Ódio à ciência

José Horta Manzano

Artigo do jornalista Vinicius Sassine, publicado no Estadão, dá a informação:

«O governo Jair Bolsonaro cortou 68,9% da cota de importação de equipamentos e insumos destinados à pesquisa científica. A medida afeta principalmente as ações desenvolvidas pelo Instituto Butantan e pela Fiocruz no combate à pandemia da Covid-19. Em 2020, o valor foi de US$ 300 milhões. Para 2021, serão apenas US$ 93,3 milhões.»

O distinto leitor leu corretamente. No meio da epidemia mais grave que o país já enfrentou, quando o pouco que temos de institutos de pesquisa se descabelam pra tirar do chapéu uma solução para prevenir o alastramento da doença, doutor Bolsonaro gira a faca na ferida. Cortou mais de 2/3 dos incentivos que deviam beneficiar a pesquisa.

Ele segue firme e bate o pé. Odeia a ciência. E continua apostando na derrocada do país. Em sua cabecinha, sobrevive a ideia fixa: com a nação em ruínas, montanha de mortos, caos total, ele se atribuirá plenos poderes e se tornará o salvador da pátria.

É por caminho semelhante que ditadores subiram ao trono. Napoleão se aproveitou do caos provocado pela Revolução Francesa. Josef Stalin valeu-se da bagunça que se seguiu à Revolução Bolchevique. Adolf Hitler surgiu das cinzas da Alemanha derrotada e humilhada em 1918. Só que tem uma diferença importante. Todos esses ditadores cresceram de um desmoronamento que não tinha sido provocado por eles. Já nosso doutor procura, por conta própria, provocar esse desmoronamento.

Essa teoria é a única que explica tim-tim por tim-tim todas as suas atitudes que, à primeira análise, parecem desconjuminadas e incompreensíveis. No delírio presidencial, há método.

A meu ver, a sua destituição não deveria passar pelo impeachment, caminho pedregoso e incerto; ele devia mesmo é ser interditado. Tinha de sair do Planalto direto para o hospital psiquiátrico. Lugar de Napoleão de hospício é o hospício.

Insensatez aparente

José Horta Manzano

Cuspir no prato em que se comeu é ingratidão. Cuspir no prato em que se vai comer é idiotice. Razoável mesmo é não cuspir no prato, convenhamos. Além de incivilizada, a prática é repulsiva.

Isso dito, manifestações políticas de certos artistas me deixam perplexo. Por definição, todo artista depende do apoio que recebe do público. Seu ganho vem dos que leem seus livros, assistem a seus filmes, compram seus discos, prestigiam seus espetáculos. Sem o público, o artista não sobrevive. Em tese.

Seguindo esse raciocínio, conclui-se que todo artista ajuizado deveria evitar tornar públicas suas preferências políticas. É fácil entender por quê. Se o artista deixa claras suas afinidades com o partido A ou o candidato Fulano, desagradará todos os que detestam esse partido ou essa personalidade. O perigo é que os desgostosos deixem de prestigiar o artista.

Tenho visto, estes últimos tempos, artistas conhecidíssimos dando prova explícita de aderir a determinados partidos e de apoiar determinados políticos. É de pasmar. Será que não se dão conta de que, se reforçam a admiração de certos fãs, acabam perdendo a simpatia de outros?

Diante do absurdo aparente, fica a desconfiança de que só se age assim por interesse. A debandada dos fãs há de estar sendo compensada por outros ganhos. Quais serão?

O importante é competir

José Horta Manzano

Você sabia?

O barão Pierre de Coubertin (1863-1937) não foi esportista famoso ‒ era pegadogo, historiador e humanista. Apesar disso, devemos a ele a ressureição dos Jogos Olímpicos, que andavam recobertos pela poeira da História já fazia dois milênios.

Foi pela influência, pelo esforço e pelo empenho do barão que se organizou, em 1896, a primeira Olimpíada dos tempos modernos. Com frequência, atribui-se a Pierre de Coubertin a frase «O importante é participar». Não há consenso no entanto. Há quem jure que a frase original teria sido «O essencial não é ter ganhado, mas ter lutado pra vencer».

JO 2016 4Há ainda quem diga que não é bem assim. O barão jamais disse nada parecido. A frase famosa teria sido pronunciada por obscuro clérigo americano por ocasião dos Jogos de Londres de 1908.

Seja como for, não resta dúvida de que é importante participar, um orgulho para todo atleta. Se, ao final do esforço, cair uma medalha, melhor ainda. Pra coroar, nenhum esportista vai desprezar um prêmio em dinheiro. Comitês olímpicos nacionais já se deram conta de que uma recompensa financeira pode ser estímulo poderoso.

Nem todos os comitês publicam o valor com que presenteiam medalhistas. Há controvérsia nas informações. No entanto, garimpando aqui e ali, dá pra estabelecer uma lista interessante.

A palma vai, sem sombra de dúvida, para Singapura. Naquela cidade-estado, o atleta que conseguir medalha de ouro levará a astronômica soma de 805 mil dólares, mais de 2,5 milhões de reais. Pra ninguém botar defeito.

O Azerbaidjão, que adoraria aumentar o número de medalhistas de ouro, propõe 510 mil dólares ao atleta que trouxer uma de volta a Baku.

JO 2016Os demais países vêm bem atrás. Há os mais generosos, como a Itália (180 mil dólares), o México (160 mil dólares), a Rússia e a Ucrânia (pouco mais de 100 mil dólares). A Espanha dá 94 mil, enquanto a França vem um pouco atrás, com 65 mil dólares para cada campeão. Japão e China têm orçamento mais restrito: 36 mil e 31 mil dólares respectivamente.

Os EUA presenteiam seus campeões com 25 mil dólares. Mais moderada ainda, a Alemanha não vai além de 19,5 mil dólares.

Cada medalhista brasileiro receberá quantia modesta. Serão R$ 35 mil (11 mil dólares) para campeões individuais e R$ 17,5mil para cada participante de esporte coletivo. A quantia está longe de ser exorbitante. Fico imaginando que o prêmio pudesse até ser maior mas, sacumé, rato roeu a roupa da rainha no meio do caminho. Para os atletas brasileiros, resta uma consolação: tanto faz que a medalha seja de ouro, de prata ou de bronze, o prêmio será o mesmo.

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Nota pitoresca:
Na Suécia, onde se acredita que esportista é profissão como qualquer outra e que ganhar ou perder faz parte do jogo, o comitê nacional não dá prêmio a ninguém. Medalhistas recebem um boneco de pelúcia. De tamanho grande para quem trouxer o ouro, médio para os medalhistas de prata e pequeno para os bronzeados.

O importante é competir.