Aula de línguas

José Horta Manzano

Com boa vontade, se consegue encontrar o lado bom de coisa ruim – e vice-versa. Até da crônica policial dos jornais, espremendo bem, algum ensinamento bom às vezes sai.

As aventuras de nosso horrível capitão já estão cansando. Tanto problema mais importante no Brasil, e só se fala dele. Agora até o Trump resolveu dar seu pontapezinho no formigueiro nacional. Uma canseira.

Donald deve imaginar estar tratando com Zambeze, Tanganika ou Bechuanalândia (pra não ofender ninguém, são países que, se existiram um dia, já sumiram). Só faltava agora o Brasil modificar suas leis para satisfazer aos caprichos daquele ogro ignorantão. Só cretinos acreditariam nessa possibilidade. E parece que houve gente que acreditou firme. Cretinice não paga imposto. Tsk, tsk…

Bom, eu dizia que as notícias policiais abrem as portas do aprendizado de dezenas de línguas estrangeiras. Duvida? Pois é como lhe digo. Tome, por exemplo, a sugestiva expressão tornozeleira eletrônica. Já é poética em si, mas há línguas que preferiram adicionar-lhe charme e a chamam de bracelete eletrônico. Um encanto, pois não? Não corresponde à realidade, mas… quem se importa com a licença poética? A conhecida “caixa preta” do avião é cor de laranja e ninguém reclama.

Aqui abaixo vai um apanhado de manchetes que colhi na mídia. Em cada uma, grifei em vermelho a expressão tornolezeira eletrônica. Algumas são facilmente reconhecíveis; quanto a outras, precisa afiar os olhos e procurar bem.

Então? Pronto para aprender o nome do cobiçado acessório que Bolsonaro já começou a portar? Antes disso, só uma observação. Dizem do ex-presidente que ele é um “quase-presidiário”. Pois eu diria que é mais que isso: já é um presidiário. Se não, vejamos:

é vigiado 24h por dia

está proibido de entrar nas redes

está proibido de sair de casa das 19h às 7h

está proibido de sair de casa nos fins de semana

está proibido de passar perto de embaixadas

está proibido de entrar em contacto com os corréus

está proibido de falar com o filho que sabe inglês

E então? Não lhe parece um verdadeiro regime de presidiário? Deveriam até descontar estes meses dos quarenta anos de sentença que deve receber.

Agora vamos às manchetes e a nosso curso “Aprenda 14 línguas em 7 minutos!”.

 

Em francês: bracelet électronique

 

 

 

Em catalão: braçalet electrònic

 

 

 

Em alemão: Fußfessel (Fussfessel)

 

 

Em tcheco: elektronický náramek

 

 

Em inglês: ankle monitor

 

 

 

Em espanhol: tobillera electrónica

 

Em italiano: braccialetto elettronico

 

Em letão: piešķirts potītes


Em lituano: apykoję

 

Em polonês: elektronicznej bransoletki

 

Em húngaro: elektronikus nyomkövetőt

 

Em romeno: brățară electronică

 

Em sueco: fotboja

 

Em finlandês: nilkkapanta

 

 

Boicote

José Horta Manzano

Gosto de comer apimentado. Para os dias em que a comida não está picante o suficiente, tenho sempre à mão um vidrinho do molho de pimenta Tabasco, feito justamente pra servir à mesa. Duas gotinhas e pronto: um prato sem graça vira uma iguaria.

Outro dia, passeando os olhos pela mesa da cozinha e lendo etiquetas de embalagem, um de meus passatempos preferidos, me dou conta de que o Tabasco é feito no país de Trump! De fato, é importado direto da Luisiana.

Me senti meio aborrecido. Com a agressividade comercial de Donald Trump fazendo o mundo inteiro temer pelo amanhã, não é confortável descobrir que estou agindo contra a corrente – em vez de me abster, continuo comprando produtos americanos.

Não é tanto por vingança, que não tenho nada contra eles, mas é questão de solidariedade para com os países que neste momento se sentem esmagados e banidos do comércio mundial.

Já que o assunto era Tabasco, tive curiosidade de saber um pouco mais sobre o produto. Descobri que já faz século e meio que é produzido na Ilha Avery, situada nos alagados do estuário do Rio Mississipi. Quem deu nome ao lugar foi a família Avery, franceses originários da Normandia, que por lá se estabeleceram nos anos 1830 e foram proprietários daquelas terras. Era o tempo em que a Nova Orléans era a porta de entrada da América francesa.

Imaginei vasculhar a lojinha do indiano aqui perto de casa. (Digo indiano, mas talvez seja paquistanês, não sei, o fato é que não fala língua nenhuma além da sua, fato que dificulta a compreensão.) A loja é minúscula, mas tem uma imensa quantidade de produtos espremidos nas prateleiras cambaleantes. Há centenas de produtos indianos, paquistaneses e de outras lonjuras do Extremo Oriente, além de artigos do mundo todo, incluindo latino-americanos e até brasileiros. Um bazar sortido.

Mesmo antes de ir ao indiano, já considerei que não vai ser fácil encontrar substituto para o Tabasco. Com todas aquelas embalagens escritas em caracteres extremo-orientais e com o balconista que não entende nada, estamos bem arranjados. Melhor não trocar o certo pelo duvidoso.

Está resolvido, fico com o Tabasco. Mas tomo uma resolução: em vez de duas gotas, vamos pingar uma gota só em cada prato.

Tenho certeza de que essa prova de desprendimento patriótico vai ajudar a cortar pela metade o PIB americano. Trump que se prepare, que comigo a conversa é apimentada.

M.A.G.A. na Groenlândia

José Horta Manzano

A Groenlândia, atual objeto da cobiça de um Trump cada dia mais agressivo, também adotou a moda do bonezinho vermelho. Só que o lema é outro:


Make America Go Away
algo como
Fora, Estados Unidos!


 

Hamburgueria

José Horta Manzano

Não faz muito tempo, Donald Trump ficou sabendo que um dos bolsonarinhos tinha fritado hambúrguer nos EUA, tinha incluído esse emprego em seu currículo e que tem usado isso como propaganda eleitoral.

Bem recentemente, Trump soube ainda que Kamala Harris, sua adversária nas eleições, também trabalhou numa hamburgueria.

Furioso, não quis ficar atrás. Entrou no primeiro McDonald’s que encontrou, requisitou um avental e mandou chamar a imprensa.

Tentou passar por um gentil atendente da rede, mas esqueceu de tirar as abotoaduras de ouro. Pegou supermal.

Candidato a prefeito, em tempos idos, numa cidade do Ceará

Gaudêncio Torquato (*)

Parece absurda, mas é verdadeira. Deixamos de dar os nomes para evitar constrangimentos às famílias. Um ex-prefeito de Aracati, cidade litorânea do Ceará, em comício animado, gritou no palanque: “Meu povo e minha pova. Vou ser reeleito prefeito de Aracati com minha fé e as fezes de vocês”. E foi.

(*) Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP e colunista.

Follow the money

José Horta Manzano

Você sabe o que é rastrear? É seguir o rastro (de alguém ou de algo). Pois é, é tão simples, mas parece que o estagiário que bolou a chamada não sabe.

Relatando uma ocorrência de resgate pago em dinheiro, a chamada diz que a polícia e o Ministério Público rastreiam o caminho do dinheiro. Está errado.

Ninguém rastreia o caminho, nem o policial mais meticuloso do mundo. Rastreia-se o dinheiro, não o caminho.

Reescrevendo a chamada, fica assim:

“Resgate de sequestro foi depositado em 40 contas; polícia e MPRJ rastreiam o dinheiro.”

Verdades para um domingo molenga

  • No Havaí, todas as sandálias são havaianas.
  • A primeira missa do Brasil foi o maior programa de índio.
  • Mulher grávida reclama de barriga cheia.
  • Os filósofos têm um problema para cada solução.
  • Lixo são as coisas que jogamos fora.
  • Coisas são o lixo que guardamos.
  • Herói é o covarde que não teve tempo de fugir.
  • Tinja o cabelo de preto para namorar e de branco para  encontros de negócio.
  • Relógio que atrasa não adianta.
  • Nasci careca, nu e sem dente. O que vier é lucro.
  • Um chato nunca perde o seu tempo, perde o dos outros.
  • Não brinque com fogo: ele não sabe brincar.
  • Celebridade é uma pessoa que trabalha duro muito tempo para se tornar conhecida, e depois passa a usar óculos escuros para não ser reconhecida.
  • Você estará velho quando começar a achar que antigamente era melhor.
  • No avião o medo é sempre passageiro.
  • Canela: parte do corpo de extrema serventia para achar móveis no escuro.
  • Amigo é alguém que tem os mesmos inimigos que você.
  • A fé move montanhas. Os ecologistas são contra.
  • Ser canhoto é muito fácil, difícil é ser direito.
  • Quando não restar mais nenhuma opção, leia o manual de instruções.
  • Evite acidentes; faça de propósito.
  • Quando criança, eu pensava que dinheiro era a coisa mais importante do mundo. Hoje tenho certeza.
  • Você sabe que está ficando velho quando as velas começam a custar mais caro que o bolo.
  • A primeira amnésia a gente nunca esquece.
  • A vantagem de ter péssima memória é divertir-se muitas vezes com a mesma piada como se fosse a primeira vez.
  • Não existem ateus numa pane de avião.

Dicas de Português

Ortografia 4José Horta Manzano

1. Vc. deve evitar ao máx. a utiliz. de abrev., etc.

2. O escritor deve prescindir de recorrer ao uso de estilo de escrita em demasia rebuscado. Tal prática costuma advir do excessivo esmero com que exibicionistas ― nem sempre ínclitos ―, cuja autoincensação decorre justamente do parco conhecimento linguístico de que dispõem, chegam a raiar o paroxismo narcisístico, sem contar, para tanto, com supedâneo sólido no que tange à formação escolástica no campo da língua pátria.

3. Anule aliterações antipáticas altamente abusivas.

4. não esqueça as maiúsculas no início das frases.

5. Fuja de lugares-comuns como o diabo foge da cruz.

6. O uso de parênteses (mesmo quando parecer relevante) é geralmente desnecessário.

7. Estrangeirismos estão out; palavras de origem vernácula são o top.

8. Evite o emprego de gíria, mesmo que pareça nice, sacou?… Então, valeu!

9. Palavras de baixo calão, porra, podem transformar o seu texto numa merda.

10. Nunca generalize: generalizar é erro fatal em todas as circunstâncias.

11. Evite repetir a mesma palavra pois essa palavra vai-se tornar palavra repetitiva. A repetição da palavra pode até fazer que a palavra repetida desqualifique o texto onde tal palavra for com insistência repetida.

12. Não abuse das citações. Como costuma dizer um amigo meu: “Quem cita terceiros não tem idéias próprias”.

13. Frases incompletas podem causar

14. Não seja redundante, isto é, não é preciso dizer a mesma coisa de formas diferentes, ou seja, basta mencionar cada argumento uma só vez. Por outras palavras: evite repetir a mesma idéia várias vezes.

15. Seja mais ou menos específico.

16. Frases com apenas uma palavra? Jamais!

17. A voz passiva deve ser evitada.

18. Utilize a pontuação corretamente o ponto e a vírgula pois a frase poderá ficar sem sentido especialmente será que ninguém mais sabe utilizar o ponto de interrogação

19. Quem precisa de perguntas retóricas?

20. Conforme recomenda a A.G.O.P., nunca use siglas desconhecidas.

21. Exagerar é cem milhões de vezes pior do que usar a moderação.

22. Evite mesóclises. Repita comigo: “Mesóclises: evitá-las-ei!”

23. De regra importante esquecer não nunca: crucial a das palavras é ordem!

24. Analogias na escrita são tão úteis quanto chifres numa galinha.

25. Não abuse das exclamações!!! Nunca!!! O seu texto fica horrível!!! Acaba parecendo um tuíte!!!

26. Evite frases exageradamente longas pois estas dificultam a compreensão da idéia por elas abarcada e, por compreenderem mais que uma idéia central, o que nem sempre torna seu conteúdo accessível, forçam, destarte, o infeliz leitor a dissecá-las nos seus diversos componentes, de forma a torná-las compreensíveis, o que não deveria ser, afinal de contas, parte do processo da leitura, hábito que devemos estimular através do uso de frases mais curtas.

27. Cuidado com a hortografia, para não estrupar a língoa portu-guêza.

28. Seja incisivo e coerente. Ou não.

29. Não vá estar escrevendo (nem vá estar falando) no gerúndio. Você vai estar deixando seu texto pobre e vai estar causando ambiguidade. Com certeza, você vai estar deixando o conteúdo esquisito, vai estar ficando com a sensação de que as coisas ainda vão estar acontecendo. E como você vai estar lendo este texto, tenho certeza de que você vai estar prestando atenção e vai estar repassando aos seus amigos, que vão estar entendendo e vão estar pensando em abandonar esta maneira irritante de estar falando.

30. Venha cá, meu rei! Outra barbaridade que deves evitar, tchê, é usar expressões que denunciem a região de onde vens, ô meu! Uai…esquece esse trem! Vixi… entendeu, bichinho?

31. Não permita que seu texto acabe por rimar, porque senão ninguém vai aguentar, já que é insuportável o mesmo final escutar, o tempo todo sem parar.