Ai, que preguiça…

José Horta Manzano

Há de ser birra minha, porque errado não é. Assim mesmo, continuo pasmo com o fato de numerosos escrevinhadores ‒ falo de profissionais ‒ não se preocuparem em fugir da rotina e do ramerrão. Gente de jornal, cujo escrito atingirá milhares de leitores, parece não estar nem aí, como se usa dizer.

Chamada Estado de São Paulo, 10 maio 2016

Chamada Estado de São Paulo, 10 maio 2016

Compreendo que dá menos trabalho copiar ‒ ou, digamos, reproduzir ‒ o que já vem pronto. Pra que fazer se é tão mais prático comprar feito, não é?

Chamada Folha de São Paulo, 10 maio 2016

Chamada Folha de São Paulo, 10 maio 2016

O Brasil viveu, neste 9 de maio, mais um dia de república bananeira. Confirmamos, a cada dia mais, a veracidade do conceito que imaginávamos definitivamente banido: «O Brasil não é um país sério». Não se sabe direito quem lançou essa desagradável expressão. Seja quem for, havemos de convir que não estava longe da verdade.

Chamada O Tempo (Belo Horizonte), 10 maio 2016

Chamada O Tempo (Belo Horizonte), 10 maio 2016

Voltando à preguiça dos que escrevem, reparei na manchete principal da mídia na manhã desta terça-feira. Uma sensaboria. Quase tudo igual.

Chamada Gazeta do Povo (Curitiba), 10 maio 2016

Chamada Gazeta do Povo (Curitiba), 10 maio 2016

O Estadão (SP), a Folha (SP), O Tempo (BH) usaram os verbos recuar, revogar e anular. A Gazeta do Povo (PR) e Zero Hora (RS) contentaram-se com revogar e anular. Mais econômico, O Globo (RJ) limitou-se a anular.

Chamada Zero Hora (Porto Alegre), 10 maio 2016

Chamada Zero Hora (Porto Alegre), 10 maio 2016

O riquíssimo Dicionário Aulete online ‒ de acesso gratuito, aberto a todos ‒ propõe mais de 800 mil verbetes. A linguagem repetitiva não se deve, portanto, a eventual pobreza vocabular da língua. Continuo acreditando que o problema maior é a preguiça. De quem escreve e de quem supervisiona.

Chamada O Globo (Rio de Janeiro), 10 maio 2016

Chamada O Globo (Rio de Janeiro), 10 maio 2016

Vários verbos podem substituir recuar(1): voltar atrás, retratar-se, reconsiderar, abandonar, retrogredir, retroceder, fugir, ceder, desistir, recolher-se, reverter, retroagir, retrogradar, rever, retrosseguir, retrair-se. Há outros, basta procurar.

O mesmo vale para revogar. Conforme o caso, pode ser substituído por: extinguir, cancelar, abolir, eliminar, anular, suprimir, afastar, proscrever, retirar, apagar, subtrair, remover, abandonar, abortar, revocar, cassar.

Interligne 18cCulotte 3Curiosidade etimológica
A gente nem sempre se dá conta, mas algumas palavras de uso corrente derivam de raiz tabuística, daquelas que a gente não pronuncia na frente de senhoras de fino trato.

Falo de recuar, acuar, cueca, cueiro, culatra, culote. São todas derivadas de cu. Surpreendente, não?

5 pensamentos sobre “Ai, que preguiça…

    • Prezada Monica,

      Obrigado pela sugestão. Li o artigo que você sugeriu. A gente chega ao final sem ficar sabendo, com certeza, se a frase foi realmente pronunciada. Muito menos se sabe quem teria sido o locutor.

      A irreverência da “boutade” não combina com a circunspecção de Charles de Gaulle. Aliás, o próprio autor do artigo da Veja se refere ao general como a «figura mais respeitada da política francesa no século XX e reserva moral da velha democracia europeia». Difícil imaginar que uma figura assim tenha deixado escapar sentença tão ofensiva.

      Pessoalmente, duvido que o astuto general tenha dito isso. Se o disse, não terá sido diante de gente que pudesse levar suas palavras além das quatro paredes do gabinete presidencial.

      Pensando bem… se a frase perdura até hoje e continua sendo citada, é justamente por ser atribuída a de Gaulle. Tivesse sido pronunciada pelo Zé do botequim da esquina, teria desvanecido com o rangido da porta do bar no fim do expediente.

      Forte abraço.

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  1. Eu queria me referir a outro tipo de curiosidade: alguém já parou para pensar como ingleses e americanos pronunciam a palavra “golpe” – “coup”? Talvez isso explique a compulsão de tantos esquerdistas de proclamar para o mundo todo que impeachment é “coup”. Será que eles ainda estão na fase anal?

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  2. Aqui é o país dos papagaios sem neurônios, todos repetem todos. Só se diz “foco”, “por conta”, “agregar valor”, “diferenciado”, abelha aficana se tornou “africanizada” e o máximo agora é “empoderar”. E o pior é que se acham o máximo. Preguiça ou ignorância, não sei.

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