José Horta Manzano
Quando Herr Ignaz Pleyel deixou sua Áustria natal e emigrou para a França, lá pelos anos 1780, não imaginava que seu nome seria ainda mencionado na mídia mais de 200 anos depois. Aliás, nem sabia o que era mídia, que essa palavra ainda não havia sido inventada.
Ao se naturalizar francês, Herr Pleyel tornou-se Monsieur Ignace Pleyel. Músico de formação, foi já com a idade de 40 anos ― respeitável para a época ― que nosso herói decidiu começar a fabricar pianos. Dado que na época não havia BNDES, os inícios foram modestos. A única ajuda com que o corajoso empresário pôde contar foi a de alguns amigos e simpatizantes. Quando faleceu, em 1831, legou ao filho uma fabriqueta.
Os anos passaram e a marca foi adquirindo renome. Numa época em que não havia rádio nem televisão, ter um piano no canto da sala era ponto de honra para toda família de respeito. A produção da firma atingiu 2500 pianos por ano no fim da década de 1880.
A crise de 1929 bateu feio e levou a empresa à falência. Mas a marca era forte demais para rolar com a enxurrada. O banco Crédit Lyonnais adquiriu o nome e continuou a fabricar os instrumentos.
Pelo final dos anos 1990, o número de pianos vendidos pela firma ainda era de dois mil por ano. De lá para cá, infelizmente, a degringolada foi dorida. A crescente concorrência do Extremo Oriente ― primeiro o Japão, depois a Coreia do Sul e principalmente a China ― solapou a empresa. O valor da mão de obra francesa pesava muito no preço final dos instrumentos. Para ouvidos menos experimentados, o que contava era muito mais preço do que pureza de som.
O final melancólico chegou. A firma acaba de anunciar que fechará as portas e encerrará suas atividades no final deste ano. Foram, aos poucos, abandonando o fabrico de pianos populares para dedicar-se aos instrumentos de luxo, de elevado desempenho. Um Pleyel atual pode custar até 200 mil euros.
São obras de arte, inteiramente feitos à mão num trabalho que pode levar até um ano. Cada unidade demanda duas mil horas de trabalho de diferentes especialistas, do marceneiro ao afinador, passando pelo laqueador e por outros artesãos. As encomendas não ultrapassam 20 ou 25 pianos por ano, o que não é suficiente para garantir a perenidade da indústria.
A entrega do último instrumento vai tirar o emprego de uns 15 funcionários e vai umedecer os olhos de milhares de músicos ao redor do globo. Que fazer? É o progresso.

