José Horta Manzano
Nossa terra tem acentos
Que outras terras não têm.
Pois é, conheço poucas línguas com tantos sinaizinhos gráficos como a nossa. Agudo, grave, circunflexo, til – são tantos! E olhe que nos proibiram de usar o trema, o mais charmoso de todos. O cê cedilha contribui para acrescentar exotismo a nossa escrita. Não é qualquer um que tem letra com rabinho.
No contexto lusofalante, a falta de um acento costuma surpreender. Um «mensalao» ou, pior, uma «corrupcao» deixa embatucado o leitor. O contrário é verdadeiro. Para quem não está habituado ao português escrito, nossos acentos parecem extravagantes. Deixam o leitor sem saber como pronunciar.
Por essa razão, futebolistas brasileiros radicados no exterior optaram por eliminar sinais gráficos de seu nome. Gazetas esportivas estrangeiras costumam grafar Brandao, Kaka, Cesar, Nene, Xandao, Leo, Fabio. Dá pra entender por quê.
Anos atrás, quando começou a se agigantar e a se internacionalizar, a Petrobrás enfrentou o mesmo problema. No estrangeiro, a maioria dos que viam aquele á, assim, com um risquinho em cima, titubeavam na hora de pronunciar. A companhia tomou a decisão de abandonar o risquinho. Virou Petrobras.
Nossa ortografia, periodicamente chacoalhada por pequenos sismos e pesados terremotos, ainda não cassou o acento agudo das oxítonas terminadas em a seguido ou não de s. Portanto, dentro das fronteiras tupiniquins, o nome daquela que já foi a maior companhia nacional deve-se escrever Petrobrás, assim, com acento.
Sabe Deus por que, a imprensa decidiu dobrar-se às exigências do marketing. É sintomático. Desvela a que ponto, em nosso País, maria vai com as outras. Propaganda e marketing fazem a lei.
Consultei O Globo, Folha de São Paulo, Correio Braziliense, Estado de Minas, Zero Hora, Gazeta do Povo, Veja, Diário do Poder, Jornal do Brasil. Todos eles grafam Petrobras sem acento.
Mas nem tudo está perdido, minha gente. Sobrou o último dos moicanos. O respeitado Estado de São Paulo é o derradeiro baluarte. Bota acento no nome da petroleira. Eu também.
Ainda ontem pensei nisso, exatamente o acento não usado em Petrobrás. Devíamos ler /petróbras/ sem acento, não é verdade?
CurtirCurtir
Era exatamente assim que eu lia mentalmente, caro João, Petróbras. E com um sorrisozinho interior.
Hoje em dia, com a profusão de menções àquela que já foi orgulho nacional, a brincadeira mental perdeu a graça. Tudo o que é demais cansa.
Abraço.
CurtirCurtir
Ótima crônica, aproveito para desejar um Feliz Natal
CurtirCurtir
Eu também acho muito sem elegância essa coisa de roubarem “o agudo” da empresa mais maltratada dos últimos tempos. Mesmo que seja um roubo aparentemente inofensivo, sem a “pegada” da corrupção. Também não tomo assento junto aos simpatizantes de se levar o trema junto com os acentos, pois esse simpático sinal gráfico deveria ter ficado fora da briga das acentuações (justamente por não ser acento). Também não gostei do “voo” (de “voar”) escrito sem o chapeuzinho. Embora eu pessoalmente não precise (ainda) de chapéu, por ainda ter a natural cobertura do couro craniano. Mas não queria ter perdido o “vôo”, pois agora é proibido escrevê-lo assim.
CurtirCurtir
Obrigado ao Nélson e ao Jaciel. Feliz Natal aos dois!
Abraço.
CurtirCurtir
Pingback: José Horta Manzano e o sentido do acento. | Caetano de Campos
Pingback: José Horta Manzano e o sentido do acento. | Caetano de Campos
O pior para mim é o roubo escancarado do acento na palavra “para” (do verbo parar). Quando estou lendo um artigo e não compreendo o significado da frase, volto ao início e me dou conta de que tudo seria mais simples se o acento continuasse existindo. Quando lembro que o verbo “pôr” exige o acento, minha raiva explode. Como pode um acordo (será que tem “^”?) ser mais importante que a alma nacional?
CurtirCurtir
Compartilho da preocupação e insatisfação com o tal “acordo”. Feliz festa natalina para todos (ao autor e todos os cooperadores e comentaristas deste olhar “tão de perto” sobre o nosso Brasil). Vir visitar aqui é tudo de bom.
CurtirCurtir