José Horta Manzano
Angola? O que é que você sabe de Angola? Muito pouco, não é? O que todos aprendemos na escola é que o país se formou ao longo dos quase cinco séculos que durou a colonização portuguesa.
Fique também sabendo que o comandante luso Diogo Cão aportou por aquelas bandas alguns anos antes do desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro.
Claro está que o país não existia ainda como entidade política naqueles tempos recuados. Como do lado de cá do Atlântico, os novos chegados criaram entrepostos em diversos pontos do litoral, estabelecimentos esses que não necessariamente mantinham contacto entre si. Não havia telefones nem GPS naquele tempo.
Com o passar dos anos, as terras africanas ― assim como as americanas ― atraíram aventureiros de outras origens. Ingleses, franceses, holandeses, espanhóis, muitos se interessaram pela exploração das riquezas.
A costa africana que, conforme a Bula Intercaetera e o Tratado de Tordesilhas, deveria ser reservada à exploração portuguesa foi-se esfacelando. Os proprietários que o decreto papal havia designado como «legítimos» não eram numerica nem militarmente suficientes para garantir a posse do longuíssimo litoral do continente.
Os portugueses se saíram bem na defesa de seus estabelecimentos americanos. Já na costa ocidental da África, conseguiram segurar somente o arquipélago de Cabo Verde e mais alguns minúsculos territórios esparsos. Preferiram concentrar suas forças para assegurar a posse da então chamada África Ocidental Portuguesa, embrião da atual Angola.
A Revolução dos Cravos, que sacudiu Portugal em 1974, provocou súbita e desastrada descolonização. Tudo o que restava do império ultramarino foi abandonado. Angola mergulhou num longo período de caos e de lutas cujas cicatrizes ainda estão hoje sendo tratadas.
Apesar da pobreza em que vive grande parte da população, os dirigentes do país vêm mostrando, estes últimos anos, uma clarividência que gostaríamos de enxergar nos mandachuvas de nosso ultraorganizado Brasil.
Faz já uns 20 ou 30 anos que seitas neopentecostais ditas «evangélicas» proliferam em terra tupiniquim. Em nome da liberdade de culto, inscrita na Constituição de nossa República Federativa, o governo central tem dedicado pouca atenção à espantosa e desordenada multiplicação desses agrupamentos.
É importante que liberdade de consciência seja garantida a cada cidadão. Sem isso, estaríamos escorregando para uma ditadura. No entanto, há princípios que primam sobre outros. A obrigação maior de um Estado civilizado é proteger os mais frágeis entre seus cidadãos. As variadas bolsas têm, mal e mal, dado conta das necessidades materiais básicas do brasileiro.
No entanto, a proteção há de ser mais ampla. Não basta aplacar a fome dos que não têm como prover a seu próprio sustento. Há quantidade de brasileiros que, embora consigam garantir seu prato de comida sem ter de esperar pela esmola de quem quer que seja, não dispõem de estrutura intelectual suficientemente sólida para resistir a charlatanismos vários.
Ao mesmo governo que mitiga a fome cabe também defender a população contra flagrantes abusos que vêm sendo cometidos. O País está cheio de espertinhos que se valem da ingenuidade de pessoas simples. Muitos andam enchendo os bolsos à custa da credulidade alheia. Além de ser coisa muito feia, abusar da fragilidade de outrem é crime. Mas vem passando impune no Brasil de todos.
Pela pluma de Patrícia Campos Mello, a Folha de São Paulo nos informa que os governantes de Angola ― o pobre e sofrido país africano ― têm tomado iniciativas para proteger sua população mais frágil contra o que consideram «propaganda enganosa».
Recomendo a leitura da reportagem. É edificante. Enquanto a ex-colônia portuguesa, machucada e cansada de guerra, se preocupa com a proteção de seus cidadãos mais fracos, a Câmara Federal brasileira escolheu um pastor neopentecostal racista e homófobo para comandar sua Comissão de Direitos Humanos. De direitos humanos!
E pensar que os «emergentes» somos nós…
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