Marcaram bobeira

José Horta Manzano

Não conheço Eduardo Cunha nem a digníssima esposa. Nossos caminhos nunca se cruzaram. As informações que tenho sobre o casal ‒ nem sempre elogiosas, diga-se ‒ vêm da mídia. Tenho, assim mesmo, sérias dúvidas sobre a esperteza e a inteligência atribuídas a senhor Cunha.

Os erros monumentais cometidos pelo casal dão mostra estonteante de que falta, aos dois, traquejo internacional. Não estão acostumados a transitar pelo mundo dos ricos tradicionais. Essa falta de vivência levou senhor Cunha a crer que seus trambiques não seriam jamais descobertos. E, se desvendados fossem, que a situação se resolveria em torno de uma pizza, fácil, fácil.

Lista (parcial) dos gastos da esposa e da filha de Senhor Cunha

Lista (parcial) dos gastos da esposa e da filha de Senhor Cunha

No entanto, o cerco em torno do casal serelepe tem-se apertado, e a pizzaria parece estar fechada para reforma. Estes últimos dias, a ação do juiz mais adorado e mais detestado do Brasil, dependendo de que lado da cerca se encontre o observador, desaguou na acusação formal de senhora Cruz, a esposa. Na impossibilidade (momentânea) de pegar o tubarão, a Justiça optou por apanhar o lambari. A gastadora compulsiva tornou-se ré de processo criminal.

by Ivan Cabral, desenhista potiguar

by Ivan Cabral, desenhista potiguar

Ah, como é fácil fazer compras com dinheiro alheio… A lista (parcial) de gastos, publicada pela imprensa, é impressionante. A autodeclarada «dona de casa» e sua filha frequentaram os pontos preferidos pelos novos-ricos. Prada, Balenciaga, Louis Vuitton, Chanel, Ermenegildo Zegna, Yves Saint Laurent, Louboutin, Burberry, Christian Dior ‒ não deixaram de rezar em nenhum dos templos obrigatórios para quem enricou de repente.

Tivesse a compradora pagado suas despesas com dinheiro vivo, ninguém teria jamais descoberto. Preferiu utilizar cartão de crédito, que parece mais cômodo. No entanto, a falta de traquejo típica de quem cresceu longe da riqueza falou mais alto: para pagar a conta da operadora de cartão, a moça escolheu o banco errado.

Fatura mensal do cartão Visa de senhora Cruz a/c Banco Julius Baer para pagamento

Fatura mensal do cartão Visa de senhora Cruz
a/c Banco Julius Baer para pagamento

Imaginando que todo banco é igual, os Cunhas encarregaram o Banco Julius Baer, de Genebra, de cuidar dos pagamentos. Acontece que esse é banco privado, diferente dos estabelecimentos comerciais com que madame está acostumada a lidar. Banco privado não tem guichê, não tem agência aberta ao público, não recebe conta de luz, não empresta dinheiro a ninguém. São especializados em gerir fortuna de aplicadores que não querem passar a vida acompanhando o comportamento da bolsa.

Dinheiro voadorIgnorando essa peculiaridade, madame pediu ao banco que pagasse suas contas do dia a dia ‒ atitude anômala e inabitual. Isso acendeu a luzinha vermelha. Já faz anos que a Suíça deixou de ser paraíso fiscal e porto seguro para fortunas de origem duvidosa. O casal não sabia disso.

Deu no que deu. De pouco valeram os trusts e as empresas de fachada criadas pelos dois em ilhas caribenhas. O gato se escondeu, mas esqueceu o rabo fora. Em estreita colaboração com a justiça, o banco suíço forneceu tudo o que as autoridades pediram: junto com extratos de conta, veio o detalhe das surpreendentes despesas. Coisa de deixar boquiaberto. Documentos mostram que a «dona de casa» torrou um milhão de dólares em artigos de altíssmo luxo ‒ e de preço elevadíssimo.

Pronto, madame já foi apanhada pela engrenagem. O caminho que separa Monsieur Cunha de Curitiba (ou da Papuda, dependendo dos caprichos do destino) encurta-se a cada dia.

Suas Excelências

José Horta Manzano

Faz três semanas, a revista Congresso em Foco publicou o resultado de estudo levado a cabo entre 13 de junho e 14 de agosto deste ano. O levantamento deve ter dado muito trabalho de pesquisa. Visava a apontar quais, entre os 513 deputados e 81 senadores, eram réus em ações criminais. Como se sabe, nossa elite dirigente não é composta de seres comuns como nós. Eventuais «malfeitos» desse povo não passam pela delegacia da esquina ― são julgados diretamente pelos juízes maiores, os do STF.

Processo penal

Processo penal

A lista final é assustadoramente longa. Parece brincadeira, mas não é. O número de senadores acusados é proporcionalmente idêntico ao de deputados que respondem a processo penal. São 37% dos senadores e 37% dos deputados. Imaginam o que isso significa? Mais de um terço de suas excelências têm alguma pendenga com a Justiça criminal! Não estamos falando de litígio de condomínio, discussão com vizinho, injúria, calúnia, ofensa à honra, despejo por falta de pagamento. Trata-se realmente de acusações penais, daquelas que, para gente menos privilegiada, costumam render cadeia.

Todos os Estados e todos os partidos estão representados na lista. Sobra para todos. E que fazemos nós outros? Continuamos a votar nessa gente? Quem preferir esperar pela condenação definitiva pode se sentar num sofá bem confortável. Ainda periga tardar anos e anos. Até lá, vão todos continuar tentando se reeleger, que é uma maneira de conservar seus privilégios.

Para quem quiser conferir, a lista completa está no site de Congresso em Foco. Clique aqui para ver a impressionante lista nominal.