José Horta Manzano
Há de ser birra minha, porque errado não é. Assim mesmo, continuo pasmo com o fato de numerosos escrevinhadores ‒ falo de profissionais ‒ não se preocuparem em fugir da rotina e do ramerrão. Gente de jornal, cujo escrito atingirá milhares de leitores, parece não estar nem aí, como se usa dizer.
Compreendo que dá menos trabalho copiar ‒ ou, digamos, reproduzir ‒ o que já vem pronto. Pra que fazer se é tão mais prático comprar feito, não é?
O Brasil viveu, neste 9 de maio, mais um dia de república bananeira. Confirmamos, a cada dia mais, a veracidade do conceito que imaginávamos definitivamente banido: «O Brasil não é um país sério». Não se sabe direito quem lançou essa desagradável expressão. Seja quem for, havemos de convir que não estava longe da verdade.
Voltando à preguiça dos que escrevem, reparei na manchete principal da mídia na manhã desta terça-feira. Uma sensaboria. Quase tudo igual.
O Estadão (SP), a Folha (SP), O Tempo (BH) usaram os verbos recuar, revogar e anular. A Gazeta do Povo (PR) e Zero Hora (RS) contentaram-se com revogar e anular. Mais econômico, O Globo (RJ) limitou-se a anular.
O riquíssimo Dicionário Aulete online ‒ de acesso gratuito, aberto a todos ‒ propõe mais de 800 mil verbetes. A linguagem repetitiva não se deve, portanto, a eventual pobreza vocabular da língua. Continuo acreditando que o problema maior é a preguiça. De quem escreve e de quem supervisiona.
Vários verbos podem substituir recuar(1): voltar atrás, retratar-se, reconsiderar, abandonar, retrogredir, retroceder, fugir, ceder, desistir, recolher-se, reverter, retroagir, retrogradar, rever, retrosseguir, retrair-se. Há outros, basta procurar.
O mesmo vale para revogar. Conforme o caso, pode ser substituído por: extinguir, cancelar, abolir, eliminar, anular, suprimir, afastar, proscrever, retirar, apagar, subtrair, remover, abandonar, abortar, revocar, cassar.
Curiosidade etimológica
A gente nem sempre se dá conta, mas algumas palavras de uso corrente derivam de raiz tabuística, daquelas que a gente não pronuncia na frente de senhoras de fino trato.
Falo de recuar, acuar, cueca, cueiro, culatra, culote. São todas derivadas de cu. Surpreendente, não?
Apesar de cercada de controvérsias, a famosa frase “Le Brésil n’est pas un pays sérieux” é atribuída ao Charles de Gaulle, como conta o correspondente da Veja em Paris, Antonio Ribeiro, neste artigo publicado em 2012:
http://veja.abril.com.br/blog/de-paris/historia-2/historia-atras-da-frase-que-de-gaulle-nunca-disse-e-mais-divertida/
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Prezada Monica,
Obrigado pela sugestão. Li o artigo que você sugeriu. A gente chega ao final sem ficar sabendo, com certeza, se a frase foi realmente pronunciada. Muito menos se sabe quem teria sido o locutor.
A irreverência da “boutade” não combina com a circunspecção de Charles de Gaulle. Aliás, o próprio autor do artigo da Veja se refere ao general como a «figura mais respeitada da política francesa no século XX e reserva moral da velha democracia europeia». Difícil imaginar que uma figura assim tenha deixado escapar sentença tão ofensiva.
Pessoalmente, duvido que o astuto general tenha dito isso. Se o disse, não terá sido diante de gente que pudesse levar suas palavras além das quatro paredes do gabinete presidencial.
Pensando bem… se a frase perdura até hoje e continua sendo citada, é justamente por ser atribuída a de Gaulle. Tivesse sido pronunciada pelo Zé do botequim da esquina, teria desvanecido com o rangido da porta do bar no fim do expediente.
Forte abraço.
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Eu queria me referir a outro tipo de curiosidade: alguém já parou para pensar como ingleses e americanos pronunciam a palavra “golpe” – “coup”? Talvez isso explique a compulsão de tantos esquerdistas de proclamar para o mundo todo que impeachment é “coup”. Será que eles ainda estão na fase anal?
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Aqui é o país dos papagaios sem neurônios, todos repetem todos. Só se diz “foco”, “por conta”, “agregar valor”, “diferenciado”, abelha aficana se tornou “africanizada” e o máximo agora é “empoderar”. E o pior é que se acham o máximo. Preguiça ou ignorância, não sei.
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Desculpem, abelha africana…
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