Quanto recebe um medalhado olímpico?

José Horta Manzano

Você sabia?

Faz só uma semana que se encerraram os Jogos Olímpicos de Tóquio, mas parece que faz um tempão. É que eventos marcantes arrebatam a atenção no momento em que ocorrem mas, assim que acabam, desaparecem da memória cansada.

Estive colecionando dados sobre o prêmio em dinheiro que cada comitê nacional destinou a seus campeões. Não foi fácil. Tive de catar um aqui, outro ali, que cada um fala do seu sem se preocupar muito com os demais.

As conclusões são interessantes, inesperadas e, às vezes, surpreendentes. Os montantes dados pelos países a seus atletas variam muito. Vão desde Singapura e Taiwan – generosíssimos – até países extremamente sovinas como a Grã-Bretanha e a Suécia.

Um singapuriano ou um taiwanês medalhado com ouro ganhou um amortecedor confortável para o resto de seus dias: voltou para casa com 3.800.000 reais no bolso. Além disso, os taiwaneses, ainda que não tenham conseguido o pódio mas tenham chegado, por exemplo, em 7° ou 8° lugar na prova final, foram premiados em dinheiro.

Para Singapura, a vistosa política até que saiu em conta, visto que o país não conseguiu nenhuma medalha. Já para o comitê taiwanês, a conta saiu salgada: seus atletas ganharam 12 medalhas, sendo 2 de ouro.

Nos esportes individuais, o Brasil pagou 250 mil reais a cada atleta dourado, 150 mil aos prateados e 100 mil aos de bronze. Os prêmios oferecidos por nosso país se encaixam na média dos vizinhos latino-americanos. Para o ouro, a Colômbia dá 300 mil reais, o Peru oferece 316 mil, o Chile presenteia com 289 mil. Mais generosa que o Brasil, a Bolívia propõe 262.500 reais a todo boliviano que chegue ao ouro; assim mesmo, nunca obtiveram nenhuma medalha.

Os comitês olímpicos de Hong Kong e da Indonésia também tiveram de levar a mão ao bolso pra pagar os prêmios prometidos. A Indonésia tinha oferecido 1.800.000 reais por ouro; seus atletas levaram um total de 5 medalhas, sendo uma de ouro. O mesmo aconteceu com Hong Kong. Um feliz vencedor “dourou” e embolsou a fabulosa soma de 3.400.000 reais por sua medalha; outros 5 colegas receberam prêmios menores com suas pratas e seus bronzes.

O paupérrimo Bangladesh propôs um megaprêmio de quase 1.600.000 reais por medalha dourada e um pouco menos para as prateadas e bronzeadas. Mas o risco de empobrecer era pequeno, visto nunca ter ganhado medalha antes. E não foi desta vez que ganhou.

A Estônia, país de espírito previdente, não dá prêmio tipo mega-sena. Talvez para evitar que o jovem, de cabeça avoada, jogue o dinheiro pela janela, faz proposta diferente. Os campeões passam a receber imediatamente uma pensão anual vitalícia de 4.600 euros, que será complementada por uma ajuda especial assim que chegarem aos 65 anos, a idade da aposentadoria.

A Polônia segue caminho semelhante, com um acréscimo generoso. Seus atletas dourados recebem, logo de cara, um prêmio de 310 mil reais. Bem mais tarde, quando chegarem ao 40° ano de vida, passarão a receber uma renda livre de impostos equivalente a 60% do salário médio nacional. Todos os meses, até o fim da vida! Atenção: não é o salário mínimo, mas o salário médio do país. Nada mal, não?

No fim da lista, estão os países de espírito pão-duro, aqueles que julgam que os atletas, treinados e financiados durante anos com o dinheiro dos contribuintes, não fazem mais que a obrigação quando vencem competições. Os jovens estarão assim devolvendo uma parte do que receberam. Sem dúvida, é uma maneira de enxergar o funcionamento da sociedade. Bem diferente da nossa criação, que nos faz acreditar que tudo nos é devido.

Entre os que não dão nenhum prêmio a seus vencedores, estão a Grã-Bretanha (65 medalhas), a Nova Zelândia (20 medalhas), a Suécia (9 medalhas), a Noruega e a Croácia (8 medalhas cada uma). Como se vê pelo número de medalhas recebidas pelos que ficaram chupando dedo, não é o vil metal que move essa juventude corajosa. O importante é competir.

Observação
Os montantes mencionados são resultado da conversão aproximada dos valores originais, expressos em moeda local.

Meta olímpica

José Horta Manzano

Tanto o Comitê Olímpico quanto o Paraolímpico esquivam a questão. Nenhum dos dois dá diretiva quanto à classificação dos países no quadro de medalhas. Como se deve determinar o ranking dos países? Na falta de orientação oficial, dois critérios coexistem.

O primeiro consiste em simplesmente adicionar as medalhas, dando peso igual a cada uma delas, quer sejam de ouro, prata ou bronze. É o mais simples, mas não o mais adotado.

by Felipe Parucci, desenhista catarinense

by Felipe Parucci, desenhista catarinense

O segundo método, mais sofisticado, atribui valor diferente a cada medalha, dependendo do metal que a compõe. A de ouro vale mais que a de prata, que vale mais que a de bronze. Portanto, um hipotético país que tivesse conquistado uma medalha de ouro, nenhuma de prata e nenhuma de bronze seria classificado à frente de um outro que tivesse conquistado várias dezenas de medalhas de prata e de bronze ‒ mas nenhuma de ouro. Embora não seja oficial, esse método sofisticado é reconhecido e bem aceito universalmente.

No Brasil, tende-se a dar preferência ao primeiro método, mais simples, adicionando as medalhas e atribuindo-lhes valor igual. Uma de ouro vale uma de prata, que vale uma de bronze. Prova disso é o Comitê Olímpico nacional dar a todo medalhista um prêmio em dinheiro de montante uniforme, pouco importando a cor do troféu.

by Guillermo Mordillo Menéndez (1932-), desenhista argentino

by Guillermo Mordillo Menéndez (1932-), desenhista argentino

No início dos JOs de atletas válidos, as autoridades olímpicas brasileiras apregoaram que nossa meta era terminar nos «top ten» ‒ entre os dez primeiros. Não deu. Pelo método de classificação mais aceito, o Brasil foi o 13°.

Antes mesmo de ser dada a largada para a Paraolimpíada, ficou combinado que a meta, mais ambiciosa ainda, era entrar nos «top five» ‒ terminar entre os cinco primeiros. De novo, não deu: o Brasil ficou em 8°.

Em ambos os casos, a meta não alcançada deixou gostinho amargo de derrota e de dever não cumprido. Embora a marca de 72 medalhas conquistadas na Paraolimpíada seja resultado excelente, o melhor que o Brasil já obteve, o desconforto permanece. Que fazer?

Prever que nosso país ocupará este ou aquele lugar no quadro final implica conhecer, de antemão, o resultado dos concorrentes. É prognóstico pra lá de arriscado. Da próxima vez, sugiro ao Comitê Olímpico abster-se de arriscar profetizar a classificação ‒ é temerário.

by Ronaldo Cunha Dias, desenhista gaúcho

by Ronaldo Cunha Dias, desenhista gaúcho

Melhor será fixar como meta o número de medalhas esperadas. Para chegar a essa conta, há que somar as modalidades em que temos boas razões de crer que conseguiremos subir ao pódio.

Já estou ouvindo sua contestação, distinto leitor: «Mas, dá no mesmo!» É verdade, aparentemente dá no mesmo. Mas o impacto psicológico é diferente.

Nos Paraolímpicos de Pequim 2012, o Brasil tinha trazido 43 medalhas para casa. Se a meta fixada para Rio 2016 tivesse sido, digamos, de 50 medalhas no mínimo, as 72 que conquistamos nos teriam deixado muito mais orgulhosos e sorridentes. Pouco importando o ranking.

Medalha não tem preço

José Horta Manzano

Você sabia?

Medalha olímpica não tem preço. De fora, a gente não se dá conta do duro que cada medalhista deu pra chegar lá. A cobiçada medalha é coroamento de quatro anos de trabalho, esforço, esperança. O valor é incalculável. Vamos ser claros: é incalculável no campo simbólico. Como se dizia antigamente, não há preço que pague. Numa análise mais chã, contudo, cada medalha tem seu valor intrínseco, sim, senhor. Vamos ver como funciona.

Foto Rio 2016/Alex Ferro

Foto Rio 2016/Alex Ferro

Para começar, saibam os distintos leitores que as medalhas dos Jogos Rio 2016 foram fabricadas pela Casa da Moeda do Brasil. No total, o Comitê Olímpico Internacional encomendou 2.488 peças ‒ 812 de ouro, 812 de prata e 864 de bronze. É sempre bom calcular com folga pra não faltar na última hora.

Todas têm tamanho e peso idêntico. Medem exatos 85 milímetros de diâmetro e pesam meio quilo. São as maiores e mais pesadas jamais encomendadas para Jogos Olímpicos de Verão.

A medalha mais importante, dita “de ouro”, não é de ouro maciço, como se poderia imaginar, mas de prata folheada. Contém 494g de prata e um revestimento de 6g de ouro. Fazendo abstração do valor simbólico, pode-se calcular o valor do metal: dá pouco mais de 560 dólares. As que foram distribuídas nos Jogos de Londres valiam muito mais, porque a cotação do ouro na época estava nas alturas. Hoje em dia, se fosse de ouro maciço, cada medalha de primeiro prêmio valeria em torno de 22 mil dólares.

Foto Rio 2016/Alex Ferro

Foto Rio 2016/Alex Ferro

A de prata é feita, naturalmente, de prata de lei (925). Pela cotação atual do metal, pode ser vendida por cerca de 300 dólares. A medalha de bronze é uma liga de 475g de cobre com 25g de zinco. É bem menos valiosa que as outras. O valor do metal não vai além de 3 dólares. Nas cercanias da Vila Olímpica, tem gente vendendo pacote de salgadinho por esse valor. E tem gente comprando.

Medalhas de ouro maciço foram distribuídas pela última vez em Estocolmo, na longínqua edição de 1912 dos JOs. Se as 812 medalhas encomendadas para Rio 2016 fossem de metal maciço, o COI deveria desembolsar quase 18 milhões de dólares, sem contar a mão de obra.

Diferentemente da Taça Jules Rimet, arrebatada pelo time de futebol do Brasil em 1970 ‒ aquela que acabou sendo roubada e derretida ‒ não vale a pena derreter galardão olímpico. A Taça da Copa era de ouro maciço, enquanto as medalhas valem mais pelo símbolo que pelo metal.

O importante é competir

José Horta Manzano

Você sabia?

O barão Pierre de Coubertin (1863-1937) não foi esportista famoso ‒ era pegadogo, historiador e humanista. Apesar disso, devemos a ele a ressureição dos Jogos Olímpicos, que andavam recobertos pela poeira da História já fazia dois milênios.

Foi pela influência, pelo esforço e pelo empenho do barão que se organizou, em 1896, a primeira Olimpíada dos tempos modernos. Com frequência, atribui-se a Pierre de Coubertin a frase «O importante é participar». Não há consenso no entanto. Há quem jure que a frase original teria sido «O essencial não é ter ganhado, mas ter lutado pra vencer».

JO 2016 4Há ainda quem diga que não é bem assim. O barão jamais disse nada parecido. A frase famosa teria sido pronunciada por obscuro clérigo americano por ocasião dos Jogos de Londres de 1908.

Seja como for, não resta dúvida de que é importante participar, um orgulho para todo atleta. Se, ao final do esforço, cair uma medalha, melhor ainda. Pra coroar, nenhum esportista vai desprezar um prêmio em dinheiro. Comitês olímpicos nacionais já se deram conta de que uma recompensa financeira pode ser estímulo poderoso.

Nem todos os comitês publicam o valor com que presenteiam medalhistas. Há controvérsia nas informações. No entanto, garimpando aqui e ali, dá pra estabelecer uma lista interessante.

A palma vai, sem sombra de dúvida, para Singapura. Naquela cidade-estado, o atleta que conseguir medalha de ouro levará a astronômica soma de 805 mil dólares, mais de 2,5 milhões de reais. Pra ninguém botar defeito.

O Azerbaidjão, que adoraria aumentar o número de medalhistas de ouro, propõe 510 mil dólares ao atleta que trouxer uma de volta a Baku.

JO 2016Os demais países vêm bem atrás. Há os mais generosos, como a Itália (180 mil dólares), o México (160 mil dólares), a Rússia e a Ucrânia (pouco mais de 100 mil dólares). A Espanha dá 94 mil, enquanto a França vem um pouco atrás, com 65 mil dólares para cada campeão. Japão e China têm orçamento mais restrito: 36 mil e 31 mil dólares respectivamente.

Os EUA presenteiam seus campeões com 25 mil dólares. Mais moderada ainda, a Alemanha não vai além de 19,5 mil dólares.

Cada medalhista brasileiro receberá quantia modesta. Serão R$ 35 mil (11 mil dólares) para campeões individuais e R$ 17,5mil para cada participante de esporte coletivo. A quantia está longe de ser exorbitante. Fico imaginando que o prêmio pudesse até ser maior mas, sacumé, rato roeu a roupa da rainha no meio do caminho. Para os atletas brasileiros, resta uma consolação: tanto faz que a medalha seja de ouro, de prata ou de bronze, o prêmio será o mesmo.

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Nota pitoresca:
Na Suécia, onde se acredita que esportista é profissão como qualquer outra e que ganhar ou perder faz parte do jogo, o comitê nacional não dá prêmio a ninguém. Medalhistas recebem um boneco de pelúcia. De tamanho grande para quem trouxer o ouro, médio para os medalhistas de prata e pequeno para os bronzeados.

O importante é competir.