José Horta Manzano
Россия
Ninguém me ama
José Horta Manzano
Fala-se hoje menos no assunto, mas é fato que Mister Snowden continua usufruindo as delícias da fria estepe russa. Já faz um ano que está sob aquelas latitudes.
Para quem não se lembra, Edward Snowden era funcionário de baixo escalão de uma empresa terceirizada que prestava serviço à ANS – Agência Nacional de Segurança, central de espionagem americana. Havendo descoberto o óbvio, ou seja, que uma agência de espionagem espiona, decidiu botar a boca no trombone. Sentiu que cabia a ele salvar a humanidade de tal baixeza. Naturalmente, tomou primeiro o cuidado de se afastar dos EUA. Em seguida, convocou a mídia e contou o que sabia.
Ora, todo dirigente – político ou empresário – sabe que seus passos e atos podem estar sendo monitorados. Sabem todos que suas conversas podem estar sendo captadas por ouvidos indiscretos. A coisa vai e a coisa vem, essa sempre foi a regra do jogo. Mas uma coisa é saber, outra coisa é a mídia mundial publicar, em manchete, que fulano espionou sicrano. Aí a coisa fica feia. Tanto o acusado de espionar quanto a vítima entram em saia justa. Ambos perdem a face.
O que o desmiolado Snowden fez foi romper acordo tácito que mantém em equilíbrio as artes da espionagem: eu sei que você faz, mas não digo nada; eu faço a mesma coisa, mas não quero que você diga.
O resultado do imbróglio é que o moço acabou desterrado lá pelas bandas de Moscou. Transformou-se em fardo que ninguém quer carregar. Senhor Putin se sentiria feliz em livrar-se do moço, mas ninguém quer saber de acolhê-lo.
Não é só no Brasil que procurados pela Interpol dão entrevista. Estes dias, Mister Snowden consentiu em ser questionado por jornalistas. Reiterou que gostaria de voltar à pátria, mas que só o fará se os EUA se comprometerem a amoldar o desenrolar do processo a determinadas exigências suas. Pode esperar sentado.
Aventou também a hipótese de obter asilo na Suíça. Cá entre nós: quem é que não gostaria? Só falta combinar com os suíços, detalhe do qual o postulante ainda não cuidou. Aliás, seu ato de candidatura começou mal. Logo de cara, descreveu Genebra, a segunda cidade do país, como “a capital da espionagem”. Que declaração infeliz! Realmente, esse rapaz tem o estranho dom de cuspir na sopa antes de engolir a primeira colherada.
Essa história nos deixa de herança alguns ensinamentos.
Temos a confirmação do que já estávamos cansados de saber: todos espionam todos, cada um se valendo dos meios de que dispõe.
Toda publicidade dada a fatos de espionagem é nociva e indesejada. Não interessa a espiões nem a espionados, dado que os enfia a todos em saia justíssima.
Diga-se (ou faça-se) o que for, a prática da espionagem, velha como o mundo, continuará firme e forte. Nada nem ninguém será capaz de dar-lhe um basta.
Não saberemos nunca se Mister Snowden terá agido por convicção ou por destrambelhamento. Continuo a acreditar que o moço é descabeçado. Louco manso, como se diz. Incomodou um bocado de gente para chegar a um resultado final nulo.