A ladeira da baderna

José Horta Manzano


Como líder, Bolsonaro já não faz jus à consideração do mundo. E os brasileiros, seus liderados, descem a ladeira da baderna.


Hoje de manhã, escutei uma reportagem de 15 minutos na rádio pública suíça sobre a campanha de desconfiança no voto eletrônico que Bolsonaro vem promovendo há três anos. E que se intensifica à medida que se aproxima a hora da onça. Ou da degola – que cada um escolha a imagem que preferir.

Fora do Brasil, a reação a esse fenômeno é de perplexidade. Todos se perguntam como é possível essa cruzada de desorientação estar sendo comandada por um indivíduo que foi eleito repetidas vezes por esse mesmo sistema eletrônico.

Se ele tivesse perdido alguma eleição, seria até compreensível que guardasse ressentimento. Mas ele ganhou todas! Essa campanha de desinformação e medo que ele promove agora é extravagante. Uma coisa não combina com a outra.

A reportagem radiofônica, feita durante um comício do capitão, trazia algumas dessas rápidas entrevistas com transeuntes. É surpreendente constatar que os devotos incorporam todas as imbecilidades que o chefe solta. Um aqui grita: “Quero minha pátria livre!”. Outra ali replica: “Sou contra o comunismo!”. E mais outro: “Os ministros do STF são todos estelionatários!”. Coisa de desequilibrados.

A impressão que fica é a de estar diante de um bando de zumbis descerebrados, sem eira nem beira, que perderam a capacidade de pensar com os próprios miolos. O mais chato é que, pouco a pouco, o veneno destilado por esse ser ignóbil vai respingando sobre a população. E o encanto com que o mundo mirava nosso país vai desmilinguindo. Um país de ingênuos capazes de aceitar o que diz Bolsonaro não merece ser objeto de consideração.

Em matéria de mentira e engodo, o capitão é um verdadeiro Putin tropical. Sem as armas.

Voto por internet

José Horta Manzano

Alguns meses atrás, eu lhes contava o progresso que o voto por internet havia feito na Suíça. De fato, a moderna parafernália informática abriu caminho pra grande avanço na área. Até outro dia, o eleitor helvético contava com apenas duas possibilidades de exercer seu direito: o comparecimento pessoal no domingo de votação ou o voto antecipado, por correspondência.

Entre os dois, o voto antecipado é bem mais prático. No canto da mesa da cozinha, bem à vontade, o eleitor rabisca seu desejo na cédula. Em seguida, enfia no envelope que já veio junto com o material eleitoral, despacha pelo correio e esquece. Mas há sempre quem prefira dar um passeio até o local de votação no domingo eleitoral. É sempre boa ocasião pra encontrar algum conhecido e bater papo em torno de um aperitivo antes do almoço. (O voto é encerrado ao meio-dia.)

Um tanto timidamente, menos de meia dúzia de cantões já haviam introduzido o voto por internet em fase experimental. Na teoria, é ultraprático. Vota-se do teclado do computador ou mesmo a partir do smartphone, companheiro de todas as horas e (quase) todos os bolsos. Mais simples, impossível. Só que essa modalidade de transmissão do voto acaba de sofrer uma senhora pancada.

A empresa nacional de correios, que é também importante operadora do ramo de transmissão eletrônica de dados, fez uma experiência. Organizou um concurso ‒ mais acertado será dizer um desafio. Conclamou piratas informáticos (em bom português: hackers) do mundo inteiro a tentar quebrar os códigos e protocolos de transmissão da empresa. Mais de três mil profissionais e amadores se apresentaram. Tiveram um mês de prazo pra tentar introduzir-se no sistema.

O resultado foi decepcionante ‒ para a empresa de correios, naturalmente. Os piratas detectaram numerosas falhas no código-fonte, problemas que tornam o voto inseguro. No frigir dos ovos, o eleitor exprime sua escolha mas não tem garantia de que o voto será computado corretamente. Deu pânico geral.

Para as votações programadas para o mês que vem, quatro cantões que se preparavam a adotar o voto por internet não tiveram remédio senão desistir. Ficou o dito pelo não dito. Vota-se de novo à antiga. O sistema, afinal de contas, não era tão ruim assim. Mais lento? Pode ser. Mas… bem mais seguro.

Fica a pergunta de sempre:
Será que o sistema brasileiro de voto eletrônico está blindado contra toda tentativa de pirataria?

Fica também a sugestão:
Que o Tribunal Superior Eleitoral institua um desafio, como foi feito na Suíça. Vamos ver se especialistas em espionagem eletrônica não encontram alguma falha no sistema. Estão com medo de quê?

Voto eletrônico ‒ 2

José Horta Manzano

A democracia semi-direta suíça se assenta sobre dois pilares: a representação popular e a consulta direta ao eleitor. O grande número de cidadãos impede, por razões práticas, que cada suíço seja individualmente consultado a cada decisão legislativa ou administrativa a ser tomada. Para contornar essa pedra, existe um parlamento, como nos demais países. Os eleitores elegem representantes que, agindo em seu nome, farão leis e tomarão decisões.

Além desse sistema afunilado, em que um só parlamentar carrega a voz de milhares de concidadãos, o país dispõe ainda de um azeitado sistema em que o eleitor participa diretamente, passando por cima de representantes. A cada três meses, em média, todos são convocados a votar. Há vários objetos em jogo. O votante poderá dar opinião sobre leis já votadas, projetos de lei, medidas administrativas, mudanças constitucionais ‒ tanto no âmbito federal, quanto cantonal ou municipal.

Vota-se este fim de semana

Nos tempos de antigamente, no dia designado, todos se dirigiam ao local eleitoral e depositavam o boletim na urna. Já faz tempo, há uma segunda opção: o voto por correio. Um mês antes de cada voto, os eleitores recebem em casa as informações e o material necessário. Votam e devolvem pelo correio, o que não deixa de ser prático. Mas os tempos têm mudado. A chegada da internet oferece mais uma opção: o voto eletrônico.

Muitos estão ainda reticentes à novidade. O temor está ligado à insegurança do sistema. Histórias de hackers, piratas russos e invasores chineses assustam muita gente. Por enquanto, somente 3 dos 26 cantões adotaram o novo método. As autoridades garantem que se trata de sistema confiável e inviolável. Já o eleitor fica meio assim, desconfiado, com receio de que seu voto não chegue a bom porto.

Voto de cabresto

É questão de tempo. Mais alguns anos, e os temores estarão dissipados. Já no Brasil, a questão não é tão simples. Tecnicamente, o voto eletrônico podia ser instaurado. Quem consegue a proeza de organizar a urna eletrônica em todo o território nacional deve estar em condições de garantir que cada eleitor possa votar a partir do próprio telefone ou computador, em toda segurança. Só que o problema é mais complexo.

Os brasileiros se espalham num leque muito aberto de classes sociais, com abissais disparidades de nível de instrução entre elas. Essa realidade é um freio ao exercício do voto longe do olho vigilante de mesários. O voto em casa seria porta aberta para o voto vendido. Bastaria que o vendedor entregasse ao comprador o material eleitoral e a senha. O perigo é demasiado grande. Na Suíça, o voto eletrônico tende a se alastrar. No Brasil, vai demorar um bocadinho mais.

Voto em cédula de papel

José Horta Manzano

A discussão é antiga, mas a solução ainda não apareceu. Portanto, vale a pena continuar malhando o ferro. Falo do voto eletrônico, uma especificidade brasileira, rejeitada por unanimidade pelo resto do mundo.

É verdade que houve tempo em que a abolição do voto em cédula de papel trouxe orgulho a muita gente. É que, antes do aparecimento da maquineta de votar, a apuração era muito demorada. Nos anos 50, o resultado não chegava antes de uma semana ‒ se tudo corresse bem. O suspense era irritante. É por ter apressado a contagem dos votos que a geringonça virou coqueluche e se tornou motivo de orgulho nacional.

É curioso que, antes de investir bilhões no sistema eletrônico, ninguém tenha pensado em verificar como se faz no estrangeiro pra contar votos. Alemanha, Itália, Suíça e muitos outros países têm cédulas complexas, em que o eleitor tem diversas opções: escolher somente o partido; escolher partido + nomear candidatos; cancelar nomes e/ou acrescentar outros; escolher candidatos do partido A mas também dar voto ao partido B. Apesar da complexidade das cédulas e da ausência de maquinetas de votar, o resultado sai em poucas horas. Onde está o milagre?

Pois o «milagre» vem da optimização da apuração. Em vez de recolher milhares de urnas e transportá-las ao centro de apuração, cada secção faz a própria contagem. Os mesários começam assim que se encerra a votação. Em seguida, vai rápido. O resultado de cada urna é enviado à autoridade eleitoral, que faz o cômputo final. Durante a apuração manual, é facultada a presença de fiscais dos diversos partidos, uma garantia contra fraude.

É simples, rápido e barato. Se adotássemos esse sistema, não seria necessário investir na compra de meio milhão de urnas eletrônicas ‒ uma economia bem-vinda. Não sei qual é o preço de uma maquineta dessas mas, se custar, digamos, 500 reais, a economia já será de 250 milhões. Só nesse item! O acoplamento de uma impressora às máquinas existentes, ideia em discussão atualmente, só complica e encarece o sistema sem melhorar a segurança.

Há outras vantagens. A contagem acompanhada e vigiada por fiscais é fator inibidor de fraudes. Mais que isso: em caso de contestação, os votos podem ser facilmente recontados.

Quando se sabe que piratas informáticos conseguem se introduzir em servidores da CIA, da Nasa e de governos ao redor do planeta, é permitido concluir que conseguem acessar o que quiserem. O voto manual faz barreira contra piratagem externa e, naturalmente, contra picaretagem interna.

Nenhum sistema é infalível, mas o voto em cédula de papel é, sem dúvida alguma, mais seguro que o eletrônico.

Votaron cuatro veces!

José Horta Manzano

«Hay ciudadanos que votaron cuatro veces!» ‒ foi uma das observações que contribuíram para desqualificar o plebiscito realizado pelo governo provincial da Catalunha no dia primeiro de outubro. Determinados eleitores são acusados de ter votado diversas vezes. De qualquer maneira, a consulta não havia sido autorizada pelo governo espanhol, fato que a tornou ilegítima e mesmo ilegal.

A organização do plebiscito, sua execução, o cômputo dos votos e a proclamação dos resultados foi feita pelo mesmo grupo de independentistas, sem controle externo. Eles próprios, ao anunciar o total de votantes, admitiram que menos da metade do eleitorado havia comparecido. Ainda que houvesse uma nesga de legitimidade, a consulta padeceu de falta de quorum. Voto descontrolado nunca dá bom resultado. Mas esses são problemas espanhóis. Vamos aos nossos.

Urna transparente

A Secretaria de Tecnologia da Informação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) andou fazendo um levantamento no cadastro de eleitores. Descobriu irregularidades ‒ surpreendente mesmo seria não descobri-las…

Um dos casos mais emblemáticos é o de um cidadão goiano que tinha 52 títulos de eleitor, 52 identidades, 52 CPFs. Cinquenta e dois exemplares de cada documento! Esse não fez as coisas pela metade. Um caso desse quilate deixa possuidores de «apenas» dez, vinte ou trinta títulos em segundo plano. Os indivíduos que têm nada mais que duas ou três identidades, então, passam despercebidos.

Essa notícia reforça a desconfiança que tenho ‒ e não sou o único ‒ na confiabilidade do voto eletrônico. Se, com fichas de papel e arquivos, que têm existência física e podem ser consultados a qualquer tempo, cidadãos conseguem manter múltiplas identidades, a urna eletrônica potencializa o perigo de fraude. De fato, na ausência da cédula de papel como comprovante, quem garante que cada voto foi computado corretamente? Em caso de litígio, como recontar?

Ouvi, ainda hoje, que piratas informáticos da Coreia do Norte invadiram sites militares da Coreia do Sul e sugaram zilhões de dados ultraconfidenciais. Ora, quem consegue entrar na casa dos outros e roubar informação deve também ser capaz de modificar dados. A meu ver, o debate vai além da segurança garantida pelo cadastramento biométrico. O que está em jogo é aquela torrente de dados que, embora ninguém veja, correm, anônimos, pelos cabos informáticos e determinam a vitória ou a derrota de cada candidato.

O risco de manipulação e de fraude maciça é bem maior que o perigo de um ou outro bugre votar 52 vezes. Um cavalo de troia introduzido no sistema eletrônico de apuração não altera 52 votos: pode adulterar 5 milhões. Ou mais.

Voto em papel

José Horta Manzano

Neste período de entressafra eleitoral, volto ao voto. Temos pela frente quase dois anos sem convocação às urnas. Para o bem da democracia, parece-me período demasiado longo, mas assim são as coisas. Quanto mais repetidamente se chama o eleitorado a se exprimir, mais corriqueiro se torna o ato. Menos solene e menos apaixonado, o voto frequente faz bem ao espírito republicano. Uma votação anual seria bem-vinda. Tem seu custo, mas é gasto útil para aproximar a população de seus representantes. Um dia, quem sabe, quando a democracia anunciada em 1988 for implantada pra valer, chegaremos lá.

Esta época de reorganização da bagunça criada nas últimas décadas é propícia para repensar o calendário eleitoral. Um caminho a considerar seria a desvinculação da eleição de presidente, senadores, deputados e governadores, que ocorre de roldão, a cada quatro anos. O espaçamento desse aglomerado de escolhas não me parece ser má ideia.

voto-3Enquanto não se chega a essa reforma maior, é tempo de refletir sobre modificações menores. O voto dito eletrônico, generalizado há vários anos, pareceu-nos a todos um avanço. Quando se pensa que, nos tempos de antigamente, a apuração chegava a levar um mês, a velocidade atual da contagem é espantosa. Nos primeiros anos, vimos nisso um sinal inequívoco de modernidade.

Segundo a sabedoria do Conselheiro Acácio, as consequências costumam vir depois. A rapidez da apuração passa pela urna eletrônica. Muitos se mostram reservados quanto à confiabilidade do sistema. Quando a gente fica sabendo que piratas informáticos já conseguiram invadir sofisticadas redes informáticas, como as do governo americano, a gente sente a pulga atrás da orelha. Se acontece lá, por que não aqui?

A Holanda tomou esta semana uma decisão que mostra que o risco de manipulação de resultados é concreto. Para as eleições do mês que vem, o país abandona o sistema eletrônico e volta ao método manual, velho de guerra. Parece-me decisão sábia. O voto no papel pode até ser mais laborioso na hora da apuração mas guarda vantagens consideráveis. A apuração, feita publicamente diante de fiscais partidários e de jornalistas, não abre brecha para manipulação eletrônica. Em caso de contestação, uma recontagem ‒ parcial ou total ‒ é possível a qualquer tempo.

voto-4Tem mais. No fundo, nenhuma razão justifica demora excessiva na apuração. Em países democráticos, cada seção eleitoral tem a incumbência de contar os votos de sua própria urna. Terminada a votação, inicia-se a apuração, à frente e à vista de todos. Em poucos minutos, sai o resultado. A presença de representantes de partidos e de partes interessadas é permitida e até incentivada.

Quando uma novidade não dá certo ou dá margem a questionamento, é mais ajuizado voltar ao sistema anterior. Pelo menos até o dia em que se encontre maneira de blindar o novo método. No caso da urna eletrônica, ainda temos longo caminho para chegar à garantia de absoluta lisura.

Verba volant

José Horta Manzano

Verba volant 1A frase marcante da semana que passou foi, sem dúvida, aquela com que o vice-presidente encabeçou a carta enviada à chefe: Verba volant, scripta manent – palavras voam, escritos permanecem.

Firme e robusto, o adágio romano vigorou por dois milênios até que a revolução digital destas últimas décadas viesse injetar um grão de areia no azeitado mecanismo. De fato, escritos podem ser facilmente destruídos, enquanto dados digitalizados tedem a ser reproduzidos e conservados com segurança.

Toda moeda, no entanto, tem duas faces. Adulterar documentos escritos é possível, mas não é tarefa simples. Rasuras e correções costumam deixar rastro, ao passo que fraude em dados digitais é muito mais difícil de detectar.

Caramuru 1Faz duas semanas, soltei fogos ao receber a notícia do fim do voto eletrônico no Brasil. Infelizmente, não eram fogos Caramuru, aqueles que nunca dão chabu. A esmola era grande demais para sacola pequena. A boa-nova não se manteve de pé.

A crer no desmentido que acaba de surgir, continuaremos a apertar botões na hora de escolher representantes. E estaremos na incapacidade de conferir se a opção de cada eleitor terá sido realmente respeitada.

Era bom demais pra ser verdade. Em matéria eleitoral, a exceção brasileira prossegue. A comprovação de nosso voto continuará embrulhada nos mistérios impenetráveis da informática e avessa a toda tentativa de autentificação. É pena.

Fim do voto eletrônico

José Horta Manzano

Dizem que o saco de Papai Noel anda meio vazio e que, este ano, muitos se deverão contentar com presente magro. Se presente houver. Bom, reconheçamos que todo ano dizem a mesma coisa. Assim mesmo, este Natal leva jeito de ser ainda menos folgado que os anteriores.

Papai Noel 4Na esfera pessoal, o que acabo de dizer é verdadeiro. No entanto, ainda que nem todos se deem conta, o bom velhinho já trouxe um presentão para o aperfeiçoamento da democracia brasileira: acabou-se o voto eletrônico! Não é esperança nem suposição: saiu no Diário Oficial de ontem. A maquineta de que meio mundo desconfia vai para o museu das antiguidades obsoletas. Fará companhia à palmatória, à galocha e ao toca-fitas.

De maneira sutil e elegante – atitude rara nestes tempos brutais – o abandono foi atribuído à falta de dinheiro. Tenho cá minhas dúvidas. Se as 400 mil urnas ainda tivessem de ser compradas, podia até ser. Mas elas já existem. Organizar a votação e a logística é gasto que terá de ser feito de qualquer maneira, seja o voto eletrônico ou tradicional.

Urna 9É permitido supor que o pessoal do andar de cima tem sentido a pressão da opinião pública. Anestesiada durante dez anos pela falácia de um governo que se autodefinia como «popular», a nação deu mostra de haver despertado. Começou, bruscamente, com os protestos de junho de 2013. Continuou com a monumental vaia à presidente no jogo de abertura da Copa. De lá pra cá, os escândalos do petrolão trouxeram a todos nós mais emoção que final de novela. Não passou uma semana sem revelação escabrosa. Coisa nunca antes vista nessepaiz.

Já disse e repito que nunca ouvi falar de país, além do nosso, que se valha unicamente do voto eletrônico – sem controle e sem comprovante – para eleger representantes. É, como se diz, uma ‘jabuticaba’, uma exclusividade nacional. Jabuticaba bichada.

Urna 5Se o voto tradicional, com cédula e urna transparente, for mantido nas eleições de 2018, pode o distinto leitor ter certeza: saberemos, finalmente, quem são os escolhidos pelo povo brasileiro. Dificilmente serão os mesmos que hoje lá estão. As dúvidas sobre a lisura do pleito desaparecerão.

Alegremo-nos, irmãos, com a melhor notícia do mês – verdadeiro presente de Natal adiantado!

Urna eletrônica na França

José Horta Manzano

Faz anos que dois grandes partidos condividem a cena política francesa: UMP (direita) e PS (esquerda). É verdade que o atual marasmo econômico alavancou um terceiro ator, a Frente Nacional, partido de extrema-direita, que se vale de métodos populistas. Sua ascensão vem assustando muita gente.

Daqui a oito dias, os afiliados à UMP (União por um Movimento Popular) votarão para eleger o presidente do partido. O voto será eletrônico, método praticamente desconhecido na França.

Vozes já se alevantam dentro da agremiação para denunciar a alta periculosidade do sistema. Muitos veem, no voto eletrônico, risco grande de fraude, de pirataria cibernética, de sobrecarga e falha na consolidação de dados.

UMPNo entourage de Nicolas Sarkozy – antigo presidente da República e atual candidato a dirigir o partido – estão os que mais desconfiam do sistema. Na França, cargo de presidente de partido político é trampolim excepcional para projetar-se e atingir esferas mais altas.

François Mitterrand, antes de ser eleito ao posto máximo da República, tinha sido presidente de partido. O mesmo aconteceu com Jacques Chirac e com François Hollande. Daí a preocupação de Nicolas Sarkozy. Conquistar o cargo de presidente da UMP é, para ele, de capital importância.

François Hollande, que preside o país atualmente, anda amargando índice de popularidade próximo de zero. Assim como no Brasil já se ensaiou um tímido «Volta, Lula!», na França também começa a se elevar um «Retourne, Sarkô!».

Pode até ser que dê certo. Com duas condições: se o voto eletrônico da semana que vem não atrapalhar; e se, mais adiante, a Frente Nacional não melar o jogo. De todo modo, ainda faltam dois anos e meio para a eleição presidencial.

Como se vê, desconfiança com voto eletrônico não é exclusividade nossa.

Frase do dia — 206

«Cientistas da computação tiveram mais tempo para estudar sistemas de votação similares usados nos EUA e na Europa, e em todos eles, sem exceção [ênfase do entrevistado], os pesquisadores encontraram vulnerabilidades graves que poderiam comprometer a privacidade do eleitor e permitir que atacantes alterassem os votos.

Nos Estados Unidos, eu mesmo demonstrei um vírus de urna eletrônica que poderia infectar uma urna e silenciosamente se disseminar para outras, comprometendo os resultados das eleições de um estado inteiro.»

J. Alex Halderman, professor da Universidade de Michigan e autoridade mundialmente reconhecida em segurança de votação eletrônica ao discorrer sobre o sistema em vigor no Brasil. A entrevista foi publicada pelo portal Brasil Post em 7 nov° 2014.

Urna eletrônica

José Horta Manzano

Os brasileiros costumam se orgulhar da excelência de seu atual sistema eleitoral. A máquina de votar ― apelidada, por extensão de sentido, de «urna eletrônica» ― trouxe um avanço impressionante. Guindou o País à modernidade. Será mesmo?

É verdade que a contagem dos boletins nos anos 50, 60 era lenta, muito lenta. Ao final da votação, encerrado o trabalho das secções eleitorais, as urnas eram lacradas e levadas, sob escolta policial, até uma central de apuração. Permaneciam ali estocadas e intocadas, sob guarda constante, até o dia seguinte, quando as equipes começavam a abrir uma por uma e a contar voto por voto, sob o olhar atento dos fiscais despachados pelos partidos.

Voto com cédula

Voto com cédula

Demorava, é verdade. O resultado definitivo de uma eleição nacional saía, na melhor das hipóteses, 3 ou 4 dias após a votação. Mas podia muito bem demorar duas semanas ou até mais.

Quando os franceses querem lembrar que é impossível ter tudo na vida, dizem que «on ne peut avoir le beurre et l’argent du beurre», não se pode ter a manteiga e o dinheiro da manteiga. Se a eleição à moda antiga, com cédula de papel, apresentava o inconveniente da lentidão da apuração, por outro lado era mais efetiva em caso de contestação. Uma recontagem dos votos era possível e até fácil de fazer.

Já o novo sistema ― eletrônico, sofisticado e modernoso ― me deixa com um pé atrás. Quem me garante que os números que teclei serão realmente creditados ao candidato que escolhi? Quem passou atestado de idoneidade aos gênios que programam aquelas engenhocas? Quem certifica que não há colusão entre as partes para beneficiar este ou aquele candidato, este ou aquele partido?

O exercício da democracia é alicerçado pelo voto popular, mas ainda não foi inventada maneira infalível de banir o risco de fraude. Portanto, a prioridade deveria ser a transparência e a exatidão no cômputo dos votos, não a rapidez da apuração.

Urna transparente

Urna transparente

A meu conhecimento, nenhum país europeu adotou o voto eletrônico. Por aqui pode-se votar na secção eleitoral, por correspondência, por procuração, por antecipação. Experiências têm sido tentadas até com voto via internet. No entanto, nada de «urna eletrônica». Donde se conclui que os europeus estão atrasados nesse particular? Eu não iria tão longe.

Se me fosse dado decidir, eu ficaria com o melhor de cada um dos sistemas. Explico.

1) Revogaria o direito de voto dos analfabetos. Um cidadão que não tem condições de ler ou de escrever num pedaço de papel o nome de seu próprio candidato é presa fácil para o voto de cabresto. É obrigação do Estado alfabetizar a população. Que o façam.

2) Voltaria ao voto à moda antiga, cabine com cortininha, cédula de papel e urna de material transparente.

3) Estenderia aos mesários a obrigação de contar os votos de sua secção. Terminada a votação, cada urna seria aberta na presença de todos os mesários e de eventuais fiscais partidários. Os votos seriam contados à vista de todos. Como se faz no resto do mundo.

4) Utilizaria os modernos meios eletrônicos para a transmissão dos resultados. Terminada a contagem, o resultado seria transmitido por canais especiais a uma central de totalização. As cédulas seriam conservadas para eventuais confrontações.

Essas mudanças tirariam a pulga que hoje vive atrás da orelha de muito cidadão.Interligne 38

Interligne 3eRecebi hoje de uma amiga um desses textos apócrifos que circulam pela internet. Não se pode saber quem o escreveu, nem se corresponde à verdade. Mas não deixa de ser um grito de alerta.

«Na verdade, não parece estranho que os países adiantados repudiam a urna eletrônica? Está aqui uma das inúmeras possibilidades de fraude à luz do dia.

Já fui fiscal de eleições duas vezes e sempre achei o sistema vulnerável. Numa das vezes,uma urna enguiçou.

Chamamos o TRE, que nos enviou um técnico, um rapaz de seus vinte anos. Pedi a ele que se identificasse e perguntei se era funcionário do TRE. Respondeu-me que trabalhava para uma firma terceirizada.

Abriu a urna, extraiu o disquete dela, tirou do bolso trazeiro da calça jeans um novo disquete e se preparava para instalá-lo no lugar do original. Antes que ele completasse a operação, pedi que me deixasse examinar o novo disquete. O apetrecho trazia apenas uma etiqueta do TRE, um carimbo, uma assinatura e um número de série. Nada provava que o disquinho fosse autêntico, neutro e seguro.

Perguntamos ao rapaz se a mesa tinha de autorizar a troca e autenticar o novo disquete. Ele disse que não, não precisava de nenhuma comprovação. E foi-se embora levando o disquete danificado.

Passei a ter minhas dúvidas sobre a segurança do sistema.»