José Horta Manzano
O verbo latino torquere deixou descendência abundante. Está na raiz de torcer, distorcer, contorcer, retorquir, torto, torso, entortar, tocha. Aparece também em derivados como torção, distorção, tortuoso, retorção (retorsão), tortilha, contorção, torta. Há outros parentes: torcedor, tortura, tortellini e até torcicolo são membros da mesma árvore genealógica.
Deixei fora da lista um filhote importante: extorquir. Nestes tempos violentos em que bandidos fazem a lei, o verbo anda muito na moda. O assaltante que, num sequestro relâmpago, obriga o infeliz cidadão a retirar dinheiro do caixa eletrônico está cometendo extorsão. O criminoso que chantageia alguém está tentando extorquir algo da vítima, geralmente dinheiro.
A notícia diz que o chefe do tráfico da Vila Aliança foi extorquido. Nada feito. Não se extorque alguém; extorque-se algo de alguém. Para não errar, é só lembrar que extorquir é sinônimo de arrancar (por ardil ou com violência). Não se arranca uma pessoa; arrancam-se objetos dela.
A notícia informa ainda que os policiais teriam tentado extorquir dinheiro do tornozeleirado, se é que posso me exprimir assim. Se conseguiram, não sei. Se a história for verdadeira, a gente fica sem saber que é mais bandido nesse episódio. Parece que, em nossa terra, só não delinque quem não tem oportunidade.
O conceito de extorquir envolve sempre a violência, explícita ou velada. Num procedimento reprovável mas bastante comum no mundo todo, policiais costumam extorquir a confissão de um indivíduo detido. Reparem bem: extorque-se a confissão, não o indivíduo.
Embora seja corriqueiro dizer que «fulano foi extorquido», a boa língua recusa essa construção. Correto será dizer que dinheiro foi extorquido do indivíduo assaltado ou que a confissão foi extorquida por meio de pressão psicológica.
Extorquir equivale sempre a obter alguma coisa de alguém por ardil (na conversa) ou por meio violento ou ameaçador.