De trás pra diante

José Horta Manzano

Os fatos da vida costumam fluir numa direção dada. Em princípio, as coisas evoluem do começo em direção ao fim, não ao contrário.

Me lembro de um filme engraçado – O curioso caso de Benjamin Button –, estrelado por Brad Pitt e Kate Blanchett, lançado no Brasil em 2009. Contava a história de um indivíduo que nascia velhinho e, conforme passavam os anos, ia aos poucos rejuvenescendo até morrer sob a forma de um recém-nascido. Uma vida de trás pra diante, em suma.

No cinema, pode tudo. Na vida real, é mais usual os fatos fluírem do começo em direção ao fim.

O percurso das palavras não escapa a essa lógica. Diferentemente do que muita gente imagina, não são os dicionários que inventam ou dão vida a palavras novas. O caminho é exatamente inverso: é só depois de surgirem e de se popularizarem que as palavras entram para o dicionário. O “pai dos burros” não faz mais que registrar expressões e termos já consagrados pela fala popular.

Pois tem gente que acha que é possível inverter a lógica. Em vez de seguir o caminho habitual uso popular → dicionário, tentam arrevesar para dicionário → uso popular.

Explico melhor. Fiquei sabendo de uma campanha lançada por SporTV e Pelé Foundation. A intenção é pressionar os dicionários a registrarem Pelé como palavra comum (substantivo e adjetivo). Sem-cerimônias, os autores da petição dão até as acepções que gostariam de ver registradas:

1. Maior que todos os outros.
2. Referência de grandeza.
3. Inigualável.
4. Sinônimo de excelência.
5. Único.

E enumeram as razões que embasam a escolha de Pelé:

1. Maior de todos
2. É considerado o maior brasileiro de todos os tempos
3. Uma lenda e recordista de gols e títulos
4. Foi responsável por parar uma guerra na África
5. Possui títulos e medalhas além do futebol

Que Pelé foi um grande jogador, quiçá o melhor do mundo, ninguém discute. Que marcou gols e ganhou títulos e medalhas, me parece natural, visto que jogava como atacante. Agora, que tenha sido “o maior brasileiro de todos os tempos”, eu diria que a concorrência é rude. Com tantos heróis e heroínas que povoam nossa história, pode ser que haja alguma controvérsia.

Mas o mais curioso nessa campanha é tentarem inverter a ordem natural das coisas. Não é comum a gente consultar o dicionário para, só em seguida, começar a usar uma palavra nova. É o contrário que costuma acontecer. Assim, me pergunto qual seria a utilidade de um verbete Pelé (pelé, na verdade).

No dia em que o termo entrar de verdade na linguagem corrente, pode deixar: dicionaristas hão de introduzi-lo na próxima edição. Não precisa nem de abaixo-assinado.

O rei

José Horta Manzano

Aqui na terrinha, nossa atenção está focalizada na PEC do estouro, na escolha do ministério de Lula, na soltura de um indivíduo condenado a mais de 430 anos de prisão – coisas de deixar de olho arregalado.

Enquanto isso, além-fronteiras, os olhos da imprensa nos observam sem dar importância aos escândalos habituais. Neste momento, não enxergam outra coisa que não seja o agravamento da enfermidade do rei Pelé.

O Brasil é particularmente ingrato com seus ídolos. Se o mundo nos reverencia como “pátria do futebol”, a contribuição de Edson Arantes do Nascimento é fundamental.

É verdade que Pelé atuou faz tempo. Suas últimas aparições no gramado datam de quase meio século. Aos ouvidos de quem tem menos de 40 anos, o nome do “rei” deve soar como soa para nós o nome de Arthur Friedenreich, grande craque cuja longa carreira começou no tempo em que o futebol era amador e se chamava foot-ball. O “Tigre”, como era conhecido, atuou de 1909 até 1935. Quando de seu último jogo, tinha 43 anos.

Assim mesmo, saibam que devemos muito a Pelé, herói de uma época em que jogador não estava preocupado com a oxigenação do cabelo nem com a mansão à beira-mar nem com o jatinho próprio estacionado no hangar mais próximo. Jogador apenas jogava. Mas como jogava!

Aqui está um apanhado de artigos, publicados na mídia europeia, que tratam do agravamento das condições de saúde do “rei”.

 

O receio pela saúde de Pelé aumenta

 

 

Pelé continua no hospital – o câncer se espalhou

 

 

O câncer de Pelé avança

 

 

Estado da legenda brasileira tem piora drástica

 

 

O câncer progrediu e pede atenção por disfunção renal e cardíaca

 

 

Câncer do craque brasileiro progrediu

 

 

Os estreantes

Chamada da Folha de São Paulo

José Horta Manzano

Em desastrada declaração feita nos anos 1970, Pelé – nossa glória nacional – afirmou que “brasileiro não sabe votar”. De lá pra cá, a fala do camisa 10 é volta e meia citada.

As eleições de 2020 deixaram a impressão de que Pelé estava totalmente enganado. Dois anos atrás, candidatos ligados ao bolsonarismo sofreram forte derrota. Parecia até que os brasileiros tinham aprendido a votar e que o pesadelo estava chegando ao fim.

Passaram-se dois anos e chegaram as eleições de 2022. Para a Presidência, no primeiro turno, apenas 33% do eleitorado votou no capitão, o que mostrou estabilidade ou até queda em sua aprovação.

No turno inicial, ele teve muito menos votos que em 2018, quando tinha alcançado a marca de 46% do eleitorado. Isso mostra que, apesar de barulhentos e arruaceiros, os bolsonaristas não representam hoje mais que 1 em cada 3 eleitores. Até aqui, tudo dominado.

O problema surge quando se lê uma notícia como essa que a Folha publicou:


40% dos estreantes na Câmara foram alvo de ação ou investigação


De cada dez estreantes, quatro não chegam envoltos em perfume de santidade. As suspeitas que pesam sobre eles variam entre calúnia, mau uso de recursos públicos, estelionato e homicídio.

E olhe que são estreantes, iniciantes, calouros! Dá pra imaginar como estarão daqui a alguns meses, quando estiverem formados, treinados, com diploma de parlamentares experientes?

João Baptista Figueiredo, último presidente do período militar, era mestre em declarações bruscas, pesadas, ofensivas, um nobre precursor do estilo bolsonárico. Como o atual presidente, não escondia o imenso desprezo que sentia pelo povo. Entre outras barbaridades, disse um dia, referindo-se aos brasileiros: “povo que não sabe nem escovar os dentes não está preparado para votar”.

Se, por milagre da física quântica, Figueiredo se levantasse da tumba e lesse a chamada estampada no alto deste artigo, era capaz de dizer: “Eu não falei?”.

In the subway

José Horta Manzano

Um estudo levado a cabo anos atrás por biólogos da Universidade do Colorado constatou que o ar que se respira nos labirintos subterrâneos do metrô nova-iorquino não é lá essas coisas. Imagino que a conclusão possa ser estendida a todos os sistemas de metrô do planeta.

Apesar da ventilação forçada e dos filtros, cerca de 15% das amostras de ar colhidas nas plataformas é constituída de… pele.

Os cientistas decidiram investigar mais a fundo para conhecer a proveniência exata dessa pelanca toda. Descobriram que a maior parte provinha da cabeça e da sola dos sapatos dos viajantes. Além disso, uns 12% da pele provinha de outras zonas do corpo: do umbigo, do ouvido, das axilas e do bum-bum.

Bon voyage! Have a nice trip!

Brasileiro não sabe votar?

José Horta Manzano

Para doutor Bolsonaro, a derrota de Trump já tinha sido uma senhora bordoada. Agora, nas municipais, conheceu uma derrota… que adjetivo usar? Vamos lá: estrepitosa. Ou fragorosa. Ou estrondosa. São todos termos que têm a ver com barulho forte de alguma coisa que se espatifa no chão.

O barulho foi tão forte que atravessou o Atlântico. Pela primeira vez, vejo a mídia europeia dar notícias das eleições municipais brasileiras – um assunto, em princípio, sem importância internacional. Pois imagine o distinto leitor que os principais órgãos soltaram uma breve nota sobre o assunto. A ênfase foi posta no fracasso de nosso doutor presidente no teste de meados do mandato.

Para todos os que, como este blogueiro e muita gente fina no planeta, andavam preocupados com a perspectiva de um Trump reeleito e de um Bolsonaro revalidado, foi um alívio. Um grande uff!

No tempo em que os militares mandavam, corria a voz de que ‘brasileiro não sabe votar’. Aliás, a frase foi repetida pelo Pelé, numa declaração imprudente que marcou o personagem e que o persegue até hoje. Olhe que, na época, podia até ser verdade, visto que os eleitores dos anos 70 eram menos esclarecidos que os atuais. Mas a situação mudou, e a prova está no resultado destas eleições.

Em mostra de amadurecimento cívico, o eleitor está reparando erros cometidos ao longo dos últimos vinte anos. Fosse hoje, é de duvidar que figuras simplórias como Lula, Dilma e Bolsonaro fossem eleitas.

by Angel Boligán Corbo (1965-), desenhista cubano

Ninguém está totalmente blindado contra aventureiros que prometem o que jamais poderão entregar. No entanto, o resultado destas municipais mostra um brasileiro menos ingênuo, mais objetivo, mais preparado para filtrar promessas e descartar potenciais estelionatários da política.

O resumo da ópera é que, se conseguir se segurar até o fim do mandato – o que não está garantido –, doutor Bolsonaro chegará ao fim da carreira em 2022. Não será reeleito. Nem ele, nem seu eventual indicado. Aliás, apadrinhamento de Bolsonaro é tóxico: é receber sua bênção e despencar nas pesquisas.

Outro que está queimado é o Lula. E seu partido junto. Não terão chance nenhuma de vencer em 2022. O Brasil acaba de mostrar que se enganou ao crer que Bolsonaro era o antídoto de Lula. Depois de experimentar ambos, optou por uma terceira via.

Assim, Lula e Bolsonaro podem saudar o público e sair de cena. Tanto eles como os respectivos afilhados. Assim que cair o pano sobre o atual governo, poderemos começar a reconstruir o país. Vai ser demorado e trabalhoso, mas não há outro jeito.

No Estádio Azteca

José Horta Manzano

No Brasil, a data passou praticamente em branco. Na Itália, o jornal La Sicilia, quotidiano fundado há 75 anos na ilha de mesmo nome, lembrou. De fato, este 21 de junho marcou o 49° aniversário de um dos mais bonitos jogos da história do futebol.

Foi quando o Brasil de Pelé, ao bater a Itália de Riva por 4 x 1 na final da Copa do Mundo de 1970, tornou-se proprietário definitivo da Taça Jules Rimet.

O dia em que o Brasil de Pelé maltratou a Itália de Riva

Aviso aos navegantes
O artigo traz até um link para um filminho de minuto e meio com os cinco gols da partida. Pra quem aprecia, vale a pena. O link é este aqui, ó.

Exclusividade racial

Ruy Castro (*)

Correu o país a história da jovem Thauane, branca, 19 anos, hostilizada num ônibus em Curitiba por mulheres negras por estar, segundo estas, se apropriando da cultura afro ao usar um turbante. Thauane alegou que sofria de leucemia, e o turbante escondia sua perda de cabelo causada pela quimioterapia. Espero que, depois de recuperada, Thauane continue a usar turbante – não como um estandarte de guerra, mas por achá-lo um bonito acessório.

Bem, se até turbantes já foram convertidos em símbolos de identidade racial, vamos ter de rever tudo. No futebol, por exemplo, fica proibido aos jogadores brancos fazer gol de bicicleta, como Leonidas da Silva, cobrar falta com folha seca, como Didi, e comemorar um gol com o soco no ar, como Pelé – são exclusividades da cultura negra. Na culinária, os restaurantes não poderão mais servir feijoada, moqueca, farofa, angu, quiabo, jiló, cocada, quindim e rapadura a clientes brancos.

by Catherine Valette, artista francesa

Lindas palavras de origem africana e há séculos incorporadas à língua brasileira, como cafuné, bunda, camundongo, xodó, zoeira, macumba, moleque, banguela, babaca, catimba, fuzuê e gandaia terão de ser abolidas do vocabulário branco. Quanto aos músicos brancos, mantenham distância do berimbau, da cuíca e do ganzá.

Aliás, a música popular será um problema. Ritmos de origem negra como o samba, o jazz, o blues, a salsa, o rap, o funk e dezenas de outros não poderão mais ser tocados em shows frequentados por brancos. E o rock, como ficará? Inventado lá atrás por negros pioneiros como Muddy Waters, Howlin’ Wolf, Chuck Berry, Bo Diddley e Little Richard, quem se apropriou e enriqueceu com ele foram Elvis Presley, John Lennon, Mick Jagger, David Bowie, Eric Clapton e milhares mais.

 Acho que os negros americanos deveriam pedir o rock de volta.

(*) Ruy Castro (1948-) é escritor, biógrafo, jornalista e colunista. O texto aqui reproduzido foi publicado originalmente pela Folha de São Paulo.

Sem mágoas

José Horta Manzano

Você sabia?

Futebol 3O IBGE acaba de publicar interessante anuário. Mostra a diversidade de nomes (prenomes) de brasileiros que participaram do Censo Demográfico de 2010. São mais de 130 mil nomes, uma enormidade.

É pena o instituto não ter compilado todos os nomes numa lista geral. Para conhecer a frequência, precisa pesquisar um por um. Outra imperfeição é o fato de diferentes grafias do mesmo nome serem computadas separadamente. Assim, Luís e Luiz são contados como nomes diferentes. O mesmo acontece com as duplas Tiago/Thiago, Carina/Karina, Paula/Paola. Enfim, nestes tempos estranhos, contentemo-nos com o que temos.

Como já se podia adivinhar, José e Maria continuam ocupando o primeiro lugar. De cada 8 brasileiras, uma se chama Maria. E de cada 17 brasileiros, um se prenomina José.

Uma análise um bocadinho mais atenta mostra resultados interessantes, surpreendentes até. Artistas da moda, futebolistas e personagens políticos influenciam os pais na hora de registrar o rebento.

Infografia Folhapress

Infografia Folhapress

Entre os famosos do espetáculo, Michael Jackson ocupa o trono. Curiosamente, a grafia utilizada não corresponde ao original. Foi estropiada por ouvidos nacionais e se transformou no peculiar «Maicon». Estatisticamente, um ajuntamento de 700 brasileiros contará com pelo menos um Maicon.

Entre os futebolistas, Romário reina. São quase 60 mil brasileiros a portar seu nome. Rivelino, com 5570 homônimos, fica muito pra trás. Pelé é prenome mal-amado. Apenas 112 cidadãos carregavam esse nome em 2010.

Lula caricatura 2aMostrando não guardar rancor nem ressentimento, 76 famílias deram o nome de Messi a um rebento. Os Maradonas são 165. E o Zidane, aquele que tinha nome de xarope e que liquidou as esperanças da Seleção em 1998, tem 827 homônimos no Brasil. Sem mágoas.

O mundo da política também está epelhado na patronímia brasileira. Getúlio e Jânio marcaram época. Ainda hoje, há quase 50 mil cidadãos com o nome de um dos dois. Sobram 831 Adhemar, provável relíquia do tempo daquele que «roubava mas fazia». (Hoje, rouba-se sem fazer.)

Até Clinton serviu de modelo: 557 conterrâneos levam seu nome. Embora pareça incrível, o Censo conseguiu encontrar 86 Sarney.

O mais decepcionante vem agora. Entre os mais de 200 milhões de brasileiros, o IBGE não conseguiu contar mais que 231 Lula. À evidência, nossos compatriotas não dão mostras de simpatizar com a autoqualificada «viv’alma mais honesta do país».

Falam de nós – 2

0-Falam de nósJosé Horta Manzano

Efeito colateral
A rádio estatal sueca – Sveriges Radio – ressalta que o escândalo de corrupção e roubalheira na Petrobrás tem respingado até na beira do Polo Norte. Um espanto!

O fato é que a Skanska, gigantesca empreiteira escandinava, está consorciada com outras empresas em pelo menos quatro grandes projetos em território brasileiro: Gasoduto Urucu-Manaus, Propylene Repar (Araucária), Gasoduto Cabiúnas-Vitória, Refinaria Presidente Bernardes (Cubatão).

Entre os sócios, estão as empresas Engevix, Camargo Correa e Toyo Setal, envolvidas no astronômico assalto. Daí o salpico em terras nórdicas.

Como é hábito em nossa terra, poderão sempre alegar que não sabiam de nada. Costuma funcionar.

Interligne 28a

Racismo 2

Embates raciais
Jornais estrangeiros compararam as escaramuças ocorridas estes dias em Ferguson (Missouri, EUA) com a crônica violência policial a que se assiste no Brasil dia sim, outro também.

Coincidentemente, o artigo de Mac Margolis (Bloomberg View, em inglês) e o de Tjerk Brühwiller (Neue Zürcher Zeitung, em alemão) ostentam praticamente o mesmo título: «Há um Ferguson por dia no Brasil».

Ambos ressaltam o fato de a violência policial brasileira, estatisticamente mais contundente, passar praticamente em branco na mídia planetária.

Interligne 28aMinistro da Fazenda
Praticamente toda a mídia mundial noticiou a nomeação dos futuros comandantes da economia brasileira. Ressaltam que a situação está crítica e que a nova equipe é considerada capaz de desfazer o nó. Aqui, no alemão Handelsblatt e no francês 20minutes.

Interligne 28aPelé 1Pelé doente
Muito comentada também a internação de Pelé. O profissional aposentado mantém intacto seu prestígio além-fronteiras.

Outros jogadores famosos houve, como Di Stefano, Johan Cruyff, Franz Beckenbauer, Michel Platini, mas o mítico Edson Arantes do Nascimento – que o mundo conhece de boca fechada – ainda aparece por cima da carne-seca.

Aqui, no britânico Daily Mirror.

Interligne 28aTemporal
O portal italiano TGCom24, de estilo marcadamente sensacionalista, volta sua atenção para o temporal que se abateu sobre a cidade de São Paulo.

Interligne 28aDinheiro lavagemLavado e passado
Sob o título «El juez que hace temblar a los corruptos de Brasil», o espanhol El País destaca a atitude inusitada de Sergio Moro, e reverencia sua coragem de enfrentar poderosos ao investigar sobre «un lavado de dinero».

Até a mídia estrangeira mostra-se surpresa com o andamento desta versão tupiniquim da italiana Õperação Mãos Limpas, levada a cabo alguns anos atrás.

Interligne 28aCobra que fumaCoquetel mortal
Cocaína com veneno de cobra coral? Pois a novidade acaba de penetrar em território nacional, segundo reportagem do espanhol El Mundo.

Vem entrando pela extensa linha fronteiriça em que o Brasil linda com o Uruguai. O intuito dos produtores é aumentar o potencial de adicção, mas o resultado pode ser desastroso. Usuários temerários ou mal informados estão pondo em risco a própria vida.

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Palpite infeliz

José Horta Manzano

A coroa do rei não é de ouro nem de prata

A coroa do rei
não é de ouro nem de prata

Todo Noticias, site informativo do grupo argentino Clarín, classificou de «desafortunado» o comentário feito por Pelé sobre a morte acidental de um operário, dez dias atrás, nas obras do estádio Itaquerão.

O acidente foi gravíssimo e causou perda de uma vida. Apesar disso, Pelé minimizou o acontecido dizendo que «são coisas da vida, nada que assuste». E concluiu dizendo que importante mesmo é a infraestrutura e os aeroportos.

O site atribui o infeliz pronunciamento do «rei» à pressão que ele vem sofrendo por parte da Fifa e do governo do Brasil.

Como já dizia, anos atrás, conhecido futebolista carioca: «O Pelé, de boca fechada, é um poeta».

De ouro

José Horta Manzano0-Sigismeno 1

Sigismeno leu matéria do Estadão deste domingo e ficou sabendo que a Fifa, numa decisão um tanto fora dos padrões, decidiu conceder uma Bola de Ouro a Pelé ― uma espécie de bola honoris causa.

O mundo inteiro, Sigismeno incluído, sabe que Edson Arantes do Nascimento foi um grande jogador de futebol. Autor de mil e tantos gols, participou de quatro Copas do Mundo ― em três das quais a seleção do Brasil foi campeã.

Um pouco simploriamente, como de costume, Sigismeno veio com suas cogitações filosóficas. Disse que a Fifa não costuma dar ponto sem nó. Até aí, tive de concordar. Disse também que andou espiando no gúgol e ficou sabendo que Pelé jogou sua última partida como profissional mais de 35 anos atrás e que, desde então, pendurou as chuteiras.

Sigismeno sabe que a Fifa nunca se preocupou com outros grandes craques brasileiros, sabe que Garrincha morreu na miséria, sabe que outros grandes foram completamente esquecidos. Espremeu suas meninges à cata de uma razão para essa repentina homenagem que a federação mundial resolveu prestar a Pelé depois de tanto tempo. O homem está aparentemente em boa saúde, portanto não há-de ser daquelas honrarias que se concedem in extremis.

Blatter, Pelé & Dilma Reparem: a Fifa pisoteou a grafia do sobrenome presidencial

Blatter, Pelé & Dilma
Reparem: a Fifa esqueceu de conferir no gúgol e acabou pisoteando a grafia do sobrenome presidencial

De repente, a luzinha acendeu. «Mas é claro! É por causa da Copa do Mundo, que está para começar daqui a 5 meses!» Confesso que, na hora, não entendi bem a relação. «E o que tem isso a ver com o ouro que vão dar ao Pelé?», perguntei.

«Mas você não percebe?», retrucou meu amigo. «Os cartolas de Zurique estão apavorados com protestos e manifestações de rua que possam ocorrer durante a Copa».

«Continuo sem entender», retruquei, sem conseguir acompanhar o raciocínio do Sigismeno.

«Pois é o seguinte, meu caro. Em junho passado, os da Fifa se deram conta de que o povo anda um bocado enfezado com essa história de Copa. Os gastos, o desperdício, os roubos, os atrasos, essa farra toda. Para se mostrar simpáticos, resolveram agradar aos brasileiros. Devem ter pensado até em dar o prêmio a nossa presidente, mas, sacumé, depois das vaias no Maracanã, a coisa ficou meio delicada. É por isso que estão homenageando o Pelé, por imaginarem que é uma espécie de ídolo adorado por todos os brasileiros. É uma tentativa de amansar o povo, você não percebe?».

Bola de ouro

Bola de ouro

Percebo. Devo admitir que percebo. Se vai funcionar, isso são outros quinhentos.

E o Sigismeno, inspirado, ainda profetizou que a Bola de Ouro deste ano ― a verdadeira ― pode ser dada até ao Dalai Lama, mas jamais será dada ao Messi. Porque o moço é argentino. Melhor não atiçar rivalidades.

Parece um gesto ajuizado. Pode dar certo. Ou não.