José Horta Manzano
A mídia dá hoje destaque à sessão do tribunal regional federal que trata do recurso interposto pelo Lula contra a sentença que o condenou num processo criminal ‒ o primeiro de uma série, ao que parece.
Antes de prosseguir, gostaria de reafirmar o que já disse em outra ocasião: não me parece adequado dizer que a apelação do réu será «julgada» hoje. O fato de cada desembargador ler o voto já escrito de antemão é sinal flagrante de que o réu já está julgado. A sessão do tribunal serve apenas para publicar o resultado.
Dito isso, prossigo. Por mais que reflita, não enxergo razão para tanta animação. Parece-me claro que nem os que simpatizam com o Lula nem os que sentem asco por ele ganharão ou perderão. Seja qual for o resultado, o jogo vai terminar empatado. Por diversas razões.
Nem que o tribunal absolva hoje o Lula, ele deixará de ser réu. Corre na justiça uma fieira de meia dúzia de processos criminais contra ele. Portanto, nada muda. Caso seja absolvido, sabemos todos que, antes de vê-lo de uniforme laranja e corrente nos pés ainda falta muito. Há pela frente embargos, contestações, apelações, subterfúgios vários. O arsenal jurídico brasileiro é riquíssimo em chicanas. Vamos agora adiantar o relógio e pular para outubro, mês das eleições.
Suponhamos que o Lula consiga registrar candidatura, que participe e que vença o pleito. Que acontecerá? Oitenta por cento dos congressistas se bandearão para o lado do novo presidente, que passará a contar com a maior bancada jamais vista ‘nessepaiz’. Banqueiros e grandes empresários farão fila para o beija-mão ao novo inquilino do Planalto. O PMDB continuará sendo o partido com o maior número de parlamentares ‒ todos eles, naturalmente, entusiastas do novo governo. A roubalheira no alto escalão se fará mais discreta. Atenção: eu disse mais discreta, não mais comedida. E a vida vai continuar impávida.
Suponhamos agora que o Lula não consiga registrar candidatura. Ou que, tendo-a registrado, não vença a eleição. Que acontecerá? Oitenta por cento dos congressistas se bandearão para o lado do novo presidente, seja ele quem for. A bancada de parlamentares apoiadores do novo mandatário será a mais importante jamais vista no país. Banqueiros e grandes empresários farão fila para o beija-mão ao novo inquilino do Planalto. O PMDB continuará sendo o partido com o maior número de parlamentares ‒ todos eles, naturalmente, entusiastas do novo governo. A roubalheira no alto escalão se fará mais discreta. Atenção: eu disse mais discreta, não mais comedida. E a vida vai continuar impávida.
Portanto, que diferença faz? Mais que dia histórico, eu diria que hoje é um dia histérico.

O dia pode não ter sido nem histórico nem histérico, como se temia. Mas aconteceu um evento certamente histórico: pela primeira vez na história da justiça brasileira, os desembargadores falaram português e ainda se preocuparam em traduzir muitos termos do juridiquês para os que acompanhavam o julgamento.
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