José Horta Manzano
Um brusco acidente de avião levou a vida de sete pessoas. Entre os desafortunados, estava um candidato ao posto de presidente de nossa República, cadeira que vai vagar dia 1° de janeiro do ano que vem.
Jornais, rádios, tevês, redes sociais, taxistas, porteiros, estudantes, manicures, ambulantes, aposentados só falam nisso. Como foi? O que é que vai ser agora? Como fica? Será que foi atentado? Cui bono ― quem é que ganha com isso?
Vamos deixar a cada um a liberdade de interpretar e de vaticinar como bem lhe parecer. De qualquer maneira, a Terra continuará a girar e, passada a comoção, as coisas vão acabar se ajeitando. Vamos aproveitar este espaço para uma observação linguística.
Em sinal de luto, o Planalto determinou que, nos edifícios oficiais, a bandeira brasileira fosse hasteada a meio pau. A meio pau ou a meio mastro? Valem ambas. Curioso é observar a transformação do falar. Em Portugal, a expressão mais usada é a meia haste. Por aquelas bandas, essa é a forma que predomina na hora de designar bandeira hasteada em sinal de luto.
Em terras brasileiras, faz dois séculos que a forma portuguesa perde terreno para sua equivalente nacional. Já faz cinquenta anos que a meia haste lusa praticamente desapareceu de nosso falar, sobrepujada pelo meio pau. Interessante é notar que, a partir dos anos 2000, uma terceira expressão ― a meio mastro, decalque do francês à mi-mât ― começou a dar mostra de vigor.
Nos últimos quinze anos, o mastro vem ganhando terreno entre nós. De cada três locutores, um prefere o mastro ao pau. Quem garante? Como muitos de meus distintos leitores devem saber, já faz alguns anos que o jornal O Estado de São Paulo permite acesso a seu precioso acervo. Pode-se lá consultar a totalidade das edições, de 1875 até os dias de hoje.
A tabelinha que ponho a seguir analisa as 1200 vezes em que as três expressões foram usadas desde o primeiro número do jornal. É interessante notar a porcentagem de ocorrência de cada uma delas em relação ao total da década.
Década Meio pau Meio mastro Meia haste
1870 80% — 20%
1880 87% — 13%
1890 95% — 5%
1900 89% — 11%
1910 81% — 19%
1920 86% 5% 9%
1930 90% 3% 7%
1940 75% 25% —
1950 96% 2% 2%
1960 90% 10%
1970 92% 7% 1%
1980 96% 4% —
1990 87% 13% —
2000 92% 8% —
2010 63% 38% —
A meia haste sumiu. E o meio pau vem perdendo força em favor do meio mastro. Será sinal destes tempos politicamente corretos? Só Deus sabe.