Sarkozy hoje – Bolsonaro amanhã?

Chamada do jornal O Globo, 30 set° 2021

José Horta Manzano

Faz mais de 9 anos que Nicolas Sarkozy, presidente da França não reeleito, entregou o cargo a seu sucessor. O povo quase já se esqueceu daquele período, que hoje parece tão distante. Mas o tempo da justiça não corre no mesmo ritmo do tempo dos homens. A justiça não se esqueceu dele.

Em primeiro lugar, porque justiça é assim mesmo. A menos que prescreva antes, todo processo segue seu curso e acaba chegando a um final. Em segundo lugar, porque um indivíduo que ocupou cargo elevado acaba fatalmente espalhando inimizades e rancores pelo caminho. Não precisa nem se comportar como nosso capitão, que parece colecionar inimigos por prazer; o mero exercício da função esbarra sempre em susceptibilidades pessoais e gera mágoas e olho gordo.

Saiu hoje a notícia de que Sarkozy foi condenado a um ano de prisão em regime fechado, ao final de um complicado processo que lhe moveram por financiamento ilegal da campanha presidencial de 2012 – aquela da reeleição, que ele acabou perdendo. Ainda cabe recurso. Nesses casos, porém, o condenado aguarda preso. Por generosidade do tribunal, talvez por ser o réu ex-presidente da República, ele poderá aguardar o julgamento do recurso trancado em casa, com tornozeleira eletrônica.

O ex-presidente responde ainda a meia dúzia de processos. Em nenhum ele é acusado de crime de sangue nem violento; todos se referem a “malfeitos” de natureza semelhante ao da condenação de hoje.

Nosso apreciado doutor Bolsonaro deveria refletir muito e muito sobre esta verdade: as coisas não duram eternamente. A situação evolui, muitas vezes mais rápido do que a gente imagina. E nem sempre no sentido em que a gente gostaria que evoluíssem.

Até a princesa Isabel, que os livros de História santificaram durante 150 anos, começa a sofrer os danos relativos à passagem do tempo. Ainda hoje, li uma chamada n’O Globo, que sugere que ela era dona de escravos e que “apenas assinou” (repare bem: o “apenas assinou” vem entre aspas) a Lei do Ventre Livre. Hoje Bolsonaro cospe fogo pelas ventas, sentindo-se por cima da carne seca. No entanto, a prudência manda… ser prudente. Golpe de Estado, ele já percebeu que não vai conseguir dar. Reeleger-se, está cada dia mais perto de ser “missão impossível”.

Nem ele é a princesa Isabel, nem estamos no século 19. No caso dele, o Brasil não vai esperar 150 anos pra cair na real. Rei morto, rei posto. No dia em que ele entregar a faixa e descer a rampa, os problemas vão começar. E virão pra valer. Se o Lula amargou ano e meio atrás das grades, por que é que o capitão escaparia?

Observação
Condenado ou não, o antigo presidente da França mantém intactas a inteligência e a verve. Veja o que ele declarou no início desta semana numa entrevista televisiva.

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