Clube dos Ricos?

OCDE: países-membros

José Horta Manzano

É desde o tempo em que o Lula era presidente que se fala em OCDE. Brasil entra na organização, não entra, os EUA apoiam, deixam de apoiar, vizinhos aplaudem, vizinhos chiam, parece que agora vai, parece que não vai dar. E assim por diante, num vai e vem sem fim. Mas, afinal, que vem a ser essa organização?

Não é nenhum bicho de sete cabeças. Trata-se de um fórum de discussão, de debates e de formulação de políticas públicas. Os membros conversam, debatem, podem até formular sugestões e fazer recomendações. Mas seu poder termina aí: as resoluções não têm força de lei.

No Brasil, a OCDE é vendida como o “Clube dos Ricos”, conceito que não corresponde à realidade. Criada em 1961, a organização tem sede em Paris. Os membros fundadores são 20. Ao longo dos anos, outros países foram sendo admitidos. São hoje 38 países-membros.

Se o Brasil não entrou para o clube até hoje foi porque não quis. Diferentemente de outros países latino-americanos, nossos sucessivos governos não mostraram interesse e não se candidataram. O interesse só surgiu com a subida do lulopetismo ao poder.

Quando o Lula “chegou lá”, ficou patente sua ânsia de pôr o Brasil sob holofotes internacionais, em todas as instâncias onde fosse possível. Era sua tática para melhorar o status “dessepaiz”.

A prova de que a OCDE nunca foi “clube de ricos” é o fato de encontrar, entre os membros fundadores, Portugal, Espanha, Grécia e Turquia – países que, sessenta anos atrás, eram pobres e francamente subdesenvolvidos.

Ao longo dos anos, outros remediados foram entrando para a organização. Entre eles, estão alguns de nossos vizinhos: o México em 1994, o Chile em 2009, a Colômbia em 2018 e até a Costa Rica em 2020.

A organização conta com países populosos e de economia poderosa, como os EUA, a Alemanha, a França, o Japão. Mas há também países de escassa população e diminuto peso econômico: a Lituânia com 2,8 milhões de habitantes; a Eslovênia com 2,1 milhões; a Letônia com 1,9 milhão; a Estônia com 1,3 milhão.

O que a OCDE sabe fazer melhor são as estatísticas comparativas do desempenho de cada país-membro. A organização é verdadeira máquina de produzir números.

Se e quando o Brasil entrar nessa confraria, é bom ir preparando um bom ministério para acomodar especialistas na matéria. No fundo, nada mal para um país habituado ao inchaço crônico da máquina federal. Mais um cabide de emprego à vista.

Mas… só um senão: nas estatísticas comparativas, aquelas em que aparece o desempenho de cada um em cada área, nosso país nem sempre vai sair bem na foto.

Ah, ça ira!

José Horta Manzano

Libération, veterano jornal da esquerda francesa, se pergunta se a epidemia de Covid-19 vai finalmente forçar o Brasil a cobrar impostos dos ricos. Esclarece que nosso país figura entre os mais desiguais do mundo, somente comparável a certos países da África ou do Oriente Médio. A diferença de posses entre os que têm mais e os que têm menos é brutal.

Explica que 206 bilionários brasileiros detêm 20% da riqueza nacional. Vamos fazer umas continhas. O país tem 200 milhões de habitantes. Vinte porcento da população dá 40 milhões de pessoas. Portanto, 206 ricaços possuem o que, em teoria, deveria pertencer a 40 milhões de compatriotas. É chocante. Diferenças sempre há, mas distorções a esse ponto são inconcebíveis num mundo civilizado.

O jornal francês assinala que o imposto é cobrado principalmente do consumo ou seja: do arroz e do feijão, da gasolina, das fraldas do bebê, do cafezinho e da farinha de mandioca. Portanto, pesa muito mais no bolso dos desfavorecidos. Os altos rendimentos são poupados. No Brasil, a alíquota máxima é de 27,5%, enquanto a média na OCDE é de 43,5% – um cruel desequilíbrio.

Apesar de suas simpatias pela esquerda, o jornal confessa que nem Lula e seu PT, em 13 anos de poder, ousaram corrigir as distorções. Ao contrário: se a era Lula fez os pobres um pouco menos pobres, em compensação, deixou os ricos bem mais ricos.

Libération conclui filosofando: no Brasil, os ricos ainda têm belos dias pela frente.

Aqui no original francês.

(*) O título deste post – Ah, ça ira! – faz referência a um refrão que surgiu em 1790, como prenúncio da Revolução Francesa. Ao longo dos anos, inúmeras versões e paródias se encaixaram na métrica dos versos. A mais ameaçadora delas é justamente a mais conhecida:

Ah, ça ira, ça ira
Les aristocrates, on les pendra!

Em tradução livre, fica assim:

Sim, venceremos, venceremos
Os aristocratas, enforcaremos!

Que fique claro: este blogueiro já passou da idade de ser incendiário. Não estou recomendando mandar nenhum bilionário para o patíbulo.

Pisa: nota vermelha

Dad Squarisi (*)

“Subdesenvolvimento não se improvisa. Cultiva-se.” A frase, repetida com fina ironia por Roberto Campos, se ajusta à educação brasileira. O desempenho no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) mostrou, mais uma vez, que o Brasil não conseguiu quitar a dívida referente à qualidade do ensino. No ranking com 79 países, continua na fila de trás.

Aplicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a cada três anos, o Pisa avalia estudantes de 15 anos. O resultado divulgado na segunda-feira reprisou fotografia de corpo inteiro de adolescentes brasileiros cuja altura se mantém. Enquanto isso, os colegas de outros países não só crescem, mas também tomam hormônio para ultrapassar os demais.

É dramática a situação da leitura. Embora tenha havido pequena oscilação para cima, quatro em cada 10 jovens são analfabetos letrados. O paradoxo se explica: eles são aprovados nos testes das séries em que estão matriculados, mas mostram-se sem aptidão para identificar a ideia central de um texto e de estabelecer a relação entre as ideias.

Não só. Nesta edição, o Pisa entrou no terreno bastante contemporâneo das fake news. Testou a habilidade de distinguir fato de opinião e de avaliar a veracidade do que se afirma. Dos 17.500 brasileiros, só 2% se saíram bem contra 10% das demais nacionalidades. Em português claro: vítimas do sistema educacional são presas fáceis de falsas promessas e políticos inescrupulosos.

A deficiência na compreensão de texto contamina as demais disciplinas. Quase metade dos rapazes e moças que frequentam salas de aula não conseguem ler gráficos, resolver problemas simples (com números inteiros) e compreender experiências científicas elementares. A razão: sem dominar enunciados, como entender as questões propostas?

O 54º lugar no ranking da leitura tem parcela de responsabilidade no 66º lugar de ciência e no 70º lugar em matemática. Estar no andar de baixo não constitui novidade. O Brasil nunca deu um salto de qualidade. Entre 2000 e 2010, porém, chamou a atenção o avanço em matemática. Mas mudanças na política educacional sem critérios técnicos emperraram o processo.

O Ministério da Educação, atolado em questiúnculas que em nada contribuem para melhorar a qualidade do ensino, revela-se incapaz de dar resposta ao maior desafio do país — universalizar o acesso ao conhecimento. Há duas décadas, com atraso em relação às demais nações, o Brasil matriculou todas as crianças na escola.

Mas estacionou na caminhada. A inércia tem preço. Condena o país ao subdesenvolvimento e à pobreza. Sem capital humano apto a ombrear com os players internacionais, imobilizamos a inovação e perdemos competitividade. Em suma: caminhamos a passos largos para a irrelevância.

(*) Dad Squarisi, formada pela UnB, é escritora. Tem especialização em Linguística e mestrado em Teoria da Literatura. É editorialista do Correio Braziliense e blogueira – Blog da Dad.

Frase do dia — 327

«Os brasileiros precisam reavaliar urgentemente seu real entendimento sobre o significado da palavra derrota.

A nação ainda guarda prolongado luto, que lembra as viúvas ibéricas de antigamente, pela perda da Copa do Mundo em 1950 contra o Uruguai. O placar de 7 a 1 que nos foi imposto pela Alemanha na Copa de 2014 continua sendo uma flecha da vergonha vibrando no ar.

Porém o país permanece imperturbável ante nosso fracasso perante a OCDE no quesito Educação. Este, sim, mereceria o pranto derramado das melhores carpideiras.»

Luiz Gonzaga Bertelli, presidente do CIEE ‒ Centro de Integração Empresa-Escola, em artigo publicado no Estadão.