Mau caminho

José Horta Manzano

Dos últimos que fizeram esse gesto, nenhum escapou. Dirceu e Genoino – os heróis do povo brasileiro – terminaram atrás das grades da Papuda. E Vargas – o imprudente ofensor de ministro do STF – viu seu mandato cassado pelos próprios pares.

Lula e GabrielliFosse eu, não levantaria punho cerrado na frente de fotógrafos. No Brasil de hoje, é preâmbulo à queda ou, pior, à encarceração. Te esconjuro, sô!

Lenin 1Observação:
Se, apesar do risco, o personagem preferir insistir no levantamento de punho cerrado, mais vale tomar lição de história: a Saudação de Lenin se faz com o braço esquerdo. Sempre.

Reparem como a peculiar plateia aplaude qualquer bobagem.

Tem bobo pra tudo

José Horta Manzano

Interligne vertical 14Tem alguém que é bobo de alguém, apesar do estudo
Está provado porque neste mundo tem bobo pra tudo.

Samba de Manoel Brigadeiro e João Correia da Silva, 1963

Não sei se terá saído de moda. É que as coisas andam mudando muito rápido. No meu tempo, se dizia bocó. Era quando a gente queria designar um bobão, daqueles que se dão ares de independência e superioridade ao mesmo tempo que seguem o rebanho. Aqueles que se acham o máximo, embora, sem se dar conta, ajam exatamente como os demais.

Tem bobo pra tudo

Tem bobo pra tudo

Assim como a fala e a escrita, o gestual deve primar pela clareza. O que é, é. O que não é, não é. Nada pode ser e não ser ao mesmo tempo. Cada um de nós, quer nos expressemos falando, escrevendo ou gesticulando, devemos deixar claro o sentido da mensagem. Ou corremos o risco de ser mal interpretados, com todas as consequências que isso possa acarretar.

Já falei em post anterior sobre a simbologia múltipla de certos gestos, mormente da «saudação de Lênin», usada como pau pra toda obra. Ao longo dos últimos 120 anos, tem sido usada por esquerdistas, direitistas, anarquistas, constestadores, revolucionários, separatistas, feministas, terroristas, socialistas, trabalhistas y otros más. É gesto polivalente. Donde, dúbio. Portanto, perigoso. Não deixa clara a mensagem que o autor gostaria de transmitir.

Nesta terça-feira, quis o acaso que doutor Barbosa, o presidente do STF, tomasse assento ao lado do vice-presidente da Câmara dos Deputados. Este último ― personalidade pouco expressiva e pouco conhecida ― decidiu aproveitar o momento de glória e de exposição às câmeras que a proximidade do doutor lhe proporcionava.

Ingênuo, fez exatamente o que não devia. Ensaiou o gesto dúbio, aquele que, de tão batido, não transmite mais mensagem nenhuma. Primeiro, levantou o braço esquerdo com o punho cerrado. Em seguida, não satisfeito, refez o gesto, desta feita com o braço direito. Para coroar, pôs-se a enviar mensagem por seu telefone de bolso. Estou falando do vice-presidente da Câmara, minha gente. Desde os tempos da Alemanha hitleriana, não me ocorre algum outro caso de autoridade levantando punho cerrado em plena assembleia.

Decoro
Está lá no dicionário para quem quiser ver. São quatro as acepções principais:

Interligne vertical 111. Recato no comportamento; decência.
2. Acatamento das normas morais; dignidade, honradez, pundonor.
3. Seriedade nas maneiras; compostura.
4. Postura requerida para exercer qualquer cargo ou função, pública ou não.

O gesto do senhor vice-presidente da Câmara Federal da República, consumado no recinto do parlamento, responde às quatro acepções. Atropela o decoro parlamentar. Agride o decoro tout court. Um certo senhor de nome Severino, que um dia teve assento privilegiado naquele mesmo recinto, tinha muitos defeitos. Mas não descia ao ridículo. O atual vice-presidente é o que a gente chamava de bocó de mola.

Tem bobo pra tudo Crédito: Sérgio Lima, Folhapress

Tem bobo pra tudo
Crédito: Sérgio Lima, Folhapress

Num país civilizado, essa demonstração de baixo nível seria punida com o desprezo dos eleitores acompanhado da exclusão imediata do parlamentar. Se nossas excelências deixarem passar essa afronta sem denunciá-la ao Conselho de Ética, é sinal de que o vale-tudo vale tudo.

Que se libere o bermudão e o chinelo de dedo.Interligne 16

PS: Para recordar o samba Tem bobo pra tudo, na voz de Alcides Gerardi, clique aqui.

Tem quem aprende

E tem quem, passados 25 anos, ainda não aprendeu…

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Lula de punho em riste ― 1989

Lula de punho em riste ― 1989

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Lula de punho em riste ― 2013

Lula de punho em riste ― 2013

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A quem não entendeu, sugiro dar uma espiadela em meu artigo
A simbologia e a inconsistência
publicado em 18 nov° 2013.
Está lá a receita da “saudação de Lênin” como manda o figurino.
Evidentemente, ninguém é obrigado a aprender.

A simbologia e a inconsistência

José Horta Manzano

Observem a imagem das duas figuras mais emblemáticas do mensalão quando faziam pose para as câmeras pouco antes de serem despachadas à Papuda.

Dirceu: braço direito Crédito: Agência Estado

Dirceu: braço direito e sorrindo = ERRADO
Crédito: Agência Estado

Desde tempos imemoriais, o homem se serviu de braços e mãos para assinalar sua presença, saudar, ameaçar, demonstrar alegria, repúdio, desprezo, satisfação. Mas a saudação com o punho fechado é pouco generosa. Não precisa ser especialista em semiologia nem em ocultismo para entender que, enquanto a mão aberta dá, a mão fechada retém e guarda para si.

Saudar com a mão aberta é simpático, familiar, amistoso. Todos costumamos fazer isso para dizer oi, para dizer tchau, para dar adeus. Não viria à cabeça de ninguém fazer a outrem um gesto com o punho cerrado. Instintivamente, evitamos o que pode ser interpretado como agressão.

Genoino: braço dobrado

Genoino: braço dobrado = ERRADO

Como se dizia antigamente, nossos dois pitorescos personagens ouviram cantar o galo, mas não sabem onde. A saudação conhecida como «de Lênin» se faz com o punho fechado, o braço esquerdo esticado e levantado, sem esboçar nenhum sorriso. Tem de ser o braço esquerdo. E não pode estar dobrado, mas sempre estendido para cima.

Como todo gesto hostil, é perigoso: não fica claro a quem está sendo dirigido. Ao povo? Ao governo? Ao Supremo Tribunal? Aos policiais? Aos companheiros de partido que escaparam de condenação? Cada um é livre de interpretar como lhe aprouver. Um símbolo que não é entendido pela assistência não tem valor.

Ao longo do tempo, esse gesto tem sido usado por dezenas de grupos e grupelhos. Esquerdistas, direitistas, anarquistas, constestadores, revolucionários, separatistas, feministas, terroristas, socialistas, trabalhistas foram ― alguns ainda são ― adeptos desse tipo de saudação.

Hugo Chávez: braço direito

Hugo Chávez: braço direito e sorrindo = ERRADO

Pelas ambiguidades que pode criar, mais vale evitar o gesto. No entanto, quem fizer questão de saudar assim deve fazê-lo sempre com o punho cerrado, o braço esquerdo totalmente estendido e dirigido para cima. E sem sorrir.

Nossos guias regionais, como se pode apreciar pelas fotos desta postagem, têm uma interpretação bastante pessoal e aproximativa da rígida «saudação de Lênin». Braço esquerdo ou direito, estendido ou meio dobrado, tanto faz. Pode até mostrar os dentes num sorriso.

Sem dúvida, a atitude leviana e displicente combina com a inconsistência dos personagens.