Bombeiros que combatem incêndios florestais conhecem o princípio do contrafogo. A técnica consiste em extinguir o incêndio suprimindo o combustível. Para isso, acende-se um fogo um pouco à frente do incêndio principal; esse novo foco de incêndio, que tem de ser comportado e controlado, vai eliminar a vegetação naquela zona. Quando incêndio principal avançar e chegar a esse ponto, não vai encontrar mais madeira para queimar. Assim, se extinguirá.
Em sentido figurado, usa-se o termo “acender um contrafogo” para designar uma técnica utilizada em política: quando surge um escândalo com potencial de estrago, acende-se um contrafogo, ou seja, cria-se um novo escândalo, que abafará o primeiro. Nosso ex-presidente utilizava essa técnica dia sim, outro também.
O escândalo da propina das Arábias, paga em forma de diamantes destinados ao capitão, não sai das manchetes nem das conversas. Cada dia, novas revelações atiçam as chamas do incêndio. As pobres explicações do ex-presidente fugido não passam de balbuciamentos acanhados, insuficientes para aplacar as labaredas.
Nesse contexto de salve-se quem puder, um deputado bolsonarista de ar adolescente decidiu tomar as rédeas da situação e acender um contrafogo. Terá sido comandado por sua hierarquia? Difícil saber. O fato é que aproveitou o Dia Internacional dos Direitos da Mulher para dar um show de baixaria em plena Câmara Federal. Acredito que não é necessário repetir aqui as palavras sórdidas que o deputado pronunciou, cabecinha encimada por uma peruca amarela – o Brasil inteiro tomou conhecimento.
O que me perturba não é tanto o tom arrogante do rapaz que olha com desdém seus compatriotas menos afortunados – essa soberba é própria a todos os devotos do capitão. O que me impressiona é a fixação que essa gente tem em matéria sexual.
“Imbrochável” foi o neologismo que Bolsonaro criou e pronunciou em diversas ocasiões referindo-se a sua pessoa. Teve também aquela vez em que ele chamou os brasileiros de “maricas” por tentarem se proteger contra a covid. O fato de ter uma filha mulher, que ele qualificou de “fraquejada”, também enriquece a coleção. E o episódio do “golden shower”, que ele fez questão de divulgar para toda a população? Lembro ainda do dia em que, no cercadinho, ele se virou para um repórter que tinha feito uma pergunta incômoda e o insultou dizendo que “tinha uma cara terrível de homossexual”.
Ficou claro que Bolsonaro sofre de pesados distúrbios de identidade sexual. Sua fixação com o assunto o denuncia. O que eu não sabia é que a doença é contagiosa. Talvez por se sentir muito próximo ao ex-presidente ou talvez por ter passado muito tempo próximo a ele, o deputado com ar adolescente demonstra ter absorvido o cacoete. Ou talvez essa característica já lhe venha de nascença. O moço vai pelo mesmo caminho que Seu Mestre: demonstra fixação em matéria sexual. Podia ter escolhido outro tema pra rodar a baiana: falar mal dos índios, do currículo escolar, da Nicarágua, do ministério do Lula. Mas não, foi atraído pela matéria sexual.
No caso do deputado, um bom psicólogo pode até resolver o transtorno. Já para o ex-presidente, psicólogo não resolve. É bom ir chamando logo a equipe do manicômio. E que tragam injeção de calmante e camisa de força.
Post scriptum
O contrafogo do rapaz não funcionou, deu chabu. Os profissionais da mídia tradicional não são bobos – deram pouca atenção ao discurso indecoroso. As joias continuam sob os holofotes e Bolsonaro, na berlinda.