Você sabia?
José Horta Manzano
A Suíça tem território pequeno, mas geograficamente bastante complexo. Montanhas altas e intransponíveis, lagos, vales profundos, geleiras eternas, paredes íngremes, canyons apertados. Essa configuração, queira-se ou não, é uma das razões da existência do país. Mas voltaremos a esse assunto numa outra ocasião. A história que eu queria lhes contar hoje é outra.
No final dos anos 20, surgiram as primeiras estações de rádio, uma maravilha técnica para a época. O impacto deve ter sido imenso, difícil de avaliar hoje. Talvez tenha impressionado mais do que o aparecimento dos telefones de bolso que conhecemos hoje. Imaginem só: num mundo cuja musicalidade só se exprimia, até então, pelo coro da igreja aos domingos, surgiu um meio mágico de trazer a orquestra para dentro de casa. E as notícias, e as entrevistas, e as novelas. Há de ter sido u
ma revolução.
É, mas nem todos os cidadãos podiam participar da festa. A configuração geográfica particularmente acidentada do território impedia que as ondas radiofônicas chegasse ao fundo de vales mais profundos ou atrás de montes mais imponentes.
Não era justo. Todos faziam parte da mesma sociedade, cumpriam suas obrigações, pagavam seus impostos. Por que, então, os habitantes de regiões afastadas seriam privados de usufruir essa novidade que encantava todo o mundo? Eram todos filhos do mesmo Guilherme Tell. Uma solução tinha de ser encontrada.
Quem procura, acha. E nem precisou muito tempo. Já em 1931, a concessionária nacional de telefones implantou um sistema que permitia levar as ondas do rádio a todos os rincões do país. Desde que o pretendente dispusesse de uma linha telefônica. Fixa, naturalmente. Por estas bandas, o telefone já era bastante difundido à época ― era, aliás, o cordão umbilical que ligava regiões recuadas aos grandes centros.
Não foi, portanto, difícil levar o som do rádio aos grotões. Utilizou-se um sistema análogo ao moderno adsl: o mesmo cabo transporta dois feixes de ondas (telefone e rádio), cada um numa frequência diferente. Hoje parece evidente, mas 80 anos atrás era uma conquista e tanto!
O novo sistema recebeu o nome de Telefonrundspruch em alemão. Como é hábito no país, a palavra foi adaptada para as outras duas línguas oficiais. Ficou télédiffusion en francês e filodiffusione em italiano. Seis canais eram transmitidos, dois em cada língua. Havia para todos os gostos: música clássica, variedades, música popular. A recepção era perfeita, sem chiado, sem interferência. Não havia hotel que não dispusesse daqueles radinhos, um em cada quarto. Restaurantes, estabelecimentos comerciais, salas de espera, aquele som aveludado estava por toda parte. Muitas casas particulares, ainda que se encontrassem em grandes centros, apreciavam a pureza do som e tomavam assinatura.
O sistema foi mantido até o fim dos anos 90, quando deixou de fazer sentido. Assim que milhares de estações de rádio e de televisão passaram a estar disponíveis via satélite, o velho sistema de 6 canais fixos entrou em rápido declínio. Ninguém mais se interessou por ele. Foi descontinuado.
O sistema era simples, mas prático e simpático. Deixou saudade.