José Horta Manzano
Extra! Extra! Notícia de primeira mão!
Sarkozy foi preso!
Bem, agora que você chegou até aqui, vamos suavizar o título sensacionalista. Nicolas Sarkozy, ex-presidente da República Francesa, foi detido para averiguações. Desde as 8h da manhã desta terça-feira (3h em Brasília), está no Escritório Central de Luta contra a Corrupção, em Nanterre, nas cercanias de Paris.
O antigo presidente está enquadrado na figura jurídica chamada «garde à vue». É situação intermediária entre liberdade e detenção provisória. O averiguado é levado à delegacia de polícia para interrogatório, numa retenção que pode durar 24 horas prorrogáveis por mais 24 horas.
É mais ou menos como se vê nos filmes: o acusado, caindo de sono em cima de uma escrivaninha, ganha um sanduíche de um solícito interrogador que o incita a começar a contar a história de novo. Se o filme for dos anos 50, um escrivão, sentado no fundo da sala, bate à máquina a ata da deposição. Hoje, o mesmo funcionário desempenha a mesma tarefa num teclado de computador.
Durante a «garde à vue» ― literalmente retenção à vista ― o investigado não deve escapar à vigilância de seus interrogadores em nenhum momento. É situação humilhante e desgastante. Até para ir ao banheiro, o infeliz tem de pedir licença. A intenção é justamente enfraquecer a resistência psicológica do inquirido e forçá-lo a falar.
Ao final da «garde à vue», o comissário de polícia decidirá. Tanto pode dar o caso por encerrado e liberar o indivíduo, como pode, caso julgue que há provas suficientemente sólidas, encaminhá-lo a um juiz que, por sua vez, determinará a sequência dos acontecimentos.
Logo que ouvi a notícia hoje de manhã, resolvi contar a vocês. Não exatamente com intenção de lhes dar um curso de Direito Processual, que não sou capacitado para isso. O que me diverte é o fosso que se escancara entre as práticas judiciais de lá e de cá.
As razões pelas quais Monsieur Sarkozy foi detido são bastante nebulosas. Seu espírito inteligente e mordaz angariou-lhe admiradores fiéis mas também inimigos viscerais. Tem muita gente que o acolheria em casa, se preciso fosse. Mas também há muitos que não hão de sossegar enquanto não o tiverem derrubado.
A acusação? Parece que o ex-presidente tem recebido, de magistrados amigos, informações privilegiadas sobre processos em que ele mesmo está envolvido. Processos ainda em andamento, naturalmente. Trata-se de coisa que, no Brasil, mereceria uma notazinha de dez linhas lá pela página 14, se tanto.
Nossa percepção de malfeitos varia conforme a frequência com que eles ocorrem. Um homicídio na Islândia rende assunto para anos. A mesma ocorrência no Brasil periga nem aparecer no jornal, dependendo da carga de notícias do dia.
Na França, a suposição de que um antigo presidente possa ter corrompido autoridades manda qualquer figurão pra delegacia e rende pano pra longuíssimas mangas. Já no Brasil…
Prezado Manzano, no Brasil não renderia “uma notazinha de 10 linhas lá pela página 14” porque um ex-presidente não seria submetido a isso. Imagine! Deter um ex-presidente para averiguações! Nem em sonho isso aqui… No máximo, o adjunto do secretário do empregado do motorista para dar as explicações. E se alguém for preso, será o mensageiro e não o autor do fato. Infelizmente!!!
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