Crioulo

Árvore genealógica

José Horta Manzano

O mundo parece gostar de se surpreender com o novo papa. A cada dia, surge nova informação, nova faceta de sua vida e de sua trajetória, incitando à curiosidade por seu passado. Como nos velhos tempos, cada um parece estar correndo atrás de um pequeno retalho de batina, de fáscia ou de peregrineta para fazer uma relíquia. Esse fascínio pelo chefe da Igreja já se registrava nos primeiros papados mas, com a visibilidade das redes sociais, está se tornando mais intenso e globalizado.

Já se disse que o Papa Leão XIV nasceu nos Estados Unidos e passou cerca de 20 anos no Peru, o que torna sua trajetória ainda mais interessante. Não foi alguém que permaneceu na retaguarda, longe da ação; pelo contrário, ele se envolveu ativamente como missionário e percorreu diversas regiões, espalhando sua fé e vivenciando culturas distintas. Esse papel de missionário é um reflexo do dinamismo que caracteriza sua personalidade, sempre buscando se conectar o mundo que o circunda, um traço que tem sobressaído desde que ascendeu ao papado.

Uma questão particularmente interessante diz respeito à análise das suas origens, um fator carregado de sensibilidade, especialmente em sua terra natal, um país cuja história está entrelaçada com questões de raça e identidade. As origens de Leão XIV, longe de serem meramente um detalhe biográfico, oferecem uma chave de leitura para a compreensão da história contemporânea, na qual o Papa surge como uma figura que atravessa fronteiras culturais e étnicas.

Em artigo publicado há dias no The Conversation, Chelsea Stieber, historiadora e pesquisadora, traça um retrato mais detalhado das descobertas feitas por uma genealogista a respeito de Robert Francis Prevost, nome de batismo do novo papa. De acordo com Stieber, do lado materno, o Sumo Pontífice tem origens ‘creoles’, um termo que, na língua inglesa, pode gerar confusão, dada sua ambiguidade. Tradicionalmente, a palavra “creole” é usada para se referir a indivíduos de ascendência europeia, descendentes dos primeiros colonizadores franceses ou espanhóis nas Américas. No entanto, esse termo também pode se referir a indivíduos mestiços, fruto da união entre colonizadores e negros, particularmente nas vizinhanças da antiga América Francesa, a atual Luisiana.

O artigo de Stieber, no entanto, não esclarece com precisão de que categoria de ‘creole’ Leão XIV descende. Numa possível interpretação, ele poderia descender de “gens de couleur libres” – expressão histórica utilizada para descrever escravos alforriados, que viviam à margem da sociedade colonial. Documentos de pesquisa indicam que o avô materno do papa, Joseph Norval Martínez, nasceu no Haiti, o que adiciona uma camada fascinante à genealogia do pontífice.

O papado de Leão XIV, que acaba de começar, abre um vasto campo para investigações. Genealogistas e estudiosos têm diante de si boa oportunidade de desenterrar documentos, consultar cartórios, registros de paróquias e arquivos esquecidos. No entanto, é importante destacar que essas descobertas, ainda que interessantes, não passam de curiosidade. No fundo ninguém é responsável por seu passado longínquo.

O que realmente importa, e o que permanecerá para a história, são os fatos e gestos de Leão XIV. O que virá a partir de agora é mais importante do que qualquer descoberta genealógica ou fofoca de rede social.

Quem viver, verá.