Cada terra com seu uso, cada roca com seu fuso – assim reza antiquíssimo provérbio português. É verdade. O youtube está cheio de vídeos filmados, às vezes, por marinheiros de poucas águas, mostrando particularidades e curiosidades daqui e dali. Hoje vou falar de uma prática comum na França, sobre a qual ainda não assisti a nenhum vídeo. Talvez a prática esteja em vigor também em outros países, não tenho certeza. Vou falar do que sei.
Como já sabem meus atentos leitores, os franceses têm palavra para tudo. E usam. Já nós somos menos rigorosos nesse particular. Portanto, na ausência de “similar nacional”, vou usar a palavra francesa e explicar o significado. Vai aqui um glossário dos substantivos (todos masculinos em francês):
Glanage: ato de catar restos que a colheita deixou para trás
Maraudage: ato de furtar antes da colheita
Grappillage: ato de colher no pé ou na planta alheia
Râtelage: ato de colher em terra alheia com uso de ferramenta
Não sei quando começou a ser regulamentado o glanage, mas é prática antiquíssima. Acredito que estivesse codificado já na Idade Média. Trata-se da prática de catar restos da colheita, deixados para trás. As colhedeiras modernas são eficazes, mas sempre deixam cerca de 1% de restos não colhidos. Num plantio de batatas, por exemplo, numa gleba que produz 100 toneladas, ainda restará na terra uma tonelada de tubérculos não colhidos. Vale a pena procurar.
Num belo domingo ensolarado de fim de outubro, quando a colheita da batata já terminou, vale a pena gastar algumas horas com a família (especialmente com as crianças, que vão adorar) remexendo a terra à cata de batata. Quem tiver paciência volta para casa com um saco cheio. Para famílias de poucas posses, é uma economia e tanto.
Condições para o glanage legal
Para ser legal, o glanage tem de respeitar os seguintes pontos:
- Após a colheita: Só é permitido “glanear” os produtos que tenham caído ao solo (ou ficado enterrados no solo) ao fim da colheita principal.
- À mão: O uso de ferramentas (p.ex: rastelo) é proibido, pois transforma o glanage em râtelage, uma prática não permitida.
- Durante o dia: O glanage deve ser realizado durante o dia, à vista de todos.
- Em terreno não cercado: É proibido “glanear” em campos fechados com cerca, pois trata-se de propriedade privada.
- Respeitar os decretos municipais: Verificar com a prefeitura se algum decreto proíbe o glanage no município.
O que é proibido:
- Maraudage/grappillage: Colher frutas ou legumes diretamente do pé ou da planta não é glanage, é furto.
- Uso de ferramentas: O râtelage é proibido.
- Glanage à noite: É proibido.
- Terrenos cercados: É proibido entrar em propriedades privadas cercadas.
Recomendações importantes:
- Peça autorização: Embora a lei permita sob certas condições, é sempre bom solicitar a autorização do proprietário ou do responsável pela terra antes de começar a “glanear”, para evitar mal-entendidos ou conflitos.
- Respeite as quantidades: O espírito do glanage é recolher o que foi deixado para trás em quantidades correspondentes ao consumo familiar, nunca para comercialização.
Pronto, vosmecê já sabe como funciona na França. Mas não recomendo tentar “glanear” no Brasil. Garruchas, trabucos e carabinas correm soltas por aí. Prudência!





Um objetivo secundário muito positivo tem sido a harmonização. Até 50 anos atrás, cada país tinha peculiaridades: sua moeda, suas unidades de medida, suas normas técnicas. As discrepâncias não desapareceram de todo, mas o panorama se apresenta, hoje, bem menos acidentado que há meio século.