Warum einfach?

José Horta Manzano

«Warum einfach wenn es auch kompliziert geht?» ‒ Por que fazer simples, se complicado também funciona?

Os alemães recorrem a essa pergunta para denunciar toda complicação inútil. Lembrei disso outro dia, quando fiquei sabendo que, em São Paulo, todo comprador de carro novo pode agora escolher placa a seu gosto ‒ desde que disponível, evidentemente.

Placa 17Para satisfazer o capricho, o feliz proprietário terá de desembolsar exatos R$91,18. Você leu bem: 91 reais e 18 centavos. Pergunto eu: por que 18 centavos? Por que não 17 ou 19?

Francamente, em matéria de complicação inútil, é difícil ir mais longe. Números quebrados, como esse, dão margem maior a erro de digitação, problema de troco, dificuldade de fazer conta. Em resumo, isso não ajeita a vida de ninguém.

A ideia, em si, não é má. Aqui na Suíça, alguns cantões têm sistema análogo. No Cantão de Vaud, por exemplo, o valor de placa livremente escolhida pode variar de 300 francos (R$1100) a 2000 francos (R$7200). Vez por outra, placas cobiçadas são vendidas em leilão por internet. O leilão é organizado pelo Departamento de Tráfego. Placas chegam a ser arrematadas por preço astronômico. Vaidade tem seu preço, ora.

Tem um senão: para evitar que se instale uma bolsa paralela de placas, a revenda de particular a particular é rigorosamente proibida.

Placa 18Ignoro a razão de as autoridades paulistas terem fixado o valor com tamanha exatidão. Seja ela qual for, terá sido preciosa contribuição para acrescentar um grãozinho de areia à crônica complicação nacional. Tivessem fixado em, digamos, 90 reais ou 100 reais, a Terra não teria deixado de girar. E a vida teria seguido, sem mais atrapalhação.

«Warum einfach?»

Burocracia

José Horta Manzano

É voz corrente que a burocracia brasileira é pesada. Carimbos, firmas reconhecidas, atestados, certificados e quejandos tornam ainda mais complicado o dia a dia do cidadão.Burocracia

Eu me pergunto, contudo, se esses entraves não seriam a essência, o espírito de nosso povo: desconfiado, minucioso, cheio de pormenores. Todo o mundo é considerado suspeito até que prove o contrário.

Ainda agora, estava lendo um artigo interessante de Bianca Pinto Lima publicado no Estadão deste 6 de março. A articulista lança um alerta aos que estão a ponto de declarar sua renda ao fisco. Lembra aos declarantes que certos erros primários e fáceis de evitar podem trazer consequências pra lá de desagradáveis.

Em seguida, o artigo discorre sobre limites, montantes admitidos, porcentagens, minúcias. Fiquei surpreso com um rigor detalhista ao qual não estou habituado.

by Serguêi Túnin, desenhista russo

by Serguêi Túnin, desenhista russo

Despesas com educação permitem abatimento de até 3’230,46 reais. Empregado doméstico dá ao patrão o direito de deduzir 1’078,08 reais de sua renda tributável. Cada dependente propicia franquia de 2’063,64 reais. Por que tamanha precisão? Por que 46 centavos aqui, 8 ali, 64 acolá?

Peço desculpa pela franqueza: muito mais do que exatidão, isso é burrice. Alguém já fez a conta dos minutos perdidos pelo declarante entre escrever e calcular os 8 centavos aqui e os 46 ali? Alguém já multiplicou esses minutos pelos milhões de declarações preenchidas a cada ano? Alguém já calculou o desperdício de tempo e de energia que isso acarreta ao País? Sem contar o risco de erro que, reforçado, acaba penalizando inocentes.

É simples remediar. Que se comece por desprezar os centavos nas declarações. Que se fixem montantes e deduções arredondadas. Nada de centavos. Se possível, que terminem em 10, 20, 30. Melhor ainda se terminarem em centenas redondas.

No nosso exemplo, os abatimentos ficariam assim:

Interligne vertical 10Educação = 3’200 reais
Empregado doméstico = 1’100 reais
Dependente = 2’100 reais

Não fica mais fácil? O que se perde aqui, ganha-se ali. Por que complicar? Um tijolinho cá, outro lá, um dia a casa fica pronta.

Deixo aqui a sugestão. Se algum de meus distintos leitores for um chegado do doutor Leão, que nos faça o obséquio de dar-lhe um toque. De leve, porque leão, como sabemos todos, é animal irracional.