José Horta Manzano
Durante meio milênio, a região onde se situa a Síria atual esteve sob o mando do Império Otomano, como era chamada a extensa zona dominada pelos turcos. Quando espocou a Primeira Guerra mundial, os otomanos tiveram o azar de escolher o lado errado: apoiaram a Alemanha e o Império Austro-Húngaro. Perderam.
Na sequência da derrota, a Grã-Bretanha e a França puseram em prática o plano já acertado anos antes: repartiram o Oriente Médio em zonas de influência britânica ou francesa, um pouco para cada um. As fronteiras da Síria, tanto quanto as dos outros países da região (Jordânia, Iraque, Líbano, Kuwait), foram desenhadas nas pranchetas de Londres e de Paris. Muito provavelmente por ignorância, os decididores deram pouca ou nenhuma importância à população local, às etnias, às religiões, às alianças ou inimizades seculares. Deu no que deu. O caldeirão ferveu.
Na época dos otomanos, quando as ordens vinham de Constantinopla, estavam todos no mesmo saco, sob domínio estrangeiro. A partir do momento em que tiveram de autogovernar-se, o problema se pôs: qual das comunidades toma as rédeas? Aquilo virou um faroeste onde manda quem grita mais.
Como se não bastassem as brigas intestinas, interesses externos têm contribuído para apimentar o molho. A criação do Estado de Israel, a descoberta de petróleo na região, a Guerra do Iraque, as pretensões iranianas de domínio regional, o antagonismo entre EUA e Rússia são fatores agravantes. Chegamos ao ponto em que nenhuma solução será satisfatória para todos. O emaranhado de interesses é tão complexo que, por mais que se procure um ponto de equilíbrio, não é possível encontrá-lo. Tem-se de optar pelo «menos pior».
Infelizmente, a única linguagem que se fará ouvir será a da firmeza e da força. Apesar de todos os defeitos, o longo período de domínio otomano trouxe relativa paz à região. Não será uma oposição entre EUA e Rússia que vai aplacar ódios ‒ só pode desembocar numa guerra por procuração. A melhor solução passará por um acordo, de preferência sob patrocínio da ONU, que garanta:
A destituição do atual ditador
É condição sine qua non. Enquanto Bachar permanecer no comando, será impossível acalmar os ânimos. O acúmulo de ódios é grande demais.
O desarmamento da população
Sempre haverá revólver escondido dentro de colchão. Mas todo esforço deve ser envidado para confiscar e neutralizar armamento pesado, tradicional e químico.
A manutenção da base naval russa de Tartus
Sem isso, nenhum acordo será alcançado ‒ toda proposta será vetada pelos russos. Eles veem a base como necessária para garantir presença na região.
A criação de uma federação
A atual Síria será partilhada entre dezenas de microestados. Para definir as fronteiras, serão levadas em conta as diferenças entre os diversos povos: religião, língua, tradições, história.
Um poder central neutro sob mando externo
Um protetorado deverá ser estabelecido, preferivelmente sob a guarda da ONU. Um representante escolhido pelas Nações Unidas exercerá o poder executivo. Será substituído periodicamente. Não deverá ser árabe, nem originário da região, nem de nenhum dos membros permanentes do Conselho de Segurança.
Pronto, aí está a solução, que o resto é blá-blá-blá. Podem, naturalmente, deixar tudo como está pra ver como fica. A guerra não terá fim e ninguém sairá ganhando. Menos os fabricantes de armas, que continuarão esfregando as mãos.