Pra estragar o carnaval

José Horta Manzano

Estes dias de carnaval anestesiam o Brasil. Políticos entram em recesso, a classe média tira férias, o povão tem folga. O país vive entre parênteses e (quase) chega a esquecer as mazelas. Fica a impressão de que, por um momento, o país sossegou.

Infelizmente, não passa de ilusão. Olhos estrangeiros, estranhos aos excessos momescos, permanecem alertas. Além-fronteiras, nossos problemas continuam (bem) visíveis. Eis um apanhado de manchetes de ontem.

Carnaval 1L’Express (França)
«Brésil: le fils de Pelé condamné en appel à près de 13 ans de prison»
«Brasil : o filho de Pelé condenado em segunda instância a quase 13 anos de cadeia»

Der Spiegel (Alemanha)
«Gefängnisse in Brasilien: das Grauen hinter Gittern»
«Cadeias brasileiras: o horror atrás das grades»

Il Post (Italia)
«Il caso sulla corruzione in Brasile è tracimato»
«O caso de corrupção no Brasil transborda»
O artigo faz alusão à Lava a Jato que se alastra por uma dúzia de países

Reuters (Reino Unido)
«Brazil faces almost lost decade due to crisis: economists»
«Segundo economistas, o Brasil enfrenta quase uma década perdida devido à crise»

L’Équipe (França)
«Brésil: l’électricité de retour au Maracana»
«Brasil: volta a eletricidade ao Maracanã»
O artigo esclarece que a luz do estádio maior havia sido cortada por falta de pagamento.

O estádio do Maracanã já conheceu dias melhores

O estádio do Maracanã já conheceu dias melhores

El Comercio (Peru)
«Brasil: ‘Campos de concentración’, una historia para el olvido»
«Brasil: ‘Campos de concentração’, uma história para esquecer»
O artigo relata história pouco conhecida de campos de concentração montados em 1915 e em 1932 para receber nordestinos flagelados pela seca excepcional.

AfärsLiv24 (Suécia)
«Brasilien: 12,9 miljoner arbetslösa»
«Brasil: 12,9 milhões de desempregados»

Meteoweb (Italia)
«Febbre Gialla: in Brasile emergenza in 64 città, 83 morti»
«Febre amarela: situação de urgência em 64 cidades brasileiras, 83 mortos»

The Times of India (India)
«Brazil’s worst-ever recession likely extended into 4th qtr»
«A pior recessão jamais ocorrida no Brasil entra no quarto trimestre»

Radio France Internationale (França)
«Brésil: sur fond de crise, un carnaval de Rio au goût amer»
«Brasil: em cenário de crise, um carnaval carioca de sabor amargo»

carnaval-13Public Radio International (EUA)
«Dozens of cities across Brazil are canceling Carnival»
«Dezenas de cidades brasileiras cancelam o carnaval»

L’Expansion – L’Express (França)
«Corruption au Brésil: un ministre clé mis en cause»
«Corrupção no Brasil: importante ministro implicado»

Sputnik News (Rússia)
«Brasil: en nueve meses renunciaron ocho ministros por sospechas de corrupción»
«Brasil: em nove meses, oito ministros renunciaram por suspeita de corrupção»

Berliner Kurier (Alemanha)
«Horror-Karneval in Brasilien: täglich werden bis zu 50 Kinder missbraucht»
«Carnaval de horror no Brasil: abuso de até 50 crianças a cada dia»

dilma-e-lofven-2Arbetaren (Suécia)
«Sveriges vapenexport till diktaturer ökar»
«Crescem as exportações de armamento sueco para ditaduras»
O artigo ressalta o maior contrato firmado no ano anterior: a venda dos aviões Saab-Gripen ao Brasil. O texto é ilustrado por uma foto de Dilma Rousseff instalada na cabine de um caça. Reparem que o jornal inclui o Brasil no rol das ditaduras.

Bom carnaval a todos !

Imbecilidade

José Horta Manzano

Señor Cabello, um dos bambambãs da hierarquia política venezuelana, esteve de visita ao Brasil dez dias atrás. Foi acolhido pelo Lula – chegaram a posar juntos, sorridentes, em fotos que saíram em todos os jornais. Embora a visita não tivesse caráter oficial, o estrangeiro foi assim mesmo recebido pela presidente da República. Dona Dilma abriu um espaço na agenda para honrar o ilustre braço direito do bondoso companheiro Maduro.

Agência Xinhua, China

Agência Xinhua, China

Oito senadores de nossa República embarcaram em avião da Força Aérea Brasileira para visitar presos políticos na Venezuela. Foram recebidos a pedradas por milicianos, convenientemente vestidos de vermelho, a soldo do governo do país hermano. A visita teve de ser interrompida.

Quando incapazes assumem funções de governo, tudo pode acontecer. É o que se tem verificado no Brasil e, em grau mais elevado, na sofrida Venezuela. Temendo que a visita de parlamentares estrangeiros pudesse servir de amplificador para o drama dos presos políticos, os brutamontes aboletados no Palacio Miraflores, de Caracas, raciocinaram de modo primitivo: sabotaram a visita.

Venezuela 2O tiro saiu pela culatra. Deu tudo errado. Tivessem os senadores visitado os presos, a notícia sairia na segunda página de jornais brasileiros. E mais nada. A ação de brucutu das autoridades venezuelanas fez o efeito exatamente oposto.

Jornais, rádios, tevês, portais, blogues do mundo inteiro repercutiram a notícia. Se alguém não sabia que houvesse presos políticos naquele país, agora sabe. Mais ainda: meteram dona Dilma numa saia justa ainda mais apertada do que a que ela anda vestindo. Um desastre.

É nisso que dá confiar responsabilidade a imbecis. Aqui está um florilégio do eco planetário suscitado pelas mazelas de um país atrasado.

The San Diego Union Tribune (EUA)
«Brazilian senators fail to meet with Venezuela opposition»

Latina Press (internacional)
«Venezuela: Chavistas greifen Senatsausschuss aus Brasilien an»

BBC (Reino Unido)
«Brazil senators flee Venezuela attack»

Agência Reuters (internacional)
«Venezuela gives landing permission for Brazil senators»

Deutsche Welle (Alemanha)
«Brazil senators blocked in Venezuela en route for visit to jailed opposition leader»

Venezuela al Día (Venezuela)
«Congreso de Brasil aprueba moción de repudio contra gobierno venezolano por agresión a senadores»

Entorno Inteligente (internacional)
«Después de las agresiones chavistas, los senadores brasileños se ven obligados a irse de Caracas»

Martí Noticias (EUA)
«Llegan a Caracas senadores brasileños en apoyo a presos políticos»

Abruzzo 24 ore (Itália)
«Venezuela: Accolgono a sassate delegazione di parlamentari brasiliani»

Venezuela al Día
«¡Que lo sepa el mundo! Senador Neves: “No nos queda duda de que en Venezuela no hay democracia”»

La Jornada (México)
«Condena Brasil ‘actos hostiles’ contra sus senadores en Venezuela»

Clarín (Argentina)
«Senadores brasileños van a Caracas y piden por los presos políticos»

Agência Xinhua (China)
«Líder de oposición brasileña critica que Venezuela no dio garantías de seguridad a comisión de senadores»

ABC Color (Paraguai)
«Senadores brasileños denuncian ataque y bloqueo en Venezuela»

Últimas Noticias (Venezuela)
«Gobierno de Brasil calificó de “inaceptable” lo ocurrido con senadores»

Futebol equilibrista

José Horta Manzano

Enchente do Rio Negro, nas cercanias de Manaus, inundou campos de futebol – já precários por natureza.

Sem paciência para esperar pela volta da secura, a juventude construiu uma plataforma flutuante, junto à margem do rio.

Cobrança de escanteio é verdadeiro espetáculo de equilibrismo. O treino de futuros craques continua.

A Agência Reuters tirou uma série de belíssimas fotos. Clique para aumentar.

Foto La Presse/Reuters

Foto La Presse/Reuters

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Foto La Presse/Reuters

Foto La Presse/Reuters

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Foto La Presse/Reuters

Foto La Presse/Reuters

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Foto La Presse/Reuters

Foto La Presse/Reuters

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Foto La Presse/Reuters

Foto La Presse/Reuters

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A função da imprensa

José Horta Manzano

Sintonizei a CBN para acompanhar o café da manhã deste sábado. Depois de ouvir as notícias da Europa, costumo me inteirar das novidades brasileiras. Com esses aparelhos de rádio atuais, conectados à internet, tudo ficou bem mais fácil.

Jornal mural ― anos 70

Jornal mural ― anos 70

Quando já é manhã por aqui, no Brasil são as que antigamente se chamavam «altas horas», não sei se os jovens ainda entendem. É quando o ponteiro das horas aponta lá pra cima. Os franceses costumam dizer «les petites heures » ― as pequenas horas ―, o que dá no mesmo. É hora boa pra ouvir notícia. Não se fala em tráfego, perdão!, em «trânsito».

Distraído, ouço de repente uma voz de mulher braba afirmar, em tom peremptório, que «investigar não é função da imprensa». Depois de um instante de estupefação, me dou conta de que é a presidente da República quem profere essa enormidade. E ela continua o discurso afirmando que cabe à imprensa apenas relatar o que já foi investigado por quem de direito.

Incomodada pela divulgação de um ‘malfeito’ atrás do outro, é compreensível que uma enfurecida Dilma Rousseff, incapaz (por enquanto) de calar a imprensa, lance suas flechas contra ela. Tem ela sorte de presidir um país cujo povo, calejado por tantos escândalos, já não dá mais atenção a miudezas.

Tivesse ela dito esse tipo de monstruosidade em terra civilizada, receberia de volta saraivada pesada vinda de uma nação indignada. Nossa presidente venturosa preside um povo ingênuo, amestrado a engolir mentiras com facilidade.

Jornal mural ― anos 70

Jornal mural ― anos 70

Relatar fatos é função de agências noticiosas. As grandes do mundo se chamam Reuters, France Presse, Associated Press, Ansa. Até o Brasil tem uma, chamada, com propriedade, Agência Brasil. Imprensa é outra coisa. Se sua função fosse unicamente relatar fatos, um jornal seria suficiente. Mas o mundo não funciona exatamente como dona Dilma gostaria.

Não se saberá jamais se a frase infeliz da presidente foi realmente de sua lavra ou se lhe terá sido soprada por alguma eminência parda. É até capaz de a enormidade ter sido bolada por suas eminências. Elas andam tão assustadas com a perspectiva real de derrota daqui a 15 dias que acionaram a metralhadora giratória. Fazem fogueira com qualquer madeira.

Pois a função da imprensa é justamente analisar, opinar, investigar, supor, debater. Para relatar fatos, bastavam os da dzi bao, jornais murais que o regime afixava na Praça da Paz Celeste, em Pequim, nos tempos de Mao Tzê Tung.

Jornal

Jornal

A fala de dona Dilma está em contradição flagrante com a boa acolhida que seu governo tem dado a Mister Greenwald. Falo daquele jornalista americano, residente no Rio de Janeiro, que deu eco planetário a informações sigilosas surrupiadas de agências de segurança americanas. Ele não se limitou a relatar fatos, mas foi parte ativa na investigação que acabou por descobri-los.

Não se pode aprovar Chico e repudiar Francisco, como está fazendo nossa presidente mandona. Isso dito, ela não precisa se desesperar. A pouca importância que, desde sempre, o poder público tem dado ao desenvolvimento cultural dos brasileiros faz que a estupefação se extinga com o último gole do café da manhã.

Ameaça à vista

José Horta Manzano

Les Echos é a publicação francesa mais reverenciada em matéria de informação econômica e financeira. É o vade-mécum dos investidores e dos grandes capitães de indústria. Principalmente franceses, mas não só. Faz mais de um século que suas análises costumam ser apreciadas e respeitadas.

Esta semana, publicou um artigo bastante contundente sobre o momento atual da economia brasileira. O título já diz muito: «Brasil ― para a economia, a Copa do Mundo se transforma em ameaça».

Durante muito tempo, segundo o texto, o Brasil contou com a Copa do Mundo para dar um empurrão a sua economia. Hoje, essa esperança deu lugar ao receio de que a convulsão social assuste os investidores e deteriore, por muito tempo, a imagem do país.

Les EchosO governo de Dilma Rousseff espera que o Mundial acrescente meio ponto percentual ao PIB nacional e crie mais de um milhão de empregos. Segundo pesquisa da Reuters, contudo, economistas independentes são mais prudentes e miram a um magro aumento de 0,2 ponto.

Sete anos atrás ― continua a análise ― quando a organização da Copa foi atribuída ao Brasil, o governo de então acariciou a ideia de poder afirmar o novo estatuto nacional de potência econômica de primeiro plano. Era também ocasião propícia para uma profunda transformação da infraestrutura de transportes.

Mas hoje a conta não fecha. Dos 11,7 bilhões de dólares de investimento previsto, nada mais que 7 bilhões foram aplicados ― uma discrepância que observadores atribuem a mau planejamento e a entraves burocráticos. Somente 36 dos 93 grandes projetos previstos foram entregues.

Essas falhas não impedirão que o campeonato se desenrole, mas, em vez de destacar a força do país, o evento periga desnudar suas fraquezas e a falta de vontade política para tocar grandes projetos.

GlandO artigo prossegue com uma grande interrogação: «Os 600 mil turistas esperados… virão?».

A reportagem fecha citando Antenor Barros Leal, presidente da Câmara de Comércio do Rio de Janeiro, que se declara muito preocupado com a imagem do país.

Barros Leal afirma que não podemos assumir o risco de perder nenhum investimento num momento em que nossa economia vai mal. Acrescenta que «todo sinal de instabilidade poderia atemorizar investidores dispostos a investir dinheiro no Brasil».

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Da semente imperfeita que foi plantada estes últimos sete anos, dificilmente brotarão bons frutos.

Tal pai, tal filho

José Horta Manzano

Um artigo do correspondente em Kiev da Agência Reuters informou que Oleksandr, filho do (deposto) presidente Ianucóvitch, amealhou impressionante fortuna em pouquíssimo tempo.

Ianucóvitch Jr.

Ianucóvitch Jr.

Diplomado em odontologia, Oleksandr, atualmente com 40 anos, já vinha sendo criticado pela oposição bem antes da destituição de seu pai. O homem está à frente de um império cujos tentáculos detêm interesses na indústria de combustíveis assim como no ramo imobiliário.

Segundo informações divulgadas por dois institutos de pesquisa ligados à oposição ― o PEPWatch e o Anticorruption Action Centre ―, os haveres de Ianukóvitch júnior cresceram impressionantes 7285%(!) em três anos. A Forbes atribui-lhe fortuna de 510 milhões de dólares.

Qualquer semelhança com filho de dirigente de algum outro país será mera coincidência. Ou não.

A notícia em inglês.

A notícia em francês.