Façam como eu digo…

Lula da Silva, Rafael Correa (Equador), Hugo Chávez (Venezuela)

José Horta Manzano

Celac é acrônimo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, organismo fundado em 2011 por um clube formado por Lula da Silva, Hugo Chávez (Venezuela) e Rafael Correa (Equador).

A organização congrega os países das Américas com exceção dos EUA e do Canadá. É uma daquelas brincadeiras adolescentes de nosso líder, que, para tentar se distanciar dos EUA, inventa soluções que acabam dando trabalho e custando dinheiro sem chegar nunca a resultados práticos. Essas pseudoassembleias emitem notas, escrevem memorandos, fazem recomendações. E só. Nada tem poder impositivo.

Pois bem, no começo desta semana, em cúpula virtual da Celac, Lula soltou uma de suas pérolas costumeiras. Em discurso veemente, passou uma carraspana no Equador por ter invadido outro dia a embaixada do México em Quito. Suas palavras:


“O que aconteceu em Quito é simplesmente inaceitável e não afeta só o México. Diz respeito a todos nós. Um pedido formal de desculpas por parte do Equador é um primeiro passo na direção correta”


Ah, na hora de passar pito nos outros, a memória humana é sempre um tanto falha. Costumamos apontar para o cisco no olho alheio sem nos dar conta da tora que está em nosso olho, já ensinava a sabedoria bíblica.

Luiz Inácio “se esqueceu” de episódio recente no qual ele mesmo ficou pessoalmente na berlinda. Todos se lembram de que, numa de suas falas jogadas fora, Luiz Inácio colocou em pé de igualdade a matança de civis cometida atualmente por militares israelenses na Faixa de Gaza e a exterminação de judeus ordenada por Hitler nos anos 1940.

Seu discurso abordou um tema delicadíssimo, que toca fundo na sensibilidade do mundo civilizado, de maneira especial nos integrantes da comunidade israelita. É terreno minado no qual convém pisar com extremo cuidado. Lula entrou de sola, como se diz. E se estrepou. Levou pancada de todos os lados.

A mídia internacional foi unânime em repudiar suas palavras. Autoridades israelenses o declararam persona non grata, uma afronta em termos de diplomacia e uma vergonha pessoal para nosso presidente. O Estado de Israel fez saber que estava à espera de um pedido de desculpas.

Lula se escondeu atrás dos vitrais do Alvorada. Dias depois, para esquivar-se, disse jamais ter pronunciado o termo Holocausto, como se fosse esse o problema. E deu o assunto por encerrado. As desculpas não vieram até hoje.

Isso visto, soa indecente ele dar pito num país inteiro (o Equador) e exigir uma postura da qual ele mesmo outro dia fugiu.

A memória humana é falha…

Observação
O Lula marcou bobeira ao não apresentar escusas pelas palavras ofensivas que pronunciou. Ele não ofendeu ninguém de propósito, só disse o que disse por pura ignorância histórica. Portanto, bastava ter escrito uma nota assim: “Não era minha intenção ofender ninguém. Se alguém se sentiu melindrado com minhas palavras, peço desculpas”. Com isso, a polêmica murchava na hora. Quis bancar o marrudinho, e deu no que deu.

Gaza: antes e depois

by Patrick Chappatte (1966-) desenhista suíço

José Horta Manzano

A trégua acertada entre Hamas e Israel durou pouco. Já desandou, cada parte atribuindo à outra a quebra do acordo e a retomada das hostilidades.

Aquele bombardeio contínuo, de dia e de noite, que as imagens nos mostram não é efeito especial de filme de guerra. É pra valer. A estimação é que 100.000 (cem mil !) prédios já tenham sido derrubados parcial ou inteiramente.

A britânica BBC publicou algumas fotos tiradas por satélite mostrando o antes e o depois em certas zonas da castigada Faixa de Gaza – território exíguo que abriga mais de dois milhões de pessoas, é bom ter em mente.

Achei bastante instrutivas as imagens em que se pode arrastar um marcador pra ver ANTES e DEPOIS dos bombardeios. Até as escassas plantações estão sendo devastadas.

Se as bombas parassem de cair hoje, anos se passariam até que as culturas fossem reconstituídas. Se já era o caso antes, hoje os gazeus dependem mais ainda da caridade de organizações estrangeiras, sob forma de ajuda alimentar.

Para ver as imagens de satélite, clique aqui.

Brasileiros em Gaza

José Horta Manzano

Até esta terça-feira 7 de novembro, nenhum brasileiro foi autorizado a deixar a Faixa de Gaza. Assim como outros milhares de estrangeiros e binacionais, nossos compatriotas são obrigados a passar privações e a continuar vivendo sob bombas até receberem permissão para deixar aquele inferno.

Os diplomatas brasileiros, com a mão nervosa e cheia de dedos, estão dando tratos à bola para entender a razão de um milhar de cidadãos de outros países já terem sido contemplados com a liberação enquanto nossos conterrâneos continuam no angustiante chá de cadeira.

A pergunta que dói é: “Por que já autorizaram tantos americanos, ingleses, franceses, alemães, e nos deixaram pra trás?”. À primeira vista, se poderia concluir que os países desenvolvidos têm preferência e os do Terceiro Mundo vêm no fim. Será?

Que há uma hierarquia entre países, parece evidente. Israel, responsável pelas autorizações, não escolhe os premiados no palitinho. Há um método, que não tem nada a ver com a oposição entre países ricos e países pobres. Para entender, há que ter em mente a própria formação do Estado de Israel.

Criado por decisão da ONU, ao final da Segunda Guerra, Israel se encontrou diante da hostilidade dos vizinhos árabes desde o primeiro momento. Os 75 anos que decorreram da criação do país até aqui estão coalhados de escaramuças, conflitos e guerras de verdade. Curtos momentos de quase-paz se alternaram com erupções de violência. O povo e o governo israelense são obrigados a manter-se em estado de alerta permanente.

Um Estado que vive na angústia constante de ser atacado a qualquer momento não divide o mundo entre países ricos e países pobres. A divisão, na verdade, é entre países amigos e países inimigos. Pode-se também falar em países países amistosos vs. países inamistosos.

Em pronunciamentos feitos desde que a guerra estourou, nosso presidente deixou transparecer certa simpatia pelos palestinos, deixando os israelenses em segundo plano. Isso, sozinho, não seria suficiente para fazer o Brasil entrar na lista de países inimigos. Mas Lula foi além. Em uma ocasião, pisou mais fundo no acelerador.

Foi duas semanas atrás que, em fala solene proferida com fundo de bandeira nacional e brasão de armas da República, Lula não deixou por menos. Referindo-se ao conflito em Gaza, afirmou que aquilo “não é guerra, é genocídio”. Tropeçou feio.


To constitute genocide, there must be a proven intent on the part of perpetrators to physically destroy a national, ethnical, racial or religious group.


A palavra genocídio não se pode utilizar assim, de supetão, na hora da raiva. O termo tem definição oficial, em vigor desde 1948, quando foi adotada a Convenção do Genocídio, ratificada por praticamente todos os países do planeta.


Para constituir genocídio, deve haver uma intenção comprovada por parte dos perpetradores de destruir fisicamente um grupo nacional, étnico, racial ou religioso.


Como se vê, a definição é objetiva, restrita, autoexplicativa. Ao acusar Israel de estar praticando genocídio, Lula simplesmente acusou o país de estar tentando eliminar fisicamente o povo palestino. No exato instante em que a frase foi pronunciada, Israel transferiu o Brasil para a lista dos países inamistosos.

Não precisa procurar mais longe. Para um povo que se sente permanentemente acuado, bastou uma palavra. Enquanto Lula não se retratar (o que me parece difícil), o Brasil vai permanecer entre os países dos quais Israel desconfia.

Certos pronunciamentos levianos, além de não ajudar ninguém, atrapalham. Com tanta desgraça interna, não precisamos cavar inimizades no exterior.