José Horta Manzano
Assim como eu, o distinto leitor certamente se dá conta da importância da imagem que um país dá ao mundo externo. Os estrangeiros não estão necessariamente a par de tudo o que acontece no Brasil. É capaz de não saberem da crise hídrica, da suspensão da vacina para adolescentes, da situação de miséria crônica em que se debate grande parte do povo, da violência – verbal e física – que se tornou a forma preferencial de expressão do brasileiro.
Também não imaginam que o Lula não era exatamente o “pai dos pobres”, o sujeito bonzinho e injustiçado, que só trabalhou em favor dos desvalidos, e que acabou sendo castigado por ter sido bom. Não sei se já se deram conta de que o governo Bolsonaro é tão recheado de corruptos quanto todos os que antecederam – talvez até pior. Se ainda não acordaram, logo toca o despertador.
Seja como for, a melhor política é não deteriorar a imagem que nosso país projeta. Se nada se pode fazer para melhorar, que pelo menos não se trabalhe para piorar. A começar pelo primeiro escalão da República.
Embora não tenha a visibilidade de uma Copa do Mundo de Futebol, a abertura anual dos trabalhos da ONU é acompanhada ao redor do globo. Bolsonaro não era obrigado a comparecer. Em várias ocasiões, o Brasil já chegou a ser representado por um um ministro, não pelo presidente. Podia também ter optado por mandar um vídeo gravado. Preferiu ir pessoalmente. Nada contra. Só que…
Só que, sacumé, Bolsonaro é Bolsonaro. Ele é sempre igual a si mesmo, nunca muda. De espírito arruaceiro, adora transgredir. Se não pode pescar, ele pesca. Se não pode andar sem máscara, ele vai de cara nua. Se tem de se vacinar, ele não se vacina. E faz isso com muito orgulho. Sua egolatria lhe ocupa todo o espaço mental, sem deixar lugar para outro pensamento.
É por isso que não se dá conta de que não foi a Nova York a turismo, mas como representante de mais de 200 milhões de conterrâneos seus, todos seres humanos como ele. Seus atos e gestos transbordarão da esfera pessoal para serem interpretados como a expressão da vontade dos brasileiros. É o Brasil inteiro que, tendo recusado a vacina, foi barrado no restaurante e obrigado a comer pizza na rua, de pé, sem prato, plantado numa calçada sinistra, com a mão nua segurando o petisco gorduroso.
Agora já é terça-feira, e Bolsonaro acaba de discursar. Assisti ao vivo. Foi uma fala sem importância, saudada por aplausos protocolares vindos de uma plateia mais interessada no discurso seguinte – o de Joe Biden. O pronunciamento do capitão foi o que se esperava: pra inglês ver. Segundo ele, nossa cobertura vegetal está intacta desde o descobrimento. Todos os habitantes do território vivem num país de conto de fadas, felizes, dinheiro no bolso e feijão no prato. E, com a graça de Deus, protegidos contra o perigoso comunismo que bate às portas. De que anda reclamando esse povo venturoso?
Todos sabem que o que o capitão diz não se escreve. Sua palavra vale tanto quanto uma nota falsa. Portanto, o que ele disse, tanto faz como tanto fez. Não vai mudar a visão que o mundo tem de nosso país e de nosso governante. Infelizmente.
Não tenho palavras para descrever meu pasmo, minha absoluta perplexidade. Não consigo acreditar que tudo não passa de um pesadelo, de uma pegadinha de mau gosto para entreter convidados internacionais. Você destaca um ponto que considero emblemático para avaliar a personalidade e a saúde mental de nosso aloprado mandatário: o direito de transgredir é sua identidade e sua única forma de autoafirmação. Ele sonha em ser a única “autoridade” do mundo a desbravar corajosamente novos horizontes na ciência, na medicina, nas políticas ambientais, sociais e econômicas. Na sua mente doentia, se suas ideias e iniciativas colarem, ele será aclamado universalmente como o mais sábio pioneiro de todos os tempos. Campeão mundial de atos falhos, ele declara textualmente: “A história e a ciência saberão responsabilizar a todos (que não compartilham de seus projetos lunáticos, é claro)”. Inacreditável!
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O que você diz, faz irresistível ligação com o distúrbio mental do Lula. Também o demiurgo acredita ser a única autoridade do mundo a desbravar territórios de combate à pobreza (bolsa família), abertura de horizontes para o povo (faculdades de beira de estrada), desenvolvimento da ciência (instalação da base de Alcântara). Assim como Bolsonaro se meteu na rixa entre EUA e China, o Lula tentou apartar israelenses e palestinos.
No fundo, cada um no seu território, os dois não são lá tão diferentes um do outro.
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Pode ser, não duvido da semelhança de conduta entre dois líderes populistas. No entanto, vejo uma diferença substancial entre os dois: até onde posso me lembrar, Lula nunca contestou bravateiramente as normas e procedimentos legais, tipo pescar em áreas proibidas de reserva natural, andar de moto sem capacete, liberar motoristas de caminhão para dirigirem bêbados ou sob influência de drogas, reduzir a zero a fiscalização de propriedades na Amazônia, incentivar o desmatamento para avanço da produção agrícola, defender abertamente golpe de estado, etc. Nunca vi tamanha sanha de destruição do patrimônio brasileiro, inclusive e principalmente da imagem do país no exterior.
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Ótimos comentários. Há semelhança entre Lula e Bolsonaro principalente em suas militâncias, muitas vezes cegas. Não concordo com o discurso de Bolsonaro, nem com sua postura, é lamentável. Não significa que morro de amores pelo Lula, mas me parece que sua política fluia melhor. A dúvida que não quer calar é o que ocorreu de corrupção nos governos petistas? Isso que atrapalha votarmos novamente no Lula ou qualquer candidadto petista.
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Desculpe me intrometer no seu raciocínio e a rudeza do meu comentário. A corrupção não é atributo exclusivo dos petistas nem de outros partidos de esquerda, ao contrário. Ninguém se lembra mais de Geddel Vieira de Lima, Romero Jucá, líderes do PTB e do Centrão, nem mesmo do Michel “precisa continuar com isso aí, viu?” Temer. Enquanto houver dois seres humanos na face da terra, a possibilidade de corrupção continuará existindo. Qualquer pretendente ao trono presidencial que prometa acabar de vez com a corrupção é, portanto, um farsante que não merece crédito. Não precisamos de um salvador da pátria, nunca precisamos. Precisamos, isso sim, de um estadista que tenha um projeto claro de nação e de futuro.
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