Humor inadequado

José Horta Manzano

Bebida 2Não sei se é permitido entrar no parlamento brasileiro com bebida alcoólica na sacola. Mesmo que seja proibido, difícil será controlar.

O senador paulista José Serra – engenheiro, economista, poliglota – já governou seu estado. A idade, aliada à cultura razoável e ao traquejo conferido por cinquenta anos de política, deveria ter bonificado o personagem.

Todos temos direito a algum deslize, que ninguém é perfeito. No entanto, o que é admissível num bate-papo informal não é tolerável no discurso público de um parlamentar.

Ontem, 9 de junho, o senador criticava a tendência, típica do grupo que nos governa há doze anos, de privilegiar obras faraônicas, o mais das vezes irrealizáveis. Como exemplo, citou a estrambótica ideia do trem-bala, felizmente enterrada. Até aí, nada a assinalar: o parlamentar estava apenas cumprindo seu papel de político de oposição.

O caldo engrossou quando, numa didática tortuosa, senhor Serra citou uma fábula bizarra sobre a descoberta do churrasco pelos chineses, uma historinha sem pé, sem cabeça e sem graça.

by Fabricio Pontes, desenhista paraense

by Fabricio Pontes, desenhista paraense

Mas foi logo em seguida que a coisa desandou de vez. O senador aconselhou ao governo que, para evitar investir 75 bilhões numa estrada de ferro no único intuito de adquirir tecnologia, recorresse ao suborno, ao roubo de informação.

Com esse rasgo patético, Serra desceu ao nível de Paulo Maluf, aquele que já foi governador biônico e está hoje na lista de procurados pela Interpol. Certa vez, criticando o ato de um estuprador que havia assassinado a vítima, Maluf aconselhou: «Tem desejo sexual? Estupra, mas não mata!»

Não estivéssemos atravessando tempos tão bicudos, com escândalos pipocando diariamente, a fala do senador Serra poderia gerar processo de perda de mandato por falta de decoro. No mínimo, merece uma admoestação.

Etilômetro, o popular bafômetro

Etilômetro, o popular bafômetro

O senador perdeu excelente ocasião para criticar a falta de investimento do governo em educação de alto nível. Preferiu argumentação de botequim. É pena. Dizem que a fala foi “irônica”. Brincadeira tem hora e lugar.

Por via das dúvidas, seria conveniente instalar um bafômetro ao lado do púlpito de onde parlamentares discursam. Todos seriam obrigados a passar pelo teste antes de cada pronunciamento.