José Horta Manzano
Nem tudo o que legal é conveniente. Nem tudo o que é conveniente é legal. Discernir entre o que se deve e o que não se deve fazer é questão de bom senso. Li hoje de manhã ‒ e ouvi pelo rádio ‒ o patético diálogo travado entre senhor José Dirceu e o juiz Sergio Moro, no âmbito da operação Lava a Jato. São ambos personagens singulares do Brasil atual.
O primeiro, o setentão José Dirceu de Oliveira e Silva, já foi guerrilheiro, degredado, foragido, anistiado, mentor de campanha eleitoral, ministro, lobista, prisioneiro. Passa atualmente, pela terceira vez na vida, uma temporada na prisão. Está condenado a uma vintena de anos de cadeia. No diálogo, alega ser pobre e implora por clemência. Acredite quem quiser.
O segundo, o quarentão Sergio Fernando Moro, é juiz federal em Curitiba. Dono de conduta atípica e nunca dantes vista no Brasil, tem-se mostrado inflexível para com criminosos de colarinho branco, sejam eles empresários ou poíticos. Destemido ‒ eu diria até temerário ‒, tem condenado gente graúda a longos anos de privação de liberdade. Sua mão pesada anda atemorizando muita gente, inclusive ex-presidentes da República.
É compreensível que o cidadão que recebe sentença de prisão apele para o «jus sperneandi», que tente o possível e o impossível para amenizar a pena. Dá pra entender. Acredito que qualquer um de nós, se estivesse em situação assim, seguiria caminho parelho.
O que não dá pra entender é que conversa entre juiz e apenado seja divulgada à mídia, como se entrevista de talk show fosse. O simples fato de saber que uma conversa periga ser divulgada ao grande público tolhe a naturalidade dos participantes.
É verdade que os tempos da Inquisição já vão longe e que a publicidade é hoje princípio basilar da Justiça. Isso, no entanto, não significa que todos os trâmites tenham de ser necessariamente publicados. Conversa entre advogado e cliente não costuma (nem deve) ser levada a público. Diálogo de gabinete entre juiz e condenado tampouco deveria ser publicada.
Imagino que a publicidade dada ontem à conversa entre os dois personagens esteja dentro da legalidade ‒ só faltava… Assim mesmo, não atino com a utilidade do procedimento, impensável na Europa.
Vai ficando cada dia mais claro que os protagonistas dessa deplorável tragicomédia nacional se consideram vedetes num palco de vaidades. O circunstancial vai encobrindo o essencial.