Conduzir a Igreja Católica não é tarefa para amadores – nem mesmo para santos. Desde que Pedro trocou as redes de pesca pelo governo das almas, o sucessor de Cristo na Terra tem vivido o angustiante dilema de apascentar um rebanho que, com o passar das décadas, vem mostrando tendência a afastar-se dos preceitos. Com o papa Francisco, esse drama atingiu novos e intricados capítulos.
Desde o início de seu pontificado, Jorge Bergoglio deixou claro que não seria apenas o “papa simpático” das selfies e dos discursos emocionantes. Ele tinha convicções firmes: uma Igreja pobre para os pobres, aberta ao diálogo com o mundo contemporâneo e mais preocupada em acolher almas do que em policiar comportamentos. Mas querer é uma coisa; fazer, especialmente no Vaticano, é outra bem diferente.
Francisco viu-se sitiado entre duas frentes surdas: de um lado, a ala conservadora, sempre pronta a acionar o freio de mão dogmático a cada aceno de mudança; de outro, o progressismo ansioso, que muitas vezes lhe cobra avanços com a impaciência típica de quem desconhece a lentidão peculiar do tempo eclesiástico – um “sim” pode levar décadas e um “não” pode durar séculos.
Os conservadores escrutaram com desconfiança cada gesto pastoral do papa: se ele visitava uma prisão, era “populismo”; se falava em mudança climática, era “desvio de missão”. Já os progressistas, que sonham com reformas profundas – ordenação de mulheres, revisão do celibato, reconhecimento de novos modelos de família –, frequentemente se frustraram com a cautela e as meias palavras do pontífice argentino. Entre uns e outros, Francisco governou o barco como pôde, entre escolhos e sargaços.
Para impor uma visão de Igreja, é preciso mais do que carisma: é necessário ser uma força da natureza. Desde João XXIII – aquele que, com candura e astúcia, abriu as janelas do Vaticano ao mundo – não se viu outro papa com perfil verdadeiramente transformador. Paulo VI teve a intenção, mas não o apoio. João Paulo II, o vigor, mas o apego a velhas práticas. Bento XVI, o intelecto, mas não o pulso. E Francisco? Teve o sonho, mas faltou-lhe o exército.
No fundo, a Igreja continua esperando aquele homem providencial capaz de, com mão firme e sorriso sereno, romper o imobilismo e trazer a barca de Pedro a nossos tempos. Desta vez, ainda não foi possível. Mas resta a todos a esperança: essa, sim, uma virtude teologal.



