José Horta Manzano
Em sua nota n° 241, o Itamaraty nos informa sobre a reunião de cúpula de chefes de Estado do Mercosul, que se realizou em Montevidéu, dias 11 e 12 de julho de 2013.
Algumas considerações me ocorrem.

Objetivo
A visão dos que idealizaram e fundaram a união alfandegária certamente alcançava horizontes mais distantes do que os que conseguimos atingir. Desgraçadamente, a ideologia terceiro-mundista fora de moda que impregnou o governo do Brasil estes últimos dez anos gerou uma distorção. Emperrou o bloco.
Chega a ser grotesco o Brasil acusar a Argentina de atrapalhar o funcionamento da organização. Quando se detém 70% de participação numa associação qualquer, tem-se a faca e o queijo na mão. É o caso do Brasil no Mercosul. Se temos cedido aos caprichos de nossos hermanos, é porque assim foi decidido em nossas altas esferas.
Na ânsia de aparecer como «o bonzinho» e na impossibilidade de montar um verdadeiro império à soviética ou à americana, nosso País perde-se em suas ilusões e fica no meio do caminho ― sem condições de avançar, nem coragem de recuar.
Quem pretende liderar tem de saber meter medo nos liderados. Pouco deveria importar que nossos sócios «gostem» do Brasil ou não. O importante é que respeitem o sócio maior. Para aparecer como o «paladino dos pobres», papel sonhado por nossos dirigentes, um país tem de começar por fazer-se respeitar.
Não temos um exército ameaçador. Não dispomos de arsenal nuclear. Não temos sequer nosso próprio satélite de comunicações. Nosso ministro da Defesa(!) confessou outro dia, candidamente, que desconfiava que seu telefone estivesse sendo grampeado. Tudo isso deixa claro que o Brasil é um país fraco, que não amedronta ninguém. Se, além disso, cedermos a todos os caprichos de nossos hermanos, estaremos cada dia mais longe do objetivo.
Um gigante bobão não assusta.

Cúpula da União Europeia
Junho 2012
Números reveladores
Em sua nota oficial, o Itamaraty revela que, embora represente 80% do PIB da América do Sul, o Mercosul responde unicamente por 65% do comércio exterior do subcontinente. Trocando em miúdos, isso significa que os países sul-americanos não membros do Mercosul exportam, proporcionalmente, muito mais que nós. E tudo isso sem união aduaneira e sem reuniões de cúpula. Não é curioso? Pra que mesmo tem servido nossa associação?
Ambiente cordial
O jornal venezuelano El Mundo publica surpreendentes declarações do presidente Mujica, do Uruguai. O dirigente vizinho se lamenta do volume de burocracia e da quantidade de instituições inúteis que regem o Mercosul.
Mujica não tem papas na língua. Diz textualmente que «quando se tem de falar tanto em livre comércio é porque não há livre comércio». Acrescenta que, na atualidade, os dirigentes passam seu tempo «cada um desconfiando do outro e olhando de soslaio para ver se consegue enganar o colega».
O ambiente, como se vê, é de franca amistad y fraternidad.
Clube político
O próprio de uma associação comercial é fomentar o comércio, seja entre os sócios, seja com parceiros de fora. Quando se observa o Mercosul, constata-se que estamos muito longe do objetivo.
O tema dominante da última reunião de cúpula não tem que ver com o comércio, como seria de esperar. Discutiu-se espionagem, ameaça externa, asilo a Snowden ― o delator destrambelhado.
O jornal gaúcho Zero Hora nos informa que, em comunicado conjunto, os sócios «repudiam» a espionagem americana. Os dirigentes da agência americana de segurança nacional não devem ter dormido à noite de tanto medo.
Reunião de condomínio costuma ser mais produtiva.
Miopia brasileira
Das trevas nasce a luz. Pelo menos, deveria nascer. Mas quem tem cabeça dura não aprende. Incapacidade é defeito difícil de suplantar.
O Planalto tem esperneado desde que tomou conhecimento de que espiões espionam, e que o Brasil, tanto quanto todos os outros países, está na mira dos que têm capacidade de bisbilhotar casa alheia. Em vez de espernear, o governo faria melhor se usasse esse episódio como fonte de inspiração.
Nosso País não dispõe da mesma parafernália tecnológica de grandes potências como EUA, Rússia, China, Reino Unido, França, Alemanha, Japão. Esses, sim, têm os meios necessários e podem se permitir muito mais.
Mas nós temos gente. Temos diplomacia ― ainda que estranhamente direcionada nos últimos doze anos. Deveríamos utilizar nossos canais de informação diplomática, nem que fosse para não fazer papelão.
O Estadão nos informa que, num gesto magnânimo, os membros do Mercosul declararam que permitiriam a volta do Paraguai, suspenso há uma ano por decisão sumária. Só que nossa antigamente festejada diplomacia se esqueceu de combinar com o adversário. Não se preocuparam em perguntar ao sócio se ele queria voltar do castigo.
Pois o presidente eleito do Paraguai, numa resposta corajosa e sintomática, recusou-se a reintegrar o bloquinho. Pelo menos, enquanto a Venezuela estiver no exercício da presidência rotativa.
Nossa diplomacia podia ter ido dormir sem esse tapa na cara. Mais preocupados em costurar termos indignados para «repudiar» espionagens do «hermano del Norte», esqueceram-se de que é importante arrumar a casa e pôr-se de acordo primeiro. Que papelão!

Cúpula do Mercosul
Junho 2013
Conclusão
Como ilustração deste artigo, ponho a foto de uma cúpula europeia e um instantâneo da reunião do Mercosul. O contraste é patético. Quase uniformizados, os europeus transpiram seriedade. Até demais. Já nossos sócios mais parecem estar vestidos para um baile à fantasia. O Mercosul morre um pouco a cada dia.
Mas que os pessimistas não percam a esperança: está sendo preparada a adesão da Guiana, do Suriname e da Bolívia. Agora, vai!

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