O Brasil e seus estádios falidos

«As primeiras arenas já apodrecem, a corrupção devora milhões e a crise financeira piora tudo: dois anos após a Copa do Mundo no Brasil, as doze cidades-sede continuam tentando digerir as consequências.

Falta dinheiro para reembolsar os empréstimos. Faltam torcedores para encher os estádios. Faltam turistas nos hotéis. E os projetos de mobilidade continuam até hoje na fila das obras que não saíram do papel. Nada disso é de bom augúrio para o que virá depois dos Jogos Olímpicos.

Os doze estádios e as doze cidades pagam hoje o preço do gigantismo de uma Copa que vinha carregada de promessas. Tudo isso é mau presságio para o Rio, sede da Olimpíada.»

Interligne 18h

Esse trecho foi extraído de matéria publicada em 12 jul° 2016 no portal alemão Sport, especializado em assuntos esportivos. Mostra preocupação com o desenrolar da Olimpíada. Para iniciados, aqui está o texto original.

Estadio 1«Brasilien und seine Pleite-Stadien

Die ersten Arenen verrotten bereits, die Korruption verschlingt Millionen und die Finanzkrise macht alles nur noch schlimmer: Zwei Jahre nach der Fußball-WM in Brasilien haben die zwölf Ausrichterstädte noch an den Folgen der Copa 2014 zu knabbern.

Es fehlt Geld, die Kredite zurückzuzahlen. Es fehlen Fans, um die Stadien zu füllen. Es fehlen Touristen in den Hotels. Und Verkehrsprojekte stecken bis heute im Planungsstau. Kein gutes Omen für Rio und die Nach-Olympia-Zeit.

Brasilien hatte sich viel von der WM 2014 versprochen. Die zwölf Stadien und Städte bezahlen noch heute für den Gigantismus. Für Olympia-Gastgeber Rio verheißt das nichts Gutes.»

O melhor da Copa

José Horta Manzano

Cada um enxerga a Copa com seus próprios olhos. Para um jogador de futebol em começo de carreira, pode ser a vitrine que o vai propulsar ao estrelato mundial. Para um técnico profissional, pode significar a abertura de interessantes oportunidades. Para autoridades nacionais, pode servir de trampolim para angariar simpatia e votos. Para empresários corruptos, é o momento de contar e recontar a fortuna amealhada nas costas dos bobões habituais.

Para indiferentes ― que os há, acredite! ― é hora de tirar uns dias de férias e desaparecer do mundo dos mortais. Para torcedores, é um momento de emoção, de alegrias, de tristezas. E no final ― quem sabe? ― pode até chegar a hora de gozar a alegria suprema de ver a esquadra nacional subir ao degrau mais alto do pódio. A todos, é permitido sonhar.

Como não sou jogador, nem selecionador, nem autoridade, nem empresário corrupto, não lanço à Copa olhar profissional. Aprecio o esporte em si. Gosto muito daquele balé colorido e imprevisível em que a partitura é inventada e reinventada a cada instante.

Um dos atrativos maiores do futebol é justamente essa incerteza quanto ao resultado. Em outros esportes, o melhor costuma vencer. É raro que, em atletismo, o mais rápido ou o mais ágil deixe de levar a medalha. No futebol, não é assim. Já vi a Itália perder para a Coreia do Norte. Aconteceu na Copa de 1966. O resultado deixou trauma que, passado meio século, ainda não se dissipou.

Há momentos mágicos em que um jogador manda a bola por cima de meia dúzia de adversários para aterrissar aos pés de um companheiro que, por sua vez, dá sequência à coreografia. Sejam quais forem os times em campo, o espetáculo é sempre bonito. Se houver emoção, melhor ainda.

Homem com a mão no coração (detalhe) by Frans Hals, pintor flamengo, séc. XVI

Homem com a mão no coração (detalhe)
by Frans Hals, pintor flamengo, séc. XVI

Mas há um momento, nesses jogos internacionais, que ― para mim ― paira acima de todos: é a hora do hino. O nosso é fabuloso. Se hino bonito ganhasse Copa, o nosso teria mais estrelas que a Marselhesa. O nosso é de escutar em pé, mão do coração, nó na garganta.

Recortei e guardo até hoje um artigo que o jornal londrino Guardian publicou doze anos atrás, por ocasião da Copa de 2002. O autor faz esfuziantes elogios ao hino brasileiro dizendo que é o mais gentil, o mais alegre, o mais melodioso, o mais envolvente. Parece escapado de uma ópera de Rossini. Chega a dizer que nosso hino é um dos grandes presentes que o Brasil deu à felicidade humana. É mole?

Parece que a Fifa impõe que a execução do hino de cada país não exceda um minuto e meio. Muitos cabem nessa exigência. O nosso, não. O resultado é que nosso cântico nacional costuma ser truncado, sustado na metade, deixando os jogadores com cara de bobos e o público com um gosto de quero mais.

Hino BrasilEntendo que regra é regra. Leis não são feitas para serem discutidas, mas para serem cumpridas. Mas, convenhamos, nossos (sempre) distraídos congressistas, aqueles que assinaram sem ler a Lei Geral da Copa, deviam ter pensado nesse detalhe.

Posso até entender que se desviem alguns bilhões do dinheiro brasileiro para construir estádios monumentais, mas tenho dificuldade em aceitar que um de nossos símbolos nacionais mais fortes seja desfigurado diante de bilhões de terráqueos.

Os bilhões de dólares, com «arenas» ou sem elas, com «Copa das copas» ou sem ela, seriam desviados de qualquer maneira. Mas truncar o hino, ah, está aí um crime facilmente evitável.

No momento em que escrevo, faltam ainda algumas horas para a abertura do campeonato. Quem sabe uma luz terá baixado nos organizadores? Quem sabe nos deliciaremos com a execução integral da primeira parte do hino?

O futebol é esporte que sempre reserva alguma surpresa. Vamos torcer. Esperemos que seja executado sete vezes. Por inteiro.

Pior do que se imaginava

José Horta Manzano

A aproximação da «Copa das copas» vai girando os holofotes em direção a nosso país. Artigos, comentários, reportagens, emissões de rádio e de tevê vão pipocando aqui e ali.

Diferentemente do que imaginavam nossos ingênuos e inexperientes figurões quando «conseguiram convencer» a Fifa a atribuir ao Brasil a realização da copa, o que menos chama a atenção dos estrangeiros são os estádios. De «arenas», o mundo está cheio. Disseminado desde o tempo dos romanos, esse tipo de construção já não deixa mais ninguém estupefacto.

Jornalistas, em princípio, são bisbilhoteiros. Fogem de lugares-comuns e partem à cata do que está por detrás do cenário. No Brasil, não precisa ir muito longe. A decepção mora ao lado.

Duas jornalistas belgas vieram ao «país do futebol» para fazer uma radiografia detalhada. Passaram 5 meses em solo tupiniquim. O resultado, que está começando a ser publicado agora, não traz a imagem cintilante com que nossos medalhões sonhavam.

A edição online do jornal L’Avenir (de Namur, Bélgica) mostra um esboço do que será o trabalho final. Cito, a seguir, alguns trechos do artigo.Copa 14 logo 2

Interligne vertical 11a«Naquele país paradoxal, em pleno crescimento econômico, mas que carrega o peso de grandes desigualdades sociais e de extrema pobreza, a grande festa está sendo preparada, mas a cólera cresce e ameaça.»

«Em junho passado, milhões de brasileiros berraram seu descontentamento nas ruas do país inteiro com o slogan “Copa para quem?”»

«Fortaleza se caracteriza pelo turismo sexual, por milhares de crianças de rua e pelas favelas. Uma realidade negra, que não corresponde à imagem que o Brasil quer vender à mídia internacional.»

«O Brasil aproveita a copa para limpar as cidades, mas sem dar solução aos problemas. A miséria é simplesmente afastada.»

«Vimos coisas que, aqui na Europa, ninguém pode imaginar. Uma das piores imagens foi a de uma menina de 10 anos, magrelinha e completamente drogada, que se prostituía.»

Prefiro parar por aqui. Se alguém quiser ler o original em francês, que clique aqui.

O respeito que um país inspira não provém da excelência de seus estádios, mas do grau de civilização de seu povo.

Escolha errada

José Horta Manzano

Talvez seja tarde demais, é verdade, mas… antes tarde do que nunca. Antevendo catástrofe no ano que vem, o presidente da Fifa finalmente reconhece que a escolha do Brasil para sediar a próxima Copa do Mundo pode não ter sido uma boa ideia. Foi delicado, falou suave.

E tem razão, ninguém pode negar, embora receio que seja demasiado tarde para voltar atrás. Bilhões já foram enterrados nessa aventura extravagante. Governo do Brasil, patrocinadores, a própria Fifa, nenhum dos envolvidos pode mais desistir. Malfeito foi, malfeito continua sendo, e malfeito continuará.

Estava bonito no papel, na prancheta e na conta bancária. Tudo parecia perfeito. Esqueceram de combinar com o povo. Os ingênuos mandachuvas brasileiros menosprezaram a inteligência dos habitantes do País. E os gananciosos dirigentes da Fifa acreditaram nas garantias do governo brasileiro.

Estava aí uma ocasião de ouro para organizar um plebiscito. Falo de 7 anos atrás, evidentemente. O governo teria assim jogado a responsabilidade no colo do povo. Ninguém poderia reclamar. Mas, que fazer? Entre o plebiscito que não houve e o governo que não ouve, deu no que deu.

Árbitro Crédito: Kopelnitsky, EUA

COPA DO MUNDO
By Kopelnitsky, EUA

Cada povo tem suas características, destiladas por um processo multissecular. Cada povo tem suas qualidades e seus defeitos. O rigor e a disciplina certamente não fazem parte da coletânea de qualidades maiores de nossa gente ― bem ao contrário.

A organização de um evento da magnitude de uma fase final de Copa do Mundo de futebol exige qualidades e prendas que ainda não possuímos. Se bastasse construir estádios monumentais e dar-lhes a bizarra apelação de «arena», o problema estaria resolvido. Infelizmente, precisa um pouco mais que sol, samba, carnaval e mulatas para organizar o espetáculo.

Temos falhas estruturais capazes de frustrar o sucesso de eventos mundiais. Há remédio para tudo, mas precisa comprar o medicamento e seguir a receita tim-tim por tim-tim. O tratamento vai levar tempo.

A visão de nossos políticos não alcança mais longe que a próxima eleição, portanto esses tratamentos a longo prazo não têm grande chance de serem adotados.

É muito chato que aconteçam coisas como esse pronunciamento de Herr Blatter, paxá da Fifa. Uma frase saída da boca de gente desse calibre é capaz de aniquilar anos de maquiagem de marqueteiros do Planalto. A imagem de país de Primeiro Mundo, moldada com tanto cuidado por «peritos em comunicação», escoa pelo ralo.

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Aqui está um florilégio da repercussão mundial da fala de Herr Blatter.

Interligne vertical 5No Brasil

No México

No Canadá

Na Alemanha I

Na Alemanha II

Nos Estados Unidos

Na Itália

Na França

No Peru

Na Inglaterra

Em Portugal

Se o mundo ainda existir ― e o Brasil e o futebol também ― talvez estejamos em condições de nos candidatar para sediar a Copa de 2126. Ou quem sabe a de 2130, ano que marcará o 200° aniversário do primeiro Campeonato Mundial de Football, como se dizia na época.

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