Por que os gringos odeiam farofa?

Marcos Nogueira (*)

Se houvesse uma Copa do Mundo da comida, que prato representaria o Brasil?

O Japão chegaria forte com o sushi. Os Estados Unidos escalariam o hambúrguer. A Itália, grande potência nesse esporte, levaria a pizza.

Aqui na América do Sul, o Peru seria bastante competitivo com o ceviche. E nós? Que comida é a cara do Brasil para o resto do mundo? Já tentamos muitas vezes emplacar a feijoada como prato nacional, mas há de se admitir que ela é um péssimo produto de exportação.

Vários de seus ingredientes só existem no Brasil. O negócio, convenhamos, não tem uma aparência assaz atraente. As partes menos populares do porco criam rejeição automática numa parcela considerável da humanidade.

O que realmente pegou no estrangeiro foi o rodízio de churrasco. Tem rodízio brasileiro em qualquer cidade grande dos EUA e da Europa. Aí surgem alguns complicadores. Primeiro, churrasco não é um prato: é um método de preparar comida, existente em toda sociedade que conheça o fogo. Segundo, rodízio é somente um sistema de serviço.

Por último, mas não menos importante, a churrascaria rodízio só faz sucesso no exterior. Aqui, onde foram enormes nos anos 1990, já estão em declínio há bastante tempo. O rodízio não representa o Brasil destes dias.

O que sobra? Pão de queijo? Não é prato, é merenda para comer com café. Açaí? Poupe-me.

A farofa merece exame mais detalhado. Está presente no Brasil todinho, com um sem-número de variações possíveis. A farinha de mandioca tem seus trocentos subtipos: grossa, fina, finíssima, flocada, farinha d’água, farinha crua, farinha torrada. Mas também dá para fazer farofa de milho ou de pão velho.

Da banana ao ovo, da uva-passa aos miúdos de frango, a farofa aceita qualquer complemento.

A farofa é genuinamente nacional. Isso pode ser encarado como uma vantagem – a identidade única – ou como um empecilho para transcender a brasilidade.

Não conheço nenhum gringo que goste de farofa. Todos a acham seca, não veem sentido naquele montinho de farelos áridos. A farofa nasceu da necessidade de preservar alimentos no calor lazarento que faz no Brasil. Menos água significa um ambiente hostil para bactérias.

Fica seco, mas a gente mistura com feijão, com vinagrete, pega líquido de outra comida qualquer. E a gente adora a textura crocante. Enfim, a farofa não teria chance na hipotética Copa das comidas. Mas ainda bem que comida não é competição.

Se os gringos não querem farofa, o azar é deles.

(*) O jornalista Marcos Nogueira é colunista da Folha de São Paulo.

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