Alívio e preocupação

José Horta Manzano

Alívio

Não há motivo pra reclamar: pelo menos nos dois municípios mais populosos do Brasil, Rio e São Paulo, evitou-se a catástrofe. No Rio, berço político de Bolsonaro, um assessor e amigo íntimo do antigo presidente se candidatou à Prefeitura e acabou derrotado por ampla margem.

Em São Paulo, um salafrário surgido das trevas se valeu de comportamento pérfido a fim de desmerecer os demais candidatos, seus adversários. Em metódica sanha de destruição de reputações, o indivíduo não hesitou em cometer crime de falsidade ideológica, denúncia de falso crime, criação e divulgação de notícia falsa, injúria, calúnia e difamação.

Apesar do auê que provocou, e que se levantou como ola agitando os caminhos ingênuos das redes, não chegou aonde queria. Ficou em terceiro lugar e acabou fora do segundo turno.

Além da derrota, vai ter de enfrentar processos na Justiça – na mais recente contagem já eram 130 ações. Algumas delas têm potencial de condená-lo a uma inelegibilidade de 8 anos, o que o alijaria das próximas duas presidenciais.

Esse foi o alívio, agora vem a preocupação.

Preocupação

Os paulistanos foram às urnas sabendo quem era o forasteiro arruaceiro. Ninguém pode alegar ignorância. Nas últimas semanas, o personagem deu exaustiva mostra de especial talento para a destruição, sem mostrar ter, em contrapeso, boas ideias para o bem comum. Todo o mundo viu isso, portanto, ninguém pode dizer que votou enganado.

Assim, os 28,15% de votos dados ao cavalheiro Marçal foram votos refletidos, pesados e decididos. Trocando em miúdos, essa porcentagem de ar inofensivo informa que 2 em cada 7 eleitores votaram nesse senhor. Dois em cada sete!

Imagine estar numa rodinha de conversa, acompanhado de outras 6 pessoas. Pois acredite: as estatísticas indicam que dois participantes da roda escolheram votar nesse pilantra. É muita gente!

Dizem que o brasileiro comum não se informa mais pelos canais tradicionais (jornal, rádio, tevê), mas só consulta redes sociais e só nelas bota fé. Não há como negar. Mas devo pôr as coisas no lugar. Se o simples fato de se informar pelas redes fosse suficiente para decidir votar no candidato de boné, todos os paulistanos comuns teriam votado nele. Não foi o que aconteceu.

Se algo vai mal, é a cabecinha dos que cometeram esse voto temerário. Uma coisa é votar num rinoceronte para vereador (São Paulo, 1959), num palhaço ou num estilista para deputado. Outra coisa, bem mais grave, é escolher um paraquedista torpe e perigoso para governar a maior cidade do país. Nesse estágio, o jogo não admite brincadeiras.

O estrago não se chama Pablo Marçal, que esse passou. O dano maior preexistia à chegada de Marçal e permanece após sua saída de cena. A verdadeira distorção está na personalidade dos cidadãos que deram seu voto a ele. A preocupação continua viva.

O próximo aventureiro que proporcionar um show de horrores – com agressões verbais e físicas, insultos e golpes abaixo da cintura, shows para otário ver (conforme disse Marçal) – tem boas chances de obter excelente votação. Quiçá de ser eleito.

Se essa perspectiva não for inquietante, o que será?

2 pensamentos sobre “Alívio e preocupação

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