Contagem de presos

José Horta Manzano

Faz uma semana que a mídia dá notícia de barbaridades que vêm ocorrendo em prisões brasileiras. São relatos de arrepiar, que deixam no chinelo a selvageria terrorista do Oriente Médio.

prison-6Não há muito a acrescentar ao que já foi dito e escrito. As ramificações do problema são múltiplas e as implicações, tenebrosas. Ao fim e ao cabo, fica a impressão de que o acontecido estes dias não é senão a ponta de um imenso iceberg. Pelo que entendi, há suspeita de a mistura explosiva não se restringir a insubordinação carcerária, mas abranger traficantes de droga, políticos, magistrados, altos funcionários. É nitroglicerina pura, a manipular com precaução extrema.

Um detalhe, aparentemente secundário, me impressionou. Agora, que a poeira dá sinais de baixar, as autoridades responsáveis decidiram proceder a um «censo» da população carcerária. Como é que é? Ano após ano, conhecemos o número de habitantes do país, com idade, nível escolar, situação financeira, hábitos de locomoção e todos os detalhes de cada família. Por seu lado, não se sabe ao menos quantos são os infelizes encarcerados? A notícia é inacreditável.

Uma coisa é estudar a situação jurídica de cada preso, se deveria ou não estar atrás das grades, se o julgamento foi equânime, se a pena está purgada. Outra coisa é saber quantos são. Estamos aí misturando dois assuntos. Fala-se nos milhões que teriam de ser gastos para levar a cabo a contagem. Volto a dizer: não é possível que cada estabelecimento não tenha uma lista atualizada de pensionistas e de quantos habitam em cada cela.

Chamada da Folha de São Paulo, 9 jan° 2017

Chamada da Folha de São Paulo, 9 jan° 2017

Nunca visitei uma cadeia, devo admitir. Volta e meia, no entanto, a gente assiste a um filme em que se contam os habitantes da penitenciária. Percebe-se que é atividade rotineira. Saem todos ao pátio, em pequenos grupos se necessário, e são contados. Contam-se os passageiros antes de o avião alçar voo, pois não? Contam-se os alunos de uma classe de escola, pois não?

Não dá pra acreditar que não se contem os habitantes de uma cadeia. Se estiverem sendo contados, a direção de cada presídio tem necessariamente a lista de presença atualizada diariamente. A partir daí, basta adicionar o número de inquilinos de todos os estabelecimentos do país para chegar ao total. Com os atuais meios eletrônicos de circulação da informação, poucas horas bastariam para computar o número final. Sem gastar milhões.

Recuso-me a acreditar que as prisões não tenham lista atualizada de presos. Tudo indica que o buraco está bem mais embaixo do que imaginamos.

Frase do dia — 140

«No Brasil a corrupção é um flagelo muito mais aviltante que o problema das drogas e, por mais estranho que possa parecer, em dezembro de 2011, das 514 mil pessoas encarceradas nas prisões do País, apenas 632 cumpriam pena por corrupção, isto é, pífios 0,12%.»

Jorge Pontes, Delegado da Polícia Federal, em artigo publicado pelo Estadão de 22 maio 2014.