Sinal dos tempos

Pescado no site da Prefeitura de S. Joaquim da Barra (SP)

José Horta Manzano

Imagino que muitos de nós – se não todos nós –, na infância, algum dia recitamos a parlenda que ia assim:

Um, dois,
Feijão com arroz;
Três, quatro,
Feijão no prato.

Quando chegava o “cinco, seis”, o coro emendava firme: “falar francês!”.

Por um daqueles acasos com que só a navegação na rede sabe nos brindar, caí hoje nesses versinhos. Surpreso, me dei conta de que sofreram leve alteração.

Francês? Nestes tempos de bilinguismo excludente que resulta num monolinguismo de facto, o francês escorreu pelo ralo. Numa gritante demonstração de que até versos infantis se adaptam ao tempo e ao vento, hoje não mais se fala francês, mas inglês.

Então, distinto leitor, ficamos combinados. Da próxima vez que chegar ao “cinco, seis”, não se esqueça: “falar inglês”.

Para a sequência da parlenda, pode continuar comendo biscoito no “sete, oito”, e pastéis no “nove, dez”. Mas isso pode mudar, que a inflação anda braba!

Ispiquingri?

José Horta Manzano

Fosse doutor Bolsonaro dotado de sagacidade em matéria política, a gente até acreditaria ser balão de ensaio, daqueles que a gente solta só pra ver que efeito faz. Mas não. Nosso presidente passou longe da fila da sutileza logo antes de descer à terra no bico da cegonha. Com ele, não há balão de ensaio. O que diz é o que pensa, vem cru e sem tempero. O problema, como bem frisa o Conselheiro Acácio, é que as consequências costumam vir depois. E olhe que vêm mesmo.

A mais recente tirada estapafúrdia do presidente foi o anúncio de sua intenção de nomear um dos bolsonarinhos para chefiar a embaixada do Brasil em Washington. Não é balão de ensaio, acreditem. É o que doutor Bolsonaro pensa, o que ele acha melhor para ele, logo, para o Brasil. Escolheu o filho que, eleito deputado federal em outubro passado, com monumental votação, não tem sido a figura mais assídua do hemiciclo.

Mas os brasileiros podem dormir tranquilos porque, antes de assumir o posto, o bolsonarinho deverá passar pelo crivo do Senado da República. Por pior que sejam os parlamentares da Câmara Alta – e não são tão ruins assim – não deixarão passar esse disparate.

Cego guiando cego
by Frits Ahlefeldt, desenhista dinamarquês

O filho do presidente não é diplomata. Nunca chefiou embaixada, nem consulado. Não foi sequer atendente de guichê de entrega de passaporte. É lícito pensar que não passaria no exame de entrada no Instituto Rio Branco. No de saída, então, nem em sonho. Nossos diplomatas são numerosos e estão entre os profissionais mais bem formados do país. Não faz sentido introduzir um estranho no ninho. Em festa de inhambu, jacu não entra.

A escolha do rebento presidencial para o mais alto posto de nossa diplomacia passa incontestável atestado da falência da Instrução Pública no país e dá prova escancarada do constrangedor monolinguismo nacional: o rapaz conhece bem inglês. Ah, se o rapaz conhece bem inglês, então está em condições de assumir o cargo – é o que imagina doutor Bolsonaro.

Ora, ora… Vejam, senhores: a ignorância nacional em matéria de conhecimento de línguas estrangeiras é tão monumental que o fato de um cidadão arranhar seu inglesinho já lhe dá currículo suficiente pra ser titular da mais importante embaixada que o Brasil mantém.

In terra caecorum monoculus rex.
Em terra de cegos, quem tem um olho é rei.

A que ponto chegamos!