Coronavoucher

José Horta Manzano

O Instituto PoderData publica sua mais recente pesquisa sobre a percepção do eleitor quanto ao trabalho de doutor Bolsonaro. A opinião de 2500 cidadãos representativos da população brasileira, distribuídos nas 27 unidades da Federação, é incontestável: a popularidade do doutor cai. As curvas se cruzaram, mostrando que a desaprovação (48%) supera a aprovação (42%).

Analistas atribuem a queda de aprovação a diversos fatores. Entre eles, está a chegada da vacina, fato que contraria a postura de um Bolsonaro descaradamente hostil, sobretudo em se tratando da vacina chinesa. O crime do Carrefour é outro acontecimento que, tendo em vista o silêncio do presidente, convence o eleitor de que o governante é racista, ensimesmado e distante do país real. Por último, o mais importante: o fim anunciado do coronavoucher.

O fracasso de quase todos os candidatos a prefeito apoiados pelo presidente já era sintoma do declínio de sua influência – se é que um dia ela foi benéfica. Ao fim e ao cabo, vai ficando claro que a subida do nível de aprovação é que foi o ponto fora da curva. Bolsonaro está retornando ao fundo das estatísticas. A Lei da Gravitação, cláusula pétrea da Constituição do planeta, ensina que tudo aquilo que sobe acaba descendo um dia.

Coronavoucher
Quando a situação aperta e o fim do mês está longe, o funcionário pede um vale por conta do salário. O passado recente da nação está salpicado de outros vales: vale-transporte, vale-gás, vale-brinde, vale-refeição.

Curiosamente, na hora de dar nome ao auxílio especial ligado à epidemia, poucos disseram vale-corona. A expressão que se firmou foi coronavoucher. Minha hipótese é de que o termo coronavírus, já no ouvido de todos, terá contaminado.

Voucher era um verbo do francês medieval, usado em textos administrativos. Significava chamar, dar nome a e tinha as formas vochier/vogier. Nos anos 1300, atravessou o Canal da Mancha e foi enriquecer o inglês.

É interessante que o termo desapareceu da língua francesa, enquanto permanece vivíssimo em inglês. O pai de família é o verbo latino vocare. Em nossa língua, temos numerosos descendentes: vogal, vocábulo, vocação, advogado, convocar, evocar, invocar, provocar, revogar, equívoco, provocação. Há inúmeros outros.

Tuíte – 17

José Horta Manzano
Chanceler Federal (Bundeskanzler) é o título que se dá na Alemanha ao chefe do governo.

Faz hoje exatamente 15 anos ininterruptos que a chanceler Frau Angela Merkel (1949-) ocupa o posto. É longevidade pra ninguém botar defeito.

O poder costuma desgastar, mas parece que os anos não têm afetado a popularidade de Merkel. Ao contrário, sua imagem melhora a cada dia. O exemplo maior está ocorrendo agora mesmo. Desde o começo da pandemia, sua popularidade subiu incríveis 21 pontos. Este mês, está em 74%, um nível de fazer inveja a qualquer dirigente. Seu modo de gerenciar a crise da covid é a razão principal da satisfação popular.

Infelizmente, em nosso país, a gestão da pandemia não tem trazido melhora na imagem do presidente. É pena porque, se ele perde, perdemos nós também.

Aprovação presidencial

José Horta Manzano

O Brasil é um poço de problemas. É um pote até aqui de injustiça, desigualdade e desesperança. Como resolver? Nada é impossível, mas a tarefa é gigantesca. Seria coisa pra duas ou três gerações. Essa conta só vale se houver verdadeira vontade. Como sabemos, verdadeira vontade não há. Portanto, nada vai começar a mudar. Vamos continuar esperando o messias, que esse que está aí não serve.

Toda e qualquer tentativa de esvaziar o poço de problemas e de elevar o nível civilizatório das gerações futuras passa obrigatoriamente pela educação. Não é razoável nem necessário exigir que todos recebam formação acadêmica; escola fundamental já está de bom tamanho, desde que a instrução seja de boa qualidade.

Se alguém ainda duvidava que uma pessoa instruída enxerga o mundo com outros olhos, eis um cala-boca: a mais recente pesquisa do Instituto Atlas. A sondagem, que acaba de ser publicada, constata que 56% da população reprova a atuação do presidente Bolsonaro, enquanto 40% a aprovam.

Esse é o número total, o somatório de todos os entrevistados. Veja agora a diferença que um pouco de estudo faz na capacidade de entendimento de cada um. Dos que fizeram curso superior, 70% reprovam o presidente, enquanto 30% aprovam (ou não respondem). Na outra margem, entre os que não foram além do ensino fundamental, as proporções praticamente se invertem: 60% o aprovam, enquanto 40% desaprovam (ou não sabem).

O distinto leitor sabe que o doutor é um estropício, uma pedra no caminho do Brasil, um prenúncio de tempos ainda mais difíceis que os atuais. Mas essa clareza de visão é privilégio de quem recebeu boa formação – aquela que abre as portas para a boa informação.

Nos tempos do lulopetismo, ainda havia a desculpa da ideologia – muitos se recusavam a admitir que os elevados ideais eram anulados pela vil roubalheira. Hoje, essa desculpa desapareceu. Ideologia não há, o que há é a ignorância rasteira de um governo que está mais para associação mafiosa. Só não se dá conta quem não consegue.

A força do Congresso

José Horta Manzano

Artigo publicado pelo Correio Braziliense em 28 dezembro 2019.

A névoa de destempero que envolve nosso bizarro presidente e seus áulicos é tão fora dos padrões que embaralha as cartas do jogo político. Notícias de velhos e obstinados ‘malfeitos’ atribuídos a membros do clã se embolam com a belicosa verbosidade presidencial para tecer o enredo do angustiante drama que continua em cartaz no Planalto. Faz um ano que analistas de alto estofo tentam – sem sucesso – decifrar o indecifrável. Nada de significativo ressalta das atividades presidenciais senão vingança, mesquinhez, paranoia. O prato feito que nos é servido todos os dias é sempre o mesmo. Fica a impressão de que, se alguma coisa ainda caminha no país, é por inércia ou por obra samaritana de funcionários dedicados.

A permanência, no mando, de mentes perturbadas monopoliza a atenção da nação. O espalhafato da cúpula manda pra escanteio tudo o mais. É pena porque dá recado distorcido. Embora não pareça, o clã do Planalto não segura sozinho as rédeas do país. Para o que der e vier, está aí o Congresso, sustentado por naco robusto do voto dos brasileiros.

No entanto, recente pesquisa do Instituto Datafolha atesta que só 14% dos que votaram nas últimas eleições avaliam positivamente o Congresso atual. E pensar que a legislatura deu partida há um ano justinho, com eleitos que sequer cumpriram o primeiro quarto do mandato. O motor ainda nem esquentou e Suas Excelências já rolaram para o vale dos enjeitados. Apenas 1 em cada 7 brasileiros vê Senado e Câmara com bons olhos. Como é possível? Os cidadãos nem bem elegeram seus representantes, e já se declaram arrependidos. É difícil de entender. Abstenção maciça ou número expressivo de votos nulos e brancos seria uma explicação. Mas os eleitores brasileiros votaram em massa. Exprimiram-se. Um ano depois, já foi tudo por água abaixo? Sozinha, a monopolização da cena política pelas estrepolias do Planalto não explica o desamor.

A mesma pesquisa informa que, às vésperas da inauguração da atual legislatura, 56% dos eleitores botavam fé nos parlamentares. A queda brutal, em um ano, de 56% para 14% só tem uma explicação plausível: os eleitores votaram às cegas, sem saber direito quem estavam elegendo. Sabe-se que, no geral, o eleitor brasileiro não se lembra do nome dos candidatos em que votou; mesmo que se lembrasse, não poderia ter certeza de que seu voto beneficiou realmente o candidato escolhido ou se foi sequestrado e desviado para a sacola de um desconhecido.

Voto distrital: representação artística

Nosso sistema eleitoral é viciado. O voto proporcional foi pensado para um cenário de partidos fortes. Não é nosso caso. O panorama partidário está esfarelado em uma torrente de agremiações, algumas minúsculas. Ideologia e propósitos tendem a ser pouco claros. Num quadro fragmentado a esse ponto, ‘dono’ de partido nanico sonha em conseguir a afiliação de um figurão de renome – futebolista, artista, pouco importa, desde que seja conhecido. Será o puxador de voto. A montanha de sufrágios que receber elegerá figuras desconhecidas, que perigam engrossar o baixo clero. E o eleitor, sem se dar conta, terá sido defraudado.

Fora do voto distrital puro, não há solução. Com ele, as vantagens serão múltiplas: proximidade entre eleitor e eleito, forte tendência ao desaparecimento de siglas de aluguel, enxugamento da fragmentação partidária. Cada um saberá sempre quem é SEU deputado, aquele que representa seu distrito de residência, o que facilita a cobrança. Outra consequência benéfica será o barateamento das campanhas, pois cada candidato se limitará a vender seu peixe dentro do próprio distrito. E mais: a falta de um deputado provocará eleição parcial somente naquele distrito, eliminando a figura esquisita do suplente.

Em períodos turbulentos como este que atravessamos, em que a Presidência derrama decretos desvairados a três por dois, sobressai a importância de um legislativo esclarecido e competente. Juntos, os parlamentares têm mais força que o presidente. Podem fazer a lei, desfazê-la e até derrubar vetos presidenciais. Oxalá a introdução do voto distrital puro intervenha rapidamente. É aprimoramento republicano bem-vindo. Feliz ano-novo a todos!

A queda de Bolsonaro

José Horta Manzano

Grande estardalhaço se está fazendo em torno da queda de aprovação que castiga doutor Bolsonaro. O Instituto Datafolha, que vem fazendo esse tipo de levantamento desde os tempos de Collor de Mello, afirma que nenhum presidente em primeiro mandato sofreu, em tão pouco tempo, baixa de popularidade tão significativa. Para ser confiável, um levantamento tem de partir de bases concretas e comprovadas. Ora, no caso em questão, acredito que esses alicerces estejam faltando.

O Instituto diz que, aos três meses de mandato, FHC era aprovado por 39% da população, Lula da Silva chegava a 43% e a doutora atingia incríveis 47%. Na rabeira, doutor Bolsonaro não passa de 32%. À vista desses números, analistas afirmam que a queda de popularidade do atual presidente foi vertiginosa. Queda? Será mesmo? Tenho cá minhas dúvidas.

Para medir a queda, será preciso conhecer a aprovação do presidente no momento da eleição. A tarefa é impossível, dada a ausência de levantamento. Que fazem, então, os analistas? Partem da hipótese tácita de cada presidente, no momento da eleição, ter contado com aprovação plena. Visto que é virtualmente impossível alguém ser unanimemente aprovado, parte-se do pressuposto de todos os presidentes terem iniciado no mesmo patamar de aprovação, um número próximo da porcentagem de votos com que cada um foi eleito. É aí que reside o erro.

FHC, Lula e Dilma foram eleitos pelos méritos que o eleitor sabia que tinham ou supunha que tivessem. Portanto, pode-se considerar que seus eleitores ‒ que representam, grosso modo, metade do eleitorado ‒ votaram neles porque os aprovavam. Assim, esses três presidentes partem de um mesmo patamar de aprovação. A comparação entre a queda de cada um deles é válida. Já o caso de doutor Bolsonaro é diverso.

Parte considerável dos que votaram no atual presidente não o fez por convicção mas por exclusão. Votaram nele não por adesão à causa bolsonarista, mas para esconjurar o espectro da volta do petismo. Portanto, ainda que possa soar paradoxal, boa parte dos eleitores de Jair Messias não aprovava o personagem já àquela altura. Foram votar de nariz tapado, só pra afastar o mal maior. Já estavam de má vontade, preparados pra lançar um olhar pra lá de crítico ao novo governo.

É o que está ocorrendo. Acredito que os 32% que agora aprovam doutor Bolsonaro são o núcleo duro de seus eleitores, aqueles que o escolheram pelos méritos que tinha ou se supunha tivesse. A diferença entre esse patamar e os 55% ‒ sua votação total ‒ representa aquela porção do eleitorado que lhe deu ‘voto útil’. Não sendo bolsonaristas desde criancinhas e vendo que o perigo petista se afastou, esses cidadãos têm dificuldade em aprovar um presidente que, ainda por cima, não é lá essas coisas. Assim, aguçam suas críticas.

É o que me parece. A aprovação do presidente não “caiu”. O fato é que ela nunca esteve lá em cima. Portanto, não pode ter “caído” de uma altura onde nunca esteve.

A contradança

José Horta Manzano

Com a redemocratização, começaram a ser feitos levantamentos de opinião pública para aferir a popularidade do presidente. Já temos hoje um estoque de 25 anos de dados, prazo que confere credibilidade a essas pesquisas. Hoje é possível comparar a marca atingida pelos diferentes presidentes em determinadas fases do mandato.

Os números referentes a doutor Bolsonaro, quentinhos do forno, acabam de ser publicados pelo Ibope. Ao dá-los a público, a mídia se encarregou de os confrontar com o escore obtido pelos presidentes anteriores, cuja popularidade foi medida na mesma altura do mandato. O resultado é desastroso.

O histórico de aprovação de governo inclui os presidentes Collor de Mello, FHC, Lula da Silva e Dilma Rousseff ‒ uma boa amostragem. Os resultados referentes a doutor Bolsonaro informam que a pontuação do presidente atual é inferior à de qualquer outro presidente no terceiro mês de mandato. (Do cálculo, estão excluídas as avaliações de presidentes em segundo mandato.)

Nem Collor, nem Dilma ‒ que seriam mais tarde destituídos ‒ sofreram apreciação tão baixa já no terceiro mês. No caso deles, a degradação da opinião pública só se manifestou mais tarde. Se eu estivesse na pele de doutor Bolsonaro, levaria muito a sério esses primeiros resultados. É hora de parar pra pensar, analisar, descobrir onde é que a engrenagem está pegando e tratar de consertar rápido antes que seja tarde.

É verdade que não precisa pensar muito pra encontrar o problema. Ele não decorre das ações do governo, praticamente inexistentes até aqui. Vem, antes, da contradança entre o despreparo e a incapacidade. As ações dos três irrequietos primeiros-filhos tem dominado a crônica de costumes.

Não se passa um dia sem que um deles não protagonize episódio bizarro. Por capricho ou vaidade, já derrubaram até ministro. Já armaram futricas contra gente graúda. Já cutucaram militares. Já se indispuseram com meio mundo. Na louvável intenção de ajudar o pai, ainda vão ser responsáveis por sua perdição. O levantamento do Ibope está aí plantado como presságio: «Depois não digam que não avisei».

Mal-informados

José Horta Manzano

Artigo publicado pelo Correio Braziliense em 26 maio 2018.

A percepção que se tem de um personagem pode variar dependendo do ponto a partir do qual se observa. O fenômeno é especialmente sensível na área política. Um figurão adorado e incensado no próprio país pode ser visto com muita reserva e até com prevenção por quem está fora. Inversamente, o medalhão mal-amado na própria pátria é às vezes festejado no estrangeiro.

Um bom exemplo é Mikhail Gorbatchov, o último czar soviético. As efusivas manifestações de que foi alvo, na virada da década de 80 para a de 90, de tão intensas, receberam até nome próprio: gorbymania. Visto como artífice da paz mundial, o homem era aclamado, por onde passasse, por multidões entusiasmadas. Enquanto isso, os cidadãos soviéticos lançavam ao personagem um olhar pra lá de crítico. Sua popularidade no exterior não se repetia no interior das fronteiras. Até hoje, passados trinta anos, enquanto o Ocidente guarda inabalável ternura por Gorbatchov, muito russo ainda pragueja contra aquele que pôs abaixo o “Ancien Régime”.

Mikhail Gorbatchov

Na polaridade inversa, bom exemplo é Donald Trump, o polêmico presidente dos EUA. No exterior, é perscrutado com desconfiança unânime. Nunca se sabe qual será a bravata seguinte. Ao redor do planeta, todos temem ser incomodados pela próxima tempestade provocada pela Casa Branca. Já para os que vivem dentro das fronteiras americanas, o diabo não é tão feio assim. Boa parte do eleitorado abomina, sem dúvida, o figurão. Mas seus fiéis, os que lhe garantiram a vitória, não se decepcionaram. Na hora agá, o homem se revela excelente tenista: rebate, um a um, os escândalos de que é acusado. Todas as denúncias resvalam e nenhuma consegue derrubá-lo. O homem tem ainda três anos de mandato pela frente, mas é de crer que, no final, se reeleja. E com folga.

Essa dualidade de apreciações está se manifestando em nossas plagas. Lula da Silva, como sabemos, já foi dono de popularidade imperial. A crer nas sondagens, ao deixar a presidência recebia aprovação de oito em dez brasileiros. Por infelicidade, de lá pra cá o Brasil virou país do assombro. Nos anos recentes, não tem passado uma semana sem revelação de novos escândalos de corrupção. O partido que Lula da Silva ajudou a fundar trinta anos atrás ‒ e que prometia purificar o cenário político ‒ foi decapitado. Sua cúpula está atrás das grades, condenada por fatos de corrupção.

Donald Trump

Os brasileiros acompanharam a derrocada, em colheradas diárias servidas ao molho do desgosto. Atônitos, nos demos conta de ter sido vítimas de assalto monstruoso, covarde e prolongado. O pão dos pobres ficou mais duro e o leite das criancinhas, mais ralo. Manifestamos nossa indignação, defenestramos uma presidente problemática e conseguimos que, ao fim de muito vaivém, o rigor da lei despencasse sobre o ex-presidente. Já vão longe os tempos em que ele surfava sobre oitenta por cento de admiradores. Pelo menos cinquenta já debandaram, deixando ao figurão magros trinta porcento de irredutíveis. O antigo líder é hoje rejeitado por dois em três brasileiros.

No entanto, no exterior ‒ com ênfase na Europa ‒ a percepção de Lula da Silva não parece ter-se deteriorado. Volta e meia, um reclamo se alevanta contra sua prisão. Vozes ousadas desacatam o Estado brasileiro e desdenham nosso ordenamento jurídico. Homens políticos simpáticos ao ex-presidente exigem que justiça seja desfeita, que Lula seja absolvido e que lhe seja permitido concorrer à presidência. Como explicar tamanha discrepância entre o juízo interno e o externo?

Lula da Silva

Via de regra, os protestos são exprimidos por líderes socialistas. Acossado pelo populismo, o movimento socialista europeu luta para não se extinguir. Lula da Silva, aquele que um dia foi chamado «o cara», evoca, na memória coletiva do Velho Mundo, um modo socialista de governar. A conclusão é fácil: ele serve de tábua de salvação para políticos que perderam a aura.

Um dos mais incisivos é señor Zapatero, aquele que foi um dia primeiro-ministro da Espanha. Intercede com ímpeto pela libertação de Lula da Silva. Pois é esse mesmo senhor que, atuando como observador das recentes eleições venezuelanas, afiançou a lisura do processo. Precisa dizer mais?

Todos culpados

José Horta Manzano

O Instituto Ipsos, especializado em pesquisa de opinião, testou a percepção que os brasileiros têm de 20 personalidades. Foram escolhidos 19 personagens políticos ou da alta administração. Para completar os 20, selecionaram ‒ sabe-se lá por que razão ‒ um homem de televisão.

Pesquisa Ipsos – Infográfico Estadão
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Excluindo justamente o homem de televisão, todos os personagens são mais rejeitados que aprovados. Não sobra nenhum. Os entrevistados torcem o nariz para todos eles, sem exceção. Começa com doutor Michel Temer, alvo da desaprovação mais eloquente, e vai até doutor João Doria, que recolhe a rejeição menos brutal. A desaprovação de doutor Aécio é fenomenal. Há que reconhecer que aquele que recolheu metade dos votos nas mais recentes eleições presidenciais foi o que mais decepcionou. É mais repelido que o próprio Lula, que, por sua vez, é mais rejeitado que doutor Bolsonaro.

Nota-se que algumas figurinhas carimbadas da política ficaram fora do questionário. Penso em doutor Maluf, doutor Sarney, doutor Collor, dona Marta Suplicy. Enfim, a selva de gente enrolada com a justiça ou com a opinião pública é tão densa que fica difícil estabelecer uma lista.

O mesmo instituto testou também a aprovação popular de sete figurões da Justiça tomados ao acaso. (Ou, talvez, não tão ao acaso assim.) No topo da desaprovação, aparece doutor Gilmar Mendes. Doutor Sergio Moro é quem sai melhor na foto. Surpreendentemente, medalhões como doutores Lewandowski e Toffoli não entraram na seleção.

Pesquisa Ipsos – Infográfico Estadão
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Ao fim e ao cabo, que me perdoe o distinto leitor pela vulgaridade, fica a impressão generalizada de saco cheio. Dado que boa parte dos entrevistados não deve ter ideia precisa de quem possam ser doutores Paulo Skaf, Tasso Jereissati ou Nélson Jobim, é de acreditar que a reprovação vale para todos. Parafraseando George Orwell, fica assim: embora alguns sejam mais culpados que outros, no fundo, são todos culpados.

O rodamoinho da corrupção traga todo o andar de cima, que sejam culpados, condenados, suspeitos ou juízes. Sobra para todos. Só não será reprovado… quem não for mencionado.

Observação
Seria extremamente interessante se a pesquisa tivesse ido mais fundo. Deveriam ter perguntado a razão da aprovação (ou desaprovação) de cada nome citado. Do jeito que está, embora pareça espetacular, a análise dos resultados não permite ir além de conjecturas.

Frase do dia — 267

«Poucas vezes terá havido situação semelhante à deste nosso banquete de horrores no qual 90% dos comensais declaram ter nojo da comida que lhes tem sido servida, mas são obrigados a continuar a tragá-la simplesmente porque não sabem pedir outro prato.»

Fernão Lara Mesquita, jornalista, em artigo publicado pelo Estadão, 24 out° 2015.

O sete de setembro aqui e ali

José Horta Manzano

Sete de setembro não é feriado na França. Esta segunda-feira é dia como qualquer outro. O presidente da República, François Hollande, está concedendo entrevista coletiva a uma plateia de jornalistas. O formato é clássico: primeiro, fala o presidente; em seguida, jornalistas fazem perguntas.

A popularidade das personalidades políticas francesas é aferida mensalmente. A do presidente, embora seja bem superior aos 7% de dona Dilma, não vai além de 26% dos entrevistados. Um presidente impopular.

François Hollande 7Entrevistas coletivas presidenciais na França são organizadas duas vezes por ano. Ainda que a aprovação do presidente esteja lá no fundo, não há previsão de panelaço. Nem de colheraço. Os céus de Paris não perigam ver boneco inflado vestido de presidiário.

É permitido concluir que as vaias de que dona Dilma é obrigada a fugir não são unicamente fruto da baixa popularidade. O peso da roubalheira é que é insuportável. O sentimento de ter sido assaltado causa frustração e revolta. Eis o cerne da bronca dos brasileiros.

Pensando bem – 7

José Horta Manzano

0-Pensando bem

Pra fazer uma sondagem
e encontrar opinião,
é preciso ter coragem,
escapar da malandragem,
caprichar na rechecagem
e contar tudo ao povão.

Um instituto conhecido
pela sua exatidão
anda quieto e encolhido
já não diz mais ter ouvido
a voz da população.

Pesquisou, já várias vezes,
o tal grau de aprovação
do governo do País.
Mas agora, já faz meses
que me deixam infeliz:
não há mais publicação!

O silêncio é contundente
e me deixa encafifado.
No fundo, quem me garante
que, neste Brasil amado,
inda temos presidente?

Frase do dia — 242

«O embaixador Guilherme Patriota foi atingido na testa porque passou pelo plenário na hora do tiroteio contra Luiz Fachin. Para salvar Fachin, mataram Patriota.»

Eliane Cantanhêde, em sua coluna do Estadão, 20 mai 2015.

Pesquisa de opinião – 2

José Horta Manzano

Dilma 9Este post faz eco a meu artigo de ontem. O grupo Folha de São Paulo há de ter-se dado conta de que sua “contagem científica” dos participantes da passeata de domingo 15 de março pegou mal pra caramba. O pouco que pudesse restar de credível à imagem do Instituto Datafolha sofreu sério arranhão. A partir de agora, duvido que alguém, com intenção honesta de conhecer a verdade verdadeira, arrisque confiar a sondagem a esse instituto.

Além de deixar no ar a suspeita de que suas pesquisas podem ser ‘negociadas’, a instituição deixa patente sua miopia estratégica. De fato, sondagens têm mais vocação para serem lidas pelos estratos esclarecidos da população. Logo, a trapalhada consiste em serrar precisamente o galho onde se está apoiado.

by Chico Caruso, desenhista paulista

by Chico Caruso, desenhista paulista

A duvidosa estimativa do número de participantes da manifestação de domingo passado assestou pancada pesada à credibilidade do instituto. Eles sentiram o golpe, sim. E a prova está em destaque no sítio do jornal.

Numa tentativa de amenizar suspeitas de parcialidade, a Folha traz, neste 18 março, o resultado de sondagem mostrando a baixa catastrófica na apreciação de nossa mal-amada presidente.

Sei não. Muitas pesquisas sérias terão de ser publicadas para alçar a confiabilidade do instituto ao patamar anterior.

Chamada de 18 mar 2015 - in Folha de São Paulo

Chamada de 18 mar 2015 – in Folha de São Paulo

Você acredita?

José Horta Manzano

Estatísticas 1Saiu o resultado da última sondagem do Ibope. Mede a aprovação do atual governo. Segundo o instituto, a maneira de governar de dona Dilma, que era aprovada por 48% dos entrevistados em setembro, subiu a espantosos 52%.

Uma conclusão se impõe: escândalos de corrupção nas altas esferas são proveitosos para o governo. Se outras falcatruas continuarem a ser descobertas – e tudo indica que ainda há muita sujeira a ser revelada – a presidente periga terminar seu quadriênio com aprovação staliniana, coisa de 90%–95%.

Desse jeito, ainda vai conseguir cacife para modificar a Constituição e obter um terceiro mandato. O Lula que se cuide!

Quando a esmola é muita, o santo desconfia. Ah, essas pesquisas…