ficavam ou se saíam da Europa. Sem falar na consulta selvagem que o governo provincial catalão convocou em outubro. Há quem garanta que a influência de Moscou distorceu o resultado de todas essas votações. Você se interessou pelo problema, Sigismeno?

‒ Claro, eu me interessei como todo o mundo. E acredito que uma pressão insistente e bem organizada exercida por meio de redes sociais pode, sim, perverter o voto. Principalmente quando a disputa é acirrada, com o colégio eleitoral dividido praticamente ao meio. Mas por que é que você anda preocupado com isso? Esses votos já ocorreram.

‒ É que este ano é nossa vez. Em outubro, teremos eleições para vários cargos, entre eles o mais importante: o de presidente da República. Se os russos influíram lá, podem perfeitamente fazer o mesmo aqui.

‒ Concordo com você. Poder, podem. Precisa ainda querer. Precisa «combinar com os russos» ‒ com o perdão de sucumbir ao trocadilho.

‒ Ora, Sigismeno, com um Lula candidato (ou um poste dele, que é a mesma coisa) não precisa nem combinar. Assim como agiram para apoiar o Trump, um candidato que lhes parecia mais interessante, podem perfeitamente apoiar um Lula.

‒ O Lula? E por que razão, criatura de Deus? Que interesse teriam os russos em facilitar a vitória do demiurgo?

‒ Ora, Sigismeno, me parece claro. O Trump é meio bobão, pouco interessado em política internacional, isolacionista. Em suma, tem todas as qualidades para agradar ao regime de Moscou. O Lula também é meio bobão. E venal. A mim, parece óbvio que a vitória do baixinho raivoso interessa aos russos.

‒ Pois eu não estou de acordo com você.

‒ E por que não, Sigismeno?

‒ Você há de se lembrar daquele episódio grotesco em que um (então) presidente Lula, mal aconselhado pelo assessor especial para assuntos internacionais, tentou interferir no caldeirão do Oriente Médio. Não se lembra?

‒ Lembro, sim, Sigismeno. Eles procuraram a cumplicidade do semiditador da Turquia e entraram no picadeiro como elefantes em loja de porcelana. Mas foi um fiasco total. Levaram puxão de orelhas de todo o mundo, até do governo de Israel. Acabaram desagradando a todos.

‒ Especialmente à Russia! Das grandes potências, o país de Putin é ‒ de longe ‒ o que maior influência exerce sobre aquela parte do mundo. Influência, aliás, que só faz aumentar com a retirada de Washington da cena internacional. Se a guerra terminou na Síria e se os djihadistas foram derrotados, foi em decorrência da intervenção russa.

‒ E o que é que isso tem a ver com eventual ingerência russa nas eleições brasileiras, Sigismeno?

‒ Ora, é simples. A última coisa que Moscou deseja é que sua hegemonia na região seja contestada. O Lula já mostrou que é capaz de tentar «resolver» sozinho o emaranhado do Oriente Médio, por obra e graça do Espírito Santo, com dois ou três discursos de efeito. Logo ele, o especialista em dividir as gentes entre «nós & eles», veja você a ironia. O fato é que se mostrou suficientemente ingênuo para fazer cócegas nos russos. Russo não brinca em serviço. O Oriente Médio tornou-se o quintal da casa deles. Não querem saber de interferência de ninguém, nem dos EUA, nem do Brasil, nem do Zimbábue.

‒ Então você não acredita que eles possam intervir nas nossas eleições a favor do Lula?

‒ Não, seria incoerente. Se o fizessem, estariam marcando desastroso gol contra. Se ingerência da Rússia houver, caro amigo, não será em favor do messias de Garanhuns. Será, ao contrário, em apoio ao candidato que estiver em melhores condições de derrotá-lo.

‒ É, Sigismeno, o que você diz faz sentido. Ninguém vai ajudar alguém que lhe pode atrapalhar a existência amanhã.

Estreito, atrasado, trapalhão

O governo «plantou» nos jornais de ontem correção importante no seu discurso sobre o Oriente Médio: destacou que a presidenta Dilma qualifica de «massacre» e não «genocídio» o que ocorre em Gaza, em razão da ofensiva israelense.

Dilma isola e se descola do aspone lulista Marco Aurélio «Top-Top» Garcia – que usou a expressão «genocídio», provocando reação de Israel e fazendo do Brasil motivo de chacota.

O governo de Israel chutou o pau da barraca e chamou de «anã» a diplomacia brasileira por saber que «Top-Top» Garcia a lidera de fato.

Dilma e GarciaEstreito, atrasado, trapalhão, Marco Aurélio Garcia jamais foi diplomata, mas define a política externa desde o governo do Lula.

Subservientes, os diplomatas assistem Marco Aurélio Garcia esfacelar o prestígio construído pelo Itamaraty ao longo de mais de cem anos.

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Reprodução de artigo publicado pelo jornalista Cláudio Humberto in Diário do Poder, 30 jul° 2014.

Unidos venceremos!

José Horta Manzano

Hoje teve lugar, no imenso estádio de Johannesburg, cerimônia de adeus a Nelson Mandela. Viram-se e ouviram-se acontecimentos espantosos.

Obama e Castro (o segundo) roubaram a cena com seu histórico aperto de mãos. Obama recebeu uma ovação da assistência ― dezenas de milhares de pessoas. Não passaram despercebidas as vaias com que essas mesmas pessoas receberam Jacob Zuma, atual presidente do país. Visita de presidente a estádio anda se tornando um exercício arriscado…

Cinco presidentes Foto: Roberto Stuckert F°

Cinco presidentes
Foto: Roberto Stuckert F°

Alguns notaram a falta de Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel. Ele disse que não iria para não gastar dinheiro do país. Como pretexto, soou meio capenga. Dizem os analistas que, na verdade, o homem estava com receio de ser acolhido por uma salva de apupos. Muitos hão de se lembrar que, nos tempos duros em que vigorava o apartheid na África do Sul, Israel foi um dos raros e constantes parceiros econômicos do país.

Dona Dilma e sua corte tiveram a excelente ideia de convidar os quatro antigos presidentes do Brasil para acompanhá-los na viagem. E, naturalmente, deram-lhes carona no Airbus presidencial. A equipe de Obama procedeu de maneira análoga. Levaram todos os que ainda estão em condições de viajar ― faltou Bush pai que, aos 89 anos, talvez tenha dificuldade em se locomover. As imagens da chegada do avião a Johannesburg mostraram Obama e Bush filho descendo do mesmo aparelho. É de crer que todos tenham viajado juntos.

by Alberto Alpino F°, desenhista capixaba

by Alberto Alpino F°, desenhista capixaba

Quem acompanhou a transmissão ao vivo talvez tenha percebido Monsieur Hollande e Monsieur Sarkozy, o atual presidente da França e seu predecessor, sentados lado a lado na tribuna reservada às autoridades.

O que pouca gente fora da França ficou sabendo é que o presidente atual convidou, sim, seu antecessor. Mas com uma condição: que viajassem em aviões separados. É voz corrente que os dois se odeiam. Resultado: os mandachuvas franceses precisaram de três aviões ― um para o presidente, mais um para o ex-presidente e um terceiro sobressalente, aquele estepe que se costuma levar.

Quando a imprensa francesa botou a boca no trombone para anunciar ao povo esse desperdício de dinheiro público, chegou a explicação. É que, na volta, o presidente atual tinha previsto uma parada na República Centro-Africana, onde o pau anda comendo tão feio que tropas francesas estão lá para acalmar os ânimos.

Sarkozy e Hollande em Johannesburg

Sarkozy e Hollande em Johannesburg

O pretexto pareceu mal costurado. Poderiam ter viajado juntos e dado ao distinto público uma imagem mais civilizada. Para organizar a volta, sempre se encontraria um jeito.

É raro, mas acontece: as altas personagens brasileiras, desta vez, se comportaram mais civilizadamente que as francesas. Que fique aqui consignada minha admiração.