Paetê

José Horta Manzano

Você sabia?

A Suíça carece de matérias-primas. O país não dispõe de petróleo, nem de carvão, nem de ouro, nem de ferro, nem de minerais preciosos. Não tem saída para o mar. As terras cultiváveis são escassas. Sem outra saída, os habitantes sempre tiveram de usar a cabeça – e as mãos – para sobreviver.

A indústria têxtil, que começou a se desenvolver na Idade Média, deu fama ao país. Durante muito tempo, produtos têxteis (sedas, bordados, fitas, rendas e tecidos) foram o primeiro produto de exportação. Até os anos 1920, os têxteis ainda apareciam à frente dos relógios na lista de produtos exportados.

Nos tempos de antigamente, a produção era essencialmente manual, o que pressupõe uma certa lentidão e pequenas quantidades produzidas. Com a Revolução Industrial, a fabricação deixou de ser obra de artesãos e foi se reagrupando em manufaturas organizadas. No século 19, a Suíça viveu a época de ouro de sua indústria têxtil. A máquina de bordar, inventada nos anos 1820 e aperfeiçoada nas décadas seguintes, deu impulso às artes do bordado suíço e fez sua fama.

Antes da automatização, tecidos bordados com lantejoulas, por exemplo, se destinavam a quem tinha muitíssimo dinheiro. A confecção era lenta, visto que cada pecinha de metal era costurada à mão. Essa mão de obra elevava o preço final às alturas; só quem podia encomendar eram rainhas, princesas & assemelhados. As máquinas de costurar e bordar baixaram os custos de produção e puseram tecidos bordados ao alcance da maioria.

O termo lantejoula é corruptela de lentejoula, palavra que vem do espanhol lentejuela (=lentezinha). Já na língua francesa, aquela pecinha de aspecto brilhante e metálico com um furo no meio, destinada a ser costurada ao tecido, chama-se paillette (palhazinha, da família de palha).

Um tecido recoberto de paillettes se diz pailleté, termo que se pronuncia paietê. O distinto leitor já deve ter reconhecido a origem de nossa palavra paetê. Trata-se de aproximação fonética, uma tentativa de reprodução do som original. Paetê combina com estes dias de Carnaval frustrado. E faz par com strass, que aparece no post de 12 fev° 2021.

Made in P.R.C.

José Horta Manzano

China PRCAté uns quinze anos atrás, os chineses eram mais que discretos ao etiquetar seus manufaturados para exportação. Se a legislação do país de destino fosse liberal, nem mencionavam a origem da mercadoria. Caso fosse absolutamente necessário, marcavam «Made in P.R.C.». A estranha e quase desconhecida sigla significava ‘feito na República Popular da China’.

De lá pra cá, as coisas evoluíram. Produtos daquele país já ostentam um desinibido «Made in China». Não se pode dizer que o que vem da China se tenha tornado chique, mas já não é olhado com tanta desconfiança.

Tendo-se transformado em fábrica do mundo, a China tornou-se incontornável. Pouco a pouco, a indústria básica dos demais países tem dismilinguido. Ninguém mais fabrica pianos na França. As fábricas brasileiras de brinquedo vão fechando uma atrás da outra. A indústria têxtil suíça sumiu. E assim por diante.

Chave 3Automóveis chineses, na Europa, nunca vi. Mas há de ser questão de tempo: mais dia, menos dia, chegarão. Parece que, no Brasil, já estão circulando. Espero que não sejam tão ruins como os carros russos – Lada –, importados nos anos 80, dos quais, com certa dose de maldade, a gente dizia que até a chave já vinha enferrujada.

Chinelo 1Nome, marca, origem da mercadoria podem ser prestigiosos. Em matéria de carnaval, praia, capoeira, caipirinha, chinelo de dedo, essas coisas, o nome de nosso País está por cima da carne seca. Deixa qualquer concorrente comendo poeira. Já em outros campos, a situação é menos dourada.

Como já mencionei recentemente, o banco brasileiro BTG Pactual comprou o tradicional banco suíço BSI, veneranda instituição com século e meio de história. Em casos assim, os clientes costumam ser avisados sobre a transação. É modo acertado pra tranquilizar todo o mundo dizendo que tudo continuará como antes. Em matéria de dinheiro, ninguém aprecia mudança.

O BSI seguiu a receita. Comunicou a cada cliente que, embora o dono fosse agora outro, nada mudaria nas relações com a clientela. Informou que, a partir de 15 de setembro, passava a pertencer ao BTG Pactual, «um dos mais importantes e influentes grupos bancários do mundo, com sede na América Latina».

BSI 1Meus distintos leitores hão de ter reparado que o nome do Brasil não aparece na comunicação. Ao ler a carta, lembrei-me do «made in P.R.C.» de antigamente. No mundo das finanças, a marca Brasil ainda é olhada com reserva e desconfiança. É compreensível. O conceito da banca brasileira não é lá essas coisas, o que justifica o fato de o BSI ter preferido situar sua sede, vagamente, em algum lugar da América Latina.

BSI 2Se a percepção das atividades financeiras brasileiras já não era tão favorável, o prognóstico não é alvissareiro. Mensalões, petrolões, eletrolões e refinões indicam que a onda de escândalos que assola o País ainda não atingiu o apogeu. Periga piorar. O arranhão causado à imagem do Brasil será mais duradouro do que supomos.