Praia sem covid

José Horta Manzano

A Folha de São Paulo publicou esse instantâneo com cena domingueira de uma pequena família na praia. A legenda não esconde uma quase admiração pela iniciativa dos três, de delimitar a área em torno do acampamento. Só faltou aplaudir um exemplo de comportamento responsável, de gente preocupada em manter a distanciação social a fim de conter o alastramento da epidemia.

A intenção dos que demarcaram terá sido certamente essa. Só que a prepotência do modus operandi foge às regras de civilidade. No Brasil, as praias são de uso público. Em princípio – digo bem em princípio –, a ninguém é permitido apropriar-se de um canto de praia, seja qual for a extensão da área. O que é de todos, de todos é.

O que eu vejo na foto é a expressão da cotovelada (ou da carteirada?). «Cheguei primeiro, e aqui mando eu. Ninguém pode pisar pra dentro dessa linha aí, talquei? Vai encarar?» Reparem que a área de exclusão é bem superior ao que seria razoável para a pequena família. Até o gestual do personagem parece confirmar a atitude desafiadora de quem se imagina por cima do populacho.

Ora, quem não quer se contaminar não frequenta lugares onde há risco de cruzar com outras pessoas. Não está correto ir à praia no domingo e mandar que os outros se afastem. Quem quer tomar sol sem perigo de infecção se estende na grama do jardim de casa. Se não tiver jardim, vai ao terraço. Se não tiver nenhum dos dois, fica branco. E espera até passar a epidemia.

Espero que a família da foto tenha aproveitado o passeio. Mas eles não são os únicos frequentadores. Fico aqui imaginando se cada grupinho se pusesse a delimitar uma área para seu uso exclusivo. A costa brasileira inteira não seria suficiente para acomodar todos os banhistas.

Será que estou enxergando prepotência onde outros só veem virtude?